Ao pensar nesse expediente, eu não tive dúvida e pedi ao meu exército de alunos, uma ajuda. Se cada um ligasse para tal emissora e pedisse a música do Pitbulls on Crack, ao menos uma vez por dia, haveria de auxiliar-nos nessa tarefa. Nos primeiros dias de 1994, isso foi feito de uma maneira simples, mas intensificou-se a seguir, quando ganhou aura de diversão, entre eles.
Com a possibilidade de transformar isso em uma grande brincadeira com ares de uma gincana infantojuvenil, a garotada embarcou nessa predisposição e não só ligou para valer, como encorpou o "movimento", ao agregar mais gente, que nem conhecia-me.
Foram irmãos, primos, amigos dos amigos, vizinhos, namoradas, enfim, quando percebemos, havia sido formado um enorme contingente a bombardear os telefones da emissora 89 FM e assim, a música: "Under the Light of the Moon" entrou para o rol das mais tocadas e chegou-se em um ponto em que venceu várias vezes o ranking da mais pedida do dia, a obter como bônus, uma execução extra no horário nobre da emissora.
Foi um indício forte de que eu tinha uma turma boa em mãos e essa energia juvenil, se bem direcionada, poderia render frutos. Não
tenho dúvida, a minha sala de aulas teve esse mérito e hoje, quando vejo
muitos desses ex-alunos a demonstrarem uma atuação firme no campo da cultura,
penso nessa semente plantada lá atrás, nas minhas aulas.
Mais
ou menos em março de 1994, a brincadeira ganhou força.
Durante todos os
dias, os alunos faziam uma verdadeira zorra nas minhas aulas, para usar o
telefone.
Ligavam o dia inteiro e divertiam-se em revezarem-se e também ao simularem vozes diferentes para confundirem as atendentes da Rádio 89 FM. O
esforço dessa operação lúdica, resultou em semanas consecutivas sob
êxito, com a música "Under the Light of the Moon" a alcançar um patamar
de estar diariamente entre as mais pedidas do dia e sempre a ganhar o
direito a uma execução a mais no horário das mais pedidas. E
muitas vezes, ela foi a campeã do dia, ao obter uma execução extra, como a canção "número
um" do dia, e dessa forma, ao ser a última música a ser tocada antes do famigerado
programa obrigatório, "A Voz do Brasil", entrar no ar.
Segundo os radialistas experientes, essa execução era a melhor possível no horário nobre do rádio, pois as pessoas tinham o costume automático de desligarem o aparelho assim que a vinheta do maçante programa governamental entrava e dessa maneira, a última música executada ficava na lembrança do ouvinte.
E logo a "brincadeira" ganhou contorno de mobilização, pois um rapaz chamado: Jason Machado, que organizou o fã-clube do Pitbulls on Crack, passou a realizar o mesmo com uma rede de amigos e familiares dele e certamente esse acréscimo de pessoas não exatamente presentes na minha órbita professoral, reforçou o volume de telefonemas em tal emissora de rádio.
De volta a
falar sobre as aulas, ainda no início de 1994, eu havia tomado a decisão de não ministrar mais aulas aos sábados.
Essa decisão deu-se pelo fato de que eu estava cansado da rotina massacrante de permanecer o sábado inteiro preso na sala e mesmo ao abrir mão de ganhar dinheiro, pois fora em tese o dia mais rentável (com onze aulas seguidas, sem intervalo), o movimento da semana útil mostrava-se o bastante para as minhas necessidades e assim, ao ficar com o sábado livre, eu poderia tocar na sexta e sábado, sem sentir-me um "zumbi", literalmente, no dia seguinte.
Essa rotina do sábado
massacrante consumia-me desde o início de minha atividade, em julho de
1987 e agora mais estabilizado, dei-me esse luxo, ao abrir mão de meu dia mais rentável, em prol de uma maior comodidade.
Nelson Maia Netto, em foto mais recente
Ídolo dos meus alunos desde 1992, o Dr. Nelson Maia Netto, também
conhecido como "professor", tomou uma iniciativa positiva, ao criar um
fanzine de Rock, com ótimos textos de sua autoria e boa diagramação.
