Conforme
eu relatei anteriormente, sobre quando fiz parte da banda de apoio do cantor, Edy
Star, por ocasião de seu show durante a realização da "Festa Odara", versão de 14 de novembro
de 2014, fora um prazer tocar e assim, muitas observações positivas foram
objeto de minha avaliação, nesse trabalho.
Em 2015,
eu recebi o telefonema da cantora: Renata "Tata" Martinelli, e desta feita,
ela é que esteve a organizar os preparativos para uma série de shows que
o grande, Edy Star, realizaria em um circuito de teatros da prefeitura de São Paulo,
a caracterizar uma espécie de mini turnê, mas eu estava em plena fase de
convalescença das minhas duas primeiras cirurgias e não pude aceitar o
convite, ao perder a oportunidade.
E no meio desse acontecimento, ainda ouve a
"Virada Cultural" da cidade de São Paulo, quando eu também perdi a chance para realizar um show
perante uma grande multidão, com direito a um cachê robusto, inclusive...
Contudo, ao final de 2016, o Kim Kehl mais uma vez abordou-me e ao Carlinhos Machado, e convidou-nos a fazer parte da banda de apoio de Edy Star, e desta feita seria em moldes diferentes da apresentação da qual eu participara em 2014.
Primeiro, que não seria anunciada a nossa participação como: "Easy Rider Band", mas apresentar-nos-íamos com a nossa identidade habitual, ou seja, "Os Kurandeiros".
Segundo aspecto, a
festa desta vez seria temática e o mote escolhido fora a efeméride em torno dos
cinquenta anos do movimento tropicalista na MPB, 1967-2017. Dessa forma, o
repertório sugerido pelo Edy, versava muito nas canções de Caetano Veloso e Gilberto Gil,
como base do espetáculo, mas a conter as canções tradicionais que compõe
o repertório regular do Edy em suas apresentações, ou seja,
bastante Rocks do cancioneiro da dita "pré" Jovem Guarda, algumas canções mais modernas, além é
claro, de muito material clássico do Raul Seixas, pela ligação artística e
histórica que ambos tiveram nos anos setenta etc. e tal.
O
palco montado para o soundcheck no Cine Joia de São Paulo. A esquerda, Luiz
Domingues a estabelecer os seus últimos ajustes no baixo e amplificador. 13 de
janeiro de 2017. Click, acervo e cortesia: Carlinhos Machado
E um
terceiro ponto, talvez temerário, em tese, que revelou-se na extrema
simplicidade da formação, por resumir-se ao Power-Trio d'Os Kurandeiros e a
inclusão de apenas um músico a mais para reforçar o time, na figura do
percussionista, Michel Machado. Tocar em formato "Power-Trio" é algo que
eu fiz muito na minha trajetória, em boa parte da carreira d'A Chave do Sol e voltei a
praticar nessa fase com Os Kurandeiros, desde 2011, e claro que não
preocupou-me em nada, no entanto, para acompanhar um outro artista e
com o repertório proposto, a presença de um segundo guitarrista a apoiar
na harmonia e melhor ainda, se fosse um tecladista, seria ótimo pelas
circunstâncias, mas isso não foi possível e assim, tivemos que preparar
muitas músicas sob um curto espaço de tempo e com essa formação bem básica.
Pior que isso, algumas canções escolhidas para a apresentação,
ostentavam características experimentais acentuadas, caso de temas
como: "Alegria, Alegria" e "Tropicália" a conter todos aqueles detalhes
com orquestrações e elementos psicodélicos "nonsense", portanto,
tocá-las assim, em formato Power-Trio e só com o acréscimo de um
percussionista como força adicional, seria temerário sob uma primeira avaliação.
O set de guitarra de Kim Kehl, pronto para a ação, no Cine Joia. Click, acervo e cortesia: Kim Kehl
Pois muito bem,
preparamos tudo e fomos para o primeiro ensaio, embora dias antes disso, o
Edy Star fora convidado pelo Kim Kehl e fez uma breve aparição em um show
d'Os Kurandeiros, quando cantou algumas canções que tocaríamos na Festa
Odara. Nessa participação, nós estávamos prontos para tocar tais músicas
baseadas nos arranjos e tonalidades dos seus respectivos álbuns, onde
estão registradas, mas o Edy surpreendeu-nos, com pedidos de mudanças
súbitas, no andamento e tonalidade. Certo, fator típica de cantor, quem
está acostumado a tocar em banda base de cantores sabe o quanto isso é
normal, apesar de ser obviamente um transtorno e tanto para qualquer
instrumentista, estabelecer modificações da rota traçada com o avião em pleno voo.
