A euforia pelo campeonato de futebol "indoor", realizado no ano anterior, gerou uma outra expectativa quando alguém sugeriu que realizássemos também um campeonato de futebol de botão.
Apesar da maioria dos meus alunos já ser constituída por membros da "geração vídeo-game", a ideia do velho botão, os contagiou. Não recordo-me ao certo, mas acredito que a ideia tenha partido do Ricardo Schevano, mas pode muito bem ter sido autoria de Marcelo Bueno, ou mesmo, Edil Postól, todos entusiastas do jogo.
Infelizmente, nunca conseguimos realizá-lo, por absoluta falta de tempo para organizá-lo e sobretudo por falta de espaço, pois ao contrário do futebol indoor, onde fora inevitável o confronto um-a-um, pensamos que em um campeonato de botão, seria mais prático realizarmos vários confrontos simultaneamente, e desta forma, precisávamos de espaço e mais tablados. O meu velho "Estrelão" esteve a postos, mas precisaríamos de mais "campos", para tal empreitada.
Mas o grande evento do primeiro semestre de 1995, foi mesmo o "Dominguestock", que ocorreu em abril daquele ano.
Quando a ideia surgiu, por volta de fevereiro, causou rebuliço na minha sala de aulas e seria muito lógico que assim se procedesse.
Foi o
seguinte o que aconteceu: surgiu a ideia para realizarmos um mini-festival com três ou
quatro bandas de alunos, a abrirem um show do Pitbulls on Crack, que realizar-se-ia em abril, no Black Jack Bar.
Tal data
foi um arranjo conseguido pelo presidente do fã-clube do Pitbulls on
Crack, Jason Machado, para comemorar o aniversário da entidade por ele presidida e que apoiou totalmente a ideia de que pudesse alojar algumas bandas
de meus alunos na programação, ao conferir-lhe um ar de festival.
A proposta foi ovacionada pelo meu "exército teen", que imediatamente abraçou a ideia, ao dar-me a certeza que o apoiariam integralmente e não só moralmente, mas inclusive a empreenderem esforços pessoais para fazer do evento, um sucesso.
Mais que um recital
tradicional de conservatório musical, seria um verdadeiro show de Rock,
com as bandas escolhidas a terem a chance para mostrarem os seus respectivos
trabalhos, em uma casa tradicional do Rock paulistano, ainda que pequena
em suas instalações.
Claro, no imaginário deles, aquela oportunidade soara como se estivessem programados para tocar no "Marquee Club", de Londres.
Neste caso, eu reportava-me às minhas próprias lembranças pessoais, e ao colocar-me no lugar deles, pensava no quanto teria sido maravilhoso se a minha banda inicial na carreira, o "Boca do Céu", tivesse tido um convite desses em 1976 ou 1977, para tocar em micro-festival, para abrir uma banda com pequeno ou médio porte daquela cena setentista, na proporção que o Pitbulls on Crack representara para os anos noventa.
Com esse entusiasmo todo da parte deles, eu soube de antemão que o show seria um sucesso de público, pois é claro que todos apoiariam, e motivariam o máximo de pessoas, cada um, a comparecerem. Isso sem contar o esforço de divulgação com os meios tradicionais, ou seja, cartazetes e filipetas que ajudariam a distribuir.
E assim, esse foi o assunto principal de minha sala de aulas, nesse período. Ao
mesmo tempo em que eu estive contente por ver essa euforia, preocupava-me
contudo, um aspecto: quais bandas eu escolheria, sem melindrar os
preteridos? Boa pergunta...
Claro, houveram disparidades. Cada banda continha um nível, por estarem em patamares diferentes. Eu não poderia escalar uma banda sem condições técnicas mínimas, é lógico.
Pelo ponto de vista da estética, foi óbvio que eu
preferia ter escolhido bandas com características, 1960 & 1970, mas naquele instante, isso não foi possível, infelizmente. As bandas que
mantinham essa característica, não estavam estruturadas adequadamente na
ocasião e dessa forma, eu tive que escalar duas bandas orientadas pelo som pesado, a
contragosto. Claro, independente de gostar ou não da estética, foram bandas de alunos e seriam bem-vindas pelo fator da amizade.
O meu aluno, Alexandre "Leco" Peres Rodrigues, baixista do "Eternal Diamonds" na ocasião e há muitos anos, líder do "Klatu"
Nesses
termos, a primeira banda que eu confirmei e gostei muito de poder contar com a sua
participação, foi o "Eternal Diamonds". Os rapazes tinham bastante
influência 1960 & 1970, mas não tratava-se exatamente de uma banda vintage,
explicitamente a falar.
Tanto que apesar de possuir belas passagens psicodélicas e progressivas em sua música, o Eternal Diamonds continha uma clara aproximação com o Heavy-Metal oitentista. Nesse caso, o Eternal Diamonds fora a minha melhor e mais animadora aposta entre as bandas de alunos que participariam do Festival.
O guitarrista & vocalista, Rodrigo Hid,
mostrava um talento nato impressionante, por considerar-se a sua pouca
idade, tanto a tocar, quanto no cantar. O meu aluno, Alexandre
"Leco" Peres Rodrigues, já tocava com desenvoltura nessa época, com
quase três anos de aulas comigo e apresentava uma capacidade de criação
muito peculiar, muitas vezes a percorrer caminhos que desafiavam a
lógica cartesiana, e de fato, na vida madura, ele fez dessa
característica pessoal, o seu principal trunfo na criação do material da
sua atual banda, que lidera há muitos anos, o "Klatu".
E o baterista, Fernando Minchillo, também segurava bem o ritmo, apesar da pouca idade e inexperiência. Portanto, no cômputo geral, tal banda fora de fato a minha maior esperança entre as bandas de meus alunos.
Outras bandas que eu gostaria que participassem, estavam desarticuladas naquele momento, por vários motivos, infelizmente. Por isso, na hora da escolha, eu não tive outra alternativa a não ser escalar outras duas bandas mais pesadas.
A primeira delas foi o "Parental Advisory", do meu
aluno, Ricardo "Pijama" Garcia. O Ricardo Garcia era um garoto extremamente elétrico, literalmente, com uma energia juvenil impressionante,
manifestada desde a sua primeira aula, realizada em 1993.
