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domingo, 19 de julho de 2015

A Chave do Sol - Capítulo 17 - A Última Chance: Um Novo Álbum - Por Luiz Domingues

Eu não saberia dizer de onde tirávamos forças para prosseguir com aquele cenário pintado à nossa frente. Sem um empresário minimamente competente, sem suporte de uma gravadora, sem dinheiro, e o pior de tudo, rachados internamente pela perda irreparável do nosso baterista querido, essa sim, a se constituir da maior das perdas que poderíamos ter tido. 

Mas ao analisar hoje em dia, acho que tenho a resposta para tal indagação que eu expus na primeira frase deste capítulo, ou seja: puro instinto de sobrevivência, foi o que moveu-nos, na ocasião. 

Contudo, também houve o sentimento que um término de atividades seria a coroação de uma frustração enorme por termos fracassado, após tanto trabalharmos, e pior que isso, dentro daquela sensação de perdermos tudo o que tínhamos conquistado (e foi muita coisa), com a nossa heroica jornada marcada por tanta labuta.

Antes de seguir em frente na cronologia, eu preciso só registrar que uma última tentativa para uma abordagem em gravadora, fora feita, mas nessa altura, ninguém mais teve esperanças, após habituarmo-nos com o modus operandi em voga em todas as companhias.

Para resumir, uma fã nossa do Rio de Janeiro, disse que conhecia um contato dentro da gravadora EMI-Odeon. Claro que a sua gentil oferta para intermediar um encontro foi atendida e assim, desta feita, Eliane Daic, ainda a exercer função como produtora da nossa banda, encontrou-se com essa fã no Rio e levou consigo o nosso material para tal contato, mas... nem resposta para marcar-se uma eventual reunião de audição com o diretor de repertório, tivemos, o que foi algo para se esperar, convenhamos e a denotar que o contato propagado pela fá. não era tão influente quanto ela deduzira que seria.

De volta à cronologia, a nossa realidade foi permeada pela profunda aspereza nessa época, mas eu louvo muito a predisposição do Beto de haver assumido muitas frentes de trabalho simultaneamente, com muita energia e praticamente a suprir esse tipo de característica de uma profunda força de trabalho obstinada, que fora a marca registrada do Dinola em nossa banda, outrora. 

Nesses termos, como eu já mencionei antes, ele alinhavou o contato com o Estúdio Guidon, ao conversar com seu gentil proprietário, um rapaz chamado Guto Guidon, resgatou o artista que fizera um esboço de capa e foi atrás para fechar um acordo para ele tocar a obra em frente e assim concluir o lay-out, contatou Ivan Busic para tocar bateria em nosso disco e não parou por aí, pois ele foi rápido em sua predisposição e começou a captar possíveis patrocinadores para auxiliar-nos nessa despesa insana com a qual não tínhamos a mínima condição de arcarmos, sozinhos.

Nessa seara, Beto Cruz logo anunciou um patrocínio conquistado, mas que no seu momento decisivo, revelou-se insípido e mais que isso, praticamente um alvo fácil para as piadas prontas dos maledicentes de plantão.

Tratou-se de um salão de cabeleireiro masculino ("Lazinho's"), que não ofereceu-nos dinheiro em espécie para ajudar nas despesas, mas dar-nos-ia o uso de seus serviços... bem, éramos "cabeludos" e artistas, portanto precisávamos de um serviço profissional com bom nível nesse quesito, mas convenhamos, eu não importava-me em acertar as pontas da minha cabeleira de Rocker setentista, em salões bem mais modestos e a pagar por isso. Porém, na penúria em que encontrávamo-nos naquele instante, qualquer ajuda ventilada teria sido válida, e se não empolgou-nos, fora melhor ter o patrocínio, do que não tê-lo.

Tirante isso, Beto não perdeu tempo e começou a cotar preços de fábricas de prensagem de vinis e gráficas para imprimir as capas.

De minha parte, o acordo com a Rock Brigade fora concretizado, mas a minha participação houvera sido pequena, pois a intervenção mais incisiva viera da parte do saudoso, Eduardo Russomano que elaborou toda a intermediação. 

Eu também prontifiquei-me a manter o fã-clube em atividade, e ele seria vital para as nossas ações de marketing. Uma outra colaboração singela, foi ter conversado com o amigo, Carlos Muniz Ventura e garantirmos assim uma sessão de fotos, com custos minimizados, praticamente só a pagarmos pelo material, ao visarmos produzir as fotos oficiais do álbum e também as promocionais que precisaríamos para a divulgação. 

Uma última ação de minha parte, foi combinar com o Walcyr Chalas (Woodstock Records), uma tarde de autógrafos para o lançamento do disco, nas dependências de sua loja e mais para frente, eu darei detalhes sobre tal ação, que reputo ter sido um dos últimos suspiros de vida da banda, com enorme sucesso. 

Infelizmente, o Rubens pareceu alheio a todo esse esforço e profundamente chateado pela somatória de acontecimentos ruins que ocorreram-nos nos últimos tempos, se manteve distante de nós e não demonstrou haver empolgado-se com a pré-produção do disco. Relevamos, ao compreendermos que o seu ânimo estava baixo e continuamos a esforçarmo-nos, apesar dessa discórdia que ainda minava a banda, internamente.

Os primeiros ensaios com Ivan Busic, foram tranquilos. Um músico com alto nível técnico, grande criatividade e a se tratar de uma excelente pessoa, claro que com sua simpatia e espírito brincalhão entre nós, o convívio foi fácil ao extremo, e para ir além, Ivan ajudou a minimizar o astral baixo com o qual estávamos a lidar na ocasião. 

Lembro-me da rotina que estabelecemos ao dirigir-me à residência dos irmãos Busic, onde de lá, íamos eu e Ivan em seu carro, para o ensaio na casa do Beto, em uma rotina que perdurou por alguns dias. 

Não foram muitos ensaios, por que o repertório do disco foi pequeno, com apenas oito canções e um músico do gabarito do Ivan, as preparou com extrema facilidade e mesmo ao se colocar de uma forma muito respeitosa ao não mudar radicalmente os arranjos originais criados pelo Zé Luiz, claro que ele colocou um pouco de sua criatividade em algumas sutilezas.

O Beto insistiu em adicionar três músicas novas que não estavam originalmente no set list dos últimos shows, em detrimento de muitas que faziam sucesso ao vivo. 

A ausência de uma música como "O que Será de Todas as Crianças?", que era super querida nos shows, desde 1986, culminou por ocorrer para dar espaço a tais músicas novas que foram propostas. 

A explicação para tais escolhas tão repentinas, foi o fato de que havíamos fechado com a ideia de que seria bom termos músicas em inglês, também, para tornar o disco híbrido. Tal decisão foi tomada por termos ouvido a opinião de muitas pessoas que convenceram-nos de que o momento seria propício para tentarmos uma expansão internacional e nesses termos, tornara-se uma condição sine qua non que houvesse material em inglês para esse disco.

E acrescento que as três novas canções são boas e poderiam de fato serem incorporadas no disco, ao manter um padrão de qualidade e aposta no potencial Pop, também. 

Tratou-se no caso de: "A Woman Like You", "Sweet Caroline" e "Change my Evil Ways". As duas primeiras que eu citei, foram composições muito frescas, fechadas naquelas últimas semanas em meio à crise da banda e o Zé Luiz ainda as executou em seus últimos ensaios conosco, contudo, mal deu tempo dele estabelecer o seu arranjo pessoal para ambas. Portanto, quem de fato veio a estabelecer as linhas gerais e definitivas ao desenho rítmico delas, culminou em ser o Ivan Busic, mesmo. 

Sobre "Change my Evil Ways", tratou-se de uma música engavetada do Beto, fruto de sua passagem pela banda de Hard-Rock interiorana, "Zenith". Ele teve a ideia de resgatá-la e de fato é uma boa canção com certos ecos "zeppelineanos" e dessa maneira, termos algo com possibilidades setentistas no repertório chegou a ser um alento. 

Mas a inclusão dessas músicas novas, ao referir-me a "A Woman Like You" e "Sweet Caroline", trouxe também algumas divergências. O Rubens, que nos últimos meses estava bastante contrariado com muitas nuances, simplesmente não quis saber dessas canções e assim, adotou posição de neutralidade desinteressada, ou seja, não opôs-se às suas inclusões no álbum, em detrimento de outras músicas que deveriam ter entrado naturalmente, caso de "Saudade" que nós tocávamos desde 1986, nos shows, a exaustão.

Tal posição de sua parte, denotara o seu esgotamento emocional com a banda e isso entristecera-me muito, é claro. Claro que chateei-me bastante nessa época com tal posição dele, mas hoje, eu entendo que as suas forças haviam esgotado-se. 

Nesses termos, ele deixou claro que não tocaria nessas duas canções novas e que a responsabilidade para suprir a base e solos de guitarra, ficaria a cargo exclusivamente do Beto. Tudo bem, o Beto não era nenhum virtuose na guitarra, mas poderia e de fato o fez, gravar sozinho, ao fazer a base da harmonia e solos para ambas. 

Nesse sentido, o Beto era mais ou menos como o norte-americano, Sammy Hagar no "Montrose", e mesmo no "Van Halen", ao tocar esporadicamente e cumprir bem a função. As outras canções escolhidas seriam, aí sim, conhecidas do público que acompanhava-nos, por estar a serem tocadas nos shows, com regularidade. 

Foi o caso de: "Profecia", "Sun City", "Lírio de um Pantanal" e "A Chave é o Show". 

Sobre "Keep me Warm Tonight", esta também era uma velha conhecida do nosso público, mas repaginada, ganhara letra em inglês doravante, pois anteriormente fora conhecida do nosso público, como "Que Falta me faz, Baby". 

No caso de "A Chave é o Show", cabe destacar que a letra de tal canção fala sobre a própria banda e a emoção que a nossa música, de uma maneira geral e a performance ao vivo da nossa banda, causava aos seus fãs. Achava e ainda acho, uma bela ideia do Beto e na época, tal canção gerava uma comoção a parte nos shows. 

Mas também há o seu lado duvidoso, pois ficara sujeita a se tornar marcada como envelhecida, rapidamente, tal como "Sun City" e também personalista em demasia. 

E não deu outra... ao olharmos os comentários de jovens hoje em dia (2016), na postagem de uma versão ao vivo, dessa canção no YouTube, muitos ironizam e debocham da letra, pelo fato da banda não ter alcançado o mainstream e dessa forma, na sua concepção moldada por paradigmas imediatistas, a letra soa ridícula na atualidade, pelo fato da banda não ter alcançado o sucesso que justificasse tal autoelogio. É um argumento legítimo de certa forma, não posso negar.

Ainda sobre o repertório, no cômputo geral tratou-se de uma boa compilação a retratar de forma sucinta a mudança de direcionamento no trabalho da banda, após o EP de 1985. Mas com a ressalva de que outras canções que tínhamos à disposição, poderiam tranquilamente ter feito parte do álbum, e em alguns casos, como já citei, acho que deveriam ter feito mesmo, pois eram queridas do público, ao vivo. Sob poucos ensaios, portanto, consideramos que estávamos prontos para entrar no estúdio.

Mas antes dessa tarefa, um novo compromisso na TV, apresentou-se para nós, e não tivemos condições para recusá-lo, apesar do clima pesado que a banda vivia, internamente. 

Falamos então com o Ivan Busic e ele aceitou a ideia de tocar ao vivo no tal programa e assim nós confirmamos a nossa presença. 

Tratou-se de um então programa novo da TV Cultura, que era apresentado pelo radialista, Kid Vinil, chamado: "Boca Livre". Era filmado nas dependências do Teatro Franco Zampari, um teatro de propriedade da própria Fundação Padre Anchieta, mantenedora da TV Cultura e auditório esse onde há anos eram produzidos programas dessa emissora. Fomos tranquilos, pois sabíamos que o Ivan, apesar de poucos ensaios, detinha uma competência absurda, e não haveria motivo para preocupações, naturalmente.

