O
Boca do Céu em foto promocional realizada em março ou abril de 1977. À
esquerda, com óculos escuros: Laert Sarrumor, atrás, agachado, Fran
Sérpico. Atrás, ajoelhado, Wilton Rentero e ao lado direito, com a
guitarra no colo, Osvaldo Vicino. A frente, com o baixo sobre as
pernas, eu (Luiz Domingues). Click: desconhecido, mas há a desconfiança
generalizada da parte dessas personas retratadas, de ter sido da parte
de Adelaide Giantomaso
Ah, o Boca
do Céu... a minha primeira banda, da qual eu guardo um carinho imenso
não apenas por ter representado o impulso inicial para a minha
construção de carreira, mas sobretudo, pela lembrança sempre inspiradora
a respeito da energia incrível que proporcionou-me, para que eu pudesse
canalizar a loucura que o Rock acometera-me, paulatinamente, desde o
final dos anos sessenta, ainda criança, e em vertiginosa escalada a
partir dos anos setenta, em pleno avançar da minha adolescência.
Pois é, o Rock não fora apenas um mero gênero musical para catalogar discos nas prateleiras de lojas de vinis, mas algo muito maior, a amalgamar-se com questões culturais, certamente muito mais amplas, e sobretudo por unir-se aos valores da contracultura & afins.
Embevecido por tal
grandiosa magnitude, a minha completa inaptidão para a arte, e a música
em específico, fora um empecilho monstruoso para que eu pudesse
canalizar tamanha volúpia que consumia-me as entranhas, no entanto, eis
que um dia, um colega da minha classe da 8ª série, chamado: Osvaldo
Vicino, formulou-me o convite para que formássemos uma banda de Rock e
este foi o impulso mágico que deu-me a chance para que eu pudesse ultrapassar as minhas
barreiras, então intransponíveis, e finalmente vislumbrar a
materialização do sonho.
O troféu que o Boca do Céu recebeu, por ter ganhado o 2º lugar no Festival Femoc, em agosto de 1977
Bem,
com essa banda nós caminhamos até onde foi possível, a compreender-se as nossas
dificuldades à época, e posso afirmar, fizemos conquistas, certamente. A dispersão
da banda foi escalonada e ao final, dos membros originais, somente eu,
Luiz, cheguei ao final das atividades da banda, juntamente ao Laert,
embora ele não tenha sido da primeiríssima formação por uma questão de
poucos meses, apenas.
Pelo fato de eu, Luiz, e Laert termos seguido
juntos quando da formação do Grupo de Poesia e Música da Faculdade
Cásper Líbero, em junho de 1979 (apenas dois meses após o final oficial
do Boca do Céu, e nesse instante, com o nosso grupo já bastante desfigurado), e por tal embrião desse grupo estudantil ter se tornado o Língua de Trapo, a posteriori, nos anos posteriores ao Boca do Céu, foi com o Laert que eu mais
tive convivência e atuação, por conta de eu ter sido membro do Língua
de Trapo em duas oportunidades (da fundação do grupo, em 1979, até 1981,
e posteriormente, entre 1983 e 1984). Por conta dessa realidade, eu
passei anos sem saber notícias sobre os outros ex-companheiros do Boca
do Céu.
Osvaldo
Vicino e Laert Sarrumor, durante a festa de aniversário do Laert, em
São Paulo, no ano de 2015. Acervo e cortesia: Laert Sarrumor. Click:
Marcia Oliveira
Por volta
de 2012, o Laert reencontrou o Osvaldo Vicino, virtualmente, através da
extinta Rede Social Orkut e daí fez a ponte para que eu também
restabelecesse o contato. Em 2015, eu fui convidado a participar de mais
uma festa de aniversário do Laert e o Osvaldo, também foi convidado.
Infelizmente, eu estava a convalescer, após ter submetido-me a duas
cirurgias de emergência e não pude estar presente. Todavia, a despeito
da minha falta, Osvaldo e Laert reencontraram-se, após trinta e sete
anos, o que foi algo extraordinário.
Ainda em 2015, o Osvaldo visitou-me
em uma apresentação da Magnólia Blues Band, grupo em que eu atuei entre
2014 e 2016, e foi um reencontro muito feliz entre amigos que não
viam-se pessoalmente, desde 1978.
Eis o Link para assistir o vídeo no YouTube:
https://www.youtube.com/watch?v=LHiL27bRGOs&feature=emb_logo
Ao final de 2016, reencontramos o baterista, Fran Sérpico, na Rede Social Facebook e algum tempo depois, na semana do Natal e Reveillon, ele deu-nos um presente maravilhoso: a digitalização e postagem no Portal YouTube, de uma filmagem que a nossa banda houvera feito em junho de 1977. Histórico, emocionante e sem dúvida a mostrar-se como um tesouro de valor incalculável, trata-se do único registro da banda em ação, mesmo que neste vídeo, não haja o áudio original, a contar com o som real que produzíamos na ocasião.
Osvaldo visitou-me posteriormente em outras ocasiões, em shows de Kim Kehl & Os Kurandeiros, em pelo menos três ocasiões e casas diferentes. E sempre que reencontramo-nos, o assunto sobre um possível encontro com todos os membros do Boca do Céu, veio à baila. Já pensou? Seria algo verdadeiramente sensacional reunir a banda inteira, após tantos anos.
eu (Luiz Domingues) e Osvaldo Vicino, em reencontros de 2015 (fotos 1 e 2, no Magnólia Villa Bar) e 2017 (foto 3, no Santa Sede Rock Bar), em São Paulo. Click, acervo e cortesia de Lara Pap (fotos 1 e 2). Foto 3: acervo e cortesia de Osvaldo Vicino. Click: acompanhante de Osvaldo
Pois foi ao final de 2019, que a perspectiva de um reencontro a envolver todos os ex-membros da banda, ganhou força, e tanto foi assim que motivou a criação de um grupo a promover a conversa reservada através do inbox da Rede Social Facebook, aliás criado por eu mesmo, Luiz, o qual foi batizado como: "Boca do Céu/Reencontro do Século XXI".