Já no ensaio, a mostrar-se contrariado com tonalidades e andamentos, ele fez várias outras modificações e ali, tratara-se da véspera do show, portanto, lá fui eu fazer transporte de harmonia e na dúvida, fiquei com duas versões de cada música em mente, exatamente a prever que na hora do show, não seria nada surpreendente que ele desistisse da modificação e pedisse-nos para tocarmos no tom original do disco.
Mais habituado a lidar
com tal tipo de situação, o Kim aproveitou e contou-me que quando
acompanhou uma dessas duplas sertanejas, mainstream, era algo comum que os
sujeitos pedissem modificações harmônicas aos músicos, com o show em
andamento, a provocar desconforto generalizado na banda inteira,
naturalmente. Certo, saímos todos ilesos do ensaio, e agora seria contar com o
velho espírito Kurandeiro de improviso, em eventuais momentos de pane, e
modéstia a parte, a nossa banda, de tanto tocar na base do improviso, era (é )
bastante calejada nesse sentido.
Nesse
click da fotógrafa, Carol Mendonça, a partir do mezanino do Cine Joia
(nós da banda e Edy, bem lá no fundo), dá para ter-se a dimensão do ambiente
triangular da sala, com o palco a perfazer o seu ângulo. 13 de janeiro
de 2017. Click, acervo e cortesia: Carol Mendonça
O local do
show seria outro também, desta vez em relação ao show em que eu participei em
2014. Ainda mais interessante ao meu ver, o Cine Joia, uma ex-sala de
cinema, ainda mantinha a sua arquitetura cinquentista, muito glamorosa.
Cinéfilo que sou desde a tenra infância, não contive o meu ímpeto, assim
que cheguei ao estabelecimento e fiz uma turnê pelas suas dependências.
Cinema histórico na cidade de São Paulo, para quem não conhece a sua trajetória, digo resumidamente que tal sala fora construída com o intuito de exibir filmes japoneses e sem legenda, exatamente para atender a colônia nipônica radicada na cidade e registre-se, São Paulo é a maior cidade "japonesa fora do Japão", no mundo, dada a imigração que foi massiva por aqui e que naturalmente gerou milhões de descendentes.
Por anos a fio, o Cine Joia cumpriu a sua função com muita dignidade, por ter sido um polo cultural para a colônia, a apoiar principalmente os imigrantes mais idosos, que tinham imensa dificuldade para aprender o nosso idioma e assim, ao irem ao Cine Joia para assistir um bom filme japonês e ouvirem a sua língua, evitava que entrassem na depressão inevitável pela não adaptação ao Brasil.
E claro, o Cine Joia fica encravado no centro do bairro da Liberdade, onde a tradição dos orientais construiu-se na cidade e por décadas foi considerado o bairro japonês da cidade. Ainda há um comércio fortíssimo dos japoneses por ali, mas nos dias atuais, os chineses e coreanos também estão ali presentes no comércio e nos serviços, em profusão.
Bem,
apesar disso tudo, por ser uma ex-sala de cinema e não ter sido muito
drasticamente modificada para vir a ser uma casa de shows na atualidade de 2017,
o palco em formato de uma concha, pareceu-me mal aproveitado, com uma
profundidade que não servia para nada e a parte útil de fato, prejudicada
pela dimensão exígua. Bem, a vantagem é que tocaríamos em quarteto, com
um mapa bem simples. Bateria e percussão na linha de trás e guitarra e
baixo na segunda linha, para deixar a frente para o Edy, a estrela da
noite, naturalmente.
No
acesso ao camarim, a banda reunida com Edy Star, momentos antes do
show. Da esquerda para a direita: Luiz Domingues, Kim Kehl, Edy Star,
Michel Machado e Carlinhos Machado. Cine Joia, 13 de janeiro de 2017.