Bem recebidos pelo Kid Vinil, que apesar de ser um entusiasta das estéticas do Punk/Pós-Punk, assumidamente, ele por outro lado nem de longe mantinha o comportamento detestável da maioria esmagadora de seus pares no jornalismo da época, portanto, o fato de não gostar da nossa estética, com nítidos signos de estéticas retrô, portanto antagônicas ao que essa gente professava, nada interferiu e assim, ele tratou-nos muitíssimo bem ao vivo, diante das câmeras e também nos bastidores. 
Eu e Beto já o conhecíamos na verdade. Certa vez em 1986, nós fomos juntos à residência do guitarrista, André Christovam, e ele, Kid Vinil estava presente nessa reunião, pois ambos tocavam juntos. 
 
Aliás, fomos convidados nesse dia e posteriormente, fomos assistir um show deles, no auditório do Masp, como: "Kid Vinil & Os Heróis do Brasil". 
 
Nessa tarde de um domingo de 1986, passamos momentos agradáveis a ouvirmos discos e eu tenho na lembrança, ouvir o Kid Vinil a tecer elogios sobre o LP "Physical Graffiti", do Led Zeppelin, o que causou-me a boa impressão de que ele seria de fato, um jornalista diferenciado nesse sentido, pois se assumidamente gostava da turma de 1977, não portava-se como um xiita em prol do detestável comprometimento de se adotar o niilismo em forma de ódio ao passado, como modus operandi em suas funções como comunicador. Talvez se todos os seus pares agissem assim, o estrago punk não tivesse sido tão grande, sem revanchismos infundados. 
 
De volta ao palco do teatro Franco Zampari, tocamos ao vivo, embora fosse um programa gravado para ser exibido depois, ou seja, nos moldes da antiga "A Fábrica do Som". 
 
Houve um bom público presente no auditório e mesmo que não tenha sido exatamente um público Rocker, portanto acostumado a tais sonoridades, foi respeitoso. 
 
A nossa performance foi tecnicamente boa, mas deu para ver nos semblantes dos três sobreviventes da banda, que o clima estava pesado para nós e entre nós. Apenas Ivan Busic, que não tinha nada a ver com tais desavenças, esteve imune e tranquilo nesse sentido. 
 
Tocamos as músicas: "Sun City" e "Que Falta me Faz Baby", que ainda não havia sido repaginada para o idioma inglês. Mas somente a segunda cópia está postada no YouTube.

O link para assistir tal performance da banda, nesse referido programa de TV, em uma postagem de melhor qualidade, lançada por Will Dissidente, em 2015:
https://www.youtube.com/watch?v=QcVOUJKxNJE

O solo vocal que era típico da música e evocava ídolos do Beto, tais como: Robert Plant, David Coverdale, Paul Rodgers e Glenn Hughes, sobretudo, causou uma estranheza normal para um público popular e não familiarizado com os signos do Rock e do Blues, nesse caso em específico, mas não chegou a ser constrangedor como seria para esperar-se em uma circunstância adversa dessas. 

Foi o nosso último programa de TV em 1987 e também o derradeiro como A Chave do Sol, ao encerrar o nosso ciclo de aparições na TV. Mas claro que não dimensionamos isso a época.

Nesse ínterim, o Beto conseguiu conquistar mais dois patrocínios para o disco, entretanto, apesar dessa ação bem-sucedida em nosso favor, assim como houvera ocorrido com a adesão do salão de cabeleireiro, "Lazinho's", desta feita ele anunciou o apoio de uma loja de artigos de couro, localizada na Rua Augusta, chamada: "Francis Couros", e um patrocínio de uma Luthieria que aspirava entrar no mercado, chamada: "Vintage". 

No caso da loja de artigos de couro, foi um fato que na época, usávamos bastante figurinos de couro para compor o nosso visual de palco, mas a perspectiva para ganharmos uma peça, cada um, não representou exatamente o que mais precisávamos naquele instante. 

Portanto, foi o segundo patrocínio apenas relativo, contabilizado, visto que termos direito a cortes de cabelo e uma peça de roupa de couro para cada um, não ajudara-nos muito a enfrentarmos a despesa assustadora que estávamos a assumir, ao bancar sem recursos, um novo LP.

E no caso dessa loja em específico, ainda houve a agravante de que só uma peça foi disponibilizada, no caso a jaqueta de couro que o Beto usou na foto da contracapa do LP, e quanto às outras peças prometidas para os demais, jamais foram entregues. 

Bem, pelo menos o Beto saiu bem na foto, no pleno uso da tal jaqueta. 

No caso da Luthieria "Vintage", cabe explicação. A ação do Beto foi ótima, sem dúvida, aliás nos três patrocínios que trouxe-nos e louvo isso com muito entusiasmo e gratidão, que fique muito claro.

Contudo, assim como no caso dos dois outros patrocinadores aos quais eu comentei anteriormente, tal luthieria também não acenou com apoio financeiro direto, mas sim com vantagens subliminares aos membros da banda, no caso, com a montagem de duas guitarras e um baixo. 

Se no caso das roupas de couro e do salão de cortes de cabelo, pelo menos na promessa, os quatro membros seriam beneficiados, neste caso, o baterista não levaria vantagem alguma com tal apoio. Ficou menos constrangedor para nós, pelo fato do Ivan Busic não ser componente oficial da nossa banda, mas um convidado, contudo, caso o Zé Luiz estivesse normalmente a ocupar seu lugar na banda, teria sido constrangedor.

No meu caso em específico, fora uma oportunidade de ouro para finalmente ter um segundo baixo e sair da incômoda posição de desenvolver uma carreira profissional, com o número alto de dificuldades que a logística do ofício submete um instrumentista normalmente, com um único instrumento à disposição, portanto, ao estar sujeito a ficar desprevenido em qualquer eventualidade. 

Contudo, tratou-se da minha situação pessoal nessa época e apesar de saber que foi arriscado ao extremo ter apenas um instrumento para cumprir os compromissos todos que tivemos, eu não reunia meios para melhorar tal situação, mesmo nos momentos de pico da banda, em que uma compensação financeira avistou-se, fruto de nossas melhores conquistas.

Então, claro que pelo ponto de vista estritamente pessoal, foi uma grande conquista pessoal, naquele instante.

Neste caso eu nem tenho como lamentar o fato de que esse patrocínio não tivesse sido na forma de dinheiro vivo, dada a nossa necessidade premente para saldarmos despesas. 

Entretanto, também não posso deixar de registrar que o patrocínio ficou falho no cômputo final, pois só eu tomei posse desse baixo, e as duas guitarras prometidas jamais foram entregues. É preciso registrar também que o acordo cobriu apenas a despesa da madeira de corpo & braço, montagem do instrumento & pintura, com a obrigação da compra dos componentes, as peças mais caras, por nossa conta. 

Além do mais, no meu caso, a canseira que eu tive para ter esse instrumento em minha posse, finalizado enfim, foi imensa. Esse acordo foi fechado em 1987, mas somente ao final de 1989, eu pude contar com ele, e isso não obstante o fato de que só ocorreu mediante inúmeras visitas na longínqua oficina onde ele esteve a ser montado. 

Em muitos momentos, sinceramente eu pensei que eu jamais o pegaria, pois em um dado instante, o luthier patrocinador chegou a anunciar dificuldades para cumprir a sua promessa, mas mediante a minha pressão, ele recorreu a outro luthier, que culminou em finalizá-lo e aí, uma situação bizarra desenhou-se, pois se o propósito inicial fora fazer propaganda de uma luthieria, no caso a "Vintage", o baixo finalizou-se ao receber o selo da "Tajima", ou seja, uma outra marca.

Usei-o pouco ao vivo e em estúdio, pois quando ele foi entregue, finalmente, A Chave do Sol simplesmente já não existia mais e o que ocorria naquele momento foi a minha participação com uma banda diferente, nascida de sua dissidência, portanto, o patrocínio não justificara-se por vários motivos, sendo o pior de todos, o fato bizarro do instrumento ter sido entregue com uma marca completamente diferente, que em nada contribuiria como exposição, ao seu patrocinador original.

Ao falar sobre o instrumento em si, quando o recebi, aliviou-me pessoalmente como eu já disse, visto que há muito tempo eu sofria por só possuir um único instrumento para enfrentar a carreira e as suas necessidades técnicas, prementes. 

Mas por ironia do destino, poucas semanas depois de tê-lo enfim em minhas mãos, a minha situação financeira mostrara-se outra, bem melhor e uma oportunidade para adquirir um terceiro baixo, desta feita importado e de uma marca renomada, surgiu, e assim, a minha situação em termos de disponibilidade de ferramentas, ficou muito mais confortável, doravante. 

Então, por esses fatores expostos, tal baixo "Vintage", mas que no "headstock" do instrumento saiu marcado como "Tajima", não foi muito usado ao vivo e em gravações. 

Porém, tal baixo marcaria de uma forma absurda a minha sala de aulas, pois foi com ele que eu mais contei para ministrar aulas, durante o período de 1989 até 1999, quando executei a minha última aula. 

Recentemente (2015), ele foi submetido a uma reforma geral, inclusive com troca de componentes e agora está a tinir, por assemelhar-se visualmente e soar como um autêntico, Fender Precision, o seu projeto inicial. 

De volta a falar dentro da cronologia: tivemos três patrocínios mambembes em que nada contribuíram diretamente no custeio do LP que iríamos gravar, mas que foram em tese, melhores que nada, e nesse aspecto, agradeço-os, apesar dos pesares, e louvo a iniciativa e esforço do Beto, que esforçou-se muito para arregimentá-los.

Para fugir completamente do padrão d'A Chave do Sol, as circunstâncias geradas por todos os fatos que eu já expus anteriormente, levou-nos a realizarmos um baixíssimo número de ensaios. 

A nossa sorte, foi que no caso da maioria das músicas, nós já as havíamos tocado muito, ao vivo, e naturalmente elas estavam sem indícios de ferrugem decorrente dessa nova fase em que encontrávamo-nos, com a ausência completa de empenho, ao contrastar com o esmero, do qual orgulhávamo-nos durante todos os anos anteriores de nossa existência. 

Outro fator de sorte, foi que se havíamos perdido o nosso grande baterista, José Luiz Dinola, o convidado para suprir tal gravação, foi ninguém menos que, Ivan Busic, ou seja, um baterista dotado de uma grande técnica e que apesar de poucos ensaios, inspirara-nos total confiança de que no estúdio desempenharia com enorme categoria a sua função, e de fato, foi o que ocorreu.

Outra ação muito positiva da parte do Beto, foi a de contatar o produtor, Edy Bianchi, que havia produzido o LP do "Inox", anteriormente. 

Edy Bianchi era (é) um grande Rocker, com formação pessoal inteiramente calcada no som vintage das décadas de sessenta e setenta. Não foi nossa intenção deliberada trazer tais influências para a sonoridade do disco. Não fora a nossa preocupação na época, soar vintage, e pelo contrário, a intenção foi ser atual para os padrões da época, ao buscar-se o Pop possível dentro das características de uma banda de Hard-Rock oitentista.

Mas no meu caso, em que tais influências sessenta-setentistas sempre foram queridas ao extremo, trabalhar com um produtor como Bianchi, que entendia a mesma linguagem, seria no mínimo, um tremendo prazer. E de fato, o foi. 

Ressalto, não buscávamos tais signos 1960 & 1970, nesse trabalho. Se eles existem, e eu acho que sim, existem, são por fatores absolutamente sutis e não deliberados para o propósito do álbum, nessa época. 

