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quinta-feira, 1 de outubro de 2015

Pitbulls on Crack - Capítulo 1 - Muito Grunge, Indie Rock & Buracos do Underground - Por Luiz Domingues

Começo aqui uma nova etapa da narrativa em minha autobiografia musical. Vou contar a minha história com o Pitbulls on Crack, banda na qual eu passei quase os anos noventa, inteiros a atuar. 
 
Bem, no caso do Pitbulls on Crack, foi a minha volta a uma banda de forma oficial, depois de um hiato de quase três anos, após ter saído d'A Chave/The Key, em 1989. Depois disso, fiquei até o início de 1991, a realizar trabalhos avulsos, ou a participar de projetos que não evoluíram e até show "tributo" à banda internacional, eu realizei. 
 
Paralelamente, dedicava-me às aulas de baixo que ministrava desde 1987. E foi nesse citado show tributo que eu fiz em 1990 ("Electric Funeral", um tributo ao "Black Sabbath", episódio relatado no capítulo dos "Trabalhos Avulsos"), que conheci o vocalista/guitarrista/compositor, Chris Skepis.
No início de 1992, ele convidou-me a integrar uma nova banda que estava a formar e eu aceitei a empreitada, pois a proposta apresentara-se totalmente diferente de tudo o que eu realizara anteriormente e nesses termos, considerei que ao fazer algo na contramão de minhas idiossincrasias, talvez eu pudesse colher frutos mais saborosos do que eu havia colhido com A Chave do Sol, na década de 1980. 
 
Exatamente por esse caráter quase diametral ao que eu acreditava em termos estéticos, será que essa estratégia radical de mergulhar em uma proposta pela qual eu não encaixava-me musicalmente render-me-ia algum dividendo? Acredito que dois fatores incentivaram-me a aceitar entrar nessa banda:
 
1) A proposta acre do som, que direcionava-o para o lado oposto de tudo em que eu acreditava, ou seja, a aposta no som que potencialmente agradaria o tipo de crítico musical que tende a pensar o contrário de minhas convicções.
 
2) O fato dos rapazes que já integravam essa banda se mostrarem como absolutamente divertidos em sua conduta pessoal. Ou seja, o Pitbulls on Crack, foi a banda onde eu mais ri em seus bastidores, pois ninguém falava sério ali. Ao longo de cinco anos em que ali estive, foi um show de sarcasmo, piadas, imitações, ironia, enfim, esses colegas eram extremamente espirituosos, com verve de comediantes natos.

Nesse período todo em que fui componente dessa banda, lembro-me de um ou dois climas tensos, no máximo, pois no geral, sempre foi muito alegre estar ali a ouvir as brincadeiras dos colegas. Foi uma banda absolutamente divertida em seus bastidores.
 
Bem, a história oficial da minha participação com essa banda, começou assim: em janeiro de 1992, eu recebi o telefonema do Chris Skepis, ao falar-me de sua intenção de formar uma nova banda para trabalhar o seu som autoral e pelo qual ele afirmou que já possuía um material grande composto e que estava acompanhado por dois outros músicos já contatados: um outro guitarrista e um baterista. 
 
Mostrei-me interessado em conhecer a proposta e assim marcamos um ensaio em um estúdio perto da Estação Santa Cruz, do Metrô, no bairro da Vila Clementino, zona sul de São Paulo. Ao chegar lá, gostei bastante do astral divertido dos rapazes.
O baterista, Juan Pastor, era estudante de jornalismo e estagiário na rádio 89 FM, que à época, fora a principal rádio Rock de São Paulo.
E o guitarrista, chamado: Luciano Curvello Cardoso, apelidado como "Deca", havia morado muitos anos em Madrid e na volta à São Paulo, havia passado por uma banda Pop-Rock sem grande relevância (chamada: "Trama"). 
 
A minha primeira impressão do som que mostraram-me, foi que pretendiam trabalhar com algo dentro da estética "indie" (um derivado do Pós-Punk oitentista), mas não ao ponto de se descambar para aquelas esquisitices propositais e muito peculiares desse espectro. 
 
O guitarrista, Deca tocava de uma forma bem Rock'n' Roll tradicional, com muita influência do AC/DC, em princípio e o Chris Skepis, apesar de insistir em buscar a roupagem moderna para tal trabalho, se provara como um grande conhecedor das escolas clássicas, um autêntico expert na história do Rock 1960 & 1970, dono de uma coleção de vinis gigantesca, inclusive, e uma enorme coleção de Bootlegs dos clássicos. 
 
Só a contar o material dos Rolling Stones, ele devia possuir cerca de cem discos piratas ao perfazer um material incrível para a sua coleção. Gostei do astral dos rapazes e apesar de não ser, certamente o som dos meus sonhos, eu estava há bastante tempo sem um trabalho fixo autoral. 
 
Sendo assim, logo no primeiro contato, eu aceitei a oferta e formou-se aí o Pitbulls on Crack em sua formação original. Mas o nome da banda só veio a ser firmado de uma forma oficial, algum tempo depois. Isso ocorreu mais ou menos em março de 1992, mediante uma lista de opções elaborada e votação que decidiu por esse nome. 
A ideia original saiu de uma foto que o Chris vira em uma revista norte-americana, onde Steven Tyler (vocalista do "Aerosmith"), aparecia com uma camiseta cuja estampa continha essa frase. 
 
Particularmente, achei feia tal denominação e votei contra, mas os outros nomes propostos se mostraram ainda piores, como "Clap Queen" (Rainha da gonorreia) e outros ainda mais aviltantes, bem em torno da mentalidade punk de se gerar escândalo. A intenção foi deliberada em usar o idioma inglês e ser agressivo, ultrajante dessa maneira. Em suma: nada a ver comigo, ao imaginar os meus ideais, mas eu acatei a decisão da maioria.
Ao analisar um outro ponto da estratégia dessa banda e falo isso de uma forma generalizada e não apenas a pensar naquele momento inicial de 1992, eu acho que se a língua oficial deste país é o português, não há justificativa para cantar-se em inglês, a não ser que o artista que opte por isso, tenha planos para aspirar uma carreira internacional. A ideia inicial do Pitbulls foi buscar um lugar ao sol na cena nacional, portanto, na minha avaliação, deveria cantar em português. 
 
Mas as composições eram da autoria do Chris Skepis e ele sempre escreveu em inglês, pois falava fluentemente, morou em Londres por muitos anos e tocara em uma banda famosa da cena punk de lá, o Cock Sparrer.
Chris Skepis falava (fala) com sotaque britânico popular, o dito "cockney" e alegava na época que escrever letras em inglês para ele seria muito mais fácil do que o português. De fato, se formos analisar pelo aspecto da fonética e do campo da semântica e da sintaxe, talvez a língua inglesa seja mais facilitada para ser usada como letra de músicas, no entanto, há de se considerar que no campo léxico, a língua portuguesa é muito mais rica, portanto, á algo a ser considerado.
 
