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segunda-feira, 20 de novembro de 2017

Cronicas da Autobiografia - A Árdua Tarefa de Decidir um Destino - Por Luiz Domingues

Aconteceu em meados de 2001, no tempo da Patrulha do Espaço...

Recebi o convite certa vez para ser componente de um corpo de jurados, a fim de apreciar e eleger uma banda vitoriosa em um embate desses em tom de festival. 

Menos mal, pela questão de cada artista ter pelo menos trinta minutos de exposição no palco, não se tratou de um festival tradicional nos moldes da qualificação de compositores, a se elegerem-se músicas inéditas, tampouco show de calouros, para buscarem-se aspirantes a cantores, mas sim, um festival de bandas cover ou melhor a dizer, bandas “tributo”, a visar premiar a melhor performance da noite. 

E a premiação se mostrara bem razoável ao vencedor, ao oferecer uma quantia em dinheiro e uma data para uma apresentação regular e remunerada, na casa em questão. 

O mundo das bandas cover não é da minha predileção e mesmo os mais convincentes intérpretes que empenham-se com afinco impressionante a reproduzir o trabalho de artistas consagrados, não comovem-me, apesar de todo o seu esforço e apuro, com todo o respeito. 

Não menosprezo a sua labuta e nem mesmo o seu nível técnico, muitas vezes bem alto e que justifica a sua condição para reproduzir o trabalho de artistas de alto nível, ainda assim, ou mesmo por isso, sempre vou achar que seria bem mais interessante que tais artistas da reprodução musical do trabalho alheio, dedicassem-se ao trabalho autoral e não tenho dúvida, muitos tem um talento criativo, latente e enorme, portanto, contribuiriam com a formatação de uma cena artística muito mais forte.

E claro que eu levo em consideração que muitos gostariam de ter uma carreira autoral sustentável, mas em um país como o Brasil, isso é praticamente impossível. Ao ir além, cabe ressaltar que eu jamais poderei deixar de reconhecer que artistas que dedicam a sua carreira à execução do trabalho consagrado de outrem, também estudaram para aprender a tocarem instrumentos e cantarem, muitas vezes por anos a fio com dedicação e mediante sacrifícios pessoais acentuados, além de invariavelmente, terem gasto um significativo montante para investirem em bons instrumentos, equipamentos e acessórios para poderem atuar com qualidade assegurada de seu áudio, portanto, mais um esforço pessoal notável de sua parte. 

E para encerrar as minhas ressalvas respeitosas aos músicos que vivem desse tipo de expediente, é lógico que sendo uma atividade honesta, tem a sua legitimidade e além disso, o simples fato de que através desse trabalho, esses artistas podem colocar comida em cima da mesa de suas respectivas famílias, já ganham o meu inteiro respeito e convenhamos, desperdício de talento a parte, o que fazem é manter acesa a chama da arte vinda da parte de artistas consagrados que admiramos, portanto, não poderia ser nunca considerado um malefício, mas muito pelo contrário, é uma espécie de serviço de perpetuação da boa arte, ao manter o seu valor agregado, portanto. 

Só mais um ponto a ressaltar-se, também não é fácil tocar geralmente para plateias desinteressadas e quase sempre formada por pessoas embriagadas/drogadas e muito mais ocupadas em procurarem parceiros sexuais nas noitadas, do que a prestarem atenção em tais músicos, portanto, há esse lado obscuro e desagradável para quem atua nas ditas bandas cover, como dissabor pessoal, eu reconheço e solidarizo-me com tais músicos.
Feitas as minhas respeitosas ressalvas para quem milita nesse mundo profissionalmente, digo que não fiquei nada empolgado ao receber o convite para ser componente de um corpo de jurados, a fim de analisar performances de bandas cover, por todas as razões acima elencadas, mas acrescento que fiquei constrangido em ter a responsabilidade de fazer um julgamento pessoal de cada banda ali a colocarem as suas esperanças de vitória e a dependerem de minha avaliação. 

Se fosse pela minha vontade, o tal festival jamais teria enfoque na competição, mas haveria de ser uma mostra livre, com cada banda a fazer o seu show e sem julgamentos da parte de ninguém, a não ser pela legítima espontaneidade do público, mediante a intensidade maior ou menor da salva de palmas, gritos & assovios e até mesmo de uma eventual vaia, que não é agradável para o artista em cima do palco, mas é aceitável como manifestação natural e legítima mediante um possível sinal de desagrado por parte da audiência.  