A sua banda era peso-pesado, na seara do Heavy-Metal extremo, com seu material cantado em inglês e com todos os maneirismos agressivos de tal estilo.
Não era do meu gosto pessoal, pelo contrário, era avesso a tudo o eu que aprecio, mas na falta de outras opções mais condizentes com o meu gosto pessoal, não tive muita escolha, pois a banda estava ensaiada e segundo o Garcia, muito empolgada para participar do mini-festival.
Ora, como não entusiasmar-me também por esse aspecto, estética e ideologia a parte? Então, o Parental Advisory foi confirmado e eu tinha a certeza de que os seus componentes colaborariam ao máximo com a divulgação e de fato, não decepcionei-me com eles, nesse aspecto, posteriormente.
Faltava uma banda a ser escolhida. Demarquei um tempo para fazer tal escolha, para esperar que alguma banda menos agressiva articulasse-se a tempo. A
banda de meu aluno, Cali, só tocava covers, infelizmente. Eu queria que
eles tocassem, mas covers, a despeito do repertório ser ótimo e recheado
por clássicos setentistas excelentes e bem tocados, destoaria do espírito. Eu
queria acima de tudo, trabalhos autorais.
Carlos Fazano, amigo e agregado das minhas aulas e que ainda não havia formado o "Supernova", em 1995
Cheguei a pensar no amigo, Carlos Fazano, também, mas ele ainda dava os primeiros passos para articular uma banda, a se mostrarem muito incipientes. Ele não montaria uma banda a tempo, de forma alguma.
Marcelo Bueno, que infelizmente ainda não tinha a sua banda articulada, nessa época.
Mesmo caso do Marcelo Bueno, que empreendia os primeiros esforços para montar o "Soulshine", o embrião primordial do "Tomada".
Enfim, eu esperei
até o último segundo e quando não havia mais tempo hábil, tive que
optar definitivamente em prol da terceira banda escolhida e assim
procedeu-se com o "Equinox".
Nesses termos, claro que escolher o Equinox para o festival, significara uma questão de lógica. Todavia, o som deles não agradava-me nem um pouco.
Em audição de sua
demo, eu já sabia que a linha adotada por eles era o Heavy-Metal oitentista, gênero
que eu nunca gostei e naquela altura dos acontecimentos, metade dos anos
noventa, eu havia perdido o último laço de tolerância que detinha com tal estética, que fora "o
fator em voga" com o qual o tolerei nos anos oitenta.
Se na década de oitenta, eu tive que engolir o Metal, tal como engolimos o treinador Zagallo, nesse novo instante, não havia nem esse fio tênue de resignação forçada pelas circunstâncias que ligasse-me com esse gênero, que não aprecio, em via de regra.
Enfim, não pelo meu aluno, que era super gentil, tampouco pelos companheiros dele, que eu só conheci no dia do festival, eu realmente não tive outra opção e creio que já expliquei bem os motivos e o contexto da ocasião.
Nesse
ínterim, a garotada estava toda empolgada e foi uma fase dentro de
minha sala de aulas, onde essa euforia foi contagiante.
Paralelamente, contamos com o apoio do fã-clube do Pitbulls on Crack, que na pessoa do seu fundador, Jason Machado, interagiu fortemente com os meus alunos e nessa parceria, um esforço de divulgação do festival foi feito e que reputo ter sido fundamental para o seu sucesso.
Sob o ponto de vista
do Pitbulls on Crack, a história desse evento está amplamente relatada
no seu respectivo capítulo, dentro da mesma cronologia coincidente. Tentarei agregar algo a mais, dentro do espírito deste capítulo, que versa sobre os meus alunos e o seu universo inerente.
Através dessa euforia a estimular-nos como combustível, claro que a mobilização foi total para fazer do evento um sucesso total. Mesmo os que não estiveram envolvidos diretamente com as bandas dos alunos escalados, trabalharam fortemente para tal sucesso.
Distribuíram filipetas, fizeram "boca-a-boca" para convidar amigos, parentes, colegas de escola, vizinhos, namoradas etc. No
dia do show, fiquei muito contente com a aglomeração incrível que fez-se na porta do "Black Jack Bar".
Lembro-me por ter saído à rua em um determinado momento e ter cumprimentado diversos pais de alunos, outros alunos e agregados em geral.
A fila na rua, estava enorme com a porta do bar ainda fechada e os funcionários da casa mostravam-se eufóricos, pois não esperavam um público tão grande, por subestimar o evento, antes de ver aquela aglomeração na porta, que inclusive suplantara e muito o movimento normal da casa, naqueles tempos decadentes em que viviam.
De fato, o movimento com mais de quinhentas pessoas presentes, foi inacreditável, até para as minhas mais otimistas expectativas. A parte do show em si, com todos os pormenores desde a caótica passagem de som, eu já relatei no capítulo sobre o Pitbulls on Crack.
De fato, aborreceu-me a postura agressiva dos membros do Equinox, ao culpar-me indevidamente por atrasos. Isento o meu aluno, Luiz Nannini, que inclusive ficou bastante constrangido com o comportamento de seus colegas, por terem sido grossos comigo, acintosamente.
Fora o fato de que tal indisposição motivou um ato abominável de insubordinação da parte deles, ao passar da conta, muito além do horário combinado para apresentarem-se. O set deles foi realizado com uma hora e meia, praticamente e além desse ato descortês com os demais, o som da banda era maçante, com aquele heavy-metal defasado e sem nenhum atrativo, por mínimo que fosse, que justificasse a presença deles no evento.
O meu aluno desculpou-se pelo comportamento horrível de seus companheiros, no próprio dia e durante o decorrer das suas aulas posteriores que avançaram até meados de 1996.
Bem, foi mesmo um erro escalar tal
banda e eu nem suspeitava que os outros elementos da banda tivessem tal temperamento, pois o meu aluno não era assim, certamente.
Ricardo "Pijama" Garcia, baixista do "Parental Advisory"
Quanto as
demais, claro que o show do "Parental Advisory" arrancou risos da plateia
pelo contraste hilário que o seu vocalista proporcionou.