Todavia, se Bianchi tivesse participado das gravações dos discos da Patrulha do Espaço, quando eu fiz parte da formação, muitos anos depois, e aí sim, com a intenção de soar retrô a se mostrar como algo explícito, aí sim, teria sido perfeito! 

Bem, fora dessas considerações estéticas, Edy Bianchi aceitou o convite do Beto e ciente de nossa penúria, foi além e predispôs-se a trabalhar sem cobrar cachê, por puro prazer e esforço colaborativo com o projeto da banda. 

Creio ter sido esse, um patrocínio que deu certo para a banda, sem reservas, e um grande feito do Beto para o nosso grupo, sem dúvida.

Então, sob um cenário que mostrara-se tétrico para a banda, pelo seu profundo momento de baixa motivação interna, com direito a uma perda que reputo irreparável, caso da saída de Zé Luiz Dinola, a arregimentação de recursos para materializar o que viria a ser o LP "The Key", foi notável, e sem dúvida, revelou-se como o último alento para salvar a banda. 

Nessa circunstância, o grande artífice dessa tentativa de manter a chama acesa, foi o Beto, não tenho dúvida, que sempre teve espírito empreendedor por natureza e ao perceber o grande perigo que corríamos, tratou de lutar com todas as forçar para reverter o quadro negativo. 

Enfim, ele não mediu esforços para extirpar o fogo interno que consumia-nos e assim, a tentar salvar-nos. Com estúdio marcado, baterista substituto pronto para gravar, selo garantido, capa a ser preparada, produtor de estúdio a postos e três patrocínios acertados, fomos para o estúdio Guidon, nos primeiros dias de outubro de 1987, para a nossa cartada final: seria ganhar a rodada desse jogo de poker, ou perder tudo.

Ao chegarmos ao estúdio Guidon, em uma primeira inspeção prévia de pré-produção, verificamos que a bateria que havia disponível no estúdio, não estava em condições ideais para a gravação de um álbum. 

Nem mesmo se fossem trocadas todas as peles, isso seria minimizado, pois algumas "canoas" (pequenas peças que tem função de presilhas para fixar a pele no instrumento e feitas de latão, geralmente, mas muitas vezes por outros materiais como plástico, ferro etc), não estavam em boas condições. 

Dessa forma, com canoas em mau estado de conservação, a possibilidade de ruídos estranhos somarem-se ao som do instrumento na sua captura básica de gravação, seria grande. Por outro lado, o Ivan não tinha uma bateria importada de alto padrão nessa época e aí, nós resolvemos tentar um empréstimo, muito inusitado!

Sem pudor algum, fomos à residência do Dinola e de forma direta, sem rodeios, pedimos-lhe seu instrumento emprestado para a gravação do disco. Situação absolutamente bizarra, estávamos a pedir o instrumento de nosso ex-baterista, para que um convidado o usasse em seu lugar no disco, álbum esse em que ele obviamente deveria estar a participar conosco. Que situação mais estranha e da qual jamais poderíamos supor passar um dia, mas foi o que aconteceu!

Bem, nessa altura, o Dinola não disse-nos oficialmente, mas na prática, o seu esforço para tentar cumprir o vestibular e visar assim cursar odontologia, já estava descartado, porém ainda contrariado, ele não esboçava sinais de que pudesse voltar para a banda, infelizmente.

Todavia, solidário como sempre, ele aceitou na hora a inglória tarefa de emprestar a sua bateria para outro músico gravar o disco de sua própria banda. 

Então, mais que isso, o Zé Luiz prontificou-se a levá-la ao estúdio, sob uma demonstração de controle emocional, enorme, eu diria. Quando o dia do início desse trabalho chegou, lá estava ele a montar a sua bateria Tama, e aquele óbvio sentimento de que o certo seria sentar-se no banquinho e gravar todas as faixas, instaurou-se no estúdio. 

Bem, quando o primeiro trabalho para levantar o som da equalização básica da bateria, começou, ele já estava tão naturalmente inserido naquele espírito de gravação, que ajudou decisivamente o Ivan, ao dar-lhe todo o apoio para timbrar o instrumento, da melhor forma possível.

Então, quando achamos uma equalização primordial e o produtor Bianchi anunciou que começaríamos a gravar, propriamente dito, o Ivan, por sentir o clima subliminar sob constrangimento entre nós quatro, membros da velha A Chave do Sol, foi direto ao ponto e disse ao Zé Luiz, que ele é que deveria gravar o disco inteiro.

Claro que sim, mas naquela altura, com o hiato a perdurar por quase dois meses de sua saída, dentro de um estúdio com os ponteiros do relógio a voarem e a cada giro desses, a arrancar-nos um dinheiro do qual não dispúnhamos, nem deu para perder tempo ali com uma catarse interna da banda, para tentar demover o Zé Luiz de sua decisão radical feita meses antes, em suma, foi uma imensa pena, enfim! 

Diante desse impasse, na base da pressão emocional que instaurou-se com tal proposta proferida pelo próprio, Ivan, Dinola aceitou gravar algumas faixas e isso minimizou em muito a nossa frustração imensa ao constatar que o nosso baterista não tivesse uma participação, mesmo que pequena, em mais um álbum da banda. 

E mesmo com a falta de ensaios naqueles meses em que havia deixado a banda, claro que ele conhecia aquelas canções, como ninguém. Então, sob comoção, e confesso, ficamos todos muito emocionados com essa ação inesperada, o Dinola gravou duas faixas do disco: "Keep me Warm Tonight" e "Lírio de um Pantanal", com Ivan Busic a gravar as demais. 

E também ele fez algumas intervenções de percussão na faixa, "Change my Evil Ways". Isso esteve longe do ideal, pois o correto seria ele ter gravado tudo, e ter sido retratado normalmente nas fotos da capa e encarte do LP como componente da nossa banda, mas a vida pregou-nos essa peça.

Portanto, a gravação da bateria foi tranquila, tecnicamente a falar, pois do ponto de vista emocional, revelou-se bastante intensa para todos, devido aos fatores que eu relatei anteriormente. 

Apesar da pressa extrema com a qual estávamos a lidar, por conta de não termos meios para bancar adequadamente uma gravação mais folgada em termos de tempo, optamos pela metodologia tradicional do "um-por-vez", ao apostar na rapidez da captura individual, em detrimento de uma gravação de bases ao vivo. 

Portanto, encerrada a participação dos bateristas, Ivan Busic e José Luiz Dinola, o próximo na ordem tradicional, fui eu. 

Em meu caso, também muito seguro daquelas canções e sem percalços, gravei rápido e até dei-me um luxo extra, ao ver que dentro do que havíamos planejado em termos de tempo para a minha parte ser gravada, havia sobrado mais de duas horas do previsto. Na faixa "Profecia", em que um micro solo de baixo mostrava-se necessário, por que fazia parte do arranjo da música ao vivo, ao ser executado desde 1986, eu usei o recurso de um canal extra, para somar-se ao baixo regular da música. 

Essa foi a primeira vez que usei tal recurso em estúdio e somente mais uma vez no futuro, em 2003, eu gravaria uma faixa no álbum solo do guitarrista, Xando Zupo, ocasião em que cometi algo semelhante, mas desta feita por sugestão dele, e não por minha ideia.

As bases de guitarras foram muito tranquilas também. O Rubens não teve dificuldades para gravar as faixas que conhecia muito bem por tocá-las ao vivo, há bastante tempo e o Beto teve uma participação ao executar a guitarra base, em três faixas: "A Woman Like You", "Sweet Caroline" e "Lírio de um Pantanal". 

Em outras sessões posteriores, os solos também foram tranquilos, sem percalços técnicos. Rubens naturalmente era o nosso "lead guitar", mas infelizmente, por conta do clima ruim em que a banda mergulhou desde a virada do primeiro para o segundo semestre de 1987, estava mal-humorado quase todo o tempo, e a colocar-se inacessível para diálogos. 

Parecia estar ali apenas a cumprir uma função profissional, mas não houve da parte dele o envolvimento emocional. Aquilo foi horrível em todos os sentidos, mas entristecera-me ainda mais, pois nós dois éramos as células primordiais da banda, e como se não bastasse não termos mais o Zé Luiz entre nós, agora amargávamos esse distanciamento. 

Bem, eu não cogitava ainda, que essa contrariedade dele resultaria em um mal maior, a ocorrer em poucas semanas, e na época, achei que o mal-estar passaria e tudo normalizar-se-ia após o lançamento do disco e com uma possível volta da maratona de shows e contatos na mídia etc. 

Terminadas as gravações de bases e solos, chegara a vez dos vocais, backing vocals e dos convidados a atuarem no disco. Sobre os convidados, foram apenas dois, além do Ivan, obviamente: Fernando Costa e Andria Busic.

Foto promocional do grupo "Inox", com Fernando Costa ("The Crow"), colocado como o segundo, da esquerda para a direita

Fernando Costa era guitarrista do "Inox", mas a sua formação mesmo se revelava como tecladista, e de fato, a sua afinidade com o Rock Progressivo setentista, era total. Um exímio tecladista e geralmente envolvido com bandas sob orientação progressiva, Fernando surpreendera a todos quando surgiu como guitarrista de uma banda de Heavy-Metal, nos anos oitenta e de fato, a conduzir bem uma guitarra para uma banda dessas características e sozinho, sem uma segunda guitarra a apoiá-lo, portanto, ao assumir-se como "lead guitar" da banda. 

Na verdade, ele era um multi-instrumentista, e nos dias atuais (2016), tem apresentado-se como baixista em vários trabalhos, versátil e dono de um excepcional dom musical, sem dúvida. 

Nessa participação como convidado, Fernando, ou "The Crow" como gostava de ser apelidado, gravou algumas intervenções aos teclados, nada rebuscado, apenas a imprimir um leve colorido aos arranjos de faixas como: "Sun City", "Lírio de um Pantanal", "Change my Evil Ways" e "Keep me Warm Tonight".

Andria Busic, em foto bem mais atual, extraída do Site oficial do "Dr. Sin", a sua banda por muitos anos.

Já no caso de Andria Busic, a sua participação foi com alguns backing vocals, ao emprestar-nos a sua bela voz aguda. Ele cantou no refrão de "A Woman Like You", "Sweet Caroline" e "Sun City". 

Sobre a rotina no estúdio Guidon, lembro-me que trabalhamos com dois técnicos, que foram solícitos e interagiram bem conosco e com o Edy Bianchi: Edelson e Pepeu. 

A mixagem do disco também foi tranquila, com o Bianchi a auxiliar-nos bastante. Claro, tudo foi feito a toque de caixa, por que o dinheiro foi curtíssimo, ao impossibilitar totalmente um maior esmero, isto é, nenhuma novidade, na dura vida do artista independente e pobre.

Por volta do final de novembro, encerrou-se essa etapa de estúdio e daí em diante, nós tivemos que acelerar com o processo posterior do corte do vinil e a depender posteriormente da rapidez da fábrica, para prensar o quanto antes, pois queríamos e na verdade, precisávamos termos o disco em mãos, o quanto antes para iniciarmos a sua vendagem. 

Ao encerrar o relato sobre o estúdio, lamento muito que não haja uma única foto desse momento histórico da banda. Além da verba curta que tínhamos para tudo, mesmo uma despesa barata como providenciar filmes para um amigo registrar em máquina Polaroid, que fosse, foi inviabilizado. Só lamento, portanto, não ter tal material aqui e agora, em 2016, quando publico estas linhas...

A sessão de fotos oficiais da capa, encarte e material promocional de imprensa, foi conduzida pelo nosso velho amigo, Carlos Muniz Ventura. 

Ele começara a sua carreira como fotógrafo amador a capturar shows, bastidores, gravações de discos e até peças promocionais bem informais, anos antes, mas nesse novo instante, estava a trabalhar em um estúdio profissional e havia crescido nesse setor. 