Estávamos no fim de uma Era, mas ainda cabia esse tipo de manifestação underground, com publicações marginais e xerocadas em preto e branco. Geralmente fanzines assim versavam sobre o Punk-Rock ou vertentes radicais do Heavy-Metal, mas a proposta do Nelson foi fazer uma publicação sobre Rock clássico em linhas gerais, com pitadas a abordar estéticas e artistas modernos, igualmente.
Claro, com o seu nível intelectual avantajado, foi óbvio que a qualidade do texto ficasse boa. E o título do fanzine se mostrou pomposo, como poder-se-ia esperar dele, que era advogado e abusava do uso de palavras refinadas em seu linguajar habitual, incluso a acrescentar citações em latim, como bom advogado que era. Dessa maneira, denominou-o como: "In Rock Signo Vinces" (um trocadilho com a expressão latina: "In Hoc Signo Vinces", que sob uma tradução livre, significa: "Por este sinal, conquistarás").
Então, ele convidou-me a participar como colaborador e deu-me a missão de preparar uma resenha sobre o mais recente álbum do "Deep Purple", lançado à época, e tratava-se de: "The Battle Rages on", que saíra do forno naquele ano de 1994.
Foi uma missão dolorosa, pois eu sempre tive a opinião de que a volta
do Deep Purple nos anos oitenta houvera sido um erro desde o início, e a
cada novo álbum, a decepção pela sua continuidade, só aumentava em minha percepção.
Com carta branca para expressar a minha opinião, eu ouvi o disco com cuidado, para não ser preconceituoso ou injusto, mas salvo uma ou outra pequenina virtude, só enxerguei aspectos negativos.
Mesmo
por ser um fanzine xerocado, como muitos que circulavam, principalmente
pelas lojas da "Galeria do Rock", o Nelson caprichou em seus esforços, e
ele repercutiu além das expectativas. Tanto que eu soube de reações acaloradas a respeito da minha crítica negativa sobre o disco do Deep Purple.
"Meu
caro, Nelson Maia Netto, desta vez você me passou uma "bola quadrada".
Mas, prometo me esforçar para não perdê-la e, se possível, marcar um
golaço para o "In Rock Signo Vinces".
Bem, a metáfora procede, pois é mesmo duro ter que comentar um novo disco do Deep Purple em pleno alvorecer de 1994.
Preconceito? Não...
Simplesmente é um fato concreto que a volta de um grande dinossauro, nunca supera em termos de qualidade e brilhantismo de sua fase áurea. O mundo é dinâmico e se apresenta em ininterrupta mutação e daí, fica mesmo muito difícil recriar na sua totalidade, o clima de uma época já passada.
A grosso modo, eu não gosto da "volta" do Deep Purple, a partir de 1984. Acredito mesmo que o melhor teria não ter havido esse ressurgimento e que nas nossas memórias se perpetuassem as doces lembranças de uma sólida e bela carreira, construída do fim dos anos 1960, ao meio dos anos anos 1970. Infelizmente isso não aconteceu e apareceu uma nova fase da banda, marcada pelo álbum, "Perfect Strangers" e outros que se seguiram, culminando neste último lançamento, intitulado: "The Battle Rages on", que saiu na metade de 1993.
Em hipótese nenhuma seria um mau disco, se ele tivesse sido gravado por qualquer banda Hard inglesa ou americana da atualidade, entretanto, por se tratar de um Deep Purple, a cobrança é inevitável por motivos óbvios. Não dá mesmo para engolir uma obra menor de uma banda formada por músicos e compositores que deixaram sua marca na história do Rock, com geniais monumentos tais como: "Machine Head", "Deep Purple In Rock" etc.
O disco é burocraticamente chato do começo ao fim. Para iniciar, uma pergunta que está engasgada na garganta de todo fã antigo do Deep Purple: o que houve com Ian Paice? No auge do Deep Purple, ele esbanjava uma técnica invejável que o alçou à condição de um dos melhores bateristas do Rock e até um pouco mais, pois ele rivalizou com diversas feras do Jazz Rock, tais como Billy Cobham, Alphounse Mouzon e Lenny White. E o que temos visto desde 1984?
