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segunda-feira, 23 de setembro de 2019

Crônicas da Autobiografia - O Oceano Etílico - Por Luiz Domingues

Aconteceu no Tempo de Kim Kehl & Os Kurandeiros, em 2011

Logo que eu entrei na formação dessa banda, tive que adaptar-me ao seu modus operandi e tradições adquiridas como hábitos, bem rapidamente, pois não houve tempo para absorver com calma todas essas novidades, incluso o seu enorme repertório autoral e também munido por releituras internacionais, visto que de imediato fui para a estrada com os companheiros. 
 
O lado bom dentro dessa pressa toda, foi que eu tive todo o respaldo dos colegas e com esse companheirismo solidário, todas as dificuldades inicias foram neutralizadas, automaticamente. 
E uma das primeiras casas que eu visitei a defender tal nova camisa, foi uma que localizava-se em plena Rua Augusta, na sua parte a apontar para o centro velho da cidade de São Paulo e onde há anos, a movimentação noturna havia crescido de uma forma descomunal. 
 
Sobre tal fato eu já sabia por relatos ouvidos da parte de várias pessoas, mas evidentemente que eu nunca havia nutrido nenhum interesse em averiguar em pessoa tal movimentação, em decorrência do meu temperamento natural. Sou notívago, mas não boêmio, portanto, só fui testemunhar tal balburdia coletiva, no dia em que fui apresentar-me com Kim Kehl & Os Kurandeiros, pela primeira vez em tal casa, encravada no epicentro dessa rua completamente tomada por uma horda de jovens e alguns nem tão jovens assim, sequiosos por diversão hedonista. 

A despeito do que narrei no parágrafo anterior, não trata-se de um julgamento moral da minha parte, visto que se não tenho apreço por tais valores, isso não significa que os condene com a veemência hipócrita de um falso moralista. 
 
Apenas constato que o panorama que eu vislumbrei ali naquela primeira vez em que fui apresentar-me em tal casa noturna localizada naquela rua, com a minha nova banda, foi esse, a confirmar as informações que eu tinha da parte de terceiros e de certa forma, para amplificar a minha impressão, ao enxergar in loco, a realidade. 
 
Por sorte, ao menos nessa casa em que tocamos algumas vezes além dessa, foi que nas primeiras ocasiões em que lá fomos tocar, havia um estacionamento exatamente em frente, providencial para que os nossos respectivos carros ficassem em segurança, mas principalmente pelo fato de que minimizou-se e muito a nossa tarefa braçal em levarmos os nossos equipamentos, do automóvel para o interior da casa noturna. 
Mesmo assim, com essa suposta facilidade, a questão em si não mostrou-se exatamente tranquila para cumprir-se. O fato, foi que a quantidade de pessoas a circular, nessas madrugadas de sexta e sábado, principalmente, assemelhava-se ao contingente de manifestações de rua. 
 
E com a agravante de haver uma enorme euforia motivada pelo uso e abuso, sobretudo de bebidas alcoólicas e drogas de todos os tipos, portanto, o simples ato para atravessar-se de uma calçada a outra, em linha reta, tornara-se uma aventura, agravada pelo fato de estarmos a carregar volumes, mediante instrumentos e equipamentos. 
 
E mesmo que não aparentasse haver um perigo iminente em termos de agressões ou tentativas de roubo dos nossos pertences, pelo fato de estarmos em meio a uma multidão completamente embriagada a berrar, cantar e a proferir um discurso desconexo, como se fosse a cena bíblica da Torre de Babel, além da dificuldade para passar em meio a essa massa humano tresloucada, havia o desconforto gerado por tal histrionismo desmesurado e a apresentar alguns perigos iminentes, como por exemplo, a existência de uma enorme quantidade de garrafas quebradas pela pista e também na calçada, com cacos de vidros a sugerir uma explosão, proveniente de um bombardeio, mas não tratava-se de um campo de guerra e sim, o resultado deixado pelo dejetos jogados pelos milhares de ébrios, que por descuido generalizado, quebravam-se, para tornar a rua, um campo minado. 
 
Em meio a tudo isso, ainda víamos cenas prosaicas, como pessoas idosas e alheias à balburdia, mas a aproveitar os dejetos, como catadores de latinhas e afins. 
Bem, foram noites muito boas no interior das casas em que ali tocamos, e exóticas por tais detalhes extra-show, onde aconteceram tantas ocorrências bizarras que ali constatamos, e entre tantas, eu pude passar pela experiência sui generis em ter dificuldade para atravessar uma rua, todavia não pelo seu tráfego pesado em decorrência dos automóveis, no entanto, ocasionado por uma multidão formada por ébrios, a caracterizar um autêntico cordão etílico.

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