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domingo, 25 de janeiro de 2015

Boca do Céu - Capítulo 8 - Sou Grato por ter existido o Boca do Céu! - Por Luiz Domingues


Dessa forma, o fim da banda não causou-me melancolia ou insegurança alguma a época. Ao analisar hoje em dia, sinto até uma ponta de orgulho por ter sido maduro o suficiente, apesar de meus dezenove anos incompletos na ocasião, para superar essa perda, e ter tido a coragem para seguir em frente. E por outro lado, ao relembrar isso, tenho um carinho muito grande pelo Boca do Céu/Bourréebach. 

Foi com essa banda iniciante que eu transmutei um sonho impossível na verdade, ao estabelecer a transição do onírico à matéria. Responsável pelo impulso inicial, que tirou-me do sonho à realidade, essa banda teve um papel fundamental nessa transição. Tenho muita saudade desse tempo, principalmente os primeiros instantes, entre 1976 e 1977, onde a força de vontade foi o motor que manteve-me nessa senda. 

O Boca do Céu tem um significado muito especial na minha trajetória, conforme saliento novamente. Apesar de ter sido tecnicamente uma banda com parcos recursos, pelo fato de seus membros terem sido iniciantes na música, naquela ocasião (principalmente eu mesmo). E certamente por isso, é que possui esse valor sentimental enorme para a minha carreira. 

Tenho muito carinho por esse tempo primordial, por tudo o que vivi e não foram poucas as impressões e vivências: foi o ambiente de meio/final dos anos setenta e ainda tive o privilégio de vivenciar o final de uma Era.
Hoje, ao relatar essas reminiscências minhas, vejo muitos jovens com os seus olhos a brilhar mediante os meus relatos e fico contente por ter vivido essas experiências na música, e no Rock em específico. Tenho carinho também pela minha minha/nossa tenacidade juvenil. Esse entusiasmo, essa convicção e força de vontade, fizeram de minha pessoa um músico de fato. 

Se eu fosse fazer valer-me pela vocação, aptidão natural, ou ouvido musical, eu jamais conseguiria. Eu só tornei-me músico e construí uma carreira com dezoito discos lançados no mercado (na somatória de todas as bandas, até 2016), por que tive uma vontade ferrenha. E o Boca do Céu teve esse papel como mola propulsora, inicial e fundamental. 

Mesmo sendo uma banda formada por jovens sem as melhores condições técnicas ideais para começar um trabalho autoral (com exceção do guitarrista, Osvaldo Vicino, que já tocava e o Wilton que entrou a posteriori e tinha técnica, graças aos seus estudos pregressos), acho que essa força de vontade não foi exclusividade minha e nós tivemos mesmo essa vontade coletiva ao conseguimos sair da inércia inicial, e levar a banda para patamares muito significativos, ao considerar-se as nossas condições técnicas e pela ingenuidade juvenil dos membros, eu incluso, logicamente. 

O fato de termos tocado em festivais, principalmente o FICO, com direito à transmissão televisiva, foi uma grande vitória coletiva, que eu particularmente, orgulho-me. Sei que o Laert pensa o mesmo, e acho que o Osvaldo também, para citar os dois que tenho contato até hoje (recentemente, 2013, retomei o contato com Fran Sérpico, também).
Sou muito grato ao destino, que sob uma improvável ação de um anúncio classificado, que foi publicado em uma revista importante da época, colocou o Laert em nosso caminho. 

Com a sua inteligência, cultura, perspicácia e talento nato, impulsionou a banda. Sem ele, não teríamos evoluído tão depressa. Claro que o grosso do material que produzimos, ficou aquém do que faríamos no futuro, tanto eu, quanto o Laert, em bandas futuras em que seríamos membros, mas chegamos a ter músicas interessantes no Boca do Céu, apesar de sermos tão fracos tecnicamente. Músicas como: "Revirada", "No Mundo de Hoje", "Centro de Loucos", "Serena", "Diva", "Na Minha Boca" e “Instante de Ser”, tinham qualidade, ao considerar-se as condições pelas quais foram compostas. Anos depois, as músicas: "Na Minha Boca" e “Instante de Ser” entraram para o repertório do Língua de Trapo, e fizeram sucesso nos shows dessa banda, por exemplo.
Tenho saudade desse tempo também pela vivência cultural intensa que eu tive, pelos shows incríveis que assisti, pelas andanças por teatros, salas de cinema, exposições, museus, palestras das mais variadas motivações. 

