Nesse hiato que tivemos em termos de shows após a apresentação no Garage Rock Festival, entramos enfim no estúdio para gravarmos as duas músicas que nos representariam na coletânea produzida pela gravadora Eldorado, em julho de 1993.
As gravações ocorreram no estúdio Be Bop, que ficava localizado no bairro da Vila Madalena, na zona oeste de São Paulo.
A
metodologia de gravação seguiria o método tradicional, com a bateria
gravada primeiro, seguido do baixo, guitarras e o vocal ao final.
O estúdio Bep Bop era bem badalado na época e frequentado por artistas renomados. Eu não saberia dizer o valor cobrado pela sua locação, mas certamente a gravadora Eldorado gastou uma boa quantia ali, pois cada banda da coletânea gravou bem à vontade, sem atropelos.
O estúdio continha duas salas de gravação, A e B. As bandas da coletânea gravaram no B, que era amplo, super equipado e do qual não tenho queixa alguma, mas o estúdio A, era cinematográfico.
No ambiente do estúdio A,
havia por exemplo um órgão Hammond B3, igual ao dos grandes tecladistas do Rock internacional setentista que admirávamos, Jon Lord entre tantos (tecladista do Deep Purple), e com uma
caixa Leslie toda pintada com motivações sessentistas psicodélicas,
lindíssima, à disposição dos artistas que ali o desejassem usá-la.
Começamos a gravar e na primeira sessão, preparou-se o som da bateria. Lembro-me do Juan Pastor a usar uma carcaça de bateria Pearl, de cor cherry, pertencente ao estúdio.
E como foram apenas duas músicas para gravarmos, logo após equalizarem-se as peças da bateria, ele pôde gravar no mesmo dia, sem maiores dificuldades, visto que estávamos bem ensaiados e além do mais, essas duas musicas faziam parte do set list dos shows, desde o início da banda, em 1992.
No dia seguinte, foi a minha vez
para gravar o baixo. Usei o baixo Rickenbacker, nas duas músicas, plugado em um
amplificador Gallien Krueger, e acoplado a duas caixas Hartke.
Particularmente, acho essas caixas pavorosas, mas essa marca estava na moda da época e eu não possuía ainda as minhas caixas Ampeg nessa ocasião. Eu tinha comigo uma caixa Snake nacional com 4 x 15' e uma outra "handmade" com um falante de 15', portanto, um equipamento ruim para gravar. E foi usada também uma linha direta na mesa, para eventualmente somar-se ao som do canal do amplificador.
Apesar
de eu ter construído um clima amistoso com o produtor do disco, no
decorrer da minha gravação, houve um momento de tensão.
Na sessão de gravação da bateria, eu havia estabelecido uma relação amistosa com o produtor, Carlos Eduardo Miranda. Apesar dele ser todo aficionado de som indie, mantinha outrossim algum apreço pelo Rock Vintage e por conta desse pormenor, chegamos a conversar animadamente sobre o "Gong", uma banda setentista que coincidentemente, apreciávamos de comum acordo.
No entanto, na hora da gravação, ele em um dado momento cismou de exigir algo que não teve cabimento,
por considerar que o trastejamento natural do Rickenbacker, fora produzido por alguma falha minha de
digitação.
A sua reclamação não procedia, pois o som de trastejamento que ele ouvia na sala da técnica, não decorria de uma suposta falta de técnica de minha parte, mas por ser uma característica normal desse instrumento.
Por desconhecer esse dado e sobretudo por que não quis levar em consideração a minha explicação sobre tal característica do instrumento, interrompeu-me a todo instante para cobrar-me uma maior precisão da minha digitação e não seria o caso.
Insatisfeito, deixou-me a gravar sozinho e foi tomar um café, quando o técnico, que era também baixista, falou-me reservadamente que eu estava certo e apoiou-me em minhas ponderações.
O tal produtor, era muito bem relacionado no mundo fonográfico, na mídia e entre empresários. Justiça seja feita, era um competente lobbysta e geralmente estava envolvido com a produção musical indie, ao indicar aspirantes a artistas e produzir em estúdio.