Pois é, quando ouvíamos a canção: "21st Century Schizoid Man", do King Crimson, ali no calor dos anos setenta, tínhamos a noção sobre o século XXI, como algo que aproximava-se, mas ainda a estar muito distante, portanto a configurar-se como uma visão do futuro, baseada naquela perspectiva fantasiosa que a nossa imaginação havia sido induzida pelo paradigma em torno dos filmes e seriados ao estilo "Sci-Fi", ou seja, a elucubrar os anos 2000, sob parâmetros espaciais, cibernéticos etc. Mas o século XXI chegou, avançou para a sua segunda década e o Boca do Céu, quem diria, abriu uma bela perspectiva para acrescentar mais histórias em minha autobiografia e para cada companheiro dessa jornada, evidentemente. Portanto, essa banda estava prestes a ofertar-me um segundo sonho, na verdade...
Quatro membros do Boca do Céu, reunidos
em pleno 2020. Da esquerda para a direita: Laert Sarrumor, eu (Luiz
Domingues), Wilton Rentero e Osvaldo Vicino. Bastidores do Show
"Vanguarda Paulistana in Concert", no Teatro Municipal de São Paulo, em
26 de janeiro de 2020. Acervo e cortesia: Wilton Rentero. Click: Paulo
Elias Zaidan
Fantástico,
após o grupo do Boca do Céu, na Rede Social Facebook, ter sido criado,
rapidamente abriu-se um grupo também no "Whatsapp", e foi o momento em
que o nosso velho guitarrista, Wilton Rentero, entrou com tudo para
interagir com os demais. Logo nos primeiros dias, trocamos informações,
avidamente, como seria por esperar-se entre amigos que não conversavam
há décadas e certamente que o teor dos assuntos sugeridos, extrapolou o
campo das nossas reminiscências sobre a década de setenta e enveredou
para a atualização generalizada dos dados, a dar conta sobre o que cada
um fez nessas quatro décadas em que não tivemos convivência direta,
entre os cinco membros mais presentes na formação do Boca do Céu.
O Laert, por sua vez, convidou a todos para estarmos presentes no dia 26 de janeiro de 2020, em meio ao luxuoso ambiente do Teatro Municipal de São Paulo, onde realizar-se-ia um show comemorativo sobre o saudoso, Teatro Lira Paulistana, ocasião em que diversos expoentes daquela famosa cena da dita "Vanguarda Paulistana", comporiam o grande corpo das atuações e haveria também um pequeno espaço à cena do Rock oitentista, ainda que circunscrita ao espectro do Punk-Rock, essencialmente.
Bem, o nosso baterista, Fran Sérpico, por morar no Rio de Janeiro, pediu desculpas, mas de antemão já declinou do convite por conta da logística que não poderia cumprir. Ficou quase acertado, portanto, que eu, Luiz, Osvaldo Vicino e Wilton Rentero iríamos prestigiar o nosso amigo, Laert, que não apenas apresentar-se-ia com o Língua de Trapo, como seria um dos apresentadores do evento, junto ao Wandi Doratiotto, outro grande músico, ator e humorista e este, um membro histórico do "Premeditando o Breque".
Em suma,
um show sensacional e a ofertar uma oportunidade única em
reencontrarmo-nos os quatro membros do Boca do Céu da formação mais
clássica de 1977, a faltar apenas o Fran Sérpico para ficar completo.
Marcamos então o encontro para a escadaria do Teatro Municipal. Eu tive um contratempo caseiro e avisei que atrasaria um pouco, mas estava a caminho. Cheguei à escadaria e não avistei Wilton e Osvaldo, em princípio. O Laert havia deixado os nossos nomes na lista Vip dos convidados, portanto, apesar do teatro estar já bem cheio, eu não temi por não encontrar lugares, visto que as nossas poltronas estavam garantidas.
Eis que alguns segundos depois, eu avisto um rapaz a olhar
para todos os lados, em típica postura de procura e que eu não reconheci
de pronto, mas fiquei com a forte sensação de que poderia ser o Wilton.
Assim que ele mirou-me e sorriu, ficou claro que finalmente, após
"apenas" quarenta e dois anos (falo sobre 1978), finalmente
reencontramo-nos.
Alguns minutos depois, vimos o Osvaldo a aproximar-se e a procurar por nós, e foi uma alegria quando vimo-nos os três, ali na escada do Teatro Municipal, e incrível, o Osvaldo também não via o Wilton desde 1978.
Wilton
Rentero, Osvaldo Vicino e eu (Luiz Domingues), neste instante, um trio do
Boca do Céu na escadaria do Teatro Municipal de São Paulo. 26 de janeiro
de 2020. Click (selfie), acervo e cortesia: Wilton Rentero
Entramos
no teatro e rapidamente eu avistei diversas pessoas conhecidas, entre
músicos, produtores, jornalistas e pessoas ligadas ao espectro do velho
Lira Paulistana, na década de oitenta. Entre nós três, recordamos sobre
diversos shows vistos no Teatro Municipal, sendo o mais memorável de
todos, o clássico Concerto de Rock apresentado entre as bandas de Rock,
Mutantes e O Terço a tocar o som dos Beatles, em 1977, que foi
histórico.
Bem, as luzes apagaram-se e o show iniciou-se. Foi
emocionante para nós três, vermos o Laert a apresentar com desenvoltura o
espetáculo e posteriormente a atuar com muita maestria com o Língua de
Trapo. Incrível, em um teatro onde tanto sonhamos juntos, assistimos o nosso
vocalista, ali a atuar com brilhantismo nesse momento de 2020.
O ingresso que eu usei, a sinalizar que sentei-me na cadeira número 11. Bastidores do Show "Vanguarda Paulistana in Concert", no Teatro Municipal de São Paulo, em 26 de janeiro de 2020.
Além das
nossas expectativas pessoais, em meio às reminiscências do Boca do Céu, o
espetáculo foi belíssimo. Com a participação de grandes artistas que
gravitaram na órbita do Lira Paulistana, amparados pelo apoio excelente
da Orquestra Sinfônica Municipal, foi um apanhado e tanto do melhor que o
Lira lançou, diretamente do seu famoso palco intimista, para o Brasil e
o mundo.