A sessão ocorreu próxima do feriado de proclamação da República, em novembro de 1987, no estúdio Pugliesi, localizado no bairro do Bexiga, zona centro-sul de São Paulo.

Estamos a aparentarmos nessas fotos, coadunados com a estética do Hard-Rock oitentista, pelo figurino, e a sessão foi tranquila, apesar do clima pesado que pairava sobre a banda. 

Mas há uma particularidade nessa sessão e que suscitou uma série de especulações, e até piadas entre fãs e gente do métier. 

Uma montagem que eu encontrei na internet, com Beto Cruz e David Coverdale, lado a lado, e provavelmente montada por alguém que gostava de fazer tal comparação entre os dois
 
Um dia antes de irmos ao estúdio de fotografia citado, o Beto nos surpreendeu, pois houvera tingido o seu cabelo com o tom louro, mas bem alaranjado. Ficou chamativo, devo dizer, mas reforçou a maledicência popular que tachava-o de copiar acintosamente o vocalista britânico, David Coverdale. Tirante esse estigma, piadas de mau gosto eram ouvidas pelas beiradas, ao dar-lhe apelido : "Boneca Emília, do Sítio do Pica Pau Amarelo, o cantor popularesco, "Ovelha" etc. 

Nos meandros técnicos da produção do áudio, tivemos a pressa absoluta de efetuarmos logo o corte, para enviar o acetato matriz à fábrica, e assombrara-nos a perspectiva de que nosso disco nem pudesse ser fabricado ainda em 1987, por conta de um detalhe que permeava a rotina das gravadoras ao final de cada ano, em sua praxe, que já durava há décadas como rotina: as fábricas não davam conta para suprir pequenas produções independentes nessa época do ano, pois as gravadoras majors faziam encomendas mastodônticas de seus discos com seus artistas populares, para suprir o estoque das lojas, bem antes do natal. 

A loucura total com que as fábricas entravam já a partir de outubro, para prensar milhões, literalmente, de cópias de álbuns de artistas como Roberto Carlos, por exemplo, era incalculável e de fato, os discos representavam nessa época do ano, um dos principais produtos procurados, como presente de Natal, por milhões de pessoas.

Sobre o encarte, a estratégia de usarmos o idioma inglês seguira a opinião de pessoas que acreditavam que o nosso melhor caminho na carreira seria por intermédio do aeroporto. 

O pessoal da Rock Brigade, que tinha muitas conexões internacionais, ainda que dentro do mundo do Heavy-Metal, estava nesse bojo de conselheiros, nesse sentido. Tanto que o diagramador oficial da revista, um rapaz chamado, Paulo Caciji, foi quem diagramou o encarte que enviei-lhe em português, mas que recebeu tradução.

Crítica construtiva, achava e ainda acho que a tipologia das letras é pequena em demasia. Sei que foi uma necessidade geométrica da diagramação para poder ser absorvida sem cortes e de fato, tem muita informação ali, mas é uma dificuldade para ler, mesmo para quem não necessita de óculos. 

Sobre a capa, como eu já mencionei, fora uma oportunidade gerada pelo publicitário e marqueteiro da produtora, Studio V, chamado, Arnaldo Trindade, ainda quando estávamos envolvidos com tal escritório.

Recuperado o contato direto com o desenhista que fizera o esboço dessa ideia bruta, Beto encomendou o lay-out. Esse rapaz chamava-se, Marcos Monteiro, e o seu atelier instalado em uma galeria localizada na Rua Augusta, era conhecido como: "MM Diagonal". 

Quando vimos o esboço, ainda no casarão do Studio V, havíamos achado a ideia criativa, e que consistia de uma casca de ovo quebrada e em seu interior, clara e gema, espalhadas, com uma enigmática chave prateada e estilizada com formato antigo, junto, a insinuar que estaria dentro do tal ovo. 

Para ir além, um facho de luz translúcido em diagonal, mostra-se emitido da chave, supostamente direcionado ao ponto infinito. Também observava-se a gema do ovo a insinuar as vezes de um Sol, e a clara, para dar a entender tratar-se de uma galáxia formada em seu entorno, com tudo sob um fundo preto, a sugerir o espaço sideral. 

Ora, não ocorreu-nos na ocasião, que isso pudesse ser interpretado por outras pessoas como um desenho de mau gosto. Foi certamente estranho aos padrões das estéticas oitentistas em geral, disso não tínhamos dúvida, mas por isso mesmo, se provara como original, por fugir da obviedade em voga. 

Ao pensar em padronizações oitentistas típicas, se fosse um disco de uma banda punk, teria que mostrar-se agressivo e ultrajante. Se fosse Pós-Punk, tinha que ter elementos existencialistas, ser depressivo, blasé, niilista e bastante arrogante, ao representar um artista do mundo do Heavy-Metal, tinha que conter morbidez, escatologia e conotação anti-cristã, e finalmente, se seguisse o Hard-Rock oitentista, deveria conter muitas mulheres sensuais e seminuas, insinuações de bebedeiras & orgias perpetradas pelos componentes da banda, estigmatizados como ébrios cafajestes e machistas contumazes. 

Então, essa capa apresentada como um esboço inicial não teve nenhuma conexão com algum signo que eu citei acima e típico de estéticas oitentistas.

De minha parte, o achei a conter signos esotéricos interessantes sobre a formação do universo, a chave como elemento místico a dar respostas nesse sentido metafísico, tal como o estranho objeto monolítico que ilustra várias fotos do LP "Presence", do Led Zeppelin. O ovo como alegoria da mônada cósmica, enfim, a se configurar como algo muito simbólico e mais a parecer uma capa de banda de Rock Progressivo setentista, portanto, de meu inteiro agrado por conter tais elementos perdidos no tempo e no espaço (perigo...perigo...). 

Então, quando o Beto resgatou esse artista e a sua ideia, eu apreciei o fato de que esse disco teria uma capa plena de simbologias místicas, a evocar a cosmogênese, ao menos em tese. 

Sobre o lançamento oficial desse álbum, estávamos longe das situações anteriores em que a banda vivera dias sob franca expansão na carreira e extremamente unida entre os seus membros, quando planejava-se shows de lançamento com incrementos cênicos, uso & abuso de textos sofisticados criados pelo poeta, Julio Revoredo etc.

Mas houve uma perspectiva para a realização de um show para dezembro, que serviria para tal finalidade, apesar de ser uma data compartilhada com outra banda, e sobretudo, pelo fato da nossa banda estar a enfrentar dias difíceis com perdas irreparáveis e clima interno, muito pesado.

O show que teríamos, seria no Teatro Mambembe, no início de dezembro de 1987. Não tínhamos certeza se contaríamos com o disco em mãos nessa ocasião e isso seria vital para efetuarmos vendas, ali no calor da apresentação. 
 
Vender discos com urgência tornou-se uma necessidade muito enfática naquele momento em que tínhamos constituído enormes dívidas e a perspectiva sobre termos que esperar a movimentação de vendas em lojas, não constituíra-se na melhor perspectiva diante da liquidez que precisávamos.  
 
Iríamos compartilhar o show com uma banda amiga do Rio de Janeiro, o "Azul Limão". Essa banda, principalmente na figura de seu guitarrista, Marco, sempre ajudou-nos em nossas andanças pelo Rio de Janeiro e nesse momento, seria o momento para retribuirmos a gentileza prestada. 
 
Infelizmente, a nossa banda vivia um momento sob forte turbulência interna e o máximo que pudemos fazer por esse show, foi no empenho de sua divulgação. Nesse caso, mesmo sem a fundamental presença do José Luiz Dinola, eu pude preparar e despachar a mala postal do fã-clube, via correio. Foi a única ferramenta que dispúnhamos para tal divulgação, pois não tivemos verba alguma para investir em outras ações.
 
Então, na prática, apesar dessa falta de recursos, tivemos o trunfo de possuirmos um ótimo público, fruto de nosso trabalho acumulado em cinco anos de luta intensa. E ele compareceu em massa ao Teatro. De fato, no segundo semestre de 1987, quando entramos em uma fase sob forte turbulência, não havíamos apresentado-nos mais ao vivo em São Paulo (e nem em outra cidade), inclusive a gerar boatos, os mais diversos.
 
Já havia vazado a informação de que o Dinola deixara a banda, especulações sobre o término das atividades, corriam para todos os lados. Mas por outro lado, a aparição que fizéramos com o Ivan Busic na TV, em setembro, deu alento para os fãs.
 
Boatos sobre a entrada oficial do Busic em nossa banda, também correu pelo métier. Sendo assim, em meio a tantas especulações, e pelo fato de estarmos a anunciar enfim um show e o lançamento de um novo álbum, o público respondeu muito bem na bilheteria do Teatro Mambembe. 
 
Para reforçar a divulgação desse show, fizemos alguns programas em emissoras de rádio. Eu estive sozinho no programa, "Comando Metal", que era apresentado pelo Walcyr Chalas, na 89 FM, no dia 6 de dezembro de 1987, para falar sobre o lançamento do disco e do show.
Foi no dia 8 de dezembro de 1987, que A Chave do Sol fez efetivamente o seu último show e desfigurada em sua formação, pois não tínhamos mais a presença de José Luiz Dinola a comandar as baquetas da banda. Com Ivan Busic mais uma vez a atuar gentilmente como convidado, tivemos na verdade mais um convidado de última hora, na figura do tecladista super técnico e eclético, Fábio Ribeiro.
                     Fábio Ribeiro em foto bem mais atual
 
Eu pouco o conhecia antes desse dia, pois sabia apenas que era um jovem músico a despontar no cenário e a atuar como convidado de bandas orientadas pelas escolas do Hard-Rock & Heavy-Metal e que mantinha um trabalho com uma banda própria e autoral, com forte influência de Rock Progressivo setentista, o que chegou a ser inacreditável para a década de oitenta, com toda aquela ambientação hostil para tal gênero. 
 
Quem normalmente falava-me bem sobre o Fábio Ribeiro, foi o nosso roadie, Eduardo Russomano, que conhecia-o pessoalmente, mas eu só fui apresentado a ele, de fato, nesse dia no Teatro Mambembe, onde ele atuou de uma forma discreta, mas bastante competente, ao tocar as partes dos teclados que o amigo, Fernando Costa, gravara no disco, "The Key". 
 
No show, a sua atuação foi discreta, apenas a cumprir tais arranjos de apoio, mas deu para ver que era um tecladista a moda antiga, piloto de muitos instrumentos, com bom gosto para criar e ser um solista brilhante. Na minha concepção, se A Chave do Sol prosseguisse e a estabelecer uma reformulação na sua formação com o acréscimo de um quinto membro, teria que ser um bom tecladista a moda antiga, na figura de um músico de formação setentista forte e para somar assim, como harmonizador e solista ao estilo dos grandes mestres setentistas, como Rick Wakeman, Keith Emerson, Jon Lord, Tony Banks, Ken Hensley, Vincent Crane e tantos outros que primaram pela extrema qualidade na pilotagem de multi-teclados nos shows de Rock. 
 
Por uma via torta e alheia a essa minha vontade pessoal, isso aconteceria em termos, em uma questão de dias depois desse show do Teatro Mambembe, mas não é hora para falar sobre isso e aliás, não será falado nesse capítulo d'A Chave do Sol, e sim em uma nova divisão na autobiografia que é necessária por considerar ser um novo trabalho, apesar de ter sido uma dissidência d'A Chave do Sol.
           Foto promocional do "Azul Limão", nos anos oitenta

Bem, o show do "Azul Limão" aconteceu antes do nosso e um fato desagradável ocorreu, não por nossa culpa, absolutamente, mas que envergonhou-nos perante os nossos amigos. Eles ainda estavam na metade de seu show, quando bairristas na plateia, começaram a hostilizá-los por conta deles serem do Rio, e isso reforçara-se a cada vez que o seu vocalista falava com o público entre as músicas e o seu forte sotaque carioca, mostrava-se proeminente.
Isso por si só, já fora constrangedor e deselegante ao extremo, mas tudo piorou quando alguém insuflou a massa para iniciar um coro para pedir pela presença d'A Chave do Sol no palco. 
 