Ele grunhia
dentro daquele tipo de vocalização típica do Metal extremo, mas quando conversava
com o público, entre uma música e outra, a sua voz mostrava-se quase sob o registro
feminino, fina e aguda, o que provocava risadas. Tive a oportunidade de testemunhar a manifestação de um pai de aluno, que foi espontânea e hilária, ante a apresentação dessa banda: -"que merda"... repetiu várias vezes esse senhor que suava aos píncaros.
Já
falei tudo sobre o "Eternal Diamonds", no capítulo do Pitbulls on Crack.
Na minha lembrança, foi a melhor banda da noite e da qual provocou-me a sensação de orgulho. Fora
disso, o que posso acrescentar, creio que foi mesmo a euforia na casa,
com aquela superlotação e mesmo com todas as adversidades de um estabelecimento
sem infraestrutura, o evento foi um sucesso.
Para o Pitbulls on Crack, creio que esse show não acrescentou nada, artisticamente. Se houve um dividendo, creio ter sido o da bilheteria graúda, mas em proporção ao tamanho da casa, nem tanto assim, por considerar-se que a casa arrecadou grande parte dessa féria e um pouco de exposição midiática, principalmente pelo "tijolo" que saiu publicado no "Jornal da Tarde".
Para as bandas dos meus alunos, foi grandioso, sem dúvida, talvez menos para o Equinox que tocou com um sentimento ruim, graças ao mau humor de seus componentes, indevidamente contrariados por problemas de produção que foram inevitáveis e sendo assim, mais preocupados em provocar retaliações sem o menor cabimento.
Para as minhas aulas, foi um marco, sem dúvida. Essa
euforia disparada, alimentou uma motivação muito forte nos meses
subsequentes e que inevitavelmente abriu a possibilidade para produzir-se
uma nova versão do festival com outras bandas e o mesmo objetivo. Infelizmente, nunca mais houve uma oportunidade igual e o "Dominguestock", jamais repetiu-se.
Pena mesmo! Tenho uma cópia em VHS dos melhores momentos de cada banda e do Pitbulls on Crack. Já digitalizei tudo e futuramente, esse material será disponibilizado na Internet.
Creio que todos os envolvidos gostarão de rever e possuir essas imagens disponibilizadas na Internet e alguns que hoje em dia construíram carreiras musicais significativas, certamente despertarão a atenção do público, que gostará de vê-los tão novos, a tocarem em suas primeiras bandas de garagem.
E a vida seguiu na minha sala de aulas, nessa quase metade de 1995.
A esperança de uma nova investida nessa área instaurou-se, mas eu tratei de não fazer disso algo obsessivo, para não vender uma falsa esperança, mas também para não perder o foco principal dentro de minha sala de aulas, que seria, obviamente, a aula em si.
Para sair completamente desse assunto, faço uma pausa para contar duas traquinagens que alguns alunos meus aprontaram e mesmo ao conceder o desconto de que eram adolescentes e ainda com muitos impulsos infantis, certamente. Portanto, vou omitir as suas identidades para evitar constrangimentos, visto tratarem-se de homens maduros, hoje em dia. Contudo, eu não poderia perder as histórias, mesmo que sejam escatológicas, deselegantes e bem nojentas, até...
Na primeira, eis que um aluno meu chegou para realizar a sua aula, certo dia com um álbum de fotos em mãos. Ele pediu-me para fazer uma ligação de meu telefone e foi quando eu ouvi que ligou para o escritório do "Guiness", o famoso livro dos recordes.
Quando terminou de
falar com o atendente, o aluno explicou-me enfim a situação: ele queria que eu
guardasse um álbum com fotos e os seus respectivos negativos, pois a sua mãe mantinha o
costume de revistar os seus armários e gavetas e tal descoberta seria
muito constrangedora.
O atendente de tal organização, contudo, disse-lhe que só poderia mandar um inspetor para conferir a autenticidade do "fenômeno", daí a três dias. Ora, como seria possível, se o material já estaria a boiar no esgoto, provavelmente há muito tempo?
Desanimado, ele notou que a sua proeza não poderia ser comprovada pelo Guiness, mas mesmo assim, tentou.
E o material registrado nas fotos? Bem,
o que posso dizer, é que fora algo monstruoso, impressionante mesmo e
que certamente faria a cobra "Anaconda" ter uma crise de baixa
autoestima.
O outro caso escatológico que eu vou contar, foi ainda mais hilário, no
sentido de que revelou-se um plano premeditado e diabólico.
Ocorreu que um
dia, tocou a campainha de minha residência em um horário pelo qual eu não esperava
nenhum aluno. Quando fui ver quem era, verifiquei ser um aluno e o
guitarrista de sua banda, agregado de minha sala de aulas e meu amigo,
também.
Estavam ambos eufóricos e queriam contar-me algo que pareceu ser algo hilariante. E o foi mesmo, ainda que abominável...
Bem, preciso retroagir, pois o momento em que apareceram na minha casa, foi na verdade, imediato ao ato que perpetraram com a sua travessura, no entanto, houve uma longa preparação prévia para tal.
Esse meu
aluno arquitetou um plano maquiavélico que começou um mês antes, em sua
residência. Ele defecara dentro de uma caixa de papelão, dessas ornadas
para abrigar presentes de aniversário.
Ele guardou então esse material insalubre dentro de um compartimento inacessível para as investidas de sua mãe ou empregadas domésticas e esperou por um mês inteiro, até iniciar a fase "B" de seu plano.
Depois disso, contou-me que recolheu a caixa e
ao verificar o estado de seu interior, haviam larvas a rastejarem-se, sob um
autêntico cenário Dantesco...
Então, ele lacrou a caixa com aquele material infame em seu interior, e revestiu-a com um papel de embrulho para presentes, para também acrescentar o requinte da crueldade pela premeditação, ao escrever um lacônico cartão de parabenização.
Chamou o seu amigo a seguir, com o qual
quis compartilhar o momento sublime de sua galhofa e este, aceitou de
pronto a cumplicidade do ato. Então, ambos subiram a minha rua, que era
uma ladeira muito íngreme e cerca de três quarteirões acima, próximo a
uma padaria famosa do bairro, eles tocaram a campainha de uma residência e
deixaram a caixa sobre o muro.