Outro dado da época, foi que no início dos anos noventa, havia uma cena, principalmente em São Paulo, com bandas a cantarem em inglês e fortemente influenciadas pelo movimento "grunge" de Seattle. O Pitbulls on Crack no seu início, fez inúmeros shows compartilhados com bandas dessas características. O fenômeno "Raimundos" a usar e abusar do português chulo, foi algo fora desse contexto de 1992, no entanto atropelou essa cena de bandas a cantar em inglês, pouco tempo depois. 
Na segunda foto, um click proveniente da primeira sessão promocional feita pela banda, em abril de 1992. Foto: Maura Cardoso

Mas faço a ressalva que o nome da banda só foi definido cerca de dois meses depois e não nos primeiros ensaios. E claro, todas as considerações estéticas sobre isso, estiveram fora de discussão, eu só comento aqui como uma análise a posteriori. Ensaiávamos em um estúdio muito próximo à estação Santa Cruz do Metrô, na Rua Loefgreen, para ser preciso. 
 
Tratara-se de um estúdio montado em uma edícula, construída no fundo de quintal de um Buffet Infantil. Muitas vezes tivemos que passar no meio de festas infantis e a causar espanto, por conta de sermos os quatro, cabeludos e a carregarmos instrumentos.
Os donos do estúdio eram dois garotos bem jovens e aficionados de psicodelia sessentista, principalmente o trabalho dos "Mutantes" e o "Pink Floyd", em sua "fase Syd Barrett". Enquanto ensaiávamos, eles costumavam subir ao telhado da edícula, que já era suspensa e bem alta por sinal, para promoverem sessões esfumaçadas, digamos assim, a olharem as estrelas e também para dispersar o aroma, com o intuito de não gerar suspeitas ao pessoal do buffet infantil.
O "New York Dolls", uma banda de Rock que praticara nos anos setenta um som visceral, cru, a beirar o mal tocado, mas nem assim, "Punk", como erroneamente é geralmente rotulada 
 
As primeiras músicas que eu conheci do Pitbulls on Crack, foram ensaiadas paulatinamente e eu notara que eles imprimiam sempre andamentos acelerados, para dar aquela vazão explícita ao padrão Punk-Rock. Então como um antídoto, eu amenizava, ao criar linhas mais elaboradas de baixo e dessa forma a tirar o ranço punk e assim aproximar a banda mais do Rock'n' Roll tradicional e do Glitter-Rock, estilo esse que sempre usou como influência clara, o Rock'n' Roll cinquentista, clássico. 
 
Mas não houve restrição alguma em relação à minha conduta, pelos demais. Pelo contrário, os colegas gostaram das minhas criações e incentivaram-me a prosseguir a sofisticar as linhas.

Nessa primeira safra com músicas ensaiadas, logo no começo das atividades dessa banda, lembro-me de uma releitura da canção: "Ticket to Ride" dos Beatles, mas de tão acelerada que se mostrou, ficara descaracterizada. Para quebrar o ranço punk, eu preenchi com escalas típicas de Rock'n' Roll, cinquentista e depois que acostumei-me com o andamento muito ligeiro, parei de estranhar aquela versão.

Preparamos as primeiras fotos promocionais em um domingo de março de 1992, redigimos o primeiro release e marcamos o primeiro show para o dia 9 de abril de 1992, em uma casa noturna na Rua Augusta em São Paulo, chamada: "Armageddon" e a dividir o palco com outra banda na mesma noite, chamada, "Runa". Um bom público compareceu nesse show debut, com cerca de duzentas pessoas. E essa boa receptividade inicial, animou-nos.

A despeito da característica do som, diametralmente oposta ao que eu gostava, o Pitbulls on Crack foi a aposta no som "indie" que tanto agradava setores influentes dentro da mídia mainstream. Após anos a desferir murro em ponta de faca, eis que eu resolvi apostar na turma que segurava a faca pelo cabo, com o perdão pela metáfora imprópria. 
 
E o som tinha esse toque punk inerente, mas não se tratou do punk declarado. Se colocava como "indie", com uma intenção em buscar tal adequação com essa modernidade noventista, que de moderna não tinha nada, pois não passara de um mero continuísmo das tendências oriundas do Punk &/ Post-Punk...
E houve o efeito "grunge" a ser considerado dentro dessa equação, certamente. Naquele início de década de noventa, essa seria a moda a ser seguida, e de fato, houveram dúzias de bandas em São Paulo, com a mesma característica: a cantarem em inglês, som calcado naquela moda de Seattle, mediante os seus membros a usarem cabelos longos novamente (com um revival setentista implícito), e uma corrida às lojas atrás de instrumentos vintage, pelo fato daqueles músicos de Seattle terem rompido com aqueles instrumentos "futuristas" que abundaram em meio aos artistas em geral que atuaram durante a década de oitenta. 
 
Sobre a questão do uso de instrumentos "vintage" da parte desses garotos de Seattle, a explicação é casual, e não se tratou de uma tomada de posição, é bom salientar. Essa garotada comprara instrumentos descartados em loja de penhores, por falta de opção monetária e daí haverem resgatado as sonoridades antigas por uma questão subliminar e não por determinação estética para se buscar os timbres retrô.
 
Então, ao falar friamente, acho que o Pitbulls on Crack foi uma amálgama desses elementos todos e não uma banda de Punk-Rock simplesmente, mesmo por que, com a minha participação no baixo e também pelo Deca como guitarrista a realizar solos a la Angus Young, nem que a proposta da banda fosse essa, explicitamente, o resultado final soaria desse jeito.
E houve mais um elemento a contribuir: o Chris estava obcecado pela modernidade e buscava as últimas tendências de Londres como um farol para esse trabalho, não de Seattle, mas apesar disso e por haver construído uma história com uma banda famosa da cena punk de 1977, no epicentro do movimento, a Inglaterra (tocou no Cock Sparrer), era (é), aficionado de estéticas 1960 & 1970.  
 
A sua formação era (é) inteiramente baseada nessa premissa e o Rock Progressivo exerce em seu imaginário, uma forte carga nessa prerrogativa. Ele amava (ama) o "Gentle Giant", por exemplo.
Nesse primeiro momento da banda, essa carga indie esteve mais pronunciada por conta dessa determinação o Chris em ser coadunado ao máximo com a então modernidade noventista, mas aos poucos, os elementos setentistas começaram a aflorar, como eu explicarei adiante nesta narrativa.
Fizemos o show da casa noturna, "Armageddon" e logo vimos que a banda chamava a atenção, principalmente pelo fato do Chris Skepis ter tocado no grupo inglês, "Cock Sparrer" e eu, Luiz Domingues, por ter sido componente do Língua de Trapo e A Chave do Sol. 
 
Uma pequena matéria (na verdade uma nota publicada como "box") com direito a uma foto, saiu rapidamente publicada na revista Bizz, ao citar-nos como uma banda promissora e no texto, falaram que apesar de sermos "modernos", tínhamos um certo ar setentista, que remetia ao "Mott the Hoople"...
Portanto para o Chris e eu (Luiz), que adorávamos as bandas do movimento Glitter-Rock britânico setentista, foi uma grande menção. 
 
Então, tal matéria em uma revista de grande circulação, aliado ao fato de que o baterista, Juan Pastor mantinha contatos fortes na cena underground, graças à sua condição como estagiário da emissora 89 FM (rádio que vivia um grande "boom" de audiência à época e por cerca de quatro anos ou mais, adiante, liderou com folga, o ranking das rádios Rock de SP), mais essa certa facilidade que a mídia escrita especializada dera-nos por causa do Chris e eu (por sermos egressos de bandas significativas dos anos 1970 e 1980), muitas chances apareceriam, e nos próximos meses, sob uma significativa aceleração, como eu detalharei a seguir.
Mais alguns shows foram marcados no circuito underground da noite paulistana. Tocamos no Black Jack Bar, Armageddon (novamente), Victoria Pub, Der Tempel, Arkhan Club e no Move's de Santo André-SP. 
 
