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quinta-feira, 16 de agosto de 2018

Crônicas da Autobiografia - Garotos Emo a Vandalizarem - Por Luiz Domingues

Aconteceu no tempo da Patrulha do Espaço, em algum momento do segundo semestre de 2003 

Desde que entrei para a formação da Patrulha do Espaço, em 1999, eu assumi uma função na produção da mesma, como responsável pela divulgação de shows. 

Coordenei, portanto, toda a parte de colocação de cartazes e distribuição de “filipetas” (flyers), a anunciar as nossas apresentações e nesse sentido a comandar uma equipe de colaboradores, e no caso das filipetas, contávamos com a sorte, invariavelmente de contarmos com espetáculos protagonizados por artistas do nosso espectro artístico, para aproveitarmos a movimentação antes dos nossos shows e na contramão, eu incentivei equipes que trabalhavam a favor de outros artistas, a aproveitarem a movimentação de nosso público, em nossas apresentações.  

Mas nem sempre a sorte foi favorável aos nossos anseios e assim, muitas vezes em que não tivemos nada perto de nós, ou seja, com alguma similaridade comprovada na seara cultural/artística, por diversas ocasiões nós forçamos campanhas de divulgação no autêntico campo minado das adversidades estéticas, no afã de aproveitar a oportunidade ao menos para estabelecer um contato fugaz com um público que nem sabia de nossa existência, em tese. 

Isso aconteceu em algumas campanhas de divulgação e especificamente em uma delas, algo exótico ocorreu e mesmo que não tenha tido nada a ver conosco diretamente, chamou-nos a atenção.
Foi o seguinte: nós resolvemos distribuir filipetas em um evento ao ar livre a ser realizado na Praça Charles Miller, e para quem não conhece São Paulo, tal local trata-se de um imenso Boulevard que fica em frente ao portão principal do estádio do Pacaembu. 

Ali aconteceria um show patrocinado por uma emissora de rádio que dedicava-se exclusivamente ao fomento da cena do “Emocore”, uma ridícula cena formada por garotinhos muito mal formados musicalmente e sobretudo mal instruídos sobre a história do Rock e que dessa forma cultuavam uma espécie de New-Punk-Rock dos anos 2000, com forte tendência Pop, sob uma atroz ruindade técnica inerente e tudo devidamente manipulado sob a meticulosa engenharia dessa emissora em conluio com empresários que fabricavam bandas nesses moldes sob a pior intenção possível. 

Ou seja, nem devíamos ter ido gastar o nosso material gráfico ali com tais garotos imberbes que gostavam dessas bandas de plástico, mas o nosso dilema instantâneo foi gastar ali o material ou amargar fazer dele, sobra para usar como papel de rascunho, pois não houve nada mais interessante antes da data do nosso próximo show.
Cheguei acompanhado do meu amigo, o baterista, Junior Muelas, que na época tocava com a banda “Hare” e grupo este que houvera aberto vários shows da Patrulha do Espaço em cidades interioranas paulistas, desde 2001 e também o roadie da nossa banda, Samuel Wagner, que sempre esteve presente nessas ações de divulgação, por ter sido o meu fiel escudeiro nessas missões, além de mais alguns rapazes para efetuar o trabalho. 

Então, eu combinei com todos que infiltrassem-se em meio à plateia, a distribuir uma rota para cada um agir pelos flancos dentro da multidão e na volta, o combinado foi que encontrar-nos-íamos na famosa e enorme banca de jornais, que aliás era o ponto de encontro mais tradicional entre amigos, nas partidas de futebol no Pacaembu, no pós-jogo, no caso de amigos que torciam para equipes rivais entre si e não poderiam entrarem juntos a ostentar camisetas antagônicas ou mesmo no caso de perderem-se uns dos outros. Eu sabia desse popular ponto de encontro desde os anos setenta, quando comecei a frequentar aquele estádio para assistir jogos de futebol.
Foi então que eu e Junior Muelas, que estávamos perto da referida banca de jornais e ponto de encontro, vimos uma cena dantesca.

O famoso jornalista que cobria a área de Rádio e TV, Nelson Rubens, que era (é) famoso por protagonizar uma coluna de fofocas a abordar principalmente o universo habitado por atores e atrizes de novelas, cantores populares e subcelebridades em geral que habitam as emissoras de TV aberta, surgiu a caminhar em meio à multidão de garotinhos "emo" e até então, ao ser abordado discretamente, mostrara-se tranquilo a se dirigir em direção ao seu automóvel, estacionado ali perto. 

Quando ele chegou perto do carro, teve que pedir licença para muitos jovens que estavam encostados em seu veículo, alguns até em clara postura de abuso, sentados sob o seu capô. Nesse mesmo instante, inevitavelmente algum galhofeiro gritou o famoso bordão que Nelson Rubens usava (usa) exaustivamente em suas reportagens televisivas: -“eu aumento, mas não invento”...

Como um fósforo aceso perto de uma bomba de gasolina, aquilo gerou a chama imediata, ou seja, todos à sua volta passaram a compor um coro, com essa frase e tal como uma palavra de ordem, a histeria ganhou força entre outros que nem estavam perto, a aumentar o contingente. 

Até aí, tudo bem, Nelson ria e ficara nítido em seu semblante que regozijava-se com tal demonstração espontânea de sua popularidade, mas sob uma fração de segundos, alguém teve o ímpeto de empurrar o carro e dessa forma, contaminados pela energia bestial que move as multidões bovinas, outros seguiram a mesma ideia e assim começou um movimento físico intenso, a balançar o carro perigosamente. 

O coro engrossara e nesta altura, o jornalista que estava já sentado dentro do veículo, mudara completamente a sua postura e gritava para que parassem com isso e já não demonstrava estar a achar a brincadeira saudável e claro que nessa proporção, não o fora mais e estava nas vias de fato do vandalismo e da agressão gratuita.  

Foi quando alguns policiais aproximaram-se e nem precisou intervirem com truculência, pois a garotada dispersou imediatamente e Nelson pode enfim engatar o seu carro e partir em segurança. 

É impressionante como a euforia desmedida gera violência sem sentido, e através de uma fração de segundos e não por acaso, vemos cenas deprimentes em festas, que deveriam se pautar pela manifestação coletiva de alegria pela sua motivação primordial, mas que culminam em ocorrências policiais.

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