Click, acervo e cortesia: Carol Mendonça
Gostei do
caminho de acesso aos camarins, com certo sentido labiríntico e a existência de
muitos cartazes antigos de filmes japoneses que certamente ali foram
exibidos em décadas passadas. Isso foi incrível mesmo, gostei muito de ver essa memorabilia,
ainda que não exatamente bem cuidada, uma pena.
Nos momentos antes do
show, Edy divertiu-nos no camarim, a contar histórias hilárias sobre as suas
andanças por Portugal, no início dos anos setenta, quando atuou como ator, em
montagens teatrais.
Sobre a organização, tudo foi muito bem azeitado, essa rapaziada organizava essa festa há anos, portanto, tudo correu muito bem, não tenho nada a reclamar e pelo contrário, só tenho elogios. Incluso na contratação de um equipamento de som e iluminação com qualidade, ou seja, foi um alívio para todos.
Outra foto do soundcheck, no período da tarde. Da
esquerda para a direita: Kim Kehl, com Carlinhos Machado ao fundo na
bateria, Edy Star, Michel Machado na percussão, atrás e Luiz Domingues. Acervo e cortesia: Kim Kehl. Click: Lara Pap.
Edy Star é
um artista performático e por ter a formação como ator, não contentava-se
em cantar e fazer a mise-en-scène tradicional, mas sempre buscava algo a
mais. Ao olhar o palco com uma considerável altura em relação ao patamar
básico do público (havia também um mezanino, muito bonito), ele inventou de
iniciar o show a vir a cantar do público e subir ao palco por uma escada
de acesso frontal.
Até aí, tudo bem, foi positiva a ideia pelo aspecto
impactante, todavia a escada era íngreme, sem apoio e pior, sob plena
escuridão no público e iluminação ofuscante na contraluz, portanto, o
risco dele desequilibrar-se e cair, seria enorme e coloca-se aí nessa
receita a sua idade cronológica, com quase oitenta anos de idade naquela
ocasião, portanto, isso gerou preocupação generalizada.
Luiz
Domingues na primeira foto, Kim Kehl na segunda e Michel Machado &
Luiz Domingues na terceira. Edy Star + Os Kurandeiros na "Festa Odara",
no Cine Joia de São Paulo. 13 de janeiro de 2017. Clicks, acervo e cortesia: Carol
Mendonça
Mas ele
insistiu e de fato, na hora do show a banda entrou a tocar a música:
"Os Mais Doces Bárbaros", que aliás é uma canção que eu adoro do
repertório desse trabalho de Gil/Gal/Bethânia & Caetano, a atuar como
uma banda.
Foi inevitável a lembrança de minha parte a lembrar-me sobre por quantas vezes eu fui ao Cine Belas
Artes assistir o documentário dessa turnê d'Os "Doces Bárbaros", e
adorava ver a abertura do show com essa mesma canção e com o Arnaldo
Brandão a destruir tudo no seu baixo Fender... claro que toquei com
muito prazer ao pensar nessa minha reminiscência setentista e também foi óbvio que
tocaria a canção na mesma intenção do Arnaldo, com aquele swing todo em torno de R'n'B/Soul Music. E o Edy fez o que prometeu... veio a cantar da
plateia, com um canhão de luz ao estilo "super trouper", a acompanhá-lo e
todo "glam", subiu apoiado por seguranças e não perdeu o pique...
Fora disso, o repertório recheado por músicas da tropicália e MPB, acertou na mosca, eu diria, pois, o público saiu a cantar e dançar o tempo todo. O percussionista, Michel Machado, era (é) excelente músico e tratou de fornecer o "champignon" ao show, como dizia o saudoso, Wilson Simonal.
Uma panorâmica do palco. Da esquerda para a direita: Kim Kehl, Edy Star e Luiz Domingues, na
linha de frente. Atrás, Carlinhos Machado e Michel Machado. Festa Odara
no Cine Joia de São Paulo. 13 de janeiro de 2017. Click, acervo e cortesia: Carol
Mendonça
Um dado
engraçado do show, em um determinado momento, eu olhei para baixo e vi
algumas pessoas a chamar a minha atenção, mediante gesticulação histriônica. Quando
as fitei mais detidamente, vi que uma menina mostrou-me uma tela de um "tablet" com os
seguintes dizeres grafados: "Fora Temer"... (o presidente do Brasil na ocasião), e ela e a sua turminha faziam
sinais para eu ir ao microfone e insuflar a massa com tal "mantra".