No trato pessoal, o Miranda mostrava-se agradável, não pareceu ser arrogante. Só
nesse instante, foi que ele cismou comigo. Mas adiante, verificamos que também teria problemas com os demais.
Eu não teria desavença alguma em
seguir a sua orientação como produtor, se ele estivesse certo, mas não
estava...
O Miklos ficou a elogiar o meu baixo, Rickenbacker, mas nitidamente repetia as frases que proferia a esmo, pois isso fazia parte de sua viagem.
E o Kiko não lembrou-se de minha pessoa, pois conversamos uma vez ao telefone, em 1988, quando eu estava a tentar fechar um show para A Chave/The Key (sem Sol), em Ribeirão Preto, a sua cidade natal e ao saber que ele era conhecido de meu tio que morava lá e da minha prima, meus familiares fizeram a ponte ao ligar à ele e apresentar-me. Mas não deu em nada, pois ele não passou-me nenhum contato forte, e limitou-se a me fornecer dicas óbvias.
Para encerrar o caso do "trastejamento", esse cansaço foi contornado rapidamente.
Primeiro por que eu sou um sujeito
zen por natureza e raramente irrito-me.
Depois, por que como eu já falei várias vezes neste capítulo
do Pitbulls on Crack, essa foi a banda mais despreocupada em que eu toquei
na minha carreira, sem sombra de dúvida.
Ali no ambiente dessa banda, era só brincadeira o tempo todo, pois os três outros componentes continham essa verve espirituosa. Qualquer coisa que era falada por um, transformava-se em trocadilhos, ironia e um festival de sarcasmos imediatamente para os demais e assim ficavam sob um eterno desencadear de piadas sobre piadas.
E houve mais um fator: o Miranda adorava o Chris também por esse humor ao estilo "Monty Python"/24 horas por dia e principalmente pelo fato do Chris ser antenado em som indie. E assim, ambos ficavam horas a conversar sobre bandas insípidas, que só eles conheciam.
A despeito desse imbróglio, eu concluí a minha parte muito rapidamente. Quem toca ou tocou comigo, sabe que costumo gravar muito rápido, pois a minha timbragem é simples e no quesito execução, eu costumo focar na gravação sem dispersões, sendo muito objetivo.
Outra coisa, cada um pensa de uma forma, mas a minha metodologia é a seguinte: quando estou a gravar, tenho a mesma postura de quando toco ao vivo. Deixo levar-me como um ator para outra dimensão e ali, naquele momento, deixo que os Deuses do Rock manifestem-se.
Foco o pensamento na emoção e tento imprimir esse sentimento nas notas que toco. Todos os discos que gravei na vida contém esse elemento, com exceção do LP "A New Revolution", d'A Chave/The Key ("sem Sol"), onde definitivamente, não há alma ali contida naqueles sulcos do vinil, mas isso eu expliquei no seu capítulo adequado.
Depois que
terminei a minha parte, vieram as sessões do Chris, alguns dias depois.
Deveriam terem sido
tranquilas, pois ele tocava de uma forma simples. Fazia bases eficientes, mas bem
simples, sem grandes voos, mais ou menos como o Marc Bolan tocava no "T.Rex", mas o
Chris toca melhor que o velho Bolan, na minha avaliação, pois entre outras coisas, este morreu ao saber fazer apenas
seis acordes, aliás, Bolan é uma tremenda influência dele, Chris, que adora o Glitter Rock setentista (eu também adoro).
Lembro-me da sessão dele também por um fato inusitado e agradável, posso dizer. Como eu já havia contado, o estúdio continha duas salas. Na sala A, que era muito maior, nesse dia, estava a acontecer uma gravação do Jorge Benjor.
Encontramos com ele no cafezinho e este foi extremamente simpático conosco, ao levar-nos pessoalmente para a sala A, para que assistíssemos um pouco da sessão de gravação das bases de seu novo trabalho.
O
clima entre os membros de sua banda nos pareceu ser de muita camaradagem, ao dar-nos
a certeza de que trabalhar com ele devia ser muito bom. Jorge contava com algumas presenças femininas consigo, e de fato, a alquimia esteve boa para ele, ali. Salve simpatia!