Um Ian Paice "bate-estaca", tocando grotescamente como se fosse um bateristazinho pop qualquer. Neste último disco, Paice prossegue tocando mediocremente, como se fosse a mais entediante e horrível obrigação, gravar mais um álbum do Purple.
Outro escondido nesse "The Battle Rages on" é o velho Jon Lord. Somente na faixa "Solitaire", ele consegue mostrar-se um pouco, embora seja uma lástima que esta canção mais pareça uma balada new wave dos anos 1980, cantada por algum grupinho de caras com cortes de cabelo esquisitinhos e usando roupas extravagantes. Alguns lampejos do velho Purple são sentidos ainda que bem discretamente em faixas como "Talk About Live", "Nasty Piece of Work" e "One Man's Meat" (nesta última, uma surpresa : Ian Paice toca congas). Alguma coisa de blues em "Ramshacle Man", a torna razoável e "A Twist the Tale" prova que Ritchie Blackmore gosta mesmo é do Rainbow. "Anya" e "Time to Kill" são "de doer".
Outra coisa desagradável é que em quase todas faixas, o vocal do Ian Gillan é dobrado. Tudo bem, ele também tem todo o direito de envelhecer, mas que é chato, é. Ponto alto do disco : A capa. Trata-se de uma ilustração muito bonita. Estão vendo ? É mesmo muito triste comentar um novo disco do Deep Purple e chegar a conclusão de que o melhor de tudo é a capa.
Nos anos 1970, geralmente as capas eram simples, fotos ou desenhos dos membros da banda, mas o som que eles faziam... quanta diferença ! Nelson, eu tentei mas, infelizmente, não deu para fazer o gol, pois o Deep Purple deu um "bicão" na bola e ela bateu na bandeira do escanteio...
Quer saber da real? assistir jogo de
"masters" é "chato pacas". É bem melhor ver os tapes dos velhos jogos,
quando eles estavam no auge de sua forma".
E na mesma edição desse fanzine, eu escrevi outra resenha. Desta feita foi para analisar o lançamento de uma banda mais moderna, naquela atualidade de 1994.
Nessa segunda resenha, usei o pseudônimo de: "Tony Bauducco".
Tal determinação de minha parte teve uma razão de ser.
Com tal
escolha em usar um pseudônimo, eu quis criar um personagem literário para
interagir livremente, sem ater-me às amarras éticas que inibissem-me para
exprimir opiniões e ao mesmo tempo, fazer uma homenagem a um produtor e
músico (baixista, inclusive), que sempre admirei por sua atuação em
discos de artistas como, David Bowie, T.Rex, Gentle Giant e tantos outros
com os quais ele interagiu.
Foi no caso, Tony Visconti, um sujeito que produziu e atuou a tocar baixo em discos históricos, principalmente nos anos setenta.
Dessa forma, Visconti lembrou-me de seu concorrente no mercado brasileiro, o panettone Bauducco. Nasceu aí, o "italianão" e crítico de Rock, Tony Bauducco, que também é fanático por trilhas sonoras de filmes e TV, sobretudo se forem trabalhos de Ennio Morricone, capice?
E o disco em questão, foi, "America Must Be Destroyed", de uma banda
pesada chamada, "Gwar", que apesar de abusar das caracterizações
exageradas, só fez um pequenino sucesso naquela época, e bem limitado aos
Estados Unidos. Eis a transcrição do que escrevi:
"Um
bando de alienígenas invasores chegou à Terra há milhares de anos, bem
na Era Glacial, e agora que a camada de ozônio está sendo destruída,
eles se descongelaram e retomaram o seu maquiavélico plano de dominar o
nosso planeta. Fixaram-se em Richmond, estado de Virginia e
depararam com um problema muito comum entre nós, terráqueos: tinham que
trabalhar para sobreviver!
Sendo assim, encontraram apenas uma saída que lhes desse dinheiro sem que os terráqueos estranhassem a sua terrível aparência : formaram uma banda de Rock. Para facilitar, encontraram um terráqueo disposto e ajudá-los, se transformando em seu empresário e que secretamente é um traidor ambicioso que planeja usá-los para que ele consiga se tornar presidente dos Estados Unidos. Parece roteiro de ficção científica classe "B", mas na verdade, trata-se da mais sensacional invenção do Rock performático, desde o Kiss. Isso é o "Gwar".