O violeiro, Passoca, a tocar, "Sonora Garoa", uma canção belíssima, causou emoção, assim como o Grupo Paranga, e a sua deliciosa brejeirice ao sabor dos filmes do Mazzaropi. O Grupo Rumo, representado por Ná Ozetti, em grande forma, uma bela homenagem ao Itamar Assumpção e o seu, "Isca de Polícia", Arrigo Barnabé, a evocar a sua "Clara Crocodilo", Premeditando o Breque (não completo), com direito a uma sensacional versão de seu sucesso, "São Paulo, São Paulo" (com inúmeras citações cinematográficas implícitas no arranjo executado pela Orquestra Sinfônica Municipal), o Língua de Trapo e Tetê Espíndola (que pediu desculpas por cantar uma oitava abaixo, nos dias atuais, devido a estar com sessenta e seis anos de idade na atualidade de 2020, mas no calor da canção, "Escrito nas Estrelas", ela não se furtou a cumprir todo aquele malabarismo vocal e agudíssimo, sua marca registrada, para levantar a plateia), a elegantérrima, Vânia Bastos, o monstruoso, Bocato e a Patife Band.
Na parte do Rock, segundo o programa oficial impresso, constava a participação de Roger Moreira, Edgard Scandurra e Sérgio Britto, mas quem de fato atuou, foi Clemente Nascimento, d'Os Inocentes e Finho (do grupo "365"). Bem, é claro que o Punk e as correntes do Pós-Punk tiveram no Lira Paulistana uma boa mola propulsora para atingir o mainstream daquela década, mas outras correntes também obtiveram uma história em tal teatro, para ser citada.
Que ninguém dessa outra corrente atuasse no palco, seria compreensível, mas ao menos a menção
no audiovisual, que foi exibido ao início do espetáculo, teria sido
elegante da parte da produção, todavia, isso não ocorreu e antes que o
leitor especule, eu não fiquei magoado, mas é claro que A Chave do Sol
construiu uma boa história nesse teatro, onde inclusive lançou dois
discos no seu palco, portanto, ao lado de outras bandas de fora da seara
do Punk & Pós-Punk, houve uma outra cena Rock que ali
solidificou-se, que se registre.
Sobre a apresentação do Língua de Trapo, esta foi impecável. Ao aproveitar o apoio da orquestra, a banda iniciou com: "Como é Bom Ser Punk", que é uma música do Carlos Melo (Castelo), que foi composta quando eu estava em minha segunda passagem por essa banda, mas nessa ocasião (falo sobre 1983-1984), eu não participava da sua execução ao vivo, que era feita em duo pelo João Lucas ao piano e Pituco Freitas, a cantar.
Neste caso, sob um suntuoso arranjo, Laert, Serginho Gama e Cacá Lima, cantaram em trio, com uma afinação exemplar, sob uma grande performance. "Concheta", o eterno clássico do primeiro álbum do grupo, veio a seguir, com apoio de Mário "Manga" Aydar e Wandi Doratiotto, ou seja, dois músicos do Premeditando o Breque no apoio e uma versão impecável de "Sampa", do Caetano Veloso, que aliás, suscitou o comentário de Wilton, ao meu lado, a observar que os arpejos feitos por Serginho Gama, remeteriam à "Dear Prudence", dos Beatles.
Realmente houve uma certa similaridade, mas após
encontrarmos o Laert no momento pós-show, ele negou que houvesse tal
menção, então, foi apenas uma impressão de nossa parte. Uma linda menção à nossa
estada no teatro, foi feita pelo Laert, que ao microfone, improvisou um
"caco" (citação fora do texto ensaiado, no jargão do teatro), a narrar
que assistira ali mesmo naquele palco, o show em dupla perpetrado pelos
Mutantes e O Terço, em 1977, a homenagear os Beatles e ele citou que
"assistira ao lado dos companheiros, Luiz, Osvaldo & Wilton, e que
nós estávamos na plateia". naquele instante, que bonito, esse foi o "momento Boca do Céu",
a tornar-se público.
De minha
parte, eu estava muito feliz por estar ali ao lado de dois companheiros
do meu velho, Boca do Céu, feliz pela possibilidade de prestigiar e
aplaudir o Laert, que juntar-se-ia conosco, a posteriori para o
reencontro do quarteto, orgulhoso por ver o Laert ali a brilhar, feliz
por estar a apreciar um belo show e também por ter a minha parcela de
gratidão pelo Lira Paulistana, onde eu vivi uma bela história com o
próprio, Língua de Trapo e também com A Chave do Sol, diretamente,
portanto a trazer por acréscimo, uma infinidade de shows de outros
artistas que eu ali assisti, a boa amizade construída com a sua cúpula,
principalmente com Chico Pardal e Ribamar de Castro, além de Canrobert
Marques, que operou quase todos os shows que eu ali realizei e foi
técnico d'A Chave do Sol, inclusive em alguns shows fora do ambiente do Lira.
Li no programa que o Canrobert operou o som nesse show do Municipal, mas eu não o encontrei nessa tarde e teria sido mais um reencontro sensacional. Entretanto, eis que vejo um velho amigo a caminhar pelo corredor: Paulo Elias Zaidan, ator que foi membro do Língua de Trapo, na época da minha segunda passagem pelo grupo.
Então, ele ligou no perfil de "Whatsapp" da Marcinha Oliveira, esposa do Laert e empresária do Língua de Trapo, com o intuito de verificar se não seria abusivo visitarmos o camarim para cumprimentar o Laert, entretanto o mais óbvio aconteceu, visto que a quantidade de artistas mostrava-se enorme e assim, receber convidados seria inoportuno na intimidade do camarim, pois então, os artistas desceram ao grande saguão de entrada e ali receberam os fãs e amigos.
Maravilha, o
Boca do Céu viu-se como um quarteto por alguns minutos, novamente, só a
faltar a persona de Fran Sérpico, para ficar completa a nossa velha
banda reunida. Tive o prazer de conversar com os sempre super simpáticos, Zé
Miletto e Marcos Martins, membros do Língua de Trapo atual, igualmente.
Quase
o Boca do Céu completo, enfim! da esquerda para a direita: Laert
Sarrumor, eu (Luiz Domingues), Wilton Rentero e Osvaldo Vicino.