Na mesma sessão, esteve presente um dos membros do Duo performático: "Os Mulheres Negras", provavelmente sob um convite do Jorge. Mas esse cidadão não foi nem um pouco simpático conosco, lamentavelmente.
E por fim, a sessão do Chris para gravar o vocal também deveria ter sido tranquila. O Chris apesar de ser um brincalhão incorrigível, na hora em que precisava desempenhar, era focado.
Todavia, o produtor o atormentou e caso raro, vi o Chris irritado e de tão contrariado que ficou, ele gravou de costas para a técnica, pois não suportava mais as interrupções constantes do cidadão. Apesar dos pesares, ele conseguiu gravar, mesmo com essa tensão.
Dias depois, fomos convidados para participar do coro
de um refrão de uma das músicas da banda brasiliense:, "Little Quail and the Mad Birds", participante da
mesma coletânea.
A ideia seria contar com uma multidão a reforçar o coro, que dizia: "Não tem cinco, não tem seis", para responder ao vocalista da banda, que cantava: "Um, dois, três, quatro"...
Além de membros
de todas as bandas da coletânea, lembro-me da presença de músicos de outras bandas
presentes, tais como o pessoal do "Viper", "Anjos dos Becos" e "Okotô", por exemplo.
Dividi o meu microfone com o grande baixista, Lee Marcucci e o guitarrista do "Okotô". Foi uma bagunça total, com mais de quarenta pessoas a berrarem, mas foi divertido.
E
foi nessa sessão que autografamos (todas os membros das bandas), uma pele de caixa
de bateria, cuja foto aparece na ficha técnica do CD/LP (sim, esse disco
ainda saiu no velho formato de vinil).
Era impossível não gargalhar o tempo todo com os três: Skepis, Deca & Pastor, pois todos eram extremamente espirituosos e seus estilos de humor diferentes entre si, complementavam-se.
Até eu, que mesmo que não me considere mal-humorado, estou longe de ser um piadista e pelo contrário, tenho temperamento sério, enquanto estive lá, não tive alternativa ao conviver com as pilhérias intermináveis por eles perpetradas.
E vou contar-lhe, caro leitor: cada um recebeu uma mísera cópia de LP apenas. A gravadora só lançou tal obra em formato CD, tempos depois e nós não recebemos nada.
A cópia em CD que eu tenho, eu comprei em uma loja
de discos usados, em 1995. Em síntese: nós músicos que militamos no underground (não por vontade própria, certamente), estamos tão acostumados com esses maus tratos, que relevamos esses absurdos. E
tem mais uma: a Eldorado detinha fama de ser uma gravadora diferenciada,
que tratava muito bem os artistas de pequeno e médio porte. Imagine se
não cuidasse.
Ouça abaixo a gravação de "Under the Light of the Moon", proveniente da coletânea: "A Vez do Brasil, da gravadora Eldorado, lançado em 1993.
O link para escutar no YouTube:
https://www.youtube.com/watch?v=Yr8n8FIXuAQ
Com a nossa participação na gravação de nossas duas músicas, encerrada, o nosso próximo show só foi ocorrer em setembro. Foi um evento com apoio da Rádio 89 FM, e para marcar a inauguração de uma nova casa de shows, com aparente boa estrutura, denominada: "Rádio Show", em 16 de setembro de 1993.
Ficava
localizado na Rua Turiaçu, no bairro das Perdizes, na zona oeste de São Paulo. Foi na
verdade, um espaço anteriormente usado por um antigo cinema do bairro. Infelizmente
esse "Rádio Show" não durou muito e logo tornou-se uma cafona casa de shows
sertanejos e logo a seguir, Igreja Evangélica, aliás, até hoje.
Infelizmente, o embalo bom que tivemos em 1992, não repetiu-se em 1993, em termos de shows. Daí, desse show de setembro, só fomos tocar novamente em novembro.
Foi também um show grande, com apoio da Rádio 89 FM, e sob um teatro bem estruturado.
Aconteceu no dia 24 de novembro de 1993, no Teatro Mars, localizado no bairro da Bela Vista, popular Bexiga, no centro de São Paulo. Antes de falar sobre esse show, tenho um fato curioso para relatar.