No álbum, "America Must Be Destroyed", o Gwar apresenta o seu som contando essa hilariante estória, como se fosse uma autêntica história em quadrinhos. As influências são óbvias, pois embora na maior parte do tempo o Gwar tente soar com uma banda de Heavy-Metal beirando o Thrash-Metal, existem nítidas pitadas de Rock'n Roll anos 70 em seu trabalho.
Impossível fazer esse Rock-circense sem lembrar o Kiss, o magistral Alice Cooper (o "pai" do Rock-teatral), e até Frank Zappa, nos seus melhores dias de Mothers of Invention.
Como se não
bastasse a ideia bem bolada, o nível dos músicos é muito bom, o que
contribui para que a mensagem sarcástica desse projeto "acerte na
mosca". Fazia tempo que não pintava no Rock, uma banda performática/teatral tão divertida".
Tony Bauducco
Bem,
acho que exagerei bastante no meu entusiasmo, mais impressionado com as
caracterizações alienígenas dos membros da banda e toda essa embalagem
Sci-Fi infantojuvenil, pois a banda não era nada demais, aliás, era bem de menos...
A seguir, a transcrição do que escrevi:
"Burning in Water, Drowing in Flame" - Skrew
Há
um ponto positivo nesse primeiro trabalho do Skrew, que é justamente o
que o diferencia do trabalho de outras bandas do dito "Rock-Industrial",
ou seja, existem influências diversas (e até díspares entre si!), que o
tornam mais atraente do que seus similares. Como ser techno, sujo, pesado e neurótico, sem ser terrivelmente maçante?
Eis o grande dilema do Rock-Industrial e o Skrew parece estar achando uma saída. A banda é formada pele dupla de guitarristas e vocalistas: Adam Grossman e Danny Lohner, ex-membros da banda Hardcore Angkor Wat. Munidos de uma bateria eletrônica, trombaram com o produtor Phil Owen e com a providencial ajuda de Al Jougensen do Ministry, se trancaram no estúdio Trax de Chicago para gravar este álbum.
Segundo consta, as letras foram inspiradas em poemas de Charles Bukowski, mescladas com as experiências junkies do guitarrista Adam Grossman, daí a cota de paranoia certa que este gênero tradicionalmente exige.
Pontos positivos: As pitadas de influências "extra-industriais" citadas acima. Mais especificamente no belo solo de guitarra no final de Charlemagne, a boa linha de baixo em Gemini, o Rap quase explícito em "Poisonous" e o surpreendente dueto vocal em "Prey Flesh", que lembrou o genial Peter Hammill, da lendária banda progressiva dos anos 1970, Van Der Graaf Generator.
Pontos negativos: o assassinato do clássico "Sympathy For the Devil" dos Stones, uma grande idiotice, principalmente pelo vocal repugnante, a bateria eletrônica terrivelmente chata (não se trata de um paradoxo! Dá para ser "industrial", usando outros recursos da tecnologia).
Para
finalizar, uma boa notícia: para a tour de lançamento, serão
convidados: um tecladista, um baixista, um guitarrista a mais e dois
bateristas de carne e osso. Com isso, o "Skrew" só tende a ganhar.
Tony Bauducco
De
fato, eu fui bastante condescendente ao escrever mais essa resenha,
pois o tal do "Skrew" era na verdade uma bela de uma porcaria (para quem entende bem o idioma inglês, sabe que esta palavra, mesmo escrita dessa forma, com letra trocada, tem conotação dupla e denota uma grosseria, portanto espelhava bem a mentalidade desses sujeitos).
Mas esforcei-me para tentar enxergar algo positivo naquela panaceia indie e noventista. E não dá para não rir do final... juro que não escrevi para ironizar, mas beira o ridículo a afirmação de que ao vivo, o tal do "Skrew" contrataria tecladista, baixista, guitarrista e dois bateristas, ou seja, foi a constatação de que o "Skrew" não passava de um simulacro de banda, que gravou uma demo "meia-boca", com bateria eletrônica e na verdade não passou de um projeto metido a modernoso de dois guitarristas ruins de doer, egressos de uma cena ridícula e irrelevante.