Aliás, uma curiosa ocorrência deu-se nessa ocasião nessa casa (Move's), situada nessa cidade, no dia 16 de maio de 1992. 
 
Este fora apenas o segundo show oficial do Pitbulls on Crack e assim nós fomos tocar nessa cidade da região do Grande ABC. Santo André, nos anos oitenta houvera sido um reduto punk e de skinheads, também. As histórias de confrontos pela cidade entre as duas tribos, e ambas contra os headbangers (estes, adeptos do Heavy-Metal), foram inúmeras e principalmente no entorno da estação central de trem daquela cidade, o perigo era iminente. No início dos anos noventa, esse panorama ficara mais ameno, mas ainda haviam focos. 
 
Fomos tocar no Move's, despreocupadamente, mas quando saímos da casa para irmos embora após o seu término, houve um grupo de punks na porta, a esperar-nos. Assim que eu desci as escadas do bar e saí na calçada, achei que teríamos problemas, mas qual não foi a minha surpresa quando vi tais elementos com atitude dócil, a aguardarem o Chris para que este autografasse capas de Lp's do grupo britânico, Cock Sparrer e para tirar fotos com ele. 
 
E os sujeitos pouco importavam-se com o fato dele, Chris, mantivesse os seus cabelos longos, enormes, ao estilo Rocker setentista, ou seja, um item peculiar da famosa cartilha de ojeriza ao passado ditada em 1977, pois o trataram como a um ídolo.
 
Porém, o primeiro grande teste para o Pitbulls on Crack ocorreu em um show organizado pela rádio 89 FM, em que abrimos o "Golpe de Estado" no estacionamento do Parque de Exposições do Anhembi, no dia 4 de julho de 1992, dentro de um evento para um público estimado em dez mil pessoas.
Acostumados a tocarmos em pequenos palcos de casas noturnas obscuras, foi um bom teste, apesar do público não ter empolgado-se, mas claro, seria esperar em demasiado pelo fato de sermos completamente desconhecidos. 
 
Mesmo assim, eu saí do palco satisfeito com as poucas palmas, mas muito mais pela ausência de vaias e hostilidades, tão comuns às bandas novas, sem condições para causar comoção, por não possuírem músicas veiculadas no rádio e TV. 

Claro que engatinhávamos ainda, pois tratava-se de um novo trabalho. Mas na minha ótica, foi um começo promissor e portanto, esse conceito de se engatinhar é bem relativo. 

Se considerarmos que em janeiro fizéramos o nosso primeiro ensaio e em abril já tocávamos ao vivo, eu considero um processo bem acelerado, pois montar um repertório com músicas próprias, demanda tempo.

E só tocávamos duas releituras: "Ticket to Ride", dos Beatles e "Cracked Actor", do David Bowie. 

Para o Pitbulls on Crack, em apenas seis meses, o feito de haver se apresentado em um evento de porte para dez mil pessoas, foi algo espetacular. Neste caso, tudo é uma questão de proporcionalidade. Esse "engatinhar" tivera uma outra dimensão, em relação ao começo do "Boca de Céu", a minha primeira banda da carreira, por exemplo.

E ao ser sincero, acho que pelo fato de eu e o Chris já termos tido uma exposição midiática por conta de outros trabalhos anteriores, facilitou muito, mas sem dúvida que os contatos que o baterista Juan Pastor mantinha dentro da Rádio 89 FM, foram somados, os fatores preponderantes para a alavancada do Pitbulls on Crack. 

Como eu já mencionei antes, ele (Pastor) era estagiário dessa emissora logo no início das atividades da nossa banda, mas cresceu rápido na instituição e em poucos meses tornou-se locutor, redator de textos e figura chave entre os programadores. 

Já naquela época, tornar-se-ia assessor do Tatola, este, o principal locutor da casa, além de ficar muito amigo do Fábio Massari, outro locutor, que por sua vez, apresentou-o ao VJ Gastão Moreira, da MTV e assim em diante, de contato em contato, portas abriram-se bem rapidamente.

Embalados por essa apresentação para um grande público, tratamos de gravar uma demo-tape, pois nessa altura, os contatos do Juan Pastor fervilhavam nos bastidores da Rádio 89 FM e aliados aos shows que estávamos a realizar no circuito underground e "indie" da cidade, sugeria-se que oportunidades bateriam na porta, rapidamente.
                      Ao vivo na casa "Cais", em 1992
 

E assim, mais ou menos em junho de 1992, gravamos uma Fita-Demo, sob espírito muito caseiro, no próprio estúdio em que ensaiávamos e no uso de uma máquina Fostex, com a qual o Chris costumava gravar as suas demos caseiras, em seu apartamento.
Gravamos todas as músicas que tínhamos disponíveis, com exceção das releituras dos Beatles e David Bowie, claro. E daí, escolhemos as cinco melhores para compor o material definitivo. Enquanto isso, sucediam-se shows pelo circuito indie da cidade e a começar a melhorar o nível, quando oportunidades para tocarmos em casas sob médio porte, começaram a surgir.
 
 

Após tocarmos novamente em casas como, "Der Tempel", "Cais", Armageddon", "Victoria Pub" (esta última não era uma espelunca, muito pelo contrário, todavia, estava decadente nos anos noventa), e fomos convidados a tocarmos no "Woodstock", uma casa noturna situada no bairro de Cerqueira Cesar, próximo à Avenida Paulista, que continha uma estrutura semelhante a de um pequeno teatro, com ótimo palco, iluminação e camarins bons. 

Em uma segunda oportunidade, tocamos em setembro de 1992 e posteriormente, realizamos dois shows em outubro no mesmo local, quando abrimos a banda punk, "Não Religião".

Essa banda era liderada pelo Tatola, o principal locutor da 89 FM e obviamente aproveitava-se das benesses da Rádio para promovê-la. E nós, fomos juntos a aproveitarmos a "cauda desse cometa", pois o Juan Pastor era assessor direto do Tatola e este havia afeiçoado-se ao som do Pitbulls on Crack. 

E por pura coincidência, o Tatola era (é) um palmeirense fanático e eu o encontrei diversas vezes em estádios, a assistir os jogos do Palmeiras, o que também ajudou a estreitar os nossos laços de amizade. 

Nesses dois shows no Woodstock, ocorreu um clima muito desagradável entre o Tatola e o dono desse equipamento que também seria o técnico nos shows. Eis que o equipamento de PA usado era de propriedade de um famoso músico do Rock brasileiro dos anos setenta e na passagem de som, ocorreu um incidente.

 

E no caso, este famoso artista operava o equipamento, costumeiramente, apesar de haverem técnicos contratados ao seu dispor. Quem o conhece pessoalmente sabe que ele é um sujeito bom, mas normalmente tenso. Não é conveniente contrariá-lo, pois é temperamental e quando se sente aviltado, ele parte para a briga, decidido a não perder o embate. 

Então, na passagem de som do "Não Religião", o Tatola pediu para que esse famoso artista a operar o áudio do PA e monitor, aumentasse a sua voz no retorno. Não satisfeito com o acréscimo concedido, ele pediu novamente e na terceira vez que reiterou tal pedido, gritou com o técnico. 