A cada música que eles terminavam, isso foi a avolumar-se e criou uma atmosfera hostil, como se a banda fosse ruim, e não era, de forma alguma, e pelo contrário, tratava-se de uma boa banda e neste caso, nós, a observarmos da coxia, ficamos muito chateados com esse comportamento do público que hostilizou os nossos colegas, gratuitamente.
 
Além de sermos amigos, por duas vezes o Azul Limão houvera ajudado-nos bastante em shows que fizemos no Rio de Janeiro, em 1986 e 1987. Sendo assim, tratou-se da nossa primeira oportunidade para recebê-los bem em São Paulo e infelizmente não pudemos evitar que essa manifestação perpetrada por algum sujeito idiota que insuflou a massa, acontecesse.
Claro que não tivemos culpa alguma em um episódio que fugira ao nosso controle, mas de forma indireta chateamo-nos, pois no camarim o Marco estava muito contrariado com a recepção da plateia. Bem, isentos de culpa direta pelo triste episódio, mas ao tentarmos fazer alguma coisa para atenuar, o Beto e eu falamos alguma coisa no microfone, não a atacar a reação da plateia diretamente, mas ao enaltecermos o Azul Limão como uma banda ativa do Rock brasileiro daquela cena oitentista e a deixarmos claro que os seus componentes eram nossos amigos pessoais. Se a carapuça serviu para os idiotas que os hostilizaram, gratuitamente, ótimo.
 
O nosso show foi muito energético, apesar do clima péssimo que pairava em nossos bastidores. Aos olhos e ouvidos do público, A Chave do Sol estava em plena forma, apesar da ausência do José Luiz Dinola. Ivan Busic, apesar de nunca ter deixado nenhuma dúvida de que jamais entraria para a banda oficialmente, tornou-se para o imaginário dos nossos fãs, o substituto natural, portanto, o mais adequado para suprir a ausência do Dinola.
 
E a presença do Fábio Ribeiro, totalmente inesperada para o público, foi também saudada com simpatia a posteriori e de fato, foi um apoio de categoria para abrilhantar o nosso trabalho. Porém, nada disso foi o suficiente para driblar a nossa crise interna.
Na percepção dos fãs, fora um alento, mas na prática, esse foi o último show da carreira d'A Chave do Sol, pelo menos em sua história oficial e sob os parâmetros de seu próprio classicismo construído sob sangue, suor e lágrimas!
 
Aconteceu no dia 8 de dezembro de 1987, com quinhentas e vinte pessoas presentes nas dependências do Teatro Mambembe.
 
Tivemos perspectivas para shows e aparições na TV para janeiro de 1988, e precisávamos agarrar desesperadamente tais oportunidades sob um esforço hercúleo de se manter a banda viva e a vender discos, como a única forma viável para movimentar dinheiro, portanto, vital naquele momento periclitante em que vivíamos, em meio a uma crise emocional interna, com direito a perda de membro histórico da formação e uma dívida cavalar para saldar sob um curto/médio prazo. 
 
Alguns dias depois desse show que fora vitorioso apesar das dificuldades que enfrentávamos, teríamos um outro evento de divulgação do disco em si e que merece ser detalhado por conta dos seus muitos desdobramentos. E revelar-se-ia como o último ato perpetrado pela A Chave do Sol, viva e com êxito absoluto alcançado!
Quando ainda estávamos a gravar o LP "The Key", eu já tinha tido a ideia de promover uma tarde de autógrafos para incrementar a divulgação e vendagem do disco. Não tratava-se de nenhuma ideia inovadora, é claro. 
 
Isso era uma prática corriqueira na Europa e Estados Unidos, mas aqui no Brasil, poucos artistas usavam tal expediente como um esforço de divulgação. Então, como a Baratos Afins não iria produzir o nosso novo álbum, e o espaço físico daquela loja teria sido o cenário ideal para tal tipo de evento promocional, surgiu a ideia da loja de Walcyr Chalas, chamada: "Woodstock", para ser o local a suprir tal demanda.
Tal sugestão viera da parte do Antonio D. Pirani, o diretor presidente da Revista "Rock Brigade", que emprestara o seu selo para lançarmos o álbum e ele era muito amigo de Walcyr, portanto, intermediaria esse contato da banda, com o citado lojista. 
 
No entanto, a nossa proposta não despertou grande interesse da parte dele, em princípio. Pelo contrário, ele mostrou-se bastante cético sobre o sucesso eventual de uma ação de marketing dessa natureza. Walcyr chegou a brincar conosco, ao afirmar que nós estávamos arriscados a sofrermos um constrangimento, mediante um eventual fracasso de presença de público, e que de certa forma, isso reverteria em anti-propaganda para o disco.

          Fachada da loja Woodstock, ao final dos anos oitenta 

Bem, a despeito de sua falta de entusiasmo pela promoção, eis que aceitou realizá-la nas dependências de seu estabelecimento. O nosso desafio então seria divulgar o evento, pois mais do que evitar o constrangimento de um eventual baixo comparecimento e gerar assim um anticlímax para o próprio LP e para a imagem da banda, nós precisávamos muito dessa exposição midiática e que isso revertesse em vendas concretas do disco.

Disparar a mala postal do fã-clube foi a providência mais natural, mas um dado a ser considerado nessa equação, fora o de que o nosso cadastro de associados não era dirigido apenas à cidade de São Paulo, portanto, o comparecimento físico das pessoas, estava condicionado e limitado aos fãs paulistanos e no máximo aos moradores de cidades vizinhas da região da Grande São Paulo. 
 
Dessa forma, algo a mais precisava ser feito para incrementar a divulgação do evento e aí, recorremos ao apoio de um jornalista experiente e que era declaradamente um fã e incentivador de nosso trabalho, isto é, o grande: Antonio Carlos "Tony" Monteiro.
Claro que ele aceitou ajudar-nos e mesmo ao deixar claro que por questões éticas não poderia assinar abertamente a assessoria de imprensa que faria específica para o evento, deu-nos uma grande apoio nesse sentido, e de fato, nós conseguimos um resultado extra, que ajudou-nos a transformar o evento, em um grande sucesso.

Realizamos um programa de rádio, também, para reforçar essa divulgação. Então, no dia 10 de dezembro, eu e Rubens fomos ao "Reynação", programa do jornalista, Leopoldo Rey, na 97 FM de Santo André-SP.
Bem, com matérias de jornais a comentarem sobre a tarde de autógrafos, acrescida da mala postal disparada aos fãs registrados, nós conseguimos um público significativo. 
 
Todavia, logo no início da ação em si, não foi essa a primeira impressão. Quando chegamos à porta da loja, o cenário inicial foi desanimador. 
 
Antes de avançar sobre a narrativa do dia, eu devo esclarecer que a loja "Woodstock" não ficava instalada na Galeria do Rock, tampouco em galerias no entorno, onde também haviam lojas de discos de Rock e produtos análogos. Ela de fato começou as suas atividades em uma dessas galerias próximas à grande Galeria do Rock, mas já há algum tempo, saíra um pouco dessa rota e foi estabelecer-se no outro lado do Viaduto do Chá, especificamente na Rua Fernando Falcão, ou seja, a se tratar de uma das entradas da Estação Anhangabaú, do Metrô.
Fotos da da internet a mostrar a aglomeração "headbanger", e típica dos sábados, na porta da loja Woodstock nos anos oitenta, e que invadia o mini boulevard que dá acesso a uma das saídas da estação Anhangabaú, do metrô

Com essa mudança de endereço e a aproveitar-se da rampa de acesso à estação do Metrô, com uma arquitetura que lembrava a de uma praça, tal micro boulevard favorecia a aglomeração de pessoas em frente à loja, que então, muito beneficiou-se desse arranjo urbanístico e assim tornou-se tradição que a loja promovesse um ponto de encontro aos sábados, ao reunir ali na sua porta e na rampa do metrô, um contingente que chegou em momentos de pico de presença, na marca dos centenas de jovens reunidos, que ali permaneciam por horas e mesmo que em sua maioria não fizessem grandes compras na loja, invariavelmente o estabeleciam vez por outra e a sua simples presença como turba ali presente, chamava a atenção para um outro tipo de público que consumia discos e por isso, colaborava subliminarmente com a loja. 
 
Portanto, que haveria uma aglomeração enorme, não tivemos dúvida, mas aquela turma que ali ficava por horas a fio era radical e nada tinha a ver com nossa banda. Eram os tais "headbangers", adeptos da estética do Heavy-Metal e com subdivisões em tribos específicas e focadas em seus muitos derivados, no bojo. 
 
Dessa forma, quando chegamos para o início de nosso evento, o Walcyr resolveu que o ideal seria que nos posicionássemos na parte externa da loja, para chamar mais a atenção e assim, uma mesa foi colocada para nós ali. Estávamos eu (Luiz), Rubens e Beto (Ivan Busic participou, também, mas chegou mais tarde), a postos, com uma caneta esferográfica para cada um de nós em mãos, durante cerca de uma hora e meia, pelo menos, ninguém apareceu para comprar um disco sequer e solicitar-nos dedicatórias no álbum.
Walcyr Chalas, em foto bem mais atual na sua loja, que permanece no mesmo endereço, até os dias atuais (2016)

Walcyr não tripudiou sobre a nossa incômoda situação, mas ficou a relembrar que avisara-nos que o constrangimento seria grande etc.
 
Para piorar a situação, os "metaleiros" que começaram a aglomerarem-se nas cercanias da loja, ironizavam-nos, a emitirem gracejos, rirem e debochar de nós, primeiro por não sermos adeptos de seu mundo metálico habitual e segundo, por que a nossa posição ali ficara sob um profundo sentimento de constrangimento, por estarmos sentados ali e quietos, sem nenhuma abordagem sequer, com semblantes de decepção estampados em nossas faces de uma maneira indisfarçável e a segurarmos canetas esferográficas novas e inteiramente virgens em nossas respectivas mãos. 
 
No entanto, tudo mudou após o meio-dia, quando o fluxo com pessoas interessadas em nosso lançamento, começou a aparecer. A verdade, é que às dez horas da manhã de um sábado, somente aquele contingente de usuários de camisetas pretas batiam ponto ali na porta da loja, mas o movimento com clientes, propriamente dito, só começava a esquentar da hora do almoço em diante.
Então, quando o relógio mostrou 14:30 horas mais ou menos, a fila de pessoas para solicitar-nos dedicatórias em discos, esteve enorme. O próprio Walcyr, já havia mudado o discurso e não escondia de ninguém que a ação revelara-se um sucesso e que doravante a sua loja faria outras tardes de autógrafos com outros artistas e de fato, foi o que ocorreu, mesmo, com muitas bandas a empreenderem esse tipo de ação de divulgação, ali na porta da Woodstock, nos anos seguintes. 
 