Os meninos comemoravam o êxito da operação, com gargalhadas descomunais, quando um rapaz bem mais jovem que a senhora, apareceu apressadamente vindo de dentro da casa, com a tampa da caixa em mãos e a exibir um olhar furioso.
Nesse momento, os garotos saíram rapidamente a disfarçarem e foram direto para a minha casa, com o intuito de contarem-me sobre a sua performance. Claro
que eu ri muito da travessura, mas no alto de meus trinta e cinco anos de idade na
ocasião, ponderei o quanto eu ficaria indignado se a campainha de minha
casa tocasse um dia e um presente desses fosse deixado para a minha
mãe. Enfim, essa história foi tragicômica.
Nesse dia, confesso que fiquei preocupado, pois a brincadeira excedeu-se bastante e o rapaz ficou sufocado. Claro que a pilhéria parou na hora, mas durante alguns minutos, cogitei levá-lo ao pronto-socorro.
Felizmente, ele recuperou-se e nada mais
grave aconteceu, contudo, ao lidar-se com adolescentes, é claro que coisas assim
poderiam acontecer a todo instante e nesse caso a minha responsabilidade seria zelar
pela integridade de todos, ainda que achasse sadio o clima de amizade
estabelecida e que tornava as minhas aulas muito mais agradáveis do que
qualquer aula de música tradicional, em conservatórios sisudos.
Lógico que eu tenho consciência de que esse caráter mega liberal, era atraente para eles, mas não nunca houve maquiavelismo de minha parte, no sentido de querer deliberadamente angariar mais clientela com isso.
Eu apenas achava que era muito mais agradável para todos, que as aulas fossem assim despojadas e houve um elemento implícito, nessa determinação. Com aquela balbúrdia instaurada, as aulas não paravam um só instante, isto é: o aluno que estivesse em seu horário, não parava de estudar e prestar atenção nas minhas orientações e a despeito disso, foi um tremendo teste de percepção musical pelo qual submetia-se.
Se o aluno
conseguia absorver a aula sob tais condições, estava preparado para tocar
em qualquer circunstância e de certa forma, uma didática absurda
dessas, assemelhara-se a exercícios de aulas de teatro e também de
cursos de rádio e TV ministrados em faculdades, em que testes de percepção dessa proporção são propostos para desenvolver os sentidos.
Todavia, eu sempre os alertei que a minha experiência com esse tipo de associação coletiva, nunca fora positiva, inteiramente. Dessa forma, como tratava-se de algo de um porte muito menor, com bandas iniciantes e formadas por amigos entre si, a ideia da ajuda cooperativa, pareceu válida e na minha boa vontade por alertá-los sobre os aspectos negativos das ditas "cooperativas", não poderia de forma alguma desestimulá-los, pois no cômputo geral, a intenção deles, foi excelente.
Sobre o final de 1995, nenhuma outra ocorrência importante dessa época desperta-me a atenção. Os últimos meses foram marcados pela rotina e normalidade.
Talvez uma única menção tenha que ser dada ao fato de que muitos alunos meus foram ao festival "Monsters of Rock", de 1995, e um curioso souvenir foi parar na minha sala de aulas, por conta desse show.
Ocorre, que nesse dia, além do "Ozzy Osbourne", "Page & Plant" (meio Led Zeppelin) e "Black Crowes" (isso sem mencionar as atrações peso-pesado e os "indies", irrelevantes), apresentou-se também o "Alice Cooper".
Em meio as clássicas encenações típicas de um show da "tia" Alice, notei que em um dado instante, muitos "frisbees" foram arremessados por ele mesmo em pessoa, além de músicos de sua banda de apoio, e roadies.
Eu estava instalado na arquibancada lateral e de longe, foi possível verificar tratarem-se apenas de frisbees de plástico, nas cores verde e amarelo, provavelmente uma tentativa de fazer menção ao Brasil e agradar assim ao público tupiniquim.
Na quarta-feira posterior ao show, eis que eu vejo que um aluno
meu aparece na sala de aulas com um objeto desses, em mãos. Na verdade,
além do disco de plástico (bem vagabundo e provavelmente adquirido às pressas na
Rua 25 de março), havia uma foto do Alice Cooper, grotescamente recortada
e colada, certamente mediante o uso de cola escolar.
Eu posso imaginar os membros da produção do Alice Cooper a realizarem essa tarefa nas coxas, literalmente, e de certo por alguém ter sugerido de última hora o arremesso desses objetos, a insistir para haver algo "personalizado", como a foto da Tia Alice.
Bem,
o aluno em questão que pegou um desses, foi o Ricardo Garcia e lógico,
ele chegou em minha sala de aulas a contar a história aumentada e valorizada, ao alegar que aquele
frisbee em específico, saíra das mãos do próprio Alice Cooper, que este o mirara
do palco e que ele (Garcia), havia feito um salto impressionante para vencer a
concorrência que também o ambicionava... enfim, bravatas juvenis e divertidíssimas...
Em 1988, lembro-me de haver encontrado o meu aluno, Cesar Cardoso, nas dependências da casa de espetáculos "Projeto SP", onde o Jethro Tull apresentou-se pela primeira vez no Brasil.
Esse ticket do show do Uriah Heep, acima, não é meu, mas achei-o na Internet apenas para ilustrar. Fui no show do sábado (8 de julho), e fiquei no mezanino da casa.
No ano de 1989, encontrei, Flavio Sozigan, no Olympia, na saída do show do Uriah Heep. Fora a primeira vez que o velho Heep viera ao Brasil, também.
Em 1992, foi a vez para encontrar-me com Cali Keller no Olympia, no show do Ian Gillan. Foi a segunda vez que o vocalista do Deep Purple, passara por aqui, em show solo.
Ainda no ano de 1992, lembro-me de ter encontrado muitos alunos e nem vou nomeá-los, nos shows do Black Sabbath, no Olympia e também no pequeno estádio de atletismo do Ibirapuera.
Em
1993, encontrei alguns no show duplo, com Little Richard e Chuck Berry, no
estádio do Pacaembu.