Foi uma época em que eu fui um consumidor voraz de cultura em geral, mas a amálgama sempre foi o Rock, e os ideais hippies, contraculturais etc. Tenho saudade da alegria que sentia quando acordava na manhã de um sábado, e sabia que ensaiaria naquele dia. Cada ensaio representava mais um passo em direção ao sonho. O cabelo pela cintura, as batas indianas, e a calça boca de sino, com a utilização de remendos coloridos... pois é, os meus pais achavam que aquilo era fantasia de festa junina, mas eu achava o máximo andar vestido a parecer com ícones meus que assim trajavam-se, em seu cotidiano, tais como Roger Daltrey ou Neil Young...
Chego ao final desta etapa, e agora é a hora para agradecer aos amigos e familiares que apoiaram a nossa banda. 

Os colegas que gravitaram nos primórdios da formação do Boca do Céu em 1976, invariavelmente foram colegas da oitava série do curso fundamental da Escola Municipal Maria Antonieta D’Alckmin Basto, na Vila Olímpia, zona sul de São Paulo. Além dos que foram membros da banda, cito Gabriel, Nelson e Toninho que foram colegas de classe e acompanharam com constância no início, a nossa movimentação para formar a banda, além de outros tantos, incluso colegas que eu conhecia desde 1968 (Grupo Escolar de Vila Olímpia) e outros tantos de 1973 (Ginásio Estadual de Vila Olímpia), em diante e que com maior ou menor profundidade, observaram os nossos esforços nessa mesma determinação. 
Irmãos Vicino em foto de 1976, bem nos primórdios do Boca do Céu. Na foto, Osvaldo está a tocar na companhia de suas irmãs. E foi nessa residência dos Vicino, um apartamento situado em Moema, bairro da zona sul de São Paulo, que realizamos as nossas primeiras reuniões com a banda, a partir de abril de 1976. Acervo e cortesia de Osvaldo Vicino 

Sou muito grato à família do Osvaldo Vicino, na figura de seu pai que era/é um gentleman, sua mãe (in memorian), e irmãs que torceram bastante e apoiaram-nos, além de Nelson Gravalos, namorado (e marido até os dias atuais), de sua irmã, Beth Vicino, pela filmagem da banda em um celuloide Super-8, em junho de 1977.

Agradeço à família de Fran Sérpico que aturou-nos por muitos ensaios barulhentos, além das sessões de televisão na sala de estar da sua residência, quando o ensaio estabelecia uma pausa estratégica para que pudéssemos assistir o programa: “Rock Concert”, da Rede Globo de Televisão, quando grudávamos os nossos olhos e ouvidos na tela, desde a introdução da vinheta, a mostrar uma colagem com imagens de shows de Rock de bandas clássicas setentistas internacionais, ao som da canção, “Led Boots”, do LP “Wired”, de Jeff Beck, dali até o último segundo daquela atração...

A figura sensacional de Dona Olga Falci (in memoriam), mãe do Laert Sarrumor, que protagonizou muitas histórias boas naqueles anos todos. E acredito que a sua torcida pelo filho, que era impressionante, produziu uma energia vitoriosa que acompanhou-o doravante, ao torná-lo um artista celebrado que o é, e com todos os méritos.

O primo freak, do Wilton Rentero, Sidnei Miranda (e a sua simpática namorada, hoje esposa, Adelaide Giantomaso), que foi uma figura sensacional, com mil histórias fascinantes sobre o movimento hippie no Brasil. Saudade do convívio que foi super prazeroso pelas conversas, hospitalidade e muitos sons incríveis advindos de sua pick-up alimentada por uma coleção de discos, primorosa.