Bastidores do Show "Vanguarda Paulistana in Concert", no Teatro
Municipal de São Paulo, em 26 de janeiro de 2020. Acervo e cortesia:
Wilton Rentero. Click: Paulo Elias Zaidan
No calor
da rápida conversa, dada a aglomeração ali presente e com o Laert a ter
que atender várias pessoas, combinamos de intensificar a conversação
pelo nosso grupo do "Whatsapp" e organizar, aí sim, o grande encontro
oficial do Boca do Céu, para fevereiro de 2020.
Coincidência? Pois fora
em fevereiro de 1977, que a banda fizera o seu primeiro show, portanto,
tal como Napoleão Bonaparte ante as pirâmides do Egito, chegara a hora para
afirmarmos, não sobre quarenta séculos, mas a observar: "quatro décadas
contemplam-nos!"
O
guitarrista, Osvaldo Vicino, e a sua amiga, Cristiane Ewel, nos idos de
1978, pouco tempo após ele ter deixado o Boca do Céu. Acervo de Osvaldo
Vicino
Após a
criação do grupo de ex-componentes do Boca do Céu, no aplicativo
virtual, "Whatsapp", a conversação básica inicial enveredou por dois
pontos básicos: as reminiscências de cada um sobre o nosso convívio durante a
década de setenta e um apanhado sobre o que cada um fez da vida,
doravante, inclusive a envolver a criação de família e a enumerar filhos
e a trajetória deles, visto que falamos sobre filhos que hoje em dia
são adultos e em alguns casos, com mais de trinta anos de idade.
Em
suma, uma grande atualização e que foi mais que prazerosa, mas
elucidativa sobre como cada um construíra a sua respectiva vida.
Sobre o Osvaldo, que eu já havia reencontrado algumas vezes após 2015, eu sabia que ele mesmo ao ter uma vida forjada no mundo corporativo do trabalho formal na área da saúde, jamais houvera abandonado a música e que muito pelo contrário, desenvolvera-se também como baixista nesses anos. Portanto, polivalente, a tocar guitarra ou baixo, esteve envolvido com bandas cover como o "Love Hunter" e "Snakebite", ambas a revelarem-se como bandas tributo ao grupo britânico, Whitesnake.
Wilton Rentero em sua residência, a praticar o violão. Acervo de Wilton Rentero
Já no caso
do Wilton, que eu não tive notícias suas desde 1978, diretamente e apenas
por volta de 2012, soubera de algumas informações mais superficiais,
graças ao Laert, também foi bom tomar conhecimento que ele jamais
abandonou a música, inteiramente. Ao ter investido na música erudita,
Wilton contou-nos que já em 1979, tornara-se um professor de violão
erudito e que vivera efetivamente de suas aulas, até a metade dos anos
oitenta, pelo menos. Ele enviou-nos alguns vídeos caseiros para o vermos
a tocar no ambiente de sua residência e foi ótimo vê-lo a tocar tão
bem.
Fran Sérpico contou-nos que vendera a sua bateria, cerca de dois anos após deixar a nossa banda em 1978, e que não desenvolvera mais. Ele optou por focar em seus estudos, formou-se e tornou-se um homem de negócios a gerir uma empresa orientada pela instalação de equipamentos para gerar energia solar em parques industriais, residências e instituições as mais diversas. Muito bem-sucedido, vivia no Rio, mas mantinha uma base em São Paulo, onde visitava a cidade para trabalhar, pelo menos uma vez por mês.
Marcamos enfim um ensaio/reencontro/confraternização para o dia 15 de fevereiro de 2020, e previamente, combinamos de resgatar todas as músicas do nosso repertório que pudéssemos relembrar e também quatro canções do Joelho de Porco, para deixarmos fluir a parte musical do encontro, a contabilizar: "Mardito Fiapo de Manga", Boeing 723897", "México Lindo" e "São Paulo By Day".
Em princípio, foi cogitada a hipótese de convidarmos agregados
que tivemos na ocasião, amigos e membros com participação menor, mas não
menos importante, caso da cantora, Pollyana Alves, por exemplo. Mas ao
ponderarmos melhor, resolvemos manter esse primeiro encontro, mais reservado e
quem sabe em outros encontros posteriores, abrir espaço para algo mais
expansivo, a agregar não somente ex-membros, porém, amigos que
interagiram com a nossa banda nos idos de 1976 & 1979.
Na semana em que antecedeu o reencontro do Boca do Céu, surgiu a ideia de relembrarmos as músicas que compunham o nosso velho repertório e nesse sentido, todos exerceram individualmente, um exercício de memória notável para relembrar ao máximo o que foi possível. Fiquei até surpreendido, pois no esforço coletivo, muitos trechos de canções foram relembrados.
Na ausência de algum apoio com material gravado, seria um esforço hercúleo, visto que as poucas canções que tínhamos registradas, através de gravações caseiras e armazenadas nas arcaicas fitas K7, foram irremediavelmente perdidas ainda nos anos setenta. Portanto, quando eu notei que os companheiros, Laert, Osvaldo & Wilton, conseguiram relembrar diversos trechos a tocar e cantarolar pedaços de músicas, eu fiquei muito feliz.
E mais
reminiscências maravilhosas foram feitas, com todos a relembrarem as
atividades culturais que presenciamos em companhia mútua a contabilizar
shows de Rock e MPB, cinema, teatro, exposições e inúmeras outras
atividades culturais em que estivemos juntos nos anos setenta. Para tal,
além do meu Blog e o relato dos capítulos escritos sobre o Boca do Céu
em minha autobiografia, outros companheiros postaram fotos da época,
caso do Wilton, que disponibilizou-nos diversas fotos clicadas pelo seu
primo, Nelson Rentero, sobre shows que ambos assistiram entre 1974 e
1976, antes até dele, Wilton, ingressar em nossa banda.
Quando eu vi tais fotos do Wilton, eu notei que todo o relato da minha vivência pessoal com o Boca do Céu, e por conseguinte, toda a minha percepção sobre a ambientação cultural e sobretudo, contracultural que envolvera-me nos anos setenta, estava incrivelmente reforçada, pois a energia contida em tais fotos, corroborou de uma força absurda com o bojo das minhas colocações expressas em texto.