Em resumo: Tony Bauducco como candidato ao prêmio Baden Powell de escotismo, na condição de "bom menino" do mês!
Foi pela metade de 1994 que chegou à minha sala de aulas, uma menina de origem oriental, chamada: Marina Mayumi Yoshie.
Extremamente simpática e comunicativa, em breve tornar-se-ia amiga minha e de todos os demais.
Mais que isso, Marina revelava o talento para as artes gráficas e em uma época onde a internet ainda não era extremamente popular como hoje em dia, Marina apresentava-se como webdesigner, por ter experiência para trabalhar em projetos gráficos de agências de publicidade.
De fato, por
apresentar tal habilidade, logo mostrou-se solícita para ajudar todo
mundo nesse sentido. Então, ela passou rapidamente a produzir filipetas e
cartazes para apresentações de várias bandas de alunos, seus colegas. Isso
seria um impulso para que dois anos depois, ela responsabilizar-se-ia pela
capa do CD do Pitbulls on Crack, e ao ir além, criar todo o projeto
gráfico do material de promoção. Sobre tal trabalho, está tudo contado detalhadamente no capítulo do Pitbulls on Crack.
Eu,
Luiz Domingues, a usar a camiseta com a logomarca de tal patrocinador,
em 1994, no Ginásio do Ibirapuera. Foto de Marcelo Rossi
Foi o seguinte: uma confecção orientada pelo "streetwear", passou a
patrocinar o Pitbulls on Crack nessa época e um dos sócios de tal
empresa, estava a administrar uma importadora de CD's, paralelamente e com um
pequeno escritório montado no Cambuci, bairro vizinho da Aclimação, onde
eu morava e ministrava as minhas aulas.
Sabedor de que eu tinha um grande número de alunos, esse rapaz pediu-me uma ajuda, para divulgar o seu negócio e como recompensa, ele ofereceu um desconto interessante que deixava o preço de qualquer CD, muito mais em conta do que nas lojas tradicionais.
Bem, por ser
simpático e claro que ao considerar o preço praticado convidativo, espalhei a
nova entre meus alunos e começou uma fase permeada por consultas e negócios a serem fechados. Durante semanas, o telefone de minha casa foi usado para
fazer encomendas, e durante as aulas, certamente.
Mas aí tal situação saiu do prumo, quando o rapaz passou a deixar de passar em minha casa para entregar os CD's dos meus alunos e amigos, por alegar falta de tempo e diante disso, eu fui obrigado a dirigir-me ao seu escritório.
Mesmo por ser perto e ser possível até ir a
pé, eu comecei a considerar um abuso da parte dele. Fora o fato de
que as vendas atingiram um certo vulto e dessa forma, passei a acumular
um volume razoável de dinheiro, o que passou a ser preocupante, pela
responsabilidade. Além de preocupar-me em
providenciar troco, eventualmente e sem ter conexão alguma com o negócio.
Bem, claro que o trilho descarrilou e eu parei de incentivar os meus alunos, amigos e agregados, ao dar por encerrada a atividade.
Da
parte do tal sujeito, ele perdeu um filão bom, pois chegava-se a vender cinquenta CD's
em um pacote de encomenda e todos importados, com valores significativos.
Fora
uma camaradagem de minha parte, na qual eu não pensei em obter vantagem
alguma, mas tornou-se um transtorno, devido à falta de bom senso, que no
linguajar popular fica caracterizada como "folga", "falta de
desconfiômetro", "ausência de semancol"...
O meu corpo discente era formado em sua maioria por representantes do sexo masculino, mas nessa época, eu tive várias meninas a estudarem comigo, também.
Lembro-me bem, desde 1991, estudava a Alcione Sana, que tinha a curiosa predileção por artistas dos anos sessenta (e claro que eu adorava isso!), depois chegou Monica Maia, esposa do Doutor Nelson Maia Netto. Em 1994, entrou Ediane e houve também, Silvana e Cristiane Leonardo Piovesan, mas estas, ficaram pouco.