Ora, eu não poderia tomar tal iniciativa de forma alguma, visto ser ali um simples acompanhante. O dono do show era o Edy e eu jamais poderia afrontá-lo ao tomar uma atitude impertinente dessas. Segundo ponto, mesmo não sendo nada simpático ao governo desse senhor citado e de seu partido, eu não faria isso nem que fosse um show regular d'Os Kurandeiros, a minha banda, e onde teria liberdade para tomar uma atitude dessas se fosse o caso, pois mesmo assim, isso só seria cabível se a banda toda estivesse de acordo com a tomada de posição política e além de que, se tudo isso fosse amplamente debatido no nosso ambiente interno, de uma maneira prévia e houvesse 100 % de concordância com tal tomada de posição em público, ao expor a banda, dessa forma.
Sinalizei para a garota que eu não poderia fazer isso, mas não fui hostilizado por ela e seus amigos. Pelo contrário, ela sinalizou-me com o dedão, ao fazer o clássico sinal de "positivo", a denotar entender a minha posição ali em cima do palco.
Contudo, não adiantou nada eu não ter feito isso, pois na primeira
pausa possível entre uma canção e outra, alguém do público deu a palavra
de ordem e a massa aderiu com contundência. Mas nós ignoramos a
manifestação e encobrimos o coro com tal teor político, ao começar
imediatamente o próximo número e ninguém ali sentiu-se ofendido.
Passaram a cantar e dançar, com o "comício" político a encerrar-se...
Bela
perspectiva com o público de frente e todo mundo sendo agraciado com o
púrpura profundo... Festa Odara, no Cine Joia de São Paulo. 13 de
janeiro de 2017. Click, acervo e cortesia: Carol Mendonça
Finalizamos
o show com o público bastante satisfeito, a aplaudir bastante o Edy, por conseguinte, a banda. Acho que demos o recado e cumprimos a missão
com bastante sucesso. No camarim, do pós-show, o cansaço foi grande.
A
madrugada quente de verão estava avançada e pela vidraça, víamos a
Avenida 23 de Maio, semi-deserta, uma cena rara ao tratar-se dessa via
de São Paulo. Na saída,
recebemos muitos cumprimentos. Essa sinalização de que muitas pessoas haviam gostado,
foi muito interessante e surpreendeu de certa forma, quando alguns mais
antenados, fizeram considerações mais embasadas da nossa performance e
a demonstrar possuir cultura Rocker, pelas colocações feitas. Positivo, por
essa não esperávamos e claro que foi um bônus agradável para nós.
Edy
Star sob as bênçãos de Caetano Veloso, nas imagens projetadas. Carlinhos
Machado ao fundo, na bateria e Luiz Domingues, no primeiro plano. Festa
Odara no Cine Joia de São Paulo. 13 de janeiro de 2017. Click, acervo e cortesia: Carol
Mendonça
Missão
cumprida, foi o meu segundo show com Edy Star e mais uma vez provou-se prazeroso
por muitos aspectos já citados ao longo do capítulo. Aconteceu em 13 de
janeiro de 2017, no Cine Joia, localizado no bairro da Liberdade,
centro de São Paulo, com cerca de quinhentas pessoas presentes.
E assim
foi esse meu trabalho avulso (embora híbrido, posso afirmar, visto que
a estrela foi o Edy, mas Os Kurandeiros levaram crédito, igualmente),
por enquanto.
A próxima ocorrência no campo dos trabalhos avulsos, foi para lá de prazerosa, por envolver personagens de diversas passagens de minha vida profissional, ao mesmo tempo... falo sobre isso no seu capítulo correspondente, a seguir.
Um
resumo da "Festa Odara" em 13 de janeiro de 2017, no Cine Joia do
bairro da Liberdade, em São Paulo. Edy Star com Os Kurandeiros. Filmagem de Lara Pap
Eis o Link para assistir no You Tube:
https://www.youtube.com/watch?v=UR__OGJ8rBo
Continua...
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