Ao final da tarde, quando demos por encerrado o evento, o Walcyr comunicou-nos que estava estupefato, pois vendera trezentas e cinquenta cópias do LP "The Key", ou seja, um número muito além do que imaginou e ele era um experiente lojista que detinha em mente, portanto, a média da movimentação diária de seu negócio, naturalmente.
Outro fator que ele comemorou foi por ter atraído pelo menos 90% desse contingente que adquiriu cópias de nossos discos, como pessoas de fora de sua clientela padrão. De fato, a loja tinha boas opções de Rock clássico em suas prateleiras, mas o seu carro chefe era o Heavy-Metal oitentista em voga, portanto, ao proporcionarmos-lhe a chance para atrair pessoas que não necessariamente conheciam a sua loja, isso fora um acréscimo para o seu estabelecimento e ao ir além, muitas pessoas sucumbiram ao impulso consumista e assim compraram outros discos além do nosso, para aproveitar a ocasião, bem naquele efeito gerado pela tentação oriunda das promoções típicas de gôndola de supermercado. No dia seguinte, nós repercutimos esse sucesso estrondoso da tarde de autógrafos, no programa: "Comando Metal", da 89 FM, e conduzido pelo próprio, Walcyr.
Bem, acredito que esse tenha sido o último suspiro de vida e alegria proporcionado pela A Chave do Sol. Lastimavelmente, alguns dias depois, sob uma reunião realizada na residência do Rubens, onde tudo começara em 1982, uma bomba atômica seria deflagrada e nos estertores de 1987, a banda chegaria ao seu final, muito melancólico.
 
Tal teor dessa conversa desnorteou-me completamente, devo dizer, e como consequência, uma banda teve que ser criada às pressas, como uma dissidência forçada e tais atos melodramáticos serão relatados a seguir. Não só neste capítulo sobre A Chave do Sol, mas em toda a autobiografia, considero que o que descreverei a seguir, trata-se de uma das mais tristes páginas da minha história pessoal na música, infelizmente.
A nossa situação ficara dramática, por tudo o que já expus nos capítulos imediatamente anteriores, pois tínhamos uma urgência absurda em recolocar a banda nos trilhos. Primeiro, para salvá-la da turbulência incômoda em que encontrava-se nesse ano de 1987, como um todo, mas com agravantes a partir do segundo semestre. Em segundo lugar, por que o clima interno entre os membros sobreviventes, esteve péssimo.
E em terceiro lugar, por que a dívida que contraíramos para produzir o novo disco foi muito alta e a única forma para saná-la, seria no sentido de vendemos muitos discos e para tal, a banda precisava voltar rápido à sua rotina de shows e realizar muita ação na mídia, sobretudo.
Estava acertado que não poderíamos contar mais com Ivan Busic, nesse esforço pós-lançamento do disco. Ele deixara claro isso desde o início, quando aceitou gravar o nosso disco, pois este estava envolvido com a criação de uma nova banda chamada: "Slogan", com o seu irmão, Andria, e outros componentes.
 
Então, para começar a organizar esse cenário caótico, seria necessário que os três membros remanescentes, estivessem 100 % imbuídos da vontade de deixarem para trás as desavenças pessoais e voltarem a estabelecer a união fraternal, internamente a falar.
 
Contudo, Rubens e Beto não se entendiam mais e as ações que o Beto tentou empreender para proporcionar um novo alento à banda, que pareceu estar a deriva, foi pessimamente interpretado pelo Rubens. E isso transformou-se em mágoa, rancor e ressentimento, com o qual não conseguiu mais desvencilhar-se doravante, por muito tempo.
Ao ver o impasse hoje em dia, tenho certeza de que mais do que aborrecer-se com as iniciativas do Beto, Rubens estava magoado comigo, ao interpretar o meu apoio ao Beto como uma demonstração de traição de minha parte, como se eu desejasse que ele fosse eliminado da banda, para a entrada de um outro guitarrista.
Não, absolutamente, não foi isso o que eu desejei. Aliás, eu nem interpretara os fatos sob tal viés, jamais, tanto que choquei-me quando ouvi essa narrativa da sua parte. Eu nunca achei que o Beto estivesse a articular um motim para derrubar o Rubens de sua própria banda e sabia que tais tentativas de talvez cogitar um quinto membro, tiveram uma outra intenção.
 
E mesmo que houvesse essa intenção por parte do Beto, eu jamais apoiaria isso, pois seria um absurdo pensar nessa hipótese. Mas por outro lado, o Rubens ao sentir-se magoado pôs-se a distanciar-se de nós, o que magoou-me também, pois estávamos a viver dias terríveis com as incertezas que rodeavam a nossa banda, e nesse momento agudo, perdemos o nosso companheiro querido, José Luiz Dinola, que fora um remador exemplar do nosso barco. O mar estava super revolto como jamais esteve e nesse cenário, com um remador valoroso a menos, o mínimo que eu esperaria, seria que os três remanescentes se esforçassem mediante um ímpeto a mais e remassem com ainda mais força, para suprirmos juntos a ausência do Dinola. Eu poderia até entender que ele, Rubens, estivesse aborrecido, mas a sua atitude foi diametralmente oposta, ao afastar-se de nós.
Portanto, o frágil bote d'A Chave do Sol lutou contra o mar revolto, em meio a uma terrível tormenta e só contara agora com dois remadores desesperados em não deixá-lo naufragar. 
 
Tivemos muita divulgação para cumprir e haviam shows marcados para janeiro de 1988, portanto, tudo o que precisamos seria aproveitarmos tais chances para diminuir o efeito da tormenta, para colocar a banda em evidência novamente e dessa forma, vender muitos discos, por que as dívidas ficaram enormes. Mas, o pior aconteceu!
 
Nessa reunião realizada na residência do Rubens, um pouco antes do natal de 1987, tais insatisfações de lado a lado foram colocadas em pauta, mas infelizmente o clima acalorou-se e diante desse impasse com mal-entendidos e movido pela raiva momentânea de se sentir preterido em sua própria banda, o Rubens declarou não querer mais prosseguir conosco, mas ao mesmo tempo proibiu-nos de continuarmos a gerir a banda adiante, no uso do seu nome. 
 
De fato, a concepção do nome da banda, fora dele, e o registro oficial do INPI estava em seu nome. Pelo lado emocional, claro que ele era o criador do nome, mas pelo lado oficial, o registro em seu nome decorrera do simples fato de que ao não haver a figura burocrática da pessoa jurídica constituída, somente uma pessoa física poderia assumir a propriedade da patente e quando decidimos por ele, Rubens, assinar isso, foi sob comum acordo entre eu e Zé Luiz, cofundadores da banda, em uma noite de 1982, dentro de um escritório de um despachante de marcas e patentes que contratáramos e ajudamos a pagar.
 
Portanto, moralmente, éramos também co-proprietários da marca. Tal situação desnorteou-nos completamente. Particularmente eu fiquei arrasado, pois toda essa indisposição estava não só a acabar com a nossa banda, mas a minar a minha amizade fraternal com o Rubens e de fato, depois dessa noite lastimável, ficamos por muitos anos, sem nos falarmos, magoados um com o outro. Eu demorei anos para entender o que realmente acontecera ali e sobretudo, por que havíamos chegado nesse ponto de nos desentendermos, dessa forma.
Se fosse para romper, o ideal, teria sido encerrarmos as atividades da banda de comum acordo, de uma forma amigável e com cada um a partir para outros projetos, sem brigas, mágoas e ressentimentos.
 
Todavia, eu e Beto não poderíamos nem pensar em encerrar por um motivo muito simples: se a banda acabasse ali, as vendas despencariam e o novo LP que mal saíra do forno, encalharia de uma forma absurda, a inviabilizar completamente o pagamento das dívidas contraídas, e que mostravam-se muito pesadas. 
 
Nesse contexto, tudo o que eu desejei foi que o Rubens prosseguisse conosco e interiormente, eu nutria esperança em demover o Dinola de sua decisão, pois nesta altura dos acontecimentos, eu já sabia que ele desistira do seu plano de estudar odontologia. O que eu desejei mesmo, foi reagrupar a banda, sacudir a poeira e dar a volta por cima, para retomar a trajetória de sucesso que construíramos, desde 1982.
Portanto, não tivemos uma outra alternativa a não ser criar uma banda dissidente e que mesmo sendo outra banda em essência, alimentasse-se subliminarmente do legado d'A Chave do Sol, para não confundir a cabeça dos fãs, e dessa forma, para continuar a trabalhar ao máximo, no sentido de estarmos de novo sob evidência na mídia. Além de vender discos desesperadamente, para levantar fundos e pagar as dívidas. 
 
Então, foi assim que o Natal e o Reveillon de 1987, apresentou-se para A Chave do Sol: com um sabor amargo de derrota na boca, amizades fraternais abaladas por ressentimentos mútuos, por conta de mal-entendidos, e o pior de tudo, a designar um racha irreversível. 
 
Ainda falarei sobre de algumas ações de mídia que pertenciam ao espectro d'A Chave do Sol, e depois, concluirei com o capítulo final a conter os agradecimentos e uma análise geral da história da banda, mas a rigor, foi assim que a nossa querida banda desintegrou-se, infelizmente. 
 
Para muitas pessoas, a banda emergencial formada em janeiro de 1988, sob um novo nome, "A Chave", foi a continuação pura e simples da velha, A Chave do Sol, mas eu não considero assim. A minha visão da história é outra, e nesses termos, considero tal banda como um outro trabalho, embora nos seus momentos iniciais, ela justificara a sua existência para cumprir compromissos inadiáveis, que seriam na verdade da agenda d'A Chave do Sol e que por sua vez, com o seu final abrupto, tornou-se impossível de serem cumpridos.
 
Nesses termos, nova banda criada ocupou tal lacuna, emergencialmente. Dessa maneira, abri um novo capítulo para contar a história dessa outra banda, separadamente, para tratá-la como a um outro trabalho onde fiz parte.
 
Estou a escrever este trecho em julho de 2015, portanto, com quase vinte e oito anos de distanciamento histórico. Nove dias atrás (10 de julho de 2015), eu fui ao show de lançamento da nova banda do Rubens (Gióia/Sucata & MusicMan), para prestigiá-lo e aos seus novos companheiros.
Como fiquei contente em vê-lo a buscar um recomeço e o clima de amizade entre nós, restabelecido amplamente. Nessa casa noturna eu vi a sua mãe, a irmã mais velha, seu filho e muitos sobrinhos seus que eu nem conhecia e senti-me imensamente feliz por estar junto a eles, como se estivéssemos naquela noite de 25 de setembro de 1982, a vivenciarmos o primeiro show d'A Chave do Sol, no Café Teatro Deixa Falar.
 
Eu lastimo muito que o desânimo que acometeu-nos em 1987, tenha minado-nos completamente, a aflorar uma série de mal-entendidos que tornou a convivência e sobretudo a continuidade do trabalho, impossível.
Esse começo do fim iniciou-se no limiar de 1987, ou até um pouco antes, ao final de 1986, quando desapontamo-nos com a inoperância do escritório denominado, Studio V.
 
Concomitante à constatação de que não fariam nada conosco, conforme o prometido em termos de expansão, não só amargamos tal frustração, mas também perdemos tempo precioso em não capitalizar o "momentum" excepcional em que vivíamos, em 1986.
 
Quando nos demos conta, já havíamos perdido boa parte do embalo e pior que isso, o nosso pilar emocional já se mostrara outro, bem debilitado. Claro que com tal fator psicológico abalado, afloraram-se insatisfações pessoais e isso também contribuiu para minar a banda internamente.
 
Com o embalo a ser perdido, vislumbramos saídas, mas como já relatei, ainda amargamos algumas negativas e com requintes de crueldade por parte de gravadoras. Isso foi a gota d'água para o Zé Luiz, que vivia pressão pessoal por conta de suas indefinições sobre o seu futuro pessoal.
A sua saída da banda, ao alegar estar a abandonar a música, foi um duro golpe para nós. Beto por sua vez sempre foi pragmático. A sua reação não foi a de choramingar pelas perdas, pelos cantos, mas ao sair à rua e tentar achar soluções práticas. 
 