Após a chegada de Marina Yoshie, outra que firmou-se com
regularidade, foi Paola Pelosini, ex-namorada de Paulo Thomaz,
baterista do "Centúrias", "Firebox", "Cheap Tequilla", "Baranga" e atualmente no "Kamboja".
Paola já tocava com desenvoltura quando buscou as minhas aulas e o seu objetivo foi aperfeiçoar-se. Eu não tive, portanto, muito o que ensinar-lhe, mas por conta de sua força de vontade em aprender, eis que ela permaneceu um bom período nas aulas, até 1996, aproximadamente.
Paola Pelosini a estudar e ser observada por outro aluno, Thiago Fratuce. Foto de 1996, em minha sala de aulas
Por ter envolvido-se no
mundo da música, ela conheceu pessoas ativas na produção
musical e assim emendou trabalhos interessantes, ao interagir como "road
manager" e assistente de produção para vários artistas.
Extremamente simpática e comunicativa, tornou-se amiga e por ter origem italiana, contava-me curiosidades sobre a Itália, onde costumava ir com regularidade, para visitar os seus avós na cidade de Perugia, distante cerca de sessenta Km de Roma. As nossas conversas extra-aulas sempre foram agradáveis nesse sentido, portanto.
Outra
garota que ficou um bom tempo em 1994, chamava-se: Carolina e também chamava a
atenção por ser muito nova e muito bonita.
Quando chegava e tocava a campainha de minha residência, por muitas vezes eu ouvia assovios de rapazes que passavam a bordo de carros ou motos na rua e que mexiam com ela, constantemente. Carolina tornou-se namorada do baterista do Pitbulls on Crack, Juan Pastor e eles permaneceram juntos por um bom tempo.
A foto acima, foi uma das primeiras que os meus alunos trouxeram-me via internet: Dr. Timothy Leary, figura emblemática da contracultura sessentista
Daí em diante, eles começaram a imprimir fotos que achavam na Internet, com imagens de ícones contraculturais os mais diversos e levá-las à sala de aulas e dessa forma, paulatinamente estas foram anexadas ao mural, que ficou pequeno e assim ao extrapolar a demanda, passaram a ocupar todas as paredes, doravante. Tornou-se uma tenda Hippie e não foi incomum que acendessem incensos, também...
Claro, fugiu um pouco do controle e vez por outra eu continha um pouco o ímpeto, justamente para não deixar que o propósito original desvirtuasse-se, ao perder-se o foco didático das aulas. Foi importante manter o padrão de qualidade das aulas a todo custo, evidentemente.
Eu, Luiz Domingues, na minha histórica cadeira do "professor", com a "mítica" esferográfica na boca, pronta para ser usada para anotações nos cadernos dos alunos, mas muitas vezes usada como "baqueta", para imprimir percussões que eu fazia, no afã de proporcionar uma sustentação rítmica aos exercícios que propunha aos alunos... quem foi meu aluno, sabe bem desse recurso prosaico que eu usava, mas que invariavelmente funcionava em seus propósitos didáticos...
Mas creio que mesmo em dias com certos excessos de euforia, protagonizados por até dezoito adolescentes dentro da sala, eu consegui controlar...
Alguns dos alunos e agregados das quintas, que por anos, frequentaram a histórica salinha da Rua Castro Alves...
A quinta-feira tornou-se o dia mais expressivo nesse sentido e quando o último aluno partia, às 21:00 horas, eu estava exausto!
Ao mudar de assunto, tirante aquela fase em que a minha sala de aulas tornou-se um balcão de vendas de CD's, por muitas vezes eu visitei lojas de discos, acompanhados de alunos e agregados.
Ao se parecer com uma verdadeira excursão escolar, tal prática fora quase uma atividade extracurricular. Além
da diversão garantida em levar esses garotos e incentivar a sua empolgação pelo
mundo dos discos, acho que essa prática ainda era uma atividade lúdica e
fundamental para quem gostava de música.
Quando penso nisso, confesso
que tenha saudade do tempo em que visitar uma loja de discos era parte
fundamental do processo, como o ritual de um verdadeiro culto à música.