Um desses alunos, deu um "show" na arquibancada, pois estava tresloucado. Quando um sorveteiro ambulante passou a oferecer picolés, ele enfiou a mão na geladeira portátil de isopor do rapaz e apanhou vários cubos de gelo, alguns inclusive, de um tamanho razoável, e sem cerimônia, passou a arremessá-los a esmo para baixo. Não jogou com força, mas claro que deve ter machucado alguém que estava sentado nos degraus abaixo.
No meio do show do Little Richard, em uma pausa entre duas músicas, ele soltou um berro alucinado que o estádio inteiro ouviu, a insultar o artista, gratuitamente. Foi engraçado, é claro, mas muita gente deve ter incomodado-se com a afirmativa dele, ao dar conta de que Little Richard seria: "uma bicha louca"...
Detalhe contraditório: o meu
aluno adorava o Little Richard e fez isso por pura brincadeira, típica de
sua pouca idade e energia infantojuvenil a explodir com os hormônios.
E há mais histórias sobre shows & afins...
Em 1994, durante uma das edições do Festival "Hollywood Rock", lembro-me de ter ido com diversos alunos e entre eles, ter encontrado-me com Edil Postól e sua esposa, Marilu, na entrada do estádio do Morumbi.
O nosso foco foi assistir o show solo de "Robert Plant" e também o "Aerosmith", mas no meio do caminho houve o "Sepultura", que não era uma atração que apreciávamos. Ele e a esposa foram para a pista, e eu e outros amigos, fomos para a arquibancada.
Na saída, um ex-aluno meu, que estava junto, "do nada", protagonizou uma cena insólita e que quase colocou-nos em perigo iminente!
Já estávamos dentro do meu carro a evadirmo-nos das imediações do estádio no pós-show, quando ele abriu a janela subitamente e aos berros, insultou um grupo de fãs do Sepultura, que caminhava em silêncio pela Avenida Morumbi, rumo ao ponto de ônibus. E o fez mediante o uso de um trocadilho infame, daqueles que são cantados em estádios por torcidas uniformizadas.
Bem, na
hora, vários "headbangers" retrucaram com xingamentos e vários postaram-se a correr, no intuito em alcançar-nos para uma provável retaliação física, além de
outros que procuraram por pedras e/ou outros artefatos no chão, para efetuar arremessos ao meu
carro.
O ato tresloucado e impensado poder-nos-ia colocar em profunda dificuldade, pois se houvesse um engarrafamento depois da próxima curva, seríamos alvo fácil da fúria desses ultrajados headbangers e de certa forma, sob uma espécie de "ética das ruas", digamos assim, eles estiveram certos em cobrar-nos uma satisfação.
Ninguém que estava no carro naquele momento, aprovou essa insanidade da parte desse meu aluno e ficou um clima constrangedor dentro do automóvel, dali até o fim da jornada em minha casa, em que cada um pegou o seu carro e foi embora, mal a proceder uma despedida formal em relação ao praguejador impulsivo e imprudente.
Esse ex-aluno já era adulto e ao aproximar-se da casa dos trinta anos nessa época, portanto,
o seu ato não teve nem o respaldo compreensível de ter sido cometido pela pouca idade,
no arroubo da adolescência.
Enfim, foi mais uma loucura cometida em dia de show, e com a presença de alunos.
Acima, um vídeo do show do "Yes" em São Paulo, que eu assisti em 1994
Um comboio foi organizado com a saída marcada para a minha
casa, e o casal Monica e Nelson Maia Netto foi colocado no carro de um
ex-aluno meu.
No caminho, os perdi de vista, por conta de uma mudança
súbita de rota que o meu ex-aluno resolveu assumir. Já estávamos
nas dependências da casa, poucos instantes antes do show começar, quando vi o
casal a entrar no recinto, esbaforidamente. O que houve?
De fato, o motorista do carro mudou o caminho e desgarrou-se de nosso comboio, por pura distração. E com tal mudança de rota, foi parar em uma avenida que dava acesso ao bairro de Pinheiros, quando em nosso caminho, dirigíamo-nos à Lapa. São bairros razoavelmente distantes um do outro.
Como se não bastasse o atraso, quanto mais atrapalhava-se com o caminho errado, mais nervoso portou-se e quase cometeu uma colisão, com direito a discussão ríspida com o motorista do outro carro envolvido.
Enfim,
apavorados, Maia Netto & Mônica pediram para descer do carro e concluíram o
percurso, mediante o uso de um táxi, quando chegaram em cima da hora na casa de espetáculos e
consequentemente, perderam um bom lugar para assistir, pois os seus
ingressos seriam para o setor da pista.
Outra lembrança digna de nota, deu-se em 1993, quando no mês de dezembro daquele ano, o grande astro do Rock cinquentista, Jerry Lee Lewis, apresentou-se pela primeira vez no Brasil.
Como é público e
notório, Lewis construiu a sua carreira inteira em cima da fama de ser
extremamente temperamental. E mesmo já com a idade avançada, "The
Killer" não demonstrara nenhuma intenção de deixar de ter a sua "fama de
mau".
Acima, o vídeo do show de Jerry Lee Lewis, que eu assisti em São Paulo, no ano de 1993
Sendo assim, Lewis entrou visivelmente embriagado no palco da
casa de shows, "Palace", de São Paulo e ali tocou por exatos quarenta e dois minutos,
apenas, quando sob um ato tresloucado, levantou-se do banquinho do piano,
chutou-o, e saiu de cena para não voltar mais naquela noite.
Apesar da casa estar lotada por fãs desse mito cinquentista, um princípio de revolta instaurou-se, com muitas pessoas a exigirem a volta do artista ao palco para a continuidade do espetáculo e outros mais exaltados, ameaçavam pessoas ligadas a produção do show, ao exigirem o ressarcimento do valor dos ingressos cobrados.
Sob o ponto de vista do código do consumidor,
claro que a reivindicação procedera, pois o show fora interrompido sem
nenhuma razão plausível, a não ser a embriagues e o temperamento irascível
do artista.
Contudo, por considerar-se que todo mundo ali presente era fã inveterado de Lewis, apesar da conduta ter sido inadequada da parte dele, seria para esperar-se uma certa tolerância, pois tal comportamento fora uma constante na sua carreira.