Eu estava na coxia a observar o soundcheck e vi o técnico a cortar o som e pendurar-se, literalmente, na casinha da operação de áudio, para iniciar uma violenta discussão, com muitos xingamentos, incluso etc. O Tatola também era temperamental, a responder na mesma altura e após vários impropérios e ofensas à dignidade das respectivas progenitoras de ambos, o clima serenou-se.

Veio o momento do Pitbulls passar o som e mesmo ao ver o técnico transtornado, tudo correu tranquilo para nós. Conosco era sempre uma relação leve com terceiros, pois os meus colegas não tinham essa característica de nervosismo (e nem eu), muito menos estrelismo.

O técnico pôs-se a acalmar-se e ao entrar no nosso clima descontraído, a rir das piadas do Chris, que nunca parava um segundo de brincar. 

Quando encerrou-se o nosso soundcheck, este famoso operador passou por perto e disse-me que tinha gostado de nós e que eu iria verificar como a nossa mixagem seria um "brinco" e a do Não Religião, um lixo. 

Claro que eu desaprovo sabotagens em shows de Rock, mas isso foi entre eles e convenhamos, o que eu poderia fazer para dissuadi-lo dessa prática? E de fato, o nosso show foi muito bom, com uma monitoração muito caprichada, ao parecer um disco para nós e no show do "Não Religião", a monitoração assemelhou-se a uma maçaroca com frequências graves disformes, que arruinaram qualquer chance para se tentar entender a voz do Tatola. 

Tudo bem que o som dos rapazes era no padrão "punk' 1977", com aquela pegada da anti-música proposital etc. e tal, mas as letras eram significativas, a bater nos dogmas das religiões e sem serem adequadamente compreendidas, tal sonoridade horrorosa reduziu o trabalho da banda a uma massa amorfa. 

E no segundo show, houve uma promoção perpetrada pela bilheteria da casa e as mulheres entraram de graça, até um determinado horário prévio. Acho que eu nunca toquei para uma plateia feminina tão grande (a não ser uma vez com A Chave do Sol, mas esse fato eu contei em detalhes no seu capítulo, certamente).

Apesar de estarmos a abrir o show para o "Não Religião", não houveram muitos fãs deles, ali presentes. Aliás, essa banda nunca conseguiu obter um grande êxito, mesmo entre o público punk, pois mais aparecera na mídia, devido aos contatos do Tatola, bem relacionado que o era como um radialista influente.

Havia um músico bom a tocar com eles, que era o Walter "Alemão", baixista experiente e um sujeito com boa índole, que já tocara no "Santa Gang", banda de Rock'n' Roll, em que o guitarrista, Rubens Gióia, teve uma passagem antes de fundar comigo, A Chave do Sol, em 1982. 

Então, ali no Woodstock, lidamos com um público híbrido, que não esteve ali para ver e ouvir as bandas em específico, mas por ser um evento patrocinado pela Rádio 89 FM. Demo-nos bem, então, pois o nosso som era mais melódico e a nossa postura de palco mais agradável às pessoas que não eram aficionadas do tosco punk.

No show do domingo, dia 25 de outubro de 1992, fomos ainda mais favorecidos, pois com um tipo de público formado por mais de trezentas garotas, predominantemente, o nosso show foi em clima de apresentação do grupo Pop-Rock norte-americano, "Bon Jovi", mesmo que as garotas ali presentes, estivessem na situação incauta de não fazerem nem ideia sobre quem éramos. Apesar dessa falta de sincronia óbvia, elas gritaram, descabelaram-se e ficaram o show inteiro coladas no palco a tentarem tocar nas nossas pernas. Foi hilário!
Após esses shows na casa de espetáculos, Woodstock, novidades boas aconteceram em profusão para a nossa banda. Por exemplo, nós concedemos entrevista para uma revista chamada: "Tribo da Skate". O que teve a ver com o Pitbulls on Crack? Nada eu diria, mas o aspecto que emanávamos, nos atraía para sermos reconhecidos em meios assim. 
Em suma, nada a ver mesmo, mas a conexão do "pauteiro" da revista certamente foi criada pelo fato dele se ater ao passado do Chris Skepis com o "Cock Sparrer", na Inglaterra, e aí a conexão entre o Punk-Rock e a cultura do Skate/streetwear ser estabelecida para motivar estarmos nas páginas dessa revista.

Tocamos a seguir no Aeroanta, uma casa de shows com médio porte a deter uma boa estrutura, ao participarmos da festa do programa, "Rock Report", do jornalista e locutor, Fábio Massari, da 89 FM e MTV. 

Concorrida, apesar de ser uma terça-feira, com cerca de quinhentas pessoas presentes no seu ambiente, assim foi a noite de 27 de outubro de 1992. E nos bastidores, Tatola nos confidenciou ventilara como certa a produção de uma coletânea, com cinco bandas emergentes, pelo selo Eldorado.

Os rumores deram conta de vários nomes e o nosso foi citado entre os favoritos. Muitas pessoas falavam-nos a respeito desses boatos: Fábio Massari, Tatola, Gastão Moreira...
E sabíamos que o produtor de estúdio, seria um sujeito chamado: Carlos Eduardo Miranda, um gaúcho que tocara em uma banda punk e obscura do Rio Grande do Sul, chamada: "Atahualpa y os Punks".
Eu lembrava dessa banda e sabia bem de sua fragilidade musical. Mas o fato é que esse produtor cultural, Miranda, agora morava em São Paulo e estava muito bem enturmado no meio fonográfico e midiático, pois detinha uma coluna na Revista Bizz.

Toda a cena paulistana efervescente no início dos anos 1990, seguiu ou os ventos do grunge de Seattle ou o indie britânico, ainda sob inspiração oitentista do Pós-Punk. O Brit-Pop noventista (este com nítidos ares sessentistas), ainda não estava em voga, infelizmente. 

Houve um bom lobby em torno do Pitbulls on Crack, graças aos contatos do baterista, Juan Pastor, é claro, mas nós possuíamos outros trunfos e entre os quais, a atração que o Chris Skepis exercia em certas pessoas (Miranda, incluso), por conta dele ter sido mmbro por alguns anos do "Cock Sparrer". 

Para os fãs do Punk-Rock'1977, o Cock Sparrer mantém uma grande relevância, por ser contemporâneo dos "Sex Pistols" e outros expoentes dessa cena. E convenhamos, falo sempre desses fatores extra-musicais, mas as nossas músicas eram boas. O Chris comunha (compõe) bem, e com a minha (Luiz) participação e Deca na banda, o nosso som mais parecia-se com o Glitter-Rock setentista, do que qualquer outra coisa.

Fotos do show realizado no Aeroanta, no dia 27 de outubro de 1992, a comemorar o aniversário do programa: "Rock Report", da Rádio 89 FM, apresentado pelo jornalista, Fábio Massari.
Nessa noite ocorrida no Aeroanta, nós tocamos junto com bandas como: "Não Religião", "3 Hombres", "Rip Monsters", "Os Inocentes" e "Devotos de Nossa Senhora de Aparecida".
Não sei exatamente de quem foi a ideia da coletânea da Eldorado.
Mas certamente houveram várias pessoas envolvidas como artífices dessa produção. Por parte do selo Eldorado, o produtor executivo, Vagner Garcia, com certeza.
 