Todavia, não foi essa a intenção da casa de espetáculos que convidou-me e como ali eu já houvera participado com shows de minha banda, a Patrulha do Espaço, em ocasiões próximas passadas, recusar teria sido uma quase afronta aos dirigentes do estabelecimento, mesmo porque o convite fora feito sob o signo da honraria, a denotar que a minha participação lhe era importante por eu ser membro de uma banda autoral consagrada no métier do Rock Brasileiro e por conseguinte, a minha presença ali, no seu imaginário e principalmente para os músicos das bandas cover que apresentar-se-iam, fora tida como um estímulo e certamente um sinal de status da casa em ter alguém ali oriundo de uma banda de projeção nacional, para compor o corpo de jurados. 

Certo, diante dessas prerrogativas, lá fui eu em um sábado a noite de 2001, ao bairro Assunção, da cidade de São Bernardo do Campo, na região do ABC paulista, fazer parte dessa aventura diferente, pois eu nunca houvera sido convidado para tal tarefa, anteriormente.
Desconfortável pela missão desagradável em ter que estabelecer um parecer sobre a performance de outros artistas, e pior ainda que isso, na perspectiva do meu voto vir a significar alegria para um e frustração para os demais, imbuí-me de resignação pela situação inevitável e assim munido com as fichas de cada banda em mãos e caneta, fui a redigir os meus relatórios sobre o que achei de cada uma e sobre as suas respectivas atuações. 

Infelizmente, a grande maioria ali inscrita para o festival, professava o Heavy-Metal como um baluarte e notadamente eis aí um gênero musical que eu desgosto profundamente. Pior ainda, entre os que atuaram dentro dessa vertente, alguns representaram bandas internacionais voltadas ao dito "Metal Melódico”, pleno de virtuosismos, exageros & afins, para tornar a minha noite, uma tortura sonora a sentir-me desconfortável em ter que opinar nessas circunstâncias adversas. 

Claro, esforcei-me ao máximo para não misturar o meu (des)gosto pessoal com a análise e procurei exprimir no relatório, os méritos de cada banda e emitir, quando fiz comentários negativos, um tom de crítica construtiva, sem execrar deméritos, mas a sugerir melhorias, que espero terem absorvido com respeito e quiçá a enxergar algo bom para corrigirem.
Somente uma banda agradou-me pela proposta estética e tratou-se de uma  a ter a proposta de homenagear a imortal, Janis Joplin, cuja vocalista esforçou-se muito para chegar minimamente perto da voz e performance da grande pérola de Port Arthur, Texas, mas convenhamos, isso foi quase humanamente impossível. 

Conheci algumas cantoras que dedicam-se a isso com brilhantismo, caso de Vera Negri nos anos oitenta e Xandra Joplin e Fabi Joplin mais recentemente, e de fato, essas três são muito boas na proposta de fazer tributo a Janis Joplin, mas mesmo assim, Janis é inimitável em essência, tamanha a sua condição monstruosa, sobre-humana, praticamente como cantora e performer. 

Mas eu fiquei tão feliz por ver uma banda fazer um tributo a um ícone sessentista dessa grandeza, ali em 2001, quando a maioria estava naquele momento inebriada por "Iron Maiden", "Metallica", "Dream Theater", "Red Hot Chilli Peppers" e "Motorhead", que cheguei a escrever no relatório que chegou às mãos da banda, que eles haviam salvado a minha noite. 

E o grupo era bom, tocava com um balanço legal. A cantora não era ruim, mas apenas a sua tarefa fora inglória ali e como um trunfo a mais, eles tiveram o bom gosto de usar um visual “hippie chic” bem convincente, a fugir do estereótipo de um figurino de festa a fantasia mal-ajambrado e caricato.
E foi assim, após uma overdose de Heavy Metal e virtuosismos histriônicos sem fim, ao menos eu pude ouvir canções marcantes como: “Ball and Chain”, “Try” e “Piece of my Heart”, com uma performance razoável e no tocante às minhas avaliações, esforcei-me para ser 100% justo em minhas ponderações ao emitir opiniões sinceras e procurar ser construtivo ao comentar aspectos negativos em respeitoso tom de crítica justa.  

Mas vamos combinar assim, doravante: festivais para novatos, sim, mas sem caráter de competitividade! Sem avaliações, notas, vencedor e perdedores, mas com espaço para todos tocarem livremente e de preferência, a executarem as suas composições próprias, certo? A cena musical agradece!

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