Cometemos uma gafe ridícula no camarim do show que realizamos no Teatro Mars. Não fui o culpado, mas estive envolvido involuntariamente nesse mal-estar gerado.
Foi o seguinte: a caminho do Teatro, a bordo do meu carro, estiveram dois roadies que trabalhariam conosco naquela noite. Quando estávamos a descer a Rua Rui Barbosa, ou seja, muito próximo da localização do Teatro Mars, os rapazes viram algumas garotas bem produzidas e que obviamente estavam a caminhar para o Teatro.
O locutor da 89 FM, Tatola, a me entrevistar (Luiz Domingues), entre as músicas que tocamos
Sem que eu pudesse evitar a pilhéria, os rapazes colocaram as suas cabeças para fora do carro e gritaram alguns "elogios" machistas para elas, que reagiram ao mostrar-lhes os seus respectivos dedos médios. Os meus passageiros esborracharam-se de rir pelo ato cometido, e quando já estávamos no camarim, o mal-estar enfim aconteceu.
Uma das moças com as quais eles haviam mexido na rua, era a namorada do baixista do Rip Monsters e as demais, suas amigas (e se não engano-me, havia uma irmã ou prima dele, entre elas).
E mais uma: nesse show, nós usamos pela primeira vez o nosso novo cenário, um imenso painel com a figura de um cão Pitbull furioso, a babar com raiva. Tudo bem, foi a ideia explícita no nome da banda, mas aquilo mais pareceu adequado para uma banda de Heavy-Metal ou Punk-Rock.
Esse
cenário não foi usado muitas vezes, no entanto. Ele era grande e trabalhoso para ser
instalado e só cabia mesmo em locais de grande porte, com estrutura
cenotécnica.
Foi o show de lançamento da coletânea, com a presença das cinco bandas e o Golpe de Estado, como convidado extra. O show foi transmitido ao vivo pela rádio 89 FM e os locutores Tatola e Fábio Massari foram os apresentadores do evento.
Matéria da Folha de São Paulo a especular sobre a cena de 1993, ao elencar as bandas emergentes, incluso a nossa. Incrível como o nome da banda era inadequado e o jornalista, desinformado em contraponto: "uma das bandas mais violentas do Rock Brasileiro"... é risível, no mínimo...
O teatro continha um porte pequeno, mas lotou completamente, com seus duzentos lugares, inteiramente tomados. O show foi bom, energético e em clima de euforia com um público muito jovem e frenético, que gritou o show inteiro, como se adorassem-nos, mas tenho certeza, fora mais pelo frenesi do evento, essa euforia desmedida que ali observamos.
A movimentação foi essa em torno desse show no Teatro Mars.
Sobre mais shows nessas características, com o caráter de festa organizada pela gravadora, isso não fora nenhuma praxe. Nos Estados Unidos havia uma tradição nesse tipo de estratégia, com até turnês organizadas pelas gravadoras e dos empresários de seus contratados, conjuntamente, para promoverem os seus artistas, mas isso nunca aconteceu por aqui, a não ser sazonalmente, como no tempo em que as gravadoras apoiavam festivais na TV (décadas de sessenta e setenta), e o caso do "Som Livre Exportação" (no início dos anos setenta), um programa criado pela gravadora Som Livre e com tal intuito, fato raro no Brasil.
E assim, normalmente nenhuma gravadora costumava mexer uma palha nesse sentido, pois
não é (era) atribuição delas. Explico: gravadora estabelece
contrato para cuidar do produto fonográfico e divulgá-lo na mídia, além
de, claro, distribuir os álbuns nas lojas. Logicamente, estou a falar de um esquema que durou décadas, mas hoje em dia, na Era pós-Internet, diluiu-se completamente.
A questão do marketing e vendas de shows, era da atribuição do artista e seu empresário. Na maioria dos casos, um dos pontos que eram levados em consideração para contratar-se um artista novo, dava-se justamente pela questão da estrutura apresentada pelo empresário que o artista possuía.