O nosso guitarrista, Wilton Rentero, presenciou, na companhia de seu primo, Nelson Rentero, um show de Caetano Veloso, nos idos de 1975. Acervo e cortesia: Wilton Rentero. Click: Nelson Rentero
Pois muito bem, estávamos prontos para o reencontro, com todos animados e com um adendo, pois o companheiro, Fran Sérpico alegou que perdera o traquejo com o instrumento, e assim, ele mesmo tomou a dianteira e convidou o seu cunhado, que
era (é) baterista e que toca regularmente na noite paulistana com bandas cover, desde os anos sessenta, portanto, a amostrar-se bem experiente.
O nosso guitarrista, Wilton Rentero, presenciou, na companhia de seu primo, Nelson Rentero, um show de Jorge Mautner, nos idos de 1976. Acervo e cortesia: Wilton Rentero. Click: Nelson Rentero
Nelson Laranjeira era (é) o nome do rapaz e ele aceitara participar do nosso reencontro. Eu roguei ao Fran Sérpico, que explicasse ao seu cunhado que seria um ensaio truncado, pois tirante as músicas do Joelho de Porco que combinamos tocar por recreação, a ideia seria tentar executar pequenos trechos de músicas do nosso velho repertório, que lembráramos durante aquelas duas semanas anteriores, pela via do aplicativo, Whatsapp.
O nosso guitarrista, Wilton Rentero, presenciou, na companhia de seu primo, Nelson Rentero, o show de lançamento do LP "Tudo Foi Feito Pelo Sol" dos Mutantes, no Teatro Bandeirantes de São Paulo, em 1974. Acervo e cortesia: Wilton Rentero. Click: Nelson Rentero
Que viesse então o dia 15 de fevereiro de 2020, o dia do grande reencontro do Boca do Céu e curiosamente, quarenta e três anos após o nosso primeiro show, realizado em 12 de fevereiro de 1977!
Eis que o grande dia chegou! Após quatro décadas, a formação mais clássica do Boca do Céu estaria novamente reunida, enfim, para uma grande confraternização. Foi por volta das 15 horas do dia 15 de fevereiro de 2020, que eu encontrei o guitarrista, Wilton Rentero, em uma estação do metrô e de lá, fomos juntos ao estúdio que alugáramos para encontrarmo-nos com os demais companheiros. No caminho, falamos sobre mais reminiscências a envolver a nossa banda e igualmente a respeito de tantas aventuras "freaks" que compartilhamos no tempo em que convivemos como companheiros de banda & sonhos, e sobretudo pela amizade que ali vivenciamos. Chegamos com uma boa antecedência ao estúdio e continuamos a conversar animadamente, quando eis que vemos adentrar o salão lounge/bar do estúdio, a persona de Osvaldo Vicino.
Foi muito
bom estar com ambos a conversar enquanto aguardávamos os demais e eu
observei com alegria, o fato de nós três estarmos a segurar instrumentos
em mãos, um fator que não cumpríamos juntos, desde 1978, quando da
saída do Wilton da nossa banda.
Uma vez já instalados na sala de ensaio, que fora liberada para iniciarmos os nossos preparativos pessoais, eis que surgiu o nosso baterista, Fran Sérpico, no recinto. Que alegria, eu não o via desde 1978, igualmente! Pois conversamos animadamente por alguns minutos, enquanto o seu cunhado, o simpático, Nelson Laranjeira, chegou, convidado que fora para participar do nosso ensaio informal.
Fran
Sérpico e eu (Luiz Domingues) a conversarmos, após tantos anos! Ensaio-Reencontro do Boca do Céu no Estúdio Som de São Paulo, em 15 de
fevereiro de 2020. Click, acervo e cortesia: Marcos Kishi
Laert
Sarrumor, o nosso genial cantor e compositor, foi o último a chegar.
"Consummatum est", o Boca do Céu estava finalmente reunido, após tantos
anos.
Muitas histórias para relembrar e celebrar, teríamos a confabular,
certamente, e assim procedeu-se, mesmo que estivéssemos a cumprir
igualmente a nossa tentativa de relembrarmos as nossas antigas
composições e também empreendêssemos a recreação, ao tocarmos as músicas
do Joelho de Porco, previamente combinadas entre nós.
Nas
duas primeiras fotos, Fran Sérpico e Laert Sarrumor a conversar
novamente, após 42 anos (1978-2020). Na segunda foto, o baterista,
Nelson Laranjeira, que cooperou com o nosso ensaio informal. Ensaio-Reencontro do Boca do Céu no Estúdio Som de São Paulo, em 15 de
fevereiro de 2020. Click e acervo: Luiz Domingues
Tocamos as
músicas do Joelho de Porco e divertimo-nos muito, pois além da nossa
recreação pura e simples, houve por considerar-se que estávamos todos
felizes pelo reencontro em si, portanto, o prazer em estarmos a tocar
novamente como uma banda, foi muito acentuado.
E houve mais um fator
importante, pois, o Joelho de Porco foi, entre outras tantas, uma forte
inspiração para a nossa banda nos anos setenta, no calor dos
acontecimentos que cercavam-nos culturalmente naquela ocasião, portanto,
este valor adicional esteve contido ao tocarmos tais canções. Melhor
ainda, foi lembrarmos diversos trechos de nossas canções e que prazer
foi tocar e cantar, a dar suporte com backing vocals a canções que eu
não nutria mais esperança de resgatá-las.
Na
primeira foto, o guitarrista, Osvado Vicino, o mais primordial elo da
formação do nosso grupo. Na segunda foto, Laert Sarrumor a cantar e
expressar a sua alegria pelo reencontro. Na terceira foto, o
guitarrista, Wilton Rentero, em claro momento de satisfação em meio ao
ensaio. Ensaio-Reencontro do Boca do Céu no Estúdio Som de São Paulo,
em 15 de fevereiro de 2020. Click, acervo e cortesia: Marcos
Kishi
E assim
foi, lembramo-nos de canções como: "Serena", "Astrais Altíssimos", "Diva", "Mina de
Escola", "O Mundo de Hoje" e alguns fragmentos de "Instante de Ser".