 

Na ordem das fotos acima: Wagner Garcia, Tatola, Fábio Massari e Carlos Eduardo Miranda, os idealizadores da coletânea em que o Pitbulls on Crack debutaria no mundo fonográfico, no ano posterior, 1993, através da gravadora Eldorado
 
Mas como seria uma produção em parceria com a emissora 89 FM, claro que o locutor Tatola teve um peso nessa decisão, mais o bom jornalista/crítico, Fábio Massari, que ajudou a escolher as bandas e talvez o produtor de estúdio, Carlos Eduardo Miranda. Mas pode ser que tenham havido outras pessoas que influenciaram e eu as desconheça nesse processo. 

Em nosso caso, em termos de sonoridade que marcaria a nossa participação em tal álbum, o que em princípio delineara-se para se apresentar como algo meio punk/meio indie, pôs-se a ficar cada vez mais setentista, a encarnar o saudoso glitter-Rock, sobretudo.

Nessa altura, as músicas: "Under the Light of the Moon" e "Answer Machine", despontaram como as nossas favoritas, internamente a falar, para representar-nos na coletânea. E tais músicas, como ficou público e notório posteriormente, mostraram-se super setentistas em seus respectivos âmagos, munidas por riffs, boas melodias, linhas de baixo e solos de guitarra, bem tocados. Foram ambas demarcadas como peças tipicamente influenciadas pelo Glitter-Rock britânico e setentista, puro. Caberiam portanto, em qualquer disco do David Bowie ou T.Rex!
Essa foto acima, em que eu, Luiz Domingues, sou o destaque, é de um ensaio do Pitbulls on Crack, aproximadamente de março de 1992
Para você, caro leitor, ter uma ideia de como uma boa parte da cena paulistana estava ligada no movimento "grunge" de Seattle, ao final de 1992, entrara em cartaz no circuito de cinema comercial, um filme do diretor norte-americano, Cameron Crowe, chamado: "Singles" (em português, deram-lhe o título como: "Vida de Solteiro"). 
Tratou-se de uma comédia romântica e bem pueril, sem maiores atrativos maiores, se não fosse ambientada em Seattle (com o personagem principal, interpretado pelo ator, Matt Dillon), e este personagem não fosse guitarrista de uma banda grunge (no filme, a sua banda fora o Pearl Jam, verdadeiramente).

Ao conter tomadas com várias bandas daquela cena a tocarem em casas de médio porte, chamou a atenção dos músicos que seguiam aquele espectro artístico e proviam a cena paulistana. 

Fui ao cinema assistir e achei o filme bem fraco, pois tratara-se na verdade de uma comédia romântica com padrão para ser exibida na "sessão da tarde" (embora eu aprecie o trabalho do diretor, Cameron Crowe, que depois dessa obra, produziu, "Almost Famous", este sim, um grande filme ambientado no mundo do Rock setentista). 

Na sala de cinema aonde eu fui assistir tal película, por uma absoluta coincidência, membros de bandas como: "Yo-Ho-Delic", "Mighty Sound Jungle" e "Anjos dos Becos" estiveram presentes na sessão em que eu compareci. Estes colegas chegaram ao ponto de emitirem gritinhos de regozijo em alguns trechos onde apareceram as bandas de Seattle, a tocar ao vivo.

Em uma determinada cena, o personagem do ator, Matt Dillon, surge no cemitério em Seattle aonde o guitarrista sessentista, Jimi Hendrix, foi sepultado. Quando o close na placa de sua tumba preencheu a tela inteiramente sob um close up, mais gritinhos foram ouvidos no auditório do cinema. Nessa hora, eu fiquei até surpreendido, pois naquela altura dos acontecimentos, alguém a demonstrar reverência a um ícone sessentista, foi um alento e tanto. 

Quanto ao movimento "grunge", isso evidentemente não dizia-me nada como estética. Tirante uma canção ou outra do "Soundgarden", "Alice in Chains", ou do "Pearl Jam", o grunge em seu bojo, não comoveu-me em nenhum aspecto. 

Curiosamente, o maior expoente do movimento, o tal do "Nirvana", na minha avaliação não passava de um grupo fraco, comprometido com o senso de continuísmo do Punk-Rock oitentista e para corroborar a minha impressão, claro que a "intelligentsia" estendeu o seu tapetinho vermelho e indevido para esse grupo, ou seja, eu só lamentei, mas não surpreendi-me com essa superestimação e reverência inadequada, amplamente calejado que estivera, graças a ter passado pelos anos oitenta e a verificar a inversão de valores como uma tendência delineada de uma forma cristalina.

O único mérito que eu enxergara nesses artistas de Seattle, fora um certo resgate dos riffs setentistas, principalmente da escola do Hard-Rock e o resgate dos instrumentos vintage a garantir uma melhor sonoridade no tocante à produção de áudio desses artistas, embora isso não fosse algo proposital da parte desses rapazes, como eu já expliquei anteriormente, pois mesmo de uma forma involuntária, o fato é que esses músicos de Seattle provocaram no mercado a vontade de outros músicos usarem instrumentos dessa estirpe "vintage". 

Em suma: após amargarmos aqueles dândis oitentistas a perturbarem-nos com a sua insipidez musical atroz e munidos pelos seus instrumentos de brinquedo, estigmatizados como típicos daquela mentalidade instaurada na década anterior, esses garotos de Seattle apareceram a empunhar guitarras e baixos das marcas tradicionais Fender e Gibson em profusão, isto é, foi um alento aos nossos ouvidos tão combalidos pela gosma de reverber que dominara a engenharia de áudio na década de oitenta. 

Dessas bandas paulistanas que eu citei, o Yo-Ho-Delic foi a mais cotada para entrar na coletânea da Eldorado. Essa banda tocava em todas as espeluncas do circuito indie da cidade, pelo menos desde 1991. Mas foi atropelada na reta final. Depois eu analiso o motivo.

Quando à MTV foi inaugurada em outubro de 1990, o som que tal emissora mais propagava, fora o grunge de Seattle e o Funk-Metal californiano. Foi a moda preponderante daquele momento.
O Pitbulls on Crack, que teoricamente era uma banda "indie", correra sob uma terceira via, obscura. Mas houve um ponto de similaridade com o grunge de Seattle, em nosso trabalho, pode-se afirmar.

Isso se analisarmos o grunge como uma árvore com dois galhos. Em um deles, a orientação fora o Hard-Rock setentista britânico e nessa fonte, foram beber as bandas como o "Soundgarden", "Alice in Chains" e "Pearl Jam", predominantemente. E no outro galho, bandas como "Mudhoney", "Sonic Youth" e "Nirvana", seguiam a cartilha do punk '1977. Sei, no entanto, que alguns historiadores classificam tais bandas como uma vertente extra-grunge.

Nesse caso, essas três bandas citadas detinham a admiração do Chris, Pastor e Deca. Eu sempre achei o Nirvana, um embuste. Um dos casos mais gritantes de superestimação da história e um mero continuísmo do Punk-Rock, a se mostrar sofrível pela sua sonoridade tosca. Infelizmente, tornou-se o maior expoente do movimento, muito pela ação midiática que a incensou, tenho isso como um fato. 

Ao chegarmos ao final de 1992, os boatos se tornaram mais fortes sobre estarmos entre as bandas escolhidas para constar na coletânea da gravadora Eldorado.

Enquanto isso, fizemos os dois últimos shows do ano: no dia 9 de dezembro de 1992, em uma casa chamada: "Cadeira Elétrica", para um surpreendente público com cem pessoas e por considerar-se o fato de ter sido marcado para um dia útil. 