Ao ir além, posso até estar
a exagerar, mas tal atitude seria até um "charme" inerente para quem assistia "The Killer" em ação e mediante uma licença poética gigantesca, posso
inclusive mencionar que seria decepcionante vê-lo a concluir um show regular, com noventa minutos de duração ou mais,
e a se comportar de forma simpática etc.
Bem, em meio a balbúrdia que ocorreu entre o público, com gente revoltada a exigir "os seus direitos", houve um aluno meu que vibrou como se estivesse em uma arquibancada de estádio de futebol.
Este pulou e gritou euforicamente como se o seu time tivesse marcado um gol. Foi o mesmo garoto que no show duplo dos também astros cinquentistas, Little Richard e Chuck Berry, deu um show na arquibancada do estádio do Pacaembu, com as suas traquinagens e de fato, ele adorava esses artistas do Rock dos anos 1950.
A sua euforia nesse caso, teve uma coerência, se vista pela tese que eu defendi acima, ou seja, ele percebeu e emocionou-se em ver Jerry Lee Lewis exatamente da maneira como a sua fama espalhou-se ao longo de sua carreira: temperamental, a abandonar o palco, chutar o banquinho do piano e bêbado.
Fez sentido, apesar da longa espera com cerca de cinquenta anos para vê-lo em ação em nosso país e mediante parcos quarenta e dois minutos de música, apenas.
Como consolo, sim, ele tocou "Great Balls of Fire" antes de aborrecer-se e abandonar o palco... menos mal!
Após essa rápida explanação por eventos do passado, volto à cronologia
do segundo semestre de 1995.
Bem, nada de muito significativo ocorreu nesses últimos meses desse referido ano, que fosse digno de nota. A rotina das aulas prosseguira, em paralelo aos agitos de shows do Pitbulls on Crack e das respectivas bandas de alunos, além do costumeiro intercâmbio entre eles, com discos, principalmente.
O ano de 1996, aproximara-se e nele, mais uma onda gerada pela euforia aconteceria, motivada pelo
Pitbulls on Crack e o movimento criado pela gravação e lançamento do CD
"Lift Off".
O apoio de meu exército Neo-Hippie fazer-se-ia valer mais uma vez, de forma contundente.
E assim terminou 1995...
Dessa forma, o ano começou igual aos anteriores, com um quadro de alunos que apresentava uma média com trinta a trinta e cinco alunos, e a rotina foi a de sempre, com a interação total, intercâmbio e o clima de camaradagem e amizade entre todos. No primeiro semestre, a normalidade foi mantida, e a súbita decadência só viria a ocorrer no segundo semestre.
Em 1996, o Pitbulls on Crack fez poucos shows, mas como de costume, os meus alunos envolveram-se e prestigiaram todos eles.
Por exemplo, em fevereiro, quando tocamos na Casa de Cultura do Ipiranga e entre as sessenta pessoas presentes na plateia, quase a metade foi formada pelos meus "Neo-Hippies".
Uma banda que apresentou-se na abertura, teve como baixista, um ex-aluno meu. A minha memória é boa normalmente, mas não é infalível, portanto ficarei a dever o seu nome, pois realmente apagou-se da minha lembrança e como eu já mencionei várias vezes, perdi o caderno em que havia anotado todos os nomes de meus alunos, desde 1987.
Esse rapaz não ficou muito tempo em meu quadro de alunos e não marcou tanto na minha sala de aulas quanto outros que eu cito com constância.
Lembro
apenas que era robusto em sua constituição física, usava cabelos longos
como a maioria e não demonstrava claramente ser apreciador de sonoridade estética das décadas de
1960 & 1970. Pelo contrário, eu desconfiava que ele gostava de Heavy-Metal.
Mas quando a sua banda começou a tocar, surpreendi-me ainda a escutar do camarim, quando cometeu a boa ousadia de executar um cover inusitado. Ouvi claramente que "a capella", três de seus membros começaram a entoar a introdução vocal da música: "Thirty Days in the Hole", do "Humble Pie".
Fiquei surpreendido positivamente não só pela escolha de uma música que jamais esperaria ouvir ali, em pleno 1996, mas também pela boa afinação que as três vozes mantiveram durante a sua performance. A banda chamava-se: "Green Stuff" e como esse aluno nem era mais do meu quadro, a sua presença no evento fora uma coincidência e não um arranjo em que eu tivesse tido alguma influência quando das negociações para fechar a data na referida casa de espetáculos mantida pelo poder público.
Foi uma surpresa agradável e mais um sinal sutil que todo o empenho para se buscar trazer tal egrégora para a
gravação do CD "Lift Off", que iniciar-se-ia em breve, teve tudo a ver.
Esse fato ocorreu em 11 de fevereiro de 1996.
O assunto do momento dali em diante dentro de minha sala de aulas, passou a ser naturalmente, a gravação do CD "Lift Off", do Pitbulls on Crack. Cada pequena informação que eu fornecia-lhes, foi um fator motivacional e tanto para a minha garotada. Claro que não cometi o deslize de convidar nenhum deles para irem visitar o estúdio em uma sessão de gravação, pelo caráter inadequado que tal predisposição teria, obviamente.
A gravar o CD Lift Off, do Pitbulls on Crack, em 1996...
O importante, todavia, foi que mais uma vez eu sentia
essa comunhão entre a banda em que tocava na ocasião e o outro mundo em
que eu vivia nos anos noventa, ou seja, justamente a minha sala de aulas e
a fomentar a existência do meu exército de alunos.
Quando o segundo semestre iniciou-se, o movimento na minha sala de aulas pareceu estar dentro da rotina. Estava habituado com a rotina de perder alguns alunos no período pós-férias escolares, mas logo na metade de agosto, essas lacunas eram normalmente preenchidas pela entrada de novos estudantes.
Essa foi uma dinâmica normal para o período das férias escolares
de julho e o mesmo ocorreria em dezembro, quando na proximidade do Natal
sempre ocorria uma debandada, mas os que não voltavam em janeiro, eram
substituídos rapidamente, por novos alunos que chegavam.