A família de Pollyana Alves, nas figuras de seus pais (in memoriam), e a sua irmã, Eliana Rímole Alves, que foram pessoas de uma docilidade impressionante. A acolhida em seu lar para os nossos ensaios, foi mais que uma gentileza, pois sentíamos o entusiasmo cativante deles em torcer pelo nosso sucesso.
A turma do bairro do Tatuapé, na zona leste de São Paulo, que gravitava em torno dos meus primos (os irmãos Turci), que lá moravam e misturavam-se aos meus colegas de escola, em conexões comuns até por coincidência. Cito: Luis Canton, Cri, Amaury Martins, Alcides “Cidão” Trindade (Cido), Eduardo Viscome, Chaím, Luiz Antonio Galvão, Norinho, Fábio Malatesta, “Piu-Piu” (in memoriam), “Cabelo”, Marcos e Regina de Fátima Nunes Galassi (que foi minha namorada na época), além de mais outros que fogem-me da lembrança os seus nomes (perdão pelo lapso de memória!). 

Das turmas do meu colégio, Oswaldo Catalano, em que fui aluno entre 1977 e 1979, além do quase vizinho, mas morador da mesma rua, cujo nome esqueci-me completamente (mil perdões, amigo!), mas que aparentava ser um "freak" e só por ver-me cabeludo a chegar para morar na Rua Jacirendi, no início de 1977, mostrou-se hospitaleiro e sem nem conhecer-me direito, tocou a campainha de minha nova residência e emprestou-me os seguintes LP’s: o triplo a conter a trilha do filme sobre o Festival de Woodstock e Mutantes ao Vivo...ou seja: ”I wanna take you higher”, que os "Anjos do Sul" já vão chegar...
E logicamente que agradeço a minha família, por apoiar-me, ainda que nessa fase, principalmente ao pensar no meu pai em específico, foi apenas uma tolerância estratégica, pois seguramente que ele não levou a sério os meus esforços. No entanto, agradeço (é claro), por tudo, principalmente pela paciência nas fases em que a banda ensaiou em nossa residência e não deve ter sido nada fácil para eles, pois além de não termos condições acústicas adequadas para promover ensaios de uma banda de Rock, pesou contra, o fato do nosso equipamento ser precário e sobretudo, a nossa condição musical como iniciantes, insípida, portanto, deve ter sido um tormento para eles.

Aproveito, e estendo o agradecimento aos meus tios e primos que apoiaram diretamente essa etapa, inclusive por ceder a sua residência para o Laert estudar no piano da família, fora o apoio e entusiasmo pela banda. Grato, família Barretto Turci, tios José Rubens & Hortência e meus primos: José Rubens Junior, Marco Antonio, Siomara e Alcione Turci.
E sou muito grato aos companheiros dessa primeira etapa da minha jornada musical, certamente! 

Chegou a hora de agradecer a cada personagem dessa etapa inicial da minha trajetória musical. Começo a falar sobre os que tiveram participação menor com a banda.

Bernardão “Janjão”

Bernardo Lopes de Almeida (vulgo “Bernardão” ou “Janjão”), foi o terceiro membro do grupo, além do Osvaldo e eu, Luiz, no início. Convivemos desde 1974, como colegas de escola, e também dividimos sonhos Rockers. Ouvimos muito os discos do “Deep Purple”, “Nektar” e tantas outras bandas que adorávamos. Fora “Mutantes”, cujo LP “Tudo Foi Feito pelo Sol”, ele sabia de cor e salteado. Fomos juntos ver o show do Rick Wakeman, em 1975, uma grande lembrança que guardo. Sobre o Bernardo, perdi o contato, desde que saiu do Boca do Céu, em 1976. Espero que esteja bem!