E o gran finale de 1992, foi um show de choque, em um festival com várias bandas, promovido pela rádio 89 FM. Esse convite veio a calhar, pois selara o ano de 1992, com um show para grande uma multidão e certamente pela exposição midiática em profusão.

Esse show de fim de ano da Rádio 89 FM, era na verdade bem tradicional da emissora (a sua concorrente, Brasil 2000 FM também produzia um show de final de ano com várias bandas autorais e curiosamente produzido na mesma casa de shows), e costumava reunir uma multidão em uma casa noturna no bairro da Barra Funda, na zona oeste de São Paulo, chamada: "Broadway". 

E não foi diferente nessa edição de 1992. Nós fomos a banda de abertura do show e por conta disso, o público estava muito agitado. Haviam cerca de três mil pessoas a acotovelarem-se dentro da casa, quando subimos ao palco e no primeiro acorde da primeira música, elas ficaram ensandecidas.

Claro que não se tratou de nenhuma comoção especial para o Pitbulls on Crack, mas a excitação para ver começar logo o show em conluio com o forte calor que fazia em dezembro, além daquela aglomeração humana. 

Nesse show, tocaram bandas da nova e velha cena paulistana, tais como: "Golpe de Estado", "Os Inocentes", "Não Religião", "Rip Monsters", "Viper", "Yo-Ho-Delic", "Volkana" e nós, Pitbulls on Crack.

Eu não tive a ilusão sobre tal comoção ser referente à nossa presença, pois éramos uma banda a empreender os seus primeiros passos ainda, mas certamente pelo fato de estarem tais pessoas da plateia ansiosas pelo show, ao primeiro sinal de som emitido no sistema de PA da casa, eis que explodiram sob um frenesi incontrolável!

Lamento muito, mas as fotos desse show foram perdidas, portanto, fico a dever ilustrações, para corroborar a minha narrativa.

Essa foto é de 1993, no camarim da casa de shows, "Rádio Show", mas mostra os roadies que auxiliavam-nos naquele período 1992/1993. O José Reis é o rapaz a usar óculos e o Luis Gustavo, está agachado, a usar camiseta escarlate.

Uma história engraçada: um garoto tentava escalar o palco para mexer nos pedais do Deca. Ele chegou bem perto disso, duas vezes.

Na terceira tentativa, o meu amigo, José Reis, que trabalhava como roadie do Pitbulls on Crack, desferiu um murro no queixo do infeliz, que voou (literalmente), e foi amparado pelo público. 

O soco foi tão forte que eu ouvi o ruído desse impacto, embora o som no palco estivesse altíssimo. Temi por uma confusão generalizada, mas nada ocorreu. Não paramos de tocar e o Chris teve uma crise de riso ao ver essa cena bizarra ao até parar de cantar para gargalhar. Esse sujeito deve ter aprendido a lição e nunca mais tentou azucrinar um artista no palco, assim espero.

Outra história engraçada desse show, deu-se quando um punk surgiu de uma forma completamente inesperada, quando veio a correr da coxia e convenhamos, o que poder-se-ia esperar de um sujeito com aquela mentalidade truculenta e cheio de preconceitos contra tudo e todos.

Mas surpreendentemente, o seu objetivo fora pacífico e prosaico até, eu diria, pois ele abraçou o Chris, dentro daquela prerrogativa de que ele era adorado pelos admiradores do Punk-Rock, graças à sua experiência pregressa como componente da banda britânica, Cock Sparrer.  Claro que o Chris assustou-se, mas desta vez o propósito de um invasor de palco foi amistoso e o José Reis não precisou exercer os seus dotes, como pugilista.

Certamente que foi engraçada a história do soco (menos para o infeliz do rapaz), mas convenhamos, teve o que mereceu o aspirante a vândalo, que saiu de sua casa não para ver um show de Rock, mas para tentar sabotá-lo de alguma forma. 

Quanto à expectativa em torno da gravadora Eldorado, claro que foi grande. Muitas bandas, não só as de São Paulo, cobiçavam essa oportunidade e cada uma detinha o seu lobby. Nessa hora, quem tem tal suporte sai na frente, pois qualidade artística é o que menos conta para atender a mentalidade da parte de executivos de gravadora. Aliás, esse tipo de gente raramente entende de música. E se entende, cala-se quando adentra o sistema, ao aprender a obedecer a cartilha imposta pela corporação.

Claro, faço a ressalva que na Eldorado isso se mostrava bem atenuado, pois por tratar-se de uma gravadora de médio porte e manter no catálogo artistas alternativos e nada fabricados para o mainstream, a mentalidade ali era diferente, ainda bem.

As especulações falavam sobre várias bandas. Nessa altura, dávamos como certa a contratação do "Yo-Ho-Delic", mas isso não ocorreu, porque a influência do produtor musical, Miranda, driblou o favoritismo dessa banda paulistana, e assim, escalou o "Graforréia Xilarmônica", de Porto Alegre. 

Sobre essa banda gaúcha, era liderada pelo Frank Jorge, um artista famoso na cena underground, porto-alegrense. O som do Graforréia Xilarmônica era de certa forma muito parecido com o que tornou-se o "Pato Fu", anos depois. Ou seja, os seus componentes misturavam diversas tendências, sob uma salada musical que atirava para todos os lados. Como no release deles contido na coletânea deixou claro, ao assinalar que iam de Roberto Carlos/fase Jovem Guarda, a King Crimson... todavia, apesar de parecer uma mistura improvável, a banda era boa, com músicos com qualidade, tanto na execução, quanto composição, e capacidade para arranjar o seu material.

Os rumores em torno de uma banda punk de Brasília, foram fortes.
Tratava-se de um tal de: "Os Raimundos". E de fato, essa banda era a paixão do Miranda, naquele momento, atração tão forte, que no último momento, esse produtor resolveu tirá-la da coletânea, para assumir direto, um álbum solo, graças ao novo selo chamado, "Banguela", que os Titãs acabavam de lançar dentro da multinacional, Warner. 

O Pitbulls on Crack continuou bem cotado, mas o acerto mesmo só veio mesmo por volta de abril de 1993. Enquanto isso, prosseguimos a nossa rotina com shows no circuito underground. E assim entramos no ano de 1993, com esperanças renovadas e ao soarmos melhor ao vivo, pois estávamos a completar um ano de banda, na ativa.

O Pitbulls on Crack esteve posicionado forte na disputa para constar na coletânea da gravadora Eldorado, pois o Tatola gostava de nós. A sua admiração não era apenas pelo som que produzíamos, mas pelo fato do nosso baterista, Juan Pastor, ser o seu assessor direto na rádio e principalmente por admirar o fato do Chris Skepis ter tocado em uma banda da cena do Punk-Rock britânica e histórica da cena de 1977. 

Muita gente bajula o Chris até hoje por isso e a maioria não sabe que ele tem uma coleção incrível com discos de Rock Progressivo, dentro de casa.

Ficar a saber dos rumores sobre os bastidores foi fácil. Haviam jornalistas e radialistas como o Tatola, Fábio Massari e Gastão Moreira sempre a comentarem fatos de bastidores para o Juan Pastor. 

E no caso do Gastão, ele foi parte interessada também, pois a sua banda, o Rip Monsters, esteve no páreo, também. 