O
baterista, Nelson Laranjeira, fora avisado que tratar-se-ia mais de uma
confraternização e que a configurar-se como um ensaio truncado, visto
que o objetivo seria tentar relembrar e tornar tais fragmentos de
memória, passíveis em serem tocados, sob uma primeira instância.
Simpático, ele logicamente queria tocar sem interrupções e mesmo assim,
teve a devida paciência para entender o caráter excepcional do nosso
reencontro.
O
guitarrista, Wilton Rentero, na primeira foto. Eu (Luiz Domingues) a usar um
baixo bem parecido com o "Giannini" que usava em 1977, na foto 2! Na
foto 3, eu (Luiz Domingues), Laert Sarrumor e Wilton Rentero. Na quarta foto,
Osvaldo Vicino e Wilton Rentero no primeiro plano, com Laert Sarrumor
ao fundo e eu (Luiz Domingues) sentado, mas visível apenas por detalhe.
Ensaio-Reencontro do Boca do Céu no Estúdio Som de São Paulo, em 15 de
fevereiro de 2020. Click, acervo e cortesia: Marcos Kishi
Encerramos
a parte musical e antes de partirmos para o restaurante Degas, onde
jantaríamos e continuaríamos a nossa confraternização, mediante a ajuda
do meu amigo, o fotógrafo superb, Marcos Kishi, registramos o encontro com uma foto histórica. Pois, Kishi ajudou-nos a
concretizar uma ideia lançada pelo Laert, em conversação travada no
grupo de Whatsapp do Boca do Céu, previamente, e assim, eis que fizemos
uma foto comemorativa, com os cinco membros da formação mais clássica de
1977, a simular a foto promocional que tiramos nesse mesmo ano.
Sob a
orientação de Kishi, eis que posamos no corredor do estúdio, a imitar a foto
de 1977 e tal documentação tornou-se histórica, igualmente, para a
nossa banda!
Incrível, a banda reunida, a empreender a mesma postura fotogênica. Em 1977, éramos adolescentes e naturalmente, quando preparamo-nos para a foto, não poderíamos imaginar que repetiríamos a mesma configuração, quarenta e três anos depois. Em 2020, mais robustos e bem grisalhos, naturalmente, mas eis os cinco componentes do Boca do Céu, ali novamente reunidos e felizes, certamente, por tal oportunidade.
Nas duas primeiras fotos, a confraternização pós-ensaio. Da esquerda para a direita: Wilton Rentero, o convidado especial, Nelson Laranjeira, Fran Sérpico, eu (Luiz Domingues) e Osvaldo Vicino, com Laert Sarrumor à frente. No lounge-bar do estúdio, na primeira três: Wilton Rentero, eu (Luiz Domingues), Laert Sarrumor e Osvaldo Vicino. Na foto quatro: Marcos Kish, Wilton Rentero, eu (Luiz Domingues), Laert Sarrumor e Osvaldo Vicino. Ensaio-Reencontro do Boca do Céu no Estúdio Som de São Paulo, em 15 de fevereiro de 2020. Click, acervo e cortesia: Marcos Kishi. Foto 4: Click automático.
Bem, Fran Sérpico tinha um compromisso pessoal e o seu cunhado, Nelson Laranjeira também despediu-se e partiu. Fomos então para o restaurante Degas e ali, com a companhia de Marcos Kishi, seguimos a conversar, relembrar inúmeras passagens ocorridas com a nossa banda e fatos análogos que vivemos na época. Ao final, Marcia Oliveira, esposa do Laert Sarrumor e empresária do Língua de Trapo, juntou-se a nós.
No restaurante Degas, localizado no bairro de Pinheiros, em São Paulo. Na ala esquerda, eu (Luiz Domingues), Marcia Oliveira e Laert Sarrumor. Ao lado direito, Osvaldo Vicino no canto superior e Wilton Rentero. Ensaio-Reencontro do Boca do Céu no Estúdio Som de São Paulo, em 15 de fevereiro de 2020. Click, acervo e cortesia: Marcos Kishi
Após tal encontro, fortaleceu-se o sentimento e mais do que isso, a predisposição para promovermos nova reuniões/ensaios, resgatarmos as nossas músicas e ficarmos abertos para até imaginar uma apresentação ao vivo e quiçá, a gravação do máximo de músicas que pudéssemos relembrar e assim, enfim, legarmos um registro sonoro do Boca do Céu ao mundo.
Da esquerda para a direita: Wilton Rentero, eu (Luiz Domingues) e Osvaldo Vicino. Boca
do Céu em encontro musical de resgate. Centro Cultural São Paulo, 8 de
março de 2020. Click (selfie), acervo e cortesia: Wilton Rentero
Foi em um
domingo (8 de março de 2020), a mostrar-se muito chuvoso em São Paulo,
que eu, Luiz Domingues, Osvaldo Vicino & Wilton Rentero
encontramo-nos nas dependências do Centro Cultural São Paulo para uma
reunião/ensaio, a fim de começarmos a remontar ao máximo as músicas do
nosso velho repertório de 1976 & 1977.
Mesmo com o ambiente do "CCSP", completamente lotado por jovens que em grupos isolados praticavam ensaios para coreografias em torno das culturas musicais orientais "K-Pop" e "J-Pop", achamos enfim um local mais sossegado, mas não muito, para munidos por três violões, trabalharmos.
Fiquei contente por saber
que os dois velhos amigos haviam desenvolvido arranjos pessoais para
avançarmos com a reestruturação das canções "Diva", "O que Resta é a
Canção" e "Serena", além de esboçarmos o resgate de "Instante de Ser",
"O Mundo de Hoje", "Astrais Altíssimos" e relacionarmos: "Mina de Escola"
e "Centro de Loucos", como possíveis candidatas ao resgate.
Não foi inteiramente produtivo por conta da barulheira que as centenas de jovens que lotavam diversos recantos do complexo, faziam, mas foi um passo inicial para incrementarmos o projeto de resgatar o material e quiçá, gravarmos uma demo-tape ao menos, para legar o material que a nossa sonhadora banda de outrora, baluarte de nossas respectivas aspirações Rockers no decorrer da adolescência, tivemos, ao longo dos anos setenta.