Entretanto, tais ações de sua parte minaram o fator emocional do Rubens, que ficou muitíssimo contrariado, por sentir-se preterido dentro de sua própria banda. A ideia de se lançar um disco, seria a salvação, mas ao mesmo tempo, foi uma loucura completa, pelo fator da falta de apoio externo. Visto pelo clima pesado no interno da banda, também foi algo temeroso. Se os três remanescentes estivessem unidos e imbuídos da vontade de salvar a banda a todo custo, talvez fosse amortizada essa carga, mas com o Rubens ressentido e afastado de nós, a banda esteve inteiramente sem forças. 
Tínhamos os fãs e o respeito da mídia pelo trabalho construído e nesses termos, nós apostamos todas as fichas em uma rodada kamikaze de poker, porém, por termos cartas fracas em mãos... será que o nosso poder para blefar, assustaria os adversários?

Mas no momento decisivo, com o Rubens a interpretar tudo da pior forma possível, o racha definitivo foi inevitável. Apesar desse desfecho triste, hoje em dia, eu considero a carreira d'A Chave do Sol, como vitoriosa ao extremo. Conseguimos muitas coisas e eu orgulho-me muito em ter feito parte dessa história.
Nunca chegamos ao mainstream, mas o legado artístico que deixamos foi imenso. Influenciamos bandas que seguiram-se, muitos músicos de forma individual e deixamos saudade entre os fãs. 
 
O simples fato da banda ser muito citada até hoje (2016), em fóruns de discussão sobre o Rock brasileiro e constantemente ser objeto de postagens e comentários acalorados e amplamente positivos em diversas redes sociais da Internet, prova o que estou a afirmar e não acho que estou a exagerar, nem no uso de bravatas tolas e egóicas, ou mesmo a ter rompantes de soberba. Mas falo sobre fatos e orgulho-me desse legado deixado. Assim acabou oficialmente a trajetória d'A Chave do Sol...

Os próximos parágrafos falam sobre a repercussão do LP "The Key", inclusive a avançar sobre o ano de 1988, quando A Chave do Sol simplesmente não existia mais. Depois, farei a última análise a seguir e também comentarei sobre as tentativas de volta que a banda teve ao longo dos anos posteriores.
Antes de avançar sobre a análise final, devo dizer que a nossa situação foi tão dramática, que nem deu tempo para entrarmos em depressão ante o abrupto.
 
Alheio ao teórico fim da banda, decretado naquela reunião fatídica de 17 de dezembro de 1987, já no dia 21, eu estive no Rio de Janeiro a efetuar vendas do LP The Key em diversas lojas pela cidade e também por Niterói. Atuei como um trabalhador braçal, literalmente, ao carregar caixas com discos por diversos bairros, a usar ônibus e metrô.
  
Por conta do apoio do presidente do fã-clube d'A Chave do Sol no Rio, Ricardo Aszmann, eu concedi entrevista na emissora, Transamérica FM do Rio, em 21 de dezembro e com a cabeça a ferver, mas sem poder revelar, em hipótese alguma, que a banda acabara a sua atividade.
 
Falei nessa entrevista sobre o disco e as perspectivas de novos shows, que realmente estavam marcados para janeiro de 1988, como se estivesse tudo às mil maravilhas. E foi horrível, é claro, pela angústia que eu senti internamente. E também incólume a esse imbróglio, matérias e resenhas estavam a serem publicadas e outras continuariam a seguir, na virada para 1988, a falar sobre o novo disco, além das entrevistas que já havíamos concedido anteriormente e que só seriam publicadas a posteriori.
 
Reproduzo neste final de capítulo tal repercussão do disco, mesmo ao considerar que tal movimentação avançou sobre o período de 1988, quando a banda simplesmente não existia mais.
Ao tratar-se da "Folha de São Paulo", onde um certo editor desse periódico disse certa vez que a melhor banda de Rock oriunda da cidade de Liverpool, Inglaterra, fora o "Echo and the Bunnymen", ter uma resenha discreta e sem depreciação, até que foi positivo.
Essa nota publicada nesse jornal popularesco ("Notícias Populares"), que era conhecido em São Paulo, como "espreme sangue", tamanha a sua apelação para o sensacionalismo do "mundo cão", foi forjada na base da pressão. Fruto raro de um contato que fora proporcionado-nos pelo inoperante, Studio V, em 1986, eu não tive preconceito de procurar pessoalmente a redação e abordar a jornalista, Sonia Abrão. Em uma época onde a triagem nas redações de jornais mainstream ainda mostrava-se frouxa, eu fui diretamente à sua mesa e a abordei. Ela tratou-me com simpatia, mas claramente não lembrara-se de minha pessoa por conta de termos participado de seu programa de rádio em 1986, contudo, publicou a nota, ainda que a redigir uma mera reprodução do press-release oficial do LP.
Rick Aszmann, o nosso colaborador no Rio de Janeiro, colocou-nos em contato com um colunista da Revista "Amiga", uma publicação que cobria tradicionalmente o mundo da TV, sobretudo a cobertura das novelas. Mas esse rapaz tinha uma coluna de Rock e Heavy-Metal e portanto, eu não perdi a oportunidade e entreguei-lhe o nosso material em sua residência, no bairro da Lagôa, na zona sul do Rio. Uma resenha curta, mas bem positiva, saiu então.
Muito boa a matéria do jornalista do jornal, "Popular da Tarde", de São Paulo, Arnaldo Branco Filho. Só o enaltecimento que fez no primeiro parágrafo, foi notável e explica muito de nossa trajetória ter tido tantos percalços para penetrar no mundo mainstream. Dá para notar que na maior parte do tempo, ele usou o nosso press-release como base, mas soube dar a sua interpretação e a acrescentar adendos pontuais.
Foi positivo ter apoio em jornais de bairro, um tipo de imprensa de pequeno porte, mas muito eficaz ao meu ver, pois mesmo por ter pequena tiragem, geralmente contava com um público leitor, bem fiel. Neste caso da "Gazeta do Tatuapé", bairro da zona leste de São Paulo, onde eu morava na ocasião, o destaque foi bem simpático, apesar do texto ter sido a mera cópia do nosso press-release. Mas melhor isso, com um texto bem explicado sobre o disco, a jornalista incauto que escreve asneiras, ou "inimigos" comprometidos com estéticas antagônicas e que vão falar mal, sem nem ouvir o trabalho, por força do hábito.
Um outro exemplo de jornal de bairro, o "Jornal da Paulista" circulava por bairros que são cortados pela Avenida Paulista, como o Paraíso, Cerqueira César e Consolação. Foi uma nota curta e baseada no press-release, mas claro que ajudou.
Eis mais um exemplo de simplicidade franciscana, mas útil no cômputo geral, com a "Folha Metropolitana".
Do mesmo grupo editorial da Folha Metropolitana, o "Metro News" foi outro jornal distribuído gratuitamente nas estações do Metrô de São Paulo, bem cedo aos seus usuários. E neste caso, o diário apenas replicou a nota do seu coirmão.
Ah, se não tivéssemos Leopoldo Rey como amigo, jamais teríamos resenhas na Revista "Bizz", esta naturalmente comprometida com o enaltecimento e manutenção do status quo de estética vigente das correntes derivadas do Pós-Punk. Tirante a informação errônea de que os nossos discos anteriores haviam sido "totalmente instrumentais", a resenha foi bem simpática e ser comparado ao Deep Purple, uma grande honra, embora eu desconfie que ele referiu-se ao Deep Purple-pós1984, portanto kilometros distante de seus melhores dias...
Na revista "Metal", houve mais uma resenha ótima do Tony Monteiro, detalhista e sempre isento, pois mesmo por ser nosso amigo, ele nunca deixou de apontar aspectos negativos. Ainda bem, ele enxergou muito mais méritos do que deméritos no disco. Na mesma edição, em outra página, uma nota a citar-nos, sob uma análise sobre o panorama de 1987. Engraçada a afirmação quase jocosa da legenda da foto, ao conferir-nos a alcunha de "Hard-oxigenado", em uma clara alusão ao cabelo tingido do Beto.
Resenha na mesma edição n° 43, da revista Metal, sobre o nosso show no teatro Mambembe, no início de dezembro de 1987. O Tony Monteiro citou o desconforto do Azul Limão, que eu narrei em parágrafo anterior e na sua opinião seu set fora longo demais, aspecto que eu não observei na hora, mas nesse caso fez um certo sentido a animosidade do público, apesar da detestável demonstração de bairrismo que eu lembro-me que ocorreu, também.
Covardia total, mas foi Eduardo Russomano quem assinou essa resenha do LP The Key, na revista "Rock Brigade"... mas a despeito dele ser nosso amigo, roadie e ex-funcionário do fã-clube, o Edu escreveu bem e acho que não transpareceu ao leitor comum, que talvez não fosse muito correto ele ter escrito, por questões éticas comprometidas pelo conflito de interesses, evidente.
Uma opinião forte da jornalista, Amanda Desireé, na revista "Roll", ao dar conta de que o preconceito contra bandas do mundo pesado mostrava-se grande na mídia mainstream e ao mesmo tempo, ao isentar-nos desse espectro, deixou claro que o nosso negócio era bem mais ameno... 
Eu e Beto concedemos essa entrevista para o jornalista Tony Monteiro, que foi publicada na revista "Metal", n° 43. O tom de desilusão e medo pelo futuro sombrio foi terrível e refletiu o que passávamos nessa época, que precedera o lançamento do disco e assim, quando a matéria foi publicada, os nossos piores temores já haviam confirmado-se, infelizmente...
Uma entrevista conduzida pelo Eduardo Russomano para a revista "Rock Brigade". Bem, quando iniciou a falar da Sonia e o Studio V, o Edu sabia de cátedra o quanto aquela associação fora prejudicial para nós.
Nota em um fanzine do México, chamado: "Heavy-Metal Subterraneo", em que o Eduardo de Souza Bonadia, da Rock Brigade, foi correspondente, no Brasil.
Essa matéria não tem assinatura, mas acredito ter sido escrita pelo jornalista, Sérgio Martorelli, para a revista "Roll". Ela é boa em linhas gerais, mas comenta sobre alguns pontos negativos do novo trabalho que lançáramos, principalmente no quesito das letras. Bem, nesse caso, receio que ele teve razão em criticar, pois o excesso de romantismo que o Beto imprimiu nas suas criações, foi realmente um ponto negativo. 
 
Uma resenha que eu infelizmente perdi e não consta do portfólio, mas é digna de nota, saiu no Jornal da Tarde de São Paulo. Nela, o crítico arrasou as nossas letras, e qualificou-as como "ginasianas", ao fazer menção à sua infantilidade romântica. Infelizmente ele teve razão...
Na revista "Metal" de janeiro de 1988, nós ficamos bem cotados na lista dos "melhores de 87"...
E lá estava novamente o Leopoldo Rey a colocar-nos na revista "Bizz", dentro de um ranking a arrolar os melhores discos de 1987... 
Resenha sobre o show do Teatro Mambembe, realizado em dezembro de 1987 e na mesma edição, nota sobre a formação da banda dissidente, na revista "Rock Brigade", em janeiro de 1988. 
Na revista "Metal" nº 46, estávamos em 7º lugar no ranking de vendas de discos, em uma lista mesclada com lançamentos internacionais e ao levar-se em conta, que tratou do mundo do Heavy-Metal
Uma resenha muito boa no jornal alternativo, "Contracorrente", assinada pelo Tony Zimmermann, que fora o pseudônimo de um jornalista famoso que eu conhecia bem, mas em respeito ao fato de que o uso de um pseudônimo denota o desejo de se manter oculto, oficialmente, claro que não revelarei quem ele era, de fato.
Resenha do LP The Key, na Revista "Burrn!", do Japão, que era uma das maiores revistas do mundo em termos de Heavy-Metal e Hard-Rock, nos anos oitenta. Saiu em abril de 1988
E a seguir, eis o que penso das canções do disco, “The Key”, para finalizar. Bem, deixei para o final, após ter comentado tudo sobre as circunstâncias que envolveram-no, de uma forma ampla, não só por enfocar a sua produção em si, mas igualmente sobre toda a ambientação dramática com a qual ele foi concebido. Dessa forma, o leitor chega nessa etapa já bem consciente de que falhas técnicas a parte, tal disco não teve o melhor clima para ser gravado e lançado, lastimavelmente.