Edson Coronato

Edson Coronato, a quem apelidávamos como: Edson "Coverdale", embora ele gostasse mais do Ian Gillan... (que ironia!). Sujeito cem por cento bacana, e certamente o melhor centroavante de nossa escola, no futebol. Edson Coronato encontrou-me um dia nos anos oitenta, a andar nas proximidades da Av. Santo Amaro, na zona sul de São Paulo. Acho que foi em 1988, mais ou menos, quando eu estava a atuar com a banda "The Key", maliciosamente apelidada como: "A Chave sem Sol". 

Em 2006, eu ainda não acessava a internet, quando soube que ele mandou um depoimento bonito, a relatar ter me visto em ação com o Pedra, quando abrimos o Uriah Heep, na casa de espetáculos, Via Funchal, em São Paulo, através do site dessa banda. Mas apesar de eu ter respondido rápido, ninguém ajudou-me de imediato a postar isso e a resposta demorou tanto a ser digitalizada e enviada, que ele deve ter ficado bravo comigo, pois não respondeu depois. Se estiver a ler este relato, fica aqui a minha sincera desculpa por essa falha de comunicação, e esteja convidado a adicionar-me em qualquer rede social onde eu estiver! Vamos relembrar os bons tempos da nossa escola, sobre o nosso time de futebol, o "Universal", e a nossa paixão mútua pelo Rock.

Pollyana Alves    
       Pollyana Alves, em foto bem mais recente, dos anos 2000

Pollyana Alves e a sua irmã, cujo nome é Eliana Rímoli Alves. E certamente, sua abnegada família, que foi entusiasmada pela música. Foi curta a sua participação, mas teve sua parcela de ajuda, também. Fiquei anos sem contato pessoal com ela e sua irmã, desde 1978, mas o Laert disse-me em 2011, que elas eram suas amigas na extinta Rede Social Orkut. Recentemente, 2016, finalmente conectamo-nos na rede social Facebook, onde conversamos com bastante entusiasmo.

Eva

Quanto à outra vocalista, Eva (um caso lamentável para a narrativa, porém, eu não recordo-me do seu sobrenome), também perdi o contato faz anos. A última vez que a vi, foi em um ensaio do Língua de Trapo, que eu assisti na condição de ex-membro, em 1982, na casa dos irmãos Luiz & João Lucas, na Vila Olímpia, zona sul de São Paulo. Também espero que ela esteja bem e feliz. E a cantar a canção, “Mercedes Benz”, a capella, ao estilo de Janis Joplin, como ela gostava de fazê-lo quando a conhecemos em 1978.

Zé Claudio
    Zé Claudio, em ação com o Violeta de Outono, nos anos oitenta

O baterista, Zé Claudio, tocou anos depois no famoso grupo de Rock, “Violeta de Outono”. Encontrei-me com ele em algum momento entre o meio e o final dos anos oitenta, e fiquei contente por vê-lo a atuar em uma banda com renome. Curiosamente, um outro baterista com estreita relação profissional comigo, a tratar-se de José Luiz Dinola (meu companheiro d' A Chave do Sol, Sidharta, e alguns trabalhos avulsos, e tudo isso relatado também em seus respectivos capítulos desta autobiografia), tornou-se baterista oficial do Violeta de Outono, muitos anos depois, a reforçar o elo de árvore genealógica em comum que estabeleci com o grande guitarrista, Fábio Golfetti.

Paulo Estevam Andrade

O guitarrista, Paulo Estevam Andrade, vulgo “Tevão” (igualmente conhecido pelo apelido, "Paulo Sustenido"), também teve passagem curtíssima pela nossa banda, e logo depois da criação do "Grupo de Poesia e Música" da Faculdade Cásper Líbero, perdi o contato, também. Não sabia de nada sobre ele, desde 1979, quando retomamos o contato recentemente através da rede social, Facebook, em 2014. Hoje em dia, ele é professor e mora na cidade de Marília, no interior de São Paulo. Conversamos então rapidamente sobre o curto espaço de tempo em que convivemos, no ano de 1979.