No entanto, essa regra quebrou-se em 1996 e sem que houvesse um motivo plausível, pois eu me lembro que na metade de agosto, eu perdi oito alunos em uma única semana. A maioria comunicou-me de sua desistência das aulas, alguns poucos sumiram sem fornecerem-me satisfações, mas pelo que percebi, trataram-se de motivações completamente diferentes entre si, e assim, não houve a menor possibilidade desse ato ter sido algo arquitetado coletivamente, ou que denotasse algum tipo de boicote e/ou sabotagem.
Simplesmente eles debandaram em massa e claro que
um número significativo nessa margem, causou um pequeno estrago em meu
orçamento. O pior de tudo, foi que não houve a costumeira reposição e essa
queda repentina provocou uma diminuição no meu quadro, do qual eu nunca
mais consegui recuperar-me.
Doravante, nos últimos anos em que ministrei aulas, o meu número médio ficou desse patamar para baixo. Estava quebrada a minha média com trinta e cinco alunos, que eu mantivera praticamente desde 1989.
Engraçado que nessa época, eu não tinha planos para encerrar a minha atividade como professor particular, tão cedo. O Pitbulls on Crack dava mostras de crescimento, mas eu não confiava plenamente na banda em um curto/médio prazo, no sentido de que garantisse-me a condição de não precisar mais da atividade paralela.
E mais estranho ainda, foi que na hora em que eu verifiquei essa queda, eu tive o "insight" claro de que ali começara o fim dessa minha atividade. Até hoje, não tenho nenhuma explicação plausível, mas o fato concreto, é que nessa semana de agosto de 1996, essa queda de alunos, repentina, realmente foi o primeiro sinal de que essa atividade caminhava para o seu final. Muito embora isso tenha sido sacramentado de fato, só três anos depois.
E mesmo com menos alunos inscritos,
a minha sala de aulas ainda protagonizaria muitas histórias, inclusive
mais um pico de euforia, que ganharia volume no ano de 1998.
Emmanuel Barreto, meu primo, um dos "monges" em questão, e atualmente, dono do Site/Blog Orra Meu, veículo pelo qual eu fui colaborador como colunista fixo, entre 2011 e 2016.
Claro que para eles houvera a conotação de farra, mas o trabalho que faziam a auxiliar a minha banda, fora extraordinário. Tirante isso, ficara clara também que a força que demonstravam nessas ações coordenadas, denotara o poder de mobilização que possuíam.
Alguns dos "monges": Natanael, Betina, Emmanuel e Wagner "Baiacu", da esquerda para a direita, em foto de 1996
Nesses termos, claro que um pequeno contingente desses, bem coordenados e motivados, poderia fazer um estardalhaço, culturalmente a falar. Eram inteligentes, cultos e detinham ideais. Além da evidente energia juvenil e inerente.
Helder Pomaro, meu primo e outro membro da trupe dos "monges"
Sendo assim, eles logo estariam
a ajudar-me novamente e desta feita, sob um mutirão, com organização de
linha de produção de fábrica, praticamente, quando envolveram-se na
montagem das latas que compunham o aparato de divulgação do CD do
Pitbulls on Crack.
Já abordei esse fato no capítulo exclusivo da
banda, mas vou tentar achar novas luzes para comentar essa fase muito
boa de união entre eles e eu, sob o ponto de vista da minha relação
como professor, portanto adequadamente comentados neste capítulo, "Sala de
Aulas".
E logo mais, faço isso.
Nem mesmo o fato do quadro de alunos ter diminuído significativamente, arrefeceu tal animação na minha sala de aulas. A dinâmica permaneceu a mesma, em todos os sentidos.
Os meses prosseguiram sem que eu
pudesse vislumbrar um motivo concreto pelo qual justificasse-se a queda
no quadro. Foi mesmo muito inesperado e completamente aleatório, salvo
alguma revelação em contrário, pois ao escrever sobre isso, com vinte anos
de distanciamento histórico (2016), realmente não consigo enxergar uma lógica
nesse processo.
Tomás Grimas, aluno que frequentou as minhas aulas em 1992, saiu e teve uma volta ao meu quadro, em 1996, ano dessa foto acima.
Em princípio, ali no calor dos acontecimentos do
segundo semestre de 1996, não fiquei muito preocupado. Pelo contrário,
relevei, por considerar tratar-se de algo fortuito e passageiro e dessa forma,
em qualquer instante, uma nova safra com alunos apareceria e tudo
voltaria ao normal.
Não foi bem assim na verdade que ocorreu e eu estava
completamente alheio a um fenômeno que estava a atingir-me com a força de um
Tsunami.
O fato, foi que a Internet estava a popularizar-se de uma forma avassaladora e nesse sentido, o mundo da música começou a ser duramente golpeado pelas novidades da tecnologia. Falo "golpeado", pois não obstante o fato de que a tecnologia foi uma novidade libertadora, por outro, velhos paradigmas estavam a ser muito ameaçados.
O setor mais ameaçado foi obviamente o da indústria
fonográfica, com a iminente derrocada do CD, mas outros setores ficaram sob judice também e no campo didático, a possibilidade de espalhar-se métodos e
vídeo-aulas, quebraria toda uma velha estrutura de aprendizado.
Claro que eu nem cogitara isso naquela época, mas tinha plena consciência de que as minhas aulas eram simples, sem metodologia tradicional ou formal, tampouco com nenhum material sofisticado de apoio.
Se o meu método simplório já era inferior a qualquer escola de música e nessa época, já haviam várias dessas modernas, plenas de novidades tecnológicas espalhadas por São Paulo, o que seria de meu curso prosaico, doravante, com tal avalanche de informações a acontecer via Internet?
Em 1996, não existia ainda o YouTube, tampouco as redes sociais, mas a Internet já era bastante ameaçadora nesse
sentido.
Essa é uma explicação a posteriori, mas tem fundamento, enfim.
Então, além das atividades coletivas para ações de divulgação (principalmente distribuição de filipetas em porta de grandes shows, onde os meus alunos misturavam-se aos "monges", já citados), a grande ação deu-se mesmo nos meses de outubro e novembro de 1996, quando a gravadora Velas, propôs produzir um aparato muito criativo de marketing para dar suporte ao lançamento do CD "Lift Off", do Pitbulls on Crack.