Gravadoras queriam artistas com agenda ativa e um empresário dinâmico por trás. Muito artista novo, achava que entrar para o elenco de uma gravadora seria a resolução de todos os seus problemas, mas o fato concreto, seria que dificilmente a gravadora interessar-se-ia por ele, se ele não estivesse com agenda lotada, um portfólio volumoso graças a muitas matérias de jornais e revistas importantes, apresentações em programas de TV e sobretudo, por possuir um empresário com estrutura profissional, dinheiro e contatos.
Nesse
esquema, a gravadora Eldorado até que fez muito, pois alavancou uma entrevista com
meia página no Jornal da Tarde, apoiou esse show em coprodução com a
Rádio 89 FM e usou espaços publicitários no "Estadão" e Jornal da Tarde,
para anunciar o disco.
Mas como tratava-se de uma coletânea, tudo ficava diluído. Um exemplo foi a entrevista para o Jornal da Tarde. No dia em que concedemos tal entrevista, esteve presente um repórter do Jornal e o fotógrafo para ouvir cerca de doze pessoas presentes, a representarem as cinco bandas.
Portanto, ficou disperso, naturalmente. E a sessão de fotos foi hilária. Resolveu-se tirar a inevitável foto coletiva na rua, onde ficava a sede da gravadora e da Rádio Eldorado. Essa sede ficava situada coincidentemente, muito perto da minha residência, no tempo em que eu morei no bairro da Aclimação, na zona sul de São Paulo.
Dois anos depois, o "Estadão" usou a minha foto dessa sessão, recortada e sob um contexto ridículo, nada a ver com o Pitbulls on Crack! Joguei fora essa reportagem adicional e arrependo-me, por isso.
Acho que vale a pena abrir um parêntese nesta narrativa para contar essa história da foto recortada, que eu mencionei anteriormente.
Dois anos depois dessa foto a ilustrar essa matéria sobre a coletânea ter sido publicada no Jornal da Tarde, com doze pessoas a representarem as cinco bandas da coletânea, eu tive uma surpresa bizarra e completamente fora do contexto da foto originalmente feita.
Foi em um domingo qualquer de 1995, que eu comprei o "Estadão" do dia, e ao olhar a capa do Caderno 2, que tratava sobre Cultura, eu tive uma surpresa bizarra!
Ao tratar-se de
uma reportagem sobre a relação entre o Punk-Rock com a violência das torcidas uniformizadas de clubes de
futebol.
Haviam várias fotos misturadas de torcedores da uniformizada "Mancha Verde" do Palmeiras e da "Independente" do São Paulo FC e punks. Nesse contexto inesperado, qual
foi a minha surpresa ao olhar a minha foto, ali inserida!
Não havia nenhuma identificação, portanto, tratou-se da minha face, ali exibida, como anônimo!
O fato, foi que o Jornal da Tarde pertence (pertencia, na verdade, pois o jornal foi extinto depois que escrevi esse trecho da narrativa), ao mesmo grupo editorial do jornal, "O Estado de São Paulo", portanto, ambos compartilhavam o mesmo banco de dados e fotos. Algum funcionário energúmeno da diagramação/lay-out olhou a minha face na foto de 1993 e me considerou com perfil de de punk, careca, ou hooligan, no mínimo.
Esse sujeito recortou a minha cabeça, pois era uma foto coletiva com várias pessoas ao redor e resolveu colocar-me ali entre punks, carecas & torcedores oriundos de uniformizadas violentas... tudo a ver comigo, não é mesmo?
Na hora, eu fiquei muito bravo e pensei em tentar buscar uma satisfação, mas logo desisti, pois seria um trabalho inútil. Guardei o jornal por um bom tempo, mas um dia o joguei fora. Arrependo-me, pois seria um material de memorabilia curioso, hoje em dia.
A
minha única dúvida foi: qual teria sido a motivação do diagramador que entre
"bilhões" de possibilidades dentro de um banco de fotos de um jornal desse porte, para ter escolhido justo a minha face? Não deixa de
ser curiosa essa dúvida, pois a despeito de eu gostar de futebol e muito,
abomino a violência das uniformizadas, e no campo da música, tenho
profunda aversão ao Punk-Rock, por diversos motivos. O que teria sido então, uma mera coincidência ou uma provocação de alguém que sabia que eu antipatizava com tudo isso?