Cido Trindade

E vale lembrar também de Cido Trindade, que nunca foi membro da banda, mas acompanhou os seus passos, e chegou a fazer um show ao vivo, como convidado especial, em um momento de reformulação que tivemos, em 1978, e relatado devidamente.

Falo agora sobre o núcleo mais sólido do Boca do Céu:

Wilton Rentero
Wilton Carlos Rentero, a quem agradeço pelo companheirismo, pelo impulso técnico e confiança que transmitiu à banda nos meses em que tocou conosco em 1977. Não o vejo desde 1978, quando ele saiu da banda, ao alegar que iria dedicar-se ao estudo de violão erudito. Soube pelo Laert, que ele apareceu em um show do Língua de Trapo, em Guarulhos-SP, onde mora e trabalha como professor universitário na Universidade de Guarulhos. Graduou-se em Letras com várias especializações, escreveu muitos livros acadêmicos e é bem atuante no sindicato da sua categoria. 

Fica aqui uma menção ao primo dele, que chamava-se, Sidnei Miranda (estendido à sua então namorada e hoje, esposa, Adelaide Giantomaso), e que deu muito apoio ao Boca do Céu. Além de ser uma referência para nós, por ser mais velho e hippie dos primórdios do movimento, tendo muitas histórias para contar e com uma bela coleção de discos que colocou à nossa disposição para ouvirmos. Saudade das visitas que fazíamos à casa dele, no bairro da Casa Verde, na zona norte de São Paulo, onde varamos madrugadas juntos a ouvir sons incríveis na vitrola, "Gradiente" (Syd Barrett - Madcap Laughs...).

Fran Sérpico
           Fran Sérpico, em foto bem mais atual, dos anos 2000

Francisco Sérpico, que apesar de ter não ter tido a mesma tenacidade dos demais por questão de escolha sua, naturalmente, teve no entanto, a sua parcela de colaboração grande, é claro. Sobre a tenacidade, nada a reclamar, pois foi uma questão de fórum íntimo e ele teve suas outras prioridades em mente e que aliás, diga-se de passagem, garantiu-lhe o sucesso na vida ao levá-lo à uma carreira profissional muito bem sucedida e a construção de uma bela família. 

Ao falar de sua participação conosco, foi incrível a sua trajetória ao instrumento sem o uso de uma caixa (snare drum), peça fundamental no kit, mas mesmo assim ele levou adiante. A sua generosidade em transformar a própria residência em nosso “QG”, foi imensa. E cabe aqui também um agradecimento à sua família, que aturou-nos por um bom período, com ensaios semanais barulhentos, com direito ao entra-e-sai de convidados etc. Saudade dos ensaios na residência dele, no bairro do Campo Belo, com direito às idas ao recém inaugurado Shopping Ibirapuera, onde causávamos estranheza pelo nosso visual hippie, ao contrastar com os playboys ali presentes. 

Poucos dias antes do natal de 2016, Fran Sérpico deu-nos um presente de natal inesquecível ao providenciar enfim a digitalização e edição do histórico vídeo em formato Super-8, que filmamos com a banda no quintal de sua residência, no dia 12 de junho de 1976. Tal documento tornou-se o único, raro e histórico registro da nossa banda em ação, portanto, nem sei o que dizer para agradecer-lhe por tê-lo guardado nesses anos todos e providenciado a sua digitalização para apresentação pública, ad eternum. 

Sou-lhe grato também, pois prestou um bonito depoimento no Facebook, ao falar do Boca do Céu, e enaltecer o Laert e eu, Luiz, também, por termos profissionalizado-nos e construído carreira artística, incluso com pontos em conjunto, caso do Língua de Trapo.

Laert “Sarrumor” Julio
       Laert Sarrumor, em foto bem mais recente, dos anos 2000

Laert Júlio Pedro Jesus Falci... com esse nome de imperador do século XIX, mediante essa profusão toda. Laert tem talento nato, criatividade, força de vontade, poder de organização, espírito empreendedor e mostra-se como um visionário. 