Levei-os muitas vezes à histórica loja, "Nuvem Nove", que era uma das mais completas e aconchegantes de São Paulo e esta, a se revelar completamente fora do circuito da "Galeria do Rock". Muito bem localizada no coração do bairro do Itaim-Bibi, na zona sul de São Paulo, fora a típica loja montada por apaixonados pelo Rock e durante muitos anos, teve como funcionários, verdadeiros especialistas no assunto.
O jornalista, Bento Araújo, editor da Revista Poeira Zine
Outro ex-funcionário da Nuvem Nove, o crítico de cinema e expert também em Rock, e música em geral, Sérgio Alpendre
Um exemplo, foi o
jornalista Bento Araújo, o editor da genial revista, "Poeira Zine", que
eu conheci ali na Nuvem Nove e também o crítico musical e
cinematográfico, Sérgio Alpendre.
A presença de muitos jornalistas, músicos famosos e colecionadores de discos com conhecimento enciclopédico sobre o assunto, fez da "Nuvem Nove", uma loja muito prazerosa para ser frequentada. E de fato, ali, por muitas vezes, eu conduzi a minha tropa de Neo-Hippies, que fez grandes compras e absorveu as conversas das pessoas ali presentes, nas animadas rodinhas, onde o assunto era sempre o Rock, principalmente das décadas de 1950, 1960 & 1970.
Isso sem contar a mega simpática presença de seus donos, Zé Carlos & Julia, igualmente dotados de conhecimentos enciclopédicos sobre a história do Rock e que muito apoiaram a Patrulha do Espaço, na época em que fui componente anos depois, com patrocínio pontual em várias campanhas de divulgação.
Outra
loja onde levei-os várias vezes, foi a "Gramophone", também ali no mesmo
bairro (Itaim-Bibi, zona sul de São Paulo). Essa, era
mais sisuda, e com linha mais tradicional de loja com padrão de shopping center
e público não Rocker. Mas o seu acervo era
bom e os preços interessantes.
Eu só tive um pequeno problema na Gramophone, uma vez. Quando entrei com esse bando de garotos, o gerente incomodou-se e eu notei que ele instruiu os funcionários para ficarem atentos.
Certamente temera por furtos e/ou vandalismo, por puro preconceito, mas não senti-me ofendido. Até entendi a posição dele, com a sua temeridade velada e como não passou disso, não tenho nada para queixar-me. E ao final de nossa visita, certamente que os seus temores devem terem tornado-se um grande alívio, pois os meus alunos e agregados fizeram uma boa compra e o caixa da loja "tilintou" muitas vezes naquela tarde.
Por fim, particularmente eu ficava muito
contente por vê-los a comprarem grandes álbuns, de grandes bandas. Foi um
reforço extracurricular e tanto para eles.
Foi obviamente uma molecagem do bem! Marcelo Bueno foi o grande campeão de 1994, com o "professor" que aqui vos escreve, a ficar com o vice-campeonato. Fernando Minchillo ficou em terceiro lugar, com Marcos Martines no 4° lugar. Rodrigo Hid terminou em 5°. Ricardo Garcia em 6°, Thiago Fratuce em 7° e Alexandre "Leco" Peres amargou a lanterna, no 8° lugar.
Edil
Postól, Junior Peloso e tantos outros não participaram por motivo de
incompatibilidade de agenda, mas em 1995, o campeonato foi mais robusto,
com mais alunos a participarem.
E assim, sob a euforia de um campeonato juvenil e absolutamente galhofeiro, ainda que no limiar, levado a sério na hora da disputa, eu encerrei o ano de 1994 em minha sala de aulas, com a boa perspectiva de que em 1995, esse bom astral não só permaneceria, como teria tudo para amplificar-se.
Aliado a isso, os bons ventos que
sopravam para o Pitbulls on Crack, também ajudou-me a prever uma onda
de boas novas para 1995 e a minha sala de aulas com os meus alunos,
faziam parte disso, certamente.
O futebol sempre animou a minha sala de aulas, sem dúvida...