Contudo, para
garantir tal aparato, pediram-nos um esforço sob mutirão, para garantir
que esta ação fosse concretizada mediante uma minimização de custos.
Na minha
sala de aulas, em 1996. Da esquerda para a direita: Cali Keller Rodrigues, eu (Luiz
Domingues) e Emmanuel Barreto. Sentado: Ricardo Schevano.
Claro
que aceitamos essa condição imposta e de antemão, eu tinha o meu trunfo
pessoal em contar justamente com o meu quadro de alunos e portanto, a certeza
de que eles colaborariam nessa tarefa com bastante entusiasmo.
Primeiro
pela farra que isso seria e na adolescência não precisa falar-se duas
vezes para que aceite-se uma bagunça generalizada dessas. E
segundo, que todos, sem exceção, nutriam pretensões artísticas pessoais e
muitos já com bandas em curso. Então, estar a ajudar, também
significara para eles a oportunidade para fazerem contatos, a inserirem-se
no mundo fonográfico, no show business em geral, mesmo que de forma
inicialmente insípida.
Claro que na medida do possível, eu mesmo incentivava que eles aproveitassem a oportunidade para assim proceder, ao travar contato e conhecimento desse mundo. E no momento certo, muitos realizaram de fato, contatos interessantes e até um emprego formal eu arrumei para um deles, quando surgiu uma oportunidade, dentro da gravadora. E do que tratou-se a tarefa de mutirão?
A gravadora, através de seu departamento de marketing, aprovara a concepção de um aparato de apoio para a divulgação do CD.
Mediante "brainstorm" realizada entre a banda e o marqueteiro da gravadora (Alexandre Madeira), foi concebida uma lata com média proporção, que seria embalada com um rótulo a evocar a banda, mas a imitar a famosa lata de "Sopa Campbell", estilizada em sentido de Pop-Art pelo artista plástico, Andy Warhol.
Dessa forma, dentro da lata, além do CD, haveriam muitos objetos oferecidos como brinde e para preparar cerca de três mil latas com tal aparato incluso, a gravadora economizaria uma boa quantia se nós organizássemos um mutirão e realizássemos tal tarefa gratuitamente.
A oportunidade para trabalhar-se
na linha de produção de uma autêntica fábrica, foi um convite à farra
generalizada e assim, claro que muitos de meus alunos aceitaram de
pronto a incumbência.
Foram tantas latas, que para não tumultuar o expediente dentro do escritório da gravadora, pediram-nos para fazermos as sessões de mutirão aos sábados e domingos inicialmente, porém, quando notaram que mesmo com tanta gente a auxiliar, não daríamos conta do montante, abriram a possibilidade para instituirmos expediente noturno nos dias úteis, após o horário comercial. Claro que nem todo dia eu conseguia mobilizar muita gente, mas foram muitos dias a trabalhar, assim mesmo.
No auge dessa loucura, chegamos a contar mais de trinta pessoas em um dia, apenas e a maioria do contingente, formada pelos meus alunos e invariavelmente vários agregados das aulas, como amigos, parentes e namoradas dos meus alunos, além é claro, de Jason Machado, que era presidente do fã-clube da banda e este também mobilizava uma tropa de ajudantes entre amigos, a contar com os seus parentes e agregados.
Tenho
uma lembrança muito boa desses dias que foram sob trabalho intenso,
organizado como linha de produção de fábrica, mesmo. Mas sempre com um clima de
intensa camaradagem, a gerar muitas risadas e brincadeiras o tempo todo.
Carol, minha aluna e que nessa época namorava o baterista, Juan Pastor, do Pitbulls on Crack, ajudou nessas maratonas de trabalho
Apesar
da descontração toda dessa tarefa, o trabalho foi eficaz e rendeu. Uma
turma colava os rótulos nas latas, a outra colocava os objetos. Outra
separava cada item que era colocado e finalmente uma quarta equipe
tratava de lacrar as latas.
Como eu já mencionei, esse trabalho aconteceu entre outubro e novembro de 1996, mas a minha turma de alunos envolveu-se também no processo de divulgação do show de lançamento do CD "Lift Off".
Dentro
dessa dinâmica dos meus alunos colaborarem decisivamente nesse processo
artesanal de finalização do aparato de lançamento do CD Lift Off, creio
que o ato final dessa ajuda inestimável foi o seu comparecimento em
massa ao show de lançamento do mesmo.
Marcelo
Bueno, um dos mais entusiasmados alunos que vibravam nessa onda retrô, e
pelo seu visual, isso é nítido, em pleno 1996, mas caracterizado como
se estivesse em 1972...
O meu
exército "neo-hippie" compareceu em massa ao evento, que foi apelidado como:
"Pitstock", em uma alusão ao mítico Festival de Woodstock.
Toda a
descrição do show está contada em detalhes no capítulo sobre o Pitbulls on
Crack. O que posso acrescentar aqui, é que eu fiquei muito
contente com a participação de todos e muito agradecido pelo esforço
que fizeram para lidar com aquela trabalheira toda que foi preencher as
tais latas, ao colocarem-se os seus respectivos rótulos e lacrá-las.
Estava por encerrar-se o ano de 1996, sob tal clima de confraternização em minha sala de aulas.
O aluno da primeira foto, era irmão de uma ex-aluna de 1989, chamada, Carlota Brito, portanto, consideremos chamá-lo como Brito, igualmente e o segundo, lastimo, mas não recordo-me de seu nome. Fotos de 1996.
Eu tinha naquela altura, a esperança de que passada a fase das férias escolares, a normalidade voltaria, com o meu quadro de alunos a restabelecer-se com a média habitual entre trinta e trinta e cinco alunos, por não dimensionar (e não haveria como pensar nesses termos, naquela época), que o processo iniciado ao segundo semestre de 1996, fora irreversível.
Flavio, um rapaz que gostava de Hravy-Metal extremo, mas nunca contestou a minha metodologia baseada em outras esferas do Rock "Vintage"
Mesmo ao não ter nunca mais atingido o pico máximo de alunos e euforia que eu tive entre 1989 e 1996,
os anos de 1997 e 1998 ainda proporcionar-me-iam alegrias. Principalmente
em 1998.
Falo na cronologia adequada.
Esteve encerrado o ano de 1996.
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