Definitivamente, acho que se "Os Raimundos" tivessem sido escalados para a coletânea, não seria o Pitbulls on Crack que seria descartado. Tanto é verdade, que o Graforréia Xilarmônica e Little Quail and the Mad Birds, chegaram de súbito para compor a lista final de bandas, por serem ambas, escolhas do produtor, Carlos Eduardo Miranda, a desbancarem favoritos como "Yo-Ho-Delic", "Virna Lisi" e "Anjos dos Becos", sem contar o "Jazzumbi" e o "Might Sound Jungle". 

No cômputo final, creio que o Pitbulls on Crack se garantira, assim como o "Rip Monsters" e o "Neanderthal", bem antes da resolução final da parte da gravadora. O fato dos Raimundos terem sido catapultados para um disco solo, abriu caminho para o "Little Quail" e o "Graforréia Xilarmônica", em minha visão.

Iniciamos o ano de 1993, com um show no Black Jack Bar. Tratava-se de uma casa pequena, com equipamento de PA precário, mas assim mesmo, muito tradicional no circuito Rocker de São Paulo, desde os anos oitenta, com tradição no meio do Hard-Rock e Heavy-Metal, principalmente. 

Nos anos noventa, tal estabelecimento abriu mais o seu leque, ao atrair também artistas da seara do Punk-Rock, Grunge e o Indie-Rock. 

Por considerar-se que foi em janeiro, um mês tradicionalmente fraco por causa das férias escolares, nós movimentamos um bom público para esse show, com cem pagantes aproximadamente (em 8 de janeiro de 1993). Foi um show satisfatório, apesar do áudio prejudicado pela má qualidade do PA precário da casa.

Lembro-me que eu tive a infeliz ideia de usar nesse dia, uma camisa bastante estampada e fui ironizado pelos meus colegas a noite inteira por esse deslize na escolha do figurino, quando compararam-me ao falecido apresentador, "Bolinha", que ficara famoso pelo mau gosto no uso de camisas espalhafatosas... mas, claro, tratava-se do Pitbulls on Crack e tudo tornava-se uma piada imediata em seus bastidores!

O próximo show demorou para acontecer. Só conseguimos marcar uma nova data em 18 de março de 1993, para ser realizado em uma exótica casa noturna chamada: "Circular Paulista", no bairro do Bom Retiro, próximo ao centro de São Paulo e na verdade, tratara-se de um galpão rústico, onde a atração principal era um ônibus estilizado, estacionado dentro da casa. Nesse show, dividimos a noite com a banda, "Maldades de Pandhora", do meu aluno, Marcos Martines. 

O Marcos, que era meu aluno e amigo, ficou constrangido pelo fato da filipeta dar destaque à sua banda e a nos colocar como "abertura". O fato, é que obviamente eu sabia que isso não fora ideia dele e para nós do Pitbulls on Crack, não importava tal referência em tom de inferioridade, na menção ao nosso nome. 

Tal colocação foi na verdade uma imposição da vocalista da banda, que detinha uma postura altiva e certamente descortês. Mesmo que a banda dela tivesse esse status de superioridade, e não o tinha, pois o Pitbulls on Crack já se colocava no mercado como uma banda emergente, mediante um portfólio de mídia mainstream, fator que a banda dela não possuía na ocasião, tal atitude de sua parte foi tresloucada, pois estávamos na prática, no mesmo barco do underground. Falo isso como dado histórico, deixo claro, pois se não incomodou-me na época, imagine hoje em dia...

Em seguida, nos apresentamos uma outra casa exótica, chamada: "Phoenix Rock Theater", no bairro da Barra Funda, na zona oeste de São Paulo. Aconteceu no dia 25 de março de 1993. 

Nessa altura, já estávamos quase confirmados como partícipes da coletânea da Eldorado e providenciávamos documentação para assinar o contrato de gravação. 

Por considerar-se que todos os discos que eu gravei com A Chave do Sol foram independentes, ou sob regime de parceria com um pequeno selo (Baratos Afins), foi portanto, a primeira vez na minha carreira, que eu assinei um contrato formal com uma gravadora, apesar de já estar com trinta e dois (quase trinta e três anos de idade, na verdade) e dezesseis anos de carreira. Coisas da vida. 

Começamos a discutir internamente quais seriam as nossas duas músicas escolhidas. "Under the Light of the Moon", "Answer Machine" e "You've Got Me on The Run", foram as mais cotadas. Tínhamos que eliminar uma. 

Já tínhamos também aparições na TV. Em um programa obscuro da TV Gazeta, um pedaço pequeno de nosso show ocorrido na Broadway em 1992 e uma mini entrevista foram ao ar. 

E em março de 1993, fizemos uma boa entrevista para o programa do Gastão Moreira, na MTV. Aliás, conheci o Gastão Moreira pessoalmente no show da Broadway em dezembro de 1992 e ele contou-me um fato inusitado, naquela noite no camarim...

O caso do Gastão, que eu mencionei anteriormente, foi que no show que fizemos na casa Broadway, em 1992, na festa da Rádio 89 FM, o "Rip Monsters", sua banda, também tocou. 

No camarim, ele só conhecia até então o Juan Pastor e ao ser apresentado aos demais membros, cumprimentou-me com ênfase ao dizer ser meu fã, do tempo d'A Chave do Sol e que assistira alguns shows de tal banda no Teatro Lira Paulistana. Falou-me portanto, com grande entusiasmo sobre tais lembranças e claro que eu fiquei surpreendido e honrado, naturalmente.

Na questão da escolha das músicas, ao visar a gravação do disco/coletânea, tudo foi decidido sob um consenso entre os quatro componentes da banda, apenas. Não houve interferência da gravadora, ou do produtor de estúdio.

Aliás, só fomos ter contato com ele, no estúdio. Sim, o Gastão já era uma estrela da MTV, em 1992, pois fazia parte do primeiro time de VJ's, desde a inauguração da emissora, em 1990. A sua atitude foi de muita humildade ao contar-me essa passagem, no camarim da Broadway. E dali em diante tornamo-nos amigos e em um futuro bem próximo, dividimos muitos camarins por conta de shows e compromissos de mídia que tivemos em conjunto, por conta da coletânea da Eldorado em que participamos com as nossas respectivas bandas.  

A votação para a escolha das duas músicas que iríamos gravar, foi tranquila mesmo. Ao final, chegamos à conclusão, sem maiores conflitos. A documentação foi a da praxe, de qualquer gravadora.
Documentos pessoais, carteira da ordem dos músicos, papelada do GRA para o ECAD etc. E dados bancários, é claro.

Eu sou membro da Ordem dos Músicos do Brasil, desde 1982. Os demais precisaram adequarem-se em tal burocracia. 

Para aproveitar o parêntese, vou contar um caso engraçado:

Na primeira vez em que fomos à MTV, nós realizamos uma boa entrevista. Nos bastidores, haviam outras bandas, a esperar a vez para gravarem as suas entrevistas, também.

Uma delas foi o Viper. Eu conhecia os rapazes dessa banda desde 1984 e muitas vezes nós dividimos o palco em shows coletivos, quando eu estava a atuar com A Chave do Sol. 

Nesta ocasião, lembro-me de estar presente juntamente com o Pit Passarel, e o Felipe Machado, na sala de maquiagem. Da minha banda naquele instante, estavam o Deca e o Juan Pastor, comigo e também o meu amigo, José Reis, roadie do Pitbulls na época. 