Ao aproximar-se
o final de ano, além do campeonato de futebol indoor, que produziu muita euforia na minha sala de aulas, as atenções
voltavam-se às crescentes apresentações das bandas dos alunos, em que uns
apoiavam os outros e isso foi muito bom, sem dúvida alguma.
E
nesse processo, eu ficava muito contente, por que além do conceito de
ajuda mútua, que eu achava positivo, houve a natural expansão que o élan
em ver uma banda ao vivo, causava. Quem ainda não tinha uma
banda, ficava estimulado para ter uma, e isso incentivava-os a estudarem mais
e melhorarem o seu desempenho ao instrumento, por uma consequência natural.
Cali Keller a descer de seu carro, e Alexandre "Leco" com o seu cão, na porta de minha residência. Foto de 1996
Outro aspecto muito
bom que eu valorizava, fora o de haver essa mobilização toda e que
inevitavelmente, trazia elementos agregados. Muitos amigos dos
amigos, namoradas e primos dos alunos, envolveram-se,
para engrossar assim, o meu crescente "exército Neo-Hippie". Em um futuro não
muito distante, essa tropa, ajudar-me-ia em diversas ocasiões e
circunstâncias.
Ao
final de 1994, um novo aluno entrou, motivado ao extremo, chamado: Ricardo Schevano.
Marcelo
Bueno, Ricardo Schevano e Marcello Schevano, posicionados da esquerda
para a direita, em foto de 1996, na minha sala de aulas
Entre muitos que mantinham essa característica, Ricardo
chamou-me a atenção desde a primeira aula, pois mesmo por ser ainda muito jovem,
ele continha uma força de vontade incrível e sobretudo, a convicção de que
queria ser um músico profissional, e um Rocker, sem sombra de dúvida.
Agregado às suas aulas, ele trouxe desde o primeiro dia o seu irmão caçula, que na verdade era ainda maior que ele em tamanho físico, um garoto chamado: Marcello Schevano.
E idem,
este também demonstrava um talento extraordinário, como guitarrista. Com
apenas quinze anos de idade, ele já fazia solos com grande desenvoltura e eu
notei uma característica sua, que reputei ser incrível: por assistir as aulas de seu
irmão, Marcello ficava quieto a observar o que eu ensinava ao Ricardo e quando
surgia uma brecha, eu o flagrava a pegar o baixo e a executar tudo o que eu
ensinara ao Ricardo, com precisão total...
Ficava claro que ele continha
um ouvido musical excelente e de fato, ao longo dos anos posteriores,
1995, 1996 e 1997, eu só pude comprovar o seu crescimento vertiginoso, até
que em 1998, ele estivesse a tocar comigo no Sidharta e a partir de 1999, tornar-se-ia um membro da
Patrulha do Espaço, junto comigo e Rodrigo Hid.
Nessa época, os
irmãos Schevano, mantinham uma banda, que durou até meados de 1997 e que chamava-se: "Essex".
Esse nome era oriundo do nome do edifício
onde eles moravam e tinham como vizinho, o baterista, Marcelo Burani,
este, um sobrinho de Diógenes Burani, ex-baterista da Gal Costa e da banda Moto
Perpétuo (em que o Guilherme Arantes foi tecladista).
O baterista do "Essex", e agregado de minhas aulas, Marcelo "Always" Burani
E para fechar
tal banda, o outro guitarrista e vocalista, foi Toni Peres Rodrigues,
irmão do meu aluno, Alexandre Peres Rodrigues, popular "Leco". Enfim, os irmãos Schevano foram aparecer na minha sala de aulas, por essa conexão do Alexandre, meu aluno e com o apoio do Toni.
Claro,
a banda inteira passou a frequentar a minha sala de aulas com
regularidade e tornamo-nos amigos. O auge dessa amizade deu-se
quando convidaram-me a produzir uma fita demo, que gravariam em 1997
(fato amplamente relatado no capítulo dos "Trabalhos Avulsos").
E através dos irmãos Schevano, um aluno novo, apelidado como "Jamé", apareceu em dezembro de 1994, também e dois anos depois, eu ministrei aulas para o seu irmão, o "Jamézinho". 1994 encerrou-se com o clássico Futebol Indoor e 1995 prometera!
Continua...
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