Com o Laert, saímos do patamar de uma banda sem condições mínimas nem para ensaiar com um mínimo de organização, para algo palpável, ao ponto de fazer planos auspiciosos para a nossa expansão etc. 

Laert Sarrumor tornou-se anos depois, conhecido pelo Língua de Trapo, mas também pela carreira como ator (já atuou no cinema várias vezes), especiais de TV, apresentador de programa de TV, dublador do personagem, Topo Gigio (versão anos 1980), escritor de livros com sucesso "best seller", redator de humor, radialista (está a atuar desde 1983 com o programa: "Rádio Matraca" no ar, pela USP FM), cartunista, ilustrador, garoto propaganda em comercias de TV...
O Boca do Céu é o embrião mais remoto do Língua de Trapo, pela nossa ligação em conjunto. Eu também toquei no Língua de Trapo em duas passagens por essa banda: desde a sua fundação, até 1981, e depois no período 1983-1984. Tenho contato permanente com o Laert. E vale relembrar a Dona Olga, sua mãe. Figura sempre presente na vida do Boca do Céu.

Osvaldo Vicino
          Osvaldo Vicino, em foto bem mais atual, dos anos 2000

O responsável pela pedra fundamental da fundação da banda e a quem quero agradecer efusivamente, é Osvaldo Vicino, meu colega da 8ª série, que formulou o convite para formarmos uma banda de Rock, em abril de 1976. Foi ele também que teve a paciência para esperar eu aprender o be-a-bá da teoria musical, e adestramento mais básico ao baixo. 

Seu segundo impulso para ajudar-me, foi tentar adaptar uma guitarra Gianinni velha que ele possuía, como baixo e santa ingenuidade de nós dois, claro que não deu certo. 

Depois, foi ele que viu um baixo usado, “handmade” na vitrine de uma loja de instrumentos velhos e baratos. Se tratou de um baixo "imitação" da renomada marca, Hofner, e foi o meu primeiro instrumento. Ele só afinava com o uso de um alicate, pois as tarraxas estavam emperradas, era muito grosseiro no seu acabamento e tinha captadores horríveis, mas foi o meu primeiro baixo. Adoraria tê-lo comigo hoje, como uma peça histórica de memorabilia, pois não daria para tocar com um negócio daqueles, mas por outro lado, que importância sentimental teria se estivesse comigo... 

Pois então, eu tenho essa dívida moral com Osvaldo Vicino, por que ele foi efetivamente o amigo que abriu-me as portas para a música de uma forma concreta, a fazer-me ir além dos devaneios que tivera até então, antes de ter aceito o seu convite para entrar em uma banda "real", em meio a um dia de abril de 1976...
 

Com o Osvaldo, eu retomei contato pela extinta rede social, Orkut, em 2010. Ele viveu no Nordeste por muitos anos, tendo morado em Fortaleza, e também no Recife. Tem três filhos, trabalhou em vários hospitais como administrador, e nunca deixou de tocar, apesar de eu ter pensado isso, quando ele saiu da banda (ainda bem, que nunca parou!). 
Com os rapazes do Lovehunter Whitesnake Tribute, Osvaldo é o quarto, da esquerda para a direita em foto de 2015. Acervo e cortesia: Osvaldo Vicino

Quando retomamos o contato pelo Orkut, fiquei muito contente por saber que ele não parou, e teve por anos, uma banda cover do grupo britânico, Whitesnake, chamada: "Lovehunter Whitesnake Tribute". Ele também desenvolveu-se no baixo, e hoje em dia toca os dois instrumentos com desenvoltura. Em 2015, voltou a morar em São Paulo e participou da festa de aniversário do Laert, em maio, ocasião em que infelizmente não pude comparecer por estar adoentado na mesma época. Mas em agosto do mesmo ano, ele foi ver-me a tocar com a Magnólia Blues Band e conversamos bastante sobre os velhos tempos.
Osvaldo Vicino e Laert Sarrumor na festa de aniversário do Laert em maio de 2015, na primeira foto com seu autor do click desconhecido. Luiz Domingues e Osvaldo Vicino sob um feliz reencontro ocorrido em agosto de 2015. Fotos: Lara Pap

Este capítulo de minha trajetória musical está encerrado. 
Viva o Boca do Céu, o verdadeiro “centro de loucos” que promoveu uma “revirada” na minha vida... 