"Desesperar jamais", foi o dizer estampado no neon atrás de nós, apesar de invertido por ação da câmera! Boca do Céu em encontro musical de resgate. Centro Cultural São Paulo, 8 de março de 2020. Click (selfie), acervo e cortesia: Wilton Rentero
Comunicamos ao Laert o nosso ligeiro progresso obtido nessa tarde chuvosa e combinamos de marcar um novo encontro doravante em um local mais reservado, com o devido silêncio a não atrapalhar a nossa concentração, no âmbito da residência de um dos três ou melhor ainda, em uma sala de ensaio.
A pandemia
de 2020, obrigou-nos a refrear levemente a euforia gerada entre
fevereiro e março, quando ganhara corpo a ideia de resgatarmos as
músicas antigas da nossa banda e quiçá entrarmos em estúdio para
promover a gravação de um disco, enfim. Todavia, como eu já salientei,
foi algo ameno, apenas a conter o ímpeto inicial, porém, jamais ao ponto
de cogitar-se engavetar o projeto, ainda bem!
Nesses
termos, os meses em que mantivemo-nos isolados em casa, prontos para
cumprir a quarentena sanitária, foram marcados por conversas via
internet e planos traçados, inclusive a gerar ideias de marketing,
quando o Osvaldo Vicino propôs a criação de um logotipo e a confecção de
camisetas promocionais.
Então, eis que ele mostrou-nos muitos esboços a
buscar uma formatação que lembrasse de certa forma o nosso espírito de
1976, digamos assim, em torno dos nossos signos contraculturais dessa
época.
Ele pôs-se a trabalhar nessa ideia, a elaborar diversos esboços, que particularmente em alguns casos, remeteu a minha impressão, no sentido de lembrar-me do trabalho do caricaturista, Juarez Machado, nos anos setenta, muito embora este artista plástico tivesse nítida influência da art-déco vintista.
Mais alguns esboços que Osvaldo Vicino criou e neste caso ficou bastante saliente o estilo do caricaturista, Juarez Machado, em tais ideias. Junho de 2020
Esse processo foi articulado a partir de junho de 2020 e no mês subsequente, eu também empreendi esforços para apresentar uma novidade no campo do marketing para a banda, quando pude encomendar com a minha amiga, Amanda Fuccia, artesã de primeira linha, a confecção de uma almofada de sofá & poltrona, com a estampa de nossa histórica foto de 1977, e com a parte reversa a conter a banda na mesmo tipo de enquadramento, em foto recente, clicada em 2020, pelo amigo, Marcos Kishi.
Ao final de julho, no dia 27, para ser preciso, realizamos enfim um primeiro ensaio virtual, quando conseguimos resgatar a canção, "Diva" do Laert, ao propormos um mapa atualizado para ela e com diversas ideias para arranjos em diversos trechos. Eu, Luiz, Osvaldo e Wilton trabalhamos e Fran Sérpico participou em dado instante, como um visitante. Laert manifestou-se a posteriori, ao perguntar sobre como transcorrera esse trabalho inicial.
Em 28 de julho de 2020, Osvaldo Vicino e eu (Luiz Domingues) a postos para um ensaio virtual do Boca do Céu. Wil Rentero entrou em seguida.
Novos ensaios foram combinados e dessa forma, mesmo com pandemia ainda muito intensa, a nossa animação para resgatar o legado de nossa banda, intensificou-se.
A pandemia de 2020 não deu trégua, ao nos atrapalhar de uma maneira contumaz, no entanto, o que seriam alguns dias, semanas e quiçá, meses, para quem simplesmente nem cogitava mais reunir a formação clássica de uma banda que atuara há quarenta e quatro anos atrás?
Pois é, com esse sentimento mais grandiloquente, conseguimos coibir a ansiedade por nos encontrarmos, para resgatar o material antigo da banda, o sonho que acalentamos quando nos reunimos no começo de 2020 para uma confraternização tão festiva e que gerou tal meta mais ambiciosa.
Tentamos prosseguir com ensaios virtuais, mas esbarramos em dificuldades técnicas para que eles fossem produtivos, uma grande pena. Então, só nos restou ter paciência para que a situação sanitária periclitante fosse superada na sociedade em geral, para que pudéssemos nos reagrupar e formalizar assim uma série de ensaios de composição e arranjo das velhas canções e certamente pensar em novas peças que Wilton e Osvaldo anunciavam terem em mãos.
Nesta foto acima, vê-se o recorte primordial para o recorte das almofadas confeccionadas por Ana Fuccia através de sua empresa, Ecoarte/Almophodas.
Enquanto isso, por volta de agosto de 2020, uma ação de marketing saiu do projeto e se materializou através de uma parceria com a artesã e artista plástica, Amanda Fuccia, quando se confeccionou uma capa de almofada a conter em seu verso, a foto clássica do Boca do Céu com o quinteto reunido no corredor lateral da minha então residência, em março ou abril de 1977 (foto que acreditamos ter sido clicada por Adelaide Giantomaso).
Devidamente montada, eis a versão da almofada do Boca do Céu, com as fotos de 1977 (preto e branco) e 2020 (colorida)
E na sua parte posterior, a almofada foi montada com a foto da banda reunida, na mesma configuração, em 2020, quando da festiva reunião-ensaio promovida em fevereiro de 2020, com foto de Marcos Kishi.
Acima,
alguns exemplos das camisetas que o Osvaldo Vicino preparou para o Boca
do Céu e chama a atenção a bela concepção de design do logotipo que ele
criou, o ótimo contraste obtido, principalmente no modelo de cor azul
marinho e a inserção de uma frase de efeito a afirmar: "Grupo de Rock-
Desde 1976". A denominação "Grupo" estivera muito em voga nos anos
setenta, em detrimento do termo, "banda", ter se tornado mais popular
para designar um conjunto musical orientado pelo Rock. Daí, ser mesmo
proposital para homenagear a nossa origem setentista.