Após o show de lançamento no Teatro Mars, fizemos a seguir mais uma apresentação no Victoria Pub.
Nesta altura, o Victoria Pub estava decadente e a vivenciar os seus dias finais, ou seja, algo muito diferente de experiências anteriores que eu tivera ali naquela casa com outros trabalhos e em épocas onde o local fora considerado em alta voga e vivia lotado por gente bonita e endinheirada, além dos "famosos" de ocasião.
Esse show ocorreu em 1° de dezembro de 1993, com um diminuto público formado por cerca de cento e vinte pessoas, muito pouco para o padrão antigo que a casa ostentava, quando no seu auge, colocava uma média de mil pessoas por noite em suas dependências, de segunda a segunda.
Mas para encerrar um ano fraco em termos de agenda de shows, tivemos ao menos um dezembro mais movimentado, com mais duas datas, ainda.
O primeiro foi mais um show considerado de lançamento da coletânea, e realizado no "Garage Rock", onde tocáramos meses atrás (a história do futebol entre bandas).
Desta vez, no dia 5 de dezembro de 1993, tocamos
com a abertura das bandas: "Sir Rock'n Rollmes" e "Tomate Inglês" (banda
do futuro vocalista do "Golpe de Estado", Kiko Müller).
Foi um show razoável, mas sem grandes novidades que marcassem na memória, por algo excepcional ocorrido, no campo musical. Acho oportuno e curioso, no entanto, lembrar-me de um fato a mais para relatar. Muitos punks haviam aparecido ali para ver o Pitbulls on Crack. Por incrível que pareça, o Chris Skepis era (é ) muito reverenciado por essa tribo, exatamente por ter tocado no "Cock Sparrer", banda inglesa da cena de 1977. Ele tocou com essa banda britânica, nos anos 1980, quando morou por cinco anos em Londres.
Propaganda oficial do álbum, no "Jornal da Tarde"
Os últimos shows de 1993 estiveram no ritmo de lançamento da coletânea. Tocamos isoladamente no Victoria Pub, no dia 1° de dezembro de 1993, para um público com apenas cento e vinte pessoas. Ao contrário de anos anteriores onde apresentei-me com A Chave do Sol ali, o Victoria Pub estava decadente.
A
decoração continuava a mesma, mas a frequência não era mais da alta
burguesia jovem e paulistana e a casa não lotava como nos anos oitenta. Fizemos
um outro show no Garage Rock com um público com trezentas pessoas,
aproximadamente. Esta noite de 15 de dezembro de 1993, foi compartilhada
com as bandas, "Sir Rock'n Holmes" e "Tomate Inglês".
Matéria no Revista "Bizz", a citar a coletânea da gravadora Eldorado
Foi logicamente um show coletivo e neste ano, tocamos com os grupos: "Anjos dos Becos", "Os Inocentes", "Viper", "Vultos". "Ira", "Rip Monsters", "Little Quail", "Neanderthal", "Okoto", "Violeta de Outono" e "Não Religião". O público presente computou mil e quinhentas pessoas, aproximadamente.
Matéria a falar sobre a coletânea, no jornal "Diário Popular"
Foi um show de choque, como deveria ser, e se mostrou muito bom, pelo agito geral da festa etc. e tal. Lembro-me que o clima no camarim foi bem amistoso. Havia uma boa camaradagem entre todas as bandas presentes ali, certamente.
Outra matéria publicada na Revista "Bizz"
O "Rip Monsters" iria tocar a música: "21st° Century Schizoid Man", do "King Crimson" e ficamos a conversar sobre os anos setenta, com o Lee Marcucci a contar-nos passagens do "Coqueiro Verde", a sua banda no início dos anos 1970, que teve a ousadia de tocar músicas do "Flash", banda britânica do primeiro guitarrista do "Yes", Peter Banks.
Nota no jornal "O Globo", do Rio, a falar da coletânea
Essas conversas que traziam-me memórias distantes dos anos 1960 & 1970, fascinavam-me e borbulhavam na minha mente...