O Boca do Céu em ação, em 12 de junho de 1977, único documento de imagem da banda e o mais remoto da minha própria carreira. Filmagem em Super-8 de Nelson Gravalos em 1977. digitalizado em 2016 por Fran Sérpico. Cortesia de Fran Sérpico e pós-produção de Jani Santana Morales

Eis o link para assistir no YouTube:

https://www.youtube.com/watch?v=LHiL27bRGOs 

A vida prosseguiu, e logo, eu estaria envolvido com o Grupo de Poesia e Música da Faculdade Cásper Líbero, que na prática foi o embrião mais remoto do Língua de Trapo. 

É daqui que segue a minha história, portanto... Língua de Trapo!  


Boca do Céu - Capítulo 7 - O Último Estertor em 1979, mas com a Convicção na Carreira Consolidada - Por Luiz Domingues

O Bourréebach viveu os seus últimos suspiros de vida, nos quatro primeiros meses de 1979. E com a saída do Osvaldo Vicino, muito da inocência inicial do Boca do Céu foi-se embora, naturalmente, pois estávamos mais amadurecidos. 

O Laert conheceu um colega na faculdade em que recém havia ingressado (Faculdade de Jornalismo Cásper Líbero), logo nos seus primeiros dias, chamado, Paulo Estevam Andrade, vulgo "Tevão" ou também: "Paulo Sustenido". 
Ele era guitarrista, mas vivia aquela típica crise de identidade que acometera a quase todos, ao final daquela década, por negar o Rock, e a bandear-se para a MPB ou outras vertentes. Ele interessou-se em conhecer o trabalho da nossa banda, e chegou a ensaiar conosco algumas vezes. Lembro-me que possuía uma guitarra nacional da marca, “Ookpik”, imitação de Gibson SG, de cor branca. 

Ele tocava bem, e parecia que encaixar-se-ia nessa nova formação da banda. Por incrível que pareça, o baterista, Zé Claudio, também estava a permanecer, e a banda sinalizou esperança de continuidade, com essa nova formação. 
Contudo, o Laert mostrava-se cada vez mais empolgado com os colegas que havia conhecido recentemente, por conta de sua entrada na faculdade. Ali nos corredores da Faculdade Cásper Líbero de jornalismo, conheceu Guca Domenico, Carlos Mello (Castelo), Pituco Freitas, Paulo Elias Zaidan, Dico, Paulo Estevam, Nilma Martins e Saulo, entre outros, e a conversa a girar em torno de música, poesia, quadrinhos, cinema e tudo a amalgamar-se pela política, estava a impressioná-lo, fortemente. 

Com a perspectiva a andar devagar para o Bourréebach, foi natural que estivesse a cada dia mais focado nesse novo ambiente, e assim que surgiu a ideia de realizar-se um sarau literário/musical a ser realizado dentro da própria faculdade, ele empolgou-se e praticamente aí nesse instante, tirou o seu pé do acelerador do Bourréebach. Então, após alguns ensaios, a banda desintegrou-se...
Apesar de ter sido um final melancólico, com a banda sendo vencida por inanição, praticamente, eu não fiquei triste com tal constatação, tampouco fui acometido pelo sentimento de perda ou lamento. Simplesmente aceitei a absoluta falta de forças para prosseguir, mas convicto de que aquela situação em nada mudaria a minha trajetória na música. Eu estava, naquela altura, muito mais seguro, por ter vencido a etapa inicial, e terrível de aprendizado musical. Estava em franco progresso, a tocar cada vez melhor, e senti-me pronto, portanto, para abraçar outras oportunidades.
Continua...