“A Woman Like You”(Beto Cruz)
Eis o Link para ouvir tal canção no YouTube:


Essa canção começa com uma convenção, bem ao estilo d'A Chave do Sol. Acho que não foi por culpa do produtor, Edy Bianchi, que era bem setentista em suas convicções por excelência, mas o excesso de reverber, bem típico dos anos oitenta se mostrava como um consenso geral, no afã de buscar-se a adequação ao mercado daquela época. 
 
A música é super influenciada pelo Hard-Rock-Pop oitentista em todos os seus quesitos: riff, harmonia e melodia e não teria por que não acompanhar a roupagem condizente em termos de áudio e timbres. E foi o que ocorreu. 
 
No entanto, apesar de ser deliberadamente uma aposta nesse aspecto comercial de época, tem os seus méritos. Trata-se de uma canção, com melodia atrativa, bom refrão e o seu riff é bom. 
 
Ao falar sobre o arranjo em si, é incrível constatar que mesmo ao buscarmos o máximo da simplificação, nós simplesmente não conseguíamos soarmos com parcimônia, mesmo quando esforçava-nos para tal. Há um excesso de convenções e até contra-solos executados pelo baixo nessa canção, que são interessantes musicalmente, mas se a ideia foi soar simples, ficam até contraditórios no contexto da canção. 
 
O solo do Beto é bastante funcional. Ele não era nenhum virtuose, mas tocava bem e a sua atuação nessa faixa é muito boa nesse quesito, visto que o Rubens não quis participar da gravação desta música, infelizmente. 
 
A letra peca pelo romantismo em excesso, mas creio já ter explicado isso ao longo da narrativa. Entretanto, a melodia é muito boa e o acréscimo da voz de Andria Busic nos backing vocals, enriqueceu-a sobremaneira. 
 
Duas curiosidades sobre essa faixa: Ivan Busic confessou-me que ela foi gravada com a falta da esteira na caixa. Ele ainda fazia testes quando surgiu a ordem para gravar e não deu tempo de colocar a esteira. E como a execução foi considerada perfeita, ficou assim mesmo. Lembrou-me do Bill Legend, baterista do "T.Rex" que confessou ter várias faixas de discos dessa banda em que ele gravou sem esteira na caixa de sua bateria, pelo mesmo motivo.

Uma outra questão engraçada: por volta do minuto 4:06’, há uma voz misteriosa a falar alguma coisa parecida com: ”não”. Nós todos naquele estúdio, ouvimos exaustivamente esse trecho, ao buscarmos em cada canal solado, descobrir onde estava esse estranho vazamento e não o encontramos, simplesmente. Um verdadeiro fantasma, portanto, ficou preso ali na mixagem final e imortalizou-se no disco...

“Sweet Caroline” (Beto Cruz)
Eis o Link para escutar no YouTube:


Outra boa canção do Beto, tem um ótimo riff, melodia e boa construção de mapa harmônico. Gosto da linha do baixo, embora hoje em dia eu faça muitas restrições ao fato de ter usado técnica pizzicato à época, a prejudicar bastante o timbre do instrumento em meu entendimento. 
 
Reconheço que tem bastante ousadia nessa linha, no entanto, e que são frases instigantes e até com uma junção com o solo de guitarra, que é criativa, e perdão pela falta de modéstia, ao falar dessa forma. Há uma tonelada de reverber na bateria, mas foram os anos oitenta, ou seja, paciência!

O Beto atuou muito bem como guitarrista, mais uma vez. A sua base e solo, são bons. Andria Busic apoiou muito bem no backing vocals mais uma vez e eu acho o refrão muito bom, com apelo Pop radiofônico. Se fôssemos uma banda da Califórnia, teríamos tocado maciçamente essa música nas emissoras de rádio de Los Angeles e ficado ricos e famosos, mas aqui era/é o Brasil...

“Change My Evil Ways” (Beto Cruz / José Carlos Vasconcelos)
Eis o Link para escutar no YouTube:
https://www.youtube.com/watch?v=zmPMDXnJdXo

Canção muito boa, que o Beto compôs ainda quando estava em sua ex-banda, o "Zenith", a sua inclusão no disco atropelou outras canções tão boas quanto, que inclusive já tocávamos com sucesso nos shows, mas mesmo assim, acho que foi válido incluí-la, pela sua qualidade. 
 
Acho a introdução dela um pouco exagerada com aquele teclado "sinth" todo pastoso e o vocal sussurrado, mas a canção tem muitos méritos. 
 
A sua estrutura harmônica e melódica é rica. Gosto do solo do Rubens (ufa, uma música d'A Chave do Sol com Gióia a pilotar a guitarra, que bom), com a salutar incursão pelo wah-wah. Tal solo, inclusive, acontece em um interlúdio bastante interessante, ao resgatar tradições antigas da nossa própria banda em seus primórdios. 
 
Ao manter a sua tradição, há uma linha de baixo e bateria sofisticada, com vários arranjos e convenções bem marcadas. 
 
No campo da temática, aqui o Beto foi romântico como buscava ser nesses tempos, mas acertou melhor a mão, na criação da letra. 
 
Tem certos climas setentistas nessa canção que agradam-me bastante. São determinadas cadências harmônicas que transitam entre os estilos do "Led Zeppelin" e o "Uriah Heep", por exemplo. Não que buscássemos isso deliberadamente, como já expliquei na narrativa, mas quando aconteciam tais sutilezas espontâneas, revelara-se um alento e tanto para o meu ouvido.

“Keep me Warm Tonight” (Roberto Cruz/Rubens Gióia/Luiz Domingues/José Luiz Dinola)
Eis o link para escutar no YouTube:
 
Essa faixa chamava-se anteriormente, “Que Falta me Faz, Baby”, mas adaptada para o inglês, ganhou tal roupagem repaginada, porém sem perder a intenção do Beto de elaborar uma letra bem na linha da sensualidade explícita, ao buscar inspiração no "Whitesnake", naturalmente.
 
O riff baseado em Blues, ainda que a usar signos oitentistas bem delineados, é sensacional em minha opinião.
 
O Zé Luiz Dinola a gravou e por um pedaço do disco ao menos, foi a formação clássica d'A Chave do Sol a tocar coesa. Acho a melodia boa, mas a métrica com a letra não encaixou-se cem por cento em alguns trechos, infelizmente, para obrigar o Beto a correr, para não cantar fora da pulsação e isso infelizmente é uma falha. 
 
Gosto muito dos solos e contra-solos da parte do Rubens. No baixo, há até “slap”, um recurso estilístico que hoje em dia eu não gosto e não usaria se fosse gravar tal faixa novamente. 
 
E o órgão Hammond que o Fernando Costa gravou é bem discreto, essa foi a intenção, mas bem bonito. Hoje em dia eu teria pedido para ele descer a mão e fazê-lo soar na frente, excepcional tecladista que era/é. 
 
E o micro solo vocal que o Beto fez, soa-me nostálgico ao ouvi-lo hoje em dia, visto trazer-me a lembrança dele a entoá-lo ao vivo, em tantas vezes que estivemos juntos no palco, naqueles anos de 1986 e 1987 e assim a arrancar uivos de emoção das plateias que tivemos nos shows.

“Profecia” (Roberto Cruz/Luiz Domingues)
Eis o link para ouvi-la no YouTube:
https://www.youtube.com/watch?v=DBTU71DG7Sg
 
Faixa mais pesada do disco, há uma estrutura praticamente dentro do preceito do Heavy-Metal, apesar de tanto esforçarmo-nos para desvincular a banda dessa pecha, conforme eu já expliquei no decorrer da narrativa. 
 
Faixa do lado “B” do antigo vinil, demarcava a parte em português desse LP. Algumas pessoas, incluso críticos, chegaram a apelidar esse álbum como “disco pizza”, por ele ser mezzo inglês/mezzo português. 
 
O andamento é muito rápido para o meu gosto, mas mesmo assim, eu gosto da linha do baixo. Ivan Busic impressiona pela sua condução mega técnica e pelas frases bem robustas. Gosto dessa letra e sobretudo da frase: “O sol só brilha para quem luta até o final”. Frase forte e que espelha bem o espírito guerreiro do Beto.

“Sun City” (Roberto Cruz/Rubens Gióia)
Eis o link para ouvir tal canção no YouTube.
https://www.youtube.com/watch?v=7QhTS9ADigk

Bem, na narrativa eu falei exaustivamente sobre essa canção, e o que ela representou para A Chave do Sol e ao ir além, para a cena do Rock pesado brasileiro, oitentista. E também sobre a questão da sua temática enfocada na letra e decorrentes erros e acertos nela inerentes. 
 
Acrescento que o arranjo colocado pelo Fernando Costa aos teclados é bem simples, bem naquela ideia de ser um reforço apenas, mas muito bonito. Assim como em “Keep me Warm Tonight”, ele deveria ter tido mais espaço, mas foi o que pedimos-lhe à época e ele cumpriu o nosso desejo. 
 
Hoje em dia eu teria dado carta branca para ele criar a vontade e ficaria soberbo, tenho certeza. De resto, é espetacular o solo do Rubens. E do riff primordial nem se fala, um dos mais geniais que ele criou para a nossa banda.

“Lírio de um Pantanal” (Beto Cruz)
Eis o link para escutar no YouTube:
https://www.youtube.com/watch?v=NMz7SNbsUPQ

Uma balada muito especial composta pelo Beto e que causava bastante emoção nos shows, eu acredito que nessa versão oficial ficou muito bonita. O trabalho com duas guitarras, apesar do clima interno da banda não ter sido nada bom nesse instante em que foi gravada, é um bálsamo para esse disco. 
 
É um arranjo tão bonito e concatenado entre Rubens e Beto, que quebra a agonia que sentíamos por ver nossa banda a desmantelar-se nessa época. 
 
Gosto muito da serenidade que ela transmite e da interpretação do Beto. Aprecio a letra, também, que saiu da temática do romantismo e apostou em um tema mais profundo. 
 
Uma outra faixa onde contamos com o nosso velho baterista, José Luiz Dinola, ela foi gravada com uma emoção extra, pelo imediatismo dessa situação gerada no estúdio. Solos belíssimos de ambos (é interessante a diferença de timbres, bem nítida entre as guitarras), Rubens e Beto e uma participação discreta do tecladista, Fernando Costa, mas providencial.

“A Chave é o Show” (Beto Cruz)
Eis o Link para ouvir essa música no YouTube: 
 
Essa é uma outra canção que eu já comentei anteriormente. Aqui acrescento que acho o andamento um pouco rápido. Mais lento um pouco e teria ficado melhor, na minha visão. 
 
Mas é um bom riff, e o refrão, bastante Pop, sem dúvida alguma. Ivan Busic arrebenta com as suas evoluções à bateria, incluso sutis passagens por dois bumbos (embora isso cause um certo efeito nocivo ao áudio, com uma embolação de frequências graves, que não foi sanada na mixagem, infelizmente). 
 
Gosto da linha de baixo que criei, ao intercalar condução simples e fraseados rápidos e mais técnicos, quase como contra-solos, foi uma marca registrada da velha, A Chave do Sol, sem dúvida.

LP The Key - na íntegra
Eis o link para escutar o álbum inteiro, no YouTube:
https://www.youtube.com/watch?v=cpbt7W5Ab4o

Continua...

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