Em setembro, Osvaldo Vicino levou adiante o seu esforço empreendido em torno da criação de um logotipo para a banda e assim, ele anunciou a confecção de camisetas, para incrementar ainda mais as ações de marketing, ou seja, estivemos impedidos de avançar no trabalho de resgate das canções por conta do isolamento motivado pela pandemia da Covid-19, no entanto, geramos mais ações de marketing em 2020, do que jamais chegamos perto nos anos setenta quando da origem e atuação do grupo, por conta da nossa inexperiência para saber lidar com tais trâmites e falta de recursos para investir naquela ocasião.
Nesse ínterim, a pandemia voltou a ficar forte, em sua segunda onda de contágio, portanto ainda mais assustadora. Entretanto, nós mantivemos o compromisso firmado para avançarmos enfim com os ensaios a visar resgatar as nossas músicas do período 1976/1977, a primeira parte da nossa missão.
Após tantos adiamentos por conta dos impedimentos de um ou outro membro e curiosamente em uma fase em que a pandemia houvera recrudescido, eis que nós insistimos para realizar justamente esse ensaio, para que simbolicamente houvesse a demarcação do avanço ainda em 2020 e assim nos garantisse o impulso para continuarmos motivados em 2021, mesmo que a situação social e sanitária do país (e do mundo), permanecesse caótica.
O guitarrista Wilton Rentero a nos mostrar o seu infortúnio por estar internado para tratar de cálculos renais, dois dias antes do ensaio marcado para dezembro de 2020. Click (selfie), acervo e cortesia: Wilton Rentero
E então, o imponderável ocorreu, pois um de nossos guitarristas, Wilton Rentero, revelou-nos que não poderia participar, pois estava internado em um hospital na cidade de Guarulhos-SP (Hospital Carlos Chagas), diagnosticado com cálculos renais, sob fortes dores e que justamente no dia marcado para o ensaio, estaria a submeter-se a uma intervenção cirúrgica. Poxa, que azar, depois de tantas postergações para se marcar esse ensaio presencial, esse infortúnio surgiu para atrapalhar os nossos planos.
Mesmo assim, resolvemos, eu e Osvaldo Vicino, mantermos o ensaio marcado, pois mesmo desfalcados do Wil, nós haveríamos de evoluir em nossos trabalhos e além do mais, como eu já expus anteriormente, esse ensaio teria a simbologia da resistência da nossa banda.
Se a pandemia mundial de 2020 não houvesse ocorrido, nesta altura dos acontecimentos, talvez até estivéssemos a gravar a nossa demo ou disco, quem sabe, e assim, a avançarmos, ainda que de uma forma cautelosa ante o perigo do contágio, eis que a insistência para se manter o ensaio, conteve tal simbologia.
O
guitarrista, Osvaldo Vicino e eu (Luiz Domingues), na sala de ensaio, em
que trabalhamos em dupla, em prol do Boca do Céu, no dia 23 de dezembro
de 2020. Click (selfie), acerco e cortesia: Osvaldo Vicino
Dessa maneira, em 23 de dezembro de 2020, eu, Luiz e Osvaldo Vicino, nos encontramos em uma sala de ensaio localizada no bairro de Pinheiros, na zona oeste de São Paulo e trabalhamos juntos em três temas do nosso velho repertório setentista: "O Mundo de Hoje", "Serena" e "Mina de Escola".
Com alguns avanços na parte estrutural das três canções, nós ficamos contentes com o resultado, e o esforço empreendido. Filmamos versões das três canções e assim, combinamos de prosseguir no trabalho, assim que o Wil sinalizasse estar em condições para participar e também a coincidir com o fechamento das festas de final de ano e a se observar a situação da pandemia, logicamente.
Wilton
Rentero no momento pós-operatório, a nos sinalizar estar bem e ao mesmo
tempo, preocupado em colher informações sobre como ocorrera o ensaio da
nossa banda sem a sua presença. 23 de dezembro de 2020. Click (selfie),
acervo e cortesia: Wilton Rentero
Wil Rentero repercutiu conosco o resultado do ensaio, algumas horas depois, já com a boa novidade da sua cirurgia ter sido concluída com sucesso e mesmo em momento pós-operatório, ele mostrou vitalidade na conversação pelo "whatsapp" do nosso grupo e assim, nós também ficamos contentes por saber que ele estava muito bem.
Ainda a falar sobre o ensaio, Osvaldo entregou-me a minha camiseta do Boca do Céu, que ele mesmo preparara meses antes e eu fiquei muito feliz por recebê-la. Que incrível, uma ação de merchandising que a nossa banda nunca teve oportunidade de possuir nos anos setenta e eis que no limiar de 2020, tal esforço se concretizara.
Em tom de brincadeira, mas a repercutir uma verdade, Osvaldo lembrou-me que esse ensaio realizado em dupla o fizera se lembrar dos nossos mais remotos esforços em prol da banda, com ensaios preliminares feitos somente por nós dois em seu apartamento da Rua Inhambú, no bairro de Moema, na zona sul de São Paulo, no longínquo mês de abril de 1976.
Ora,
foi a mais pura verdade, que volta incrível demos em torno de quarenta e
quatro anos decorridos, para voltarmos a trabalhar pelo Boca do Céu,
novamente e no mesmo formato, ainda que desta vez tenha sido por uma
contingência meramente ocasional, dada a situação de saúde do nosso
companheiro, Wilton, e pelo fato do Laert sabidamente não participar
dessa fase de ensaios preliminares, de forma proposital por morar em
outra cidade (São Vicente-SP, no litoral) e no caso, ele só viria a
participar de ensaios futuros.
Esperançosos de que a pandemia mundial do Covid-19 se arrefecesse em 2021, e sobretudo que o nosso legado pudesse enfim ser construído a resgatar o nosso material e eternizá-lo, nós fechamos o ano com tais expectativas em alta voga. Que 2021 fosse o ano da "Revirada" do nosso heroico, Boca do Céu...
História em franca (re)construção, portanto...
Eu (Luiz Domingues), a ostentar orgulhosamente a bela camiseta da minha primeira banda na carreira, o glorioso: Boca do Céu, grupo de Rock, desde 1976, em pleno avançar do século XXI! 23 de dezembro de 2020. Click (selfie) e acervo: Luiz Domingues
Continua...
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