Matéria no jornal "Folha de São Paulo", a citar o "Pasley Underground", um festival que simplesmente não foi realizado...
Foram sementes que levar-me-iam ao Sidharta, anos depois...
E
assim, nós terminamos o ano de 1993, com o disco pronto e com a perspectiva
da gravadora Eldorado bancar a produção de um vídeoclip, para cada banda da coletânea, logo no
início de 1994.
Ainda a repercutir o show na Broadway, por tratar-se de um festival com várias bandas, em ritmo de maratona, cada uma tocou apenas três músicas, sendo, portanto, um show de choque. A troca de bandas e tempo para "setar" cada uma (termo aportuguesado e derivado do inglês "set up"), foi maior que o tempo de show de cada banda, propriamente dito.
O espetáculo, apesar disso, foi como no ano de 1992, ou seja, muito energético. O público dessas festas das rádios Brasil 2000 FM ou da 89 FM, era um público jovem e que gostava do trabalho dessas bandas nacionais, portanto, a resposta era sempre imediata.
O som
esteve bom. Não lembro-me que empresa contrataram, mas foi uma das
grandes que sonorizavam grandes eventos em São Paulo. Dessa forma, se tratou de um PA compatível com o
tamanho da casa, é claro, mas com grande qualidade. E o equipamento de
palco (backline), idem, a conter amplificadores importados, bateria boa etc.
Ao entrarmos em 1994, as perspectivas mostravam-se magníficas. Com o disco lançado e um clip a ser produzido, contávamos com um aumento de shows e consequentemente, novas oportunidades, quiçá com um empresário bom a interessar-se pelo nosso "passe", etc. e tal.
Tivemos a certeza de que a
música, "Under the Light of the Moon", entraria na programação da Rádio
89 FM, mas em princípio, para tocar em horários alternativos. O aumento
dessa execução e a sua recolocação para os horários nobres, ocorreria
apenas se houvesse uma resposta popular, não haveria favorecimento, fomos avisados sobre isso.
O encarte do CD, lançado tempos depois, acompanhou o encarte do LP, com as letras das músicas, disponibilizadas
Em tempos ainda sob
internet restrita a uma camada pequena da população, essa pressão
popular esperada pela estação, deveria ocorrer predominantemente através do
telefone, mas as velhas cartas manuscritas e entregues pelos nossos
valorosos carteiros, também haveriam de possuir a sua força.
Dessa forma, já
com um batalhão de "Neo-Hippies" à minha disposição em minha sala de
aulas, essa pressão que desejavam seria exercida em nosso favor, e assim o foi, como
eu contarei no decorrer da cronologia dos fatos.
No tocante ao vídeoclip, a Eldorado disponibilizou verba, mensalmente. A ideia seria um clip a ser produzido por mês e paulatinamente que entrassem na grade das estações de TV.
Inicialmente, foi uma certeza que a MTV apoiaria e quanto às emissoras abertas, havia uma pequena esperança. Já na TV a cabo, que ainda mantinha atuação bem tímida nessa ocasião, também, embora os canais existentes dessem prioridade ao material estrangeiro, naquela época.
Sabíamos que seria um clip simples, sem pirotecnias. Deram-nos liberdade para emitirmos algumas ideias, mas o básico seria: a banda a dublar, como ênfase.
Apesar dessa animação toda, estávamos
sem perspectiva para shows no início do ano subsequente. Só começamos a engrenar
novamente a partir de março de 1994.
Resenha da coletânea, na Revista "Rock Brigade", publicada em janeiro de 1994
Ainda assim, comemorávamos matérias publicadas em jornais e revistas a aludir ao lançamento do LP.
Paralelamente,
surgiu uma possibilidade de um contato obtido pelo nosso baterista, Juan
Pastor para patrocinar camisetas, como forma de merchandising. Essa negociação começou em fevereiro,
mais ou menos, logrou êxito parcialmente e no tocante às obrigações da banda com o patrocinador em contrapartida, "sobrou" algo desagradável para a minha pessoa... contarei
tais detalhes no próximo capítulo.
Continua...
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