Foi quando subitamente, entrou na sala uma VJ famosa da casa, que era considerada bonita pela audiência da emissora, e ela teve a mesma intenção de passar pela maquiagem.

Essa moça sentou-se na cadeira e a maquiadora começou a trabalhar em seu rosto etc. Depois que encerrou e ela passou por nós, alguém do Viper (não revelarei quem, mas recordo-me bem, certamente), disse: -"essa é que a fulana? Parece bonita na TV, mas não é nada disso"... e claro que não foi exatamente com essas palavras, é bom registrar, e diante da pilhéria, ainda que maldosa, nós todos ali presentes caímos na risada automática. 

E no mesmo dia, aguardávamos em uma roda formada por pessoas no corredor, quando entediados pela demora sepulcral e típica de programas de TV, cansamos e sentamo-nos nos degraus da escada. Estávamos também com os membros do Viper, juntos conosco, e eu conversava com o César Cardoso, que naquela época trabalhava na MTV, e houvera sido meu aluno em 1988/1989.

Aí apareceu subitamente a VJ, Astrid Fontenelle a descer a escada e ela estava vestida com uma saia, curtíssima. A conversa parou, ela constrangeu-se por um segundo, mas aí descontraiu ao dizer-nos: -"vocês já viram tudo, mesmo" e todo mundo caiu na risada, incluso ela mesma, que desceu a brincar, e a quebrar o constrangimento. 

O programa em que fomos entrevistados, foi o: "Fúria Metal". Claro que o Pitbulls on Crack não tinha nada a ver com a cena do Heavy Metal, mas comparecemos, sem preconceito algum. O astral com o Gastão foi ótimo e a entrevista foi com a banda inteira.

Em relação aos funcionários dessa emissora, a recepção costumava ser fria, blasé. Se fôssemos famosos, certamente seria diferente, mas no caso do Pitbulls on Crack, éramos somente mais uma banda desconhecida a andar por aqueles corredores. 

A questão não fora sermos uma banda iniciante. Pois todos tínhamos semblantes maduros. A questão foi não sermos "hypados" no meio. Principalmente no âmbito onde a MTV inseria-se, também, isso fora uma causa preponderante na relação entre artistas e pessoal de mídia, ao determinar o tipo de tratamento despendido nos bastidores.

Os próximos shows foram feitos mediante multidão. No dia 3 de abril de 1993, fomos convidados a participar de um micro festival ao ar livre, com o palco montado na porta da loja de discos, "Woodstock".

Essa loja era (é), muito tradicional em São Paulo e nos anos oitenta, era predominantemente frequentada por admiradores do Heavy-Metal e durante anos, foi um ponto de encontro aos sábados para tal "tribo", quando costumava reunir centenas de pessoas na calçada próxima a uma das saídas da estação Anhangabaú, do Metrô.

Naquele momento noventista, havia perdido muito de sua força, mas ainda continha fôlego como loja, e a maior prova disso, é que existe (e muito bem, obrigado), até os dias atuais (2014). 

O festival conteve algumas bandas da cena indie noventista e alguns expoentes do Heavy-Metal. Sinceramente só recordo-me da presença do "Anjo dos Becos" e do "Viper", ao nosso lado. O equipamento disponibilizado para o evento não foi dos melhores, mas para o Pitbulls on Crack, que fora uma banda de Rock'n' Roll visceral e bem básico, tal falta de maior refinamento no áudio não culminou em nos atrapalhar decisivamente enquanto execução da performance. Mas claro que sempre foi incômodo tocar nessas condições ruins. Duas lembranças extra show, vem-me à cabeça:

1) No camarim improvisado (foi no escritório reservado da loja), uma roda formada com músicos, conversava tranquilamente enquanto aguardava-se a hora dos shows iniciarem-se, quando surgiu uma conversa a falar sobre o comportamento do público de Rock nos anos 1960 e 1970, muito diferente da postura agressiva e alheia, adotada a partir da "revolução punk" de 1977, com o público quase que a expressar repúdio ao artista no palco, ao ponto de cogitar-se até a agressão física, de fato. 

Claro que eu argumentei sobre isso e expus minha visão, a denunciar o estrago causado nessa mentalidade anti-musical e iconoclástica. É óbvio que nunca simpatizei com "rodas de pogo" (é show de Rock ou rebelião na penitenciária?), "Stage Dive"/"Mosh" e outras práticas que mais pareciam denotar que a música não importava para essa gente, e diante de tais fatos, como eu poderia concordar com tal predisposição?

No entanto, um componente da banda, "Anjo dos Becos" exaltou-se com a minha opinião e simpatizante assumido de tal filosofia, passou a falar que as minhas ideias eram ultrapassadas e que estavam lá atrás no Festival de Woodstock em 1969, coisa de "hippies e bichos grilos" etc. 

Disse em seu discurso raivoso, que eu "não entendia", que o público "moderno" de Rock, fazia essas coisas, por que queria "divertir-se"...
Ora, ora... que comprasse um par de luvas de boxe e esmurrasse as paredes de sua casa a ouvir discos de suas bandas prediletas, então, pois o efeito seria o mesmo enquanto diversão e dispêndio de energia infantojuvenil, não é mesmo? 

O que ele "não entendera", foi que a magia do Rock correra para o ralo, quando instituiu-se que o artista em si não teria mais importância e entre outros fatores, saber tocar um instrumento seria "coisa do passado", pois o ideal doravante foi formarem-se bandas com pessoas que não sabiam tocar e por não saberem tocar, ninguém interessava-se mais por sua música malfeita e esta só serviria em tese, como pano de fundo para estripulias juvenis truculentas, como as que eu citei acima. 

Esse rapaz na verdade era gentil, mas a sua mentalidade fora arraigada sob um paradigma errôneo, cuja formulação não fora culpa dele. Na verdade, fora mais uma vítima dessa desgraça perpetrada pelos famigerados "formadores de opinião". Nesses termos, o melhor foi encerrar a conversa, pois essa turma que pensava dessa forma, era adepta da máxima sintetizada sob uma gíria em forma de palavrão e que denotara o absoluto nivelamento por baixo nos parâmetros culturais. Para eles, tudo, absolutamente tudo, era definido da seguinte maneira: "É ducaraio, véio". Triste constatação de um tempo perdido.

2) É fato consumado que muitos Rockers brasileiros ligam-se em futebol e nos bastidores de shows, é muito comum que sempre haja uma movimentação extra, com muita gente a buscar um monitor de TV, ou no mínimo um radinho de pilha para saber dos resultados da rodada, em dias de jogos (hoje em dia tem internet, eu sei, muito melhor)...

Dessa maneira, havia sempre um murmúrio da parte de alguns e claro que eu incluo-me nesse rol, ao tentar buscar informações sobre o jogo que acontecia naquele momento, válido pelo campeonato paulista de 1993: Palmeiras x Santos, no Morumbi. Muitos palmeirenses presentes entre os músicos comemoraram a virada do nosso time e o resultado final de 2 x 1, quando já começava a anoitecer e aproximava-se a hora do Pitbulls on Crack, subir ao palco. 

Foi quando um ônibus lotado com torcedores do Santos, passou, e claro que um palco com bandas de Rock a tocar ao ar livre e uma multidão de cabeludos, tornou-se um prato cheio para o bullying inevitável dos sujeitos, ao gritarem impropérios pelas janelas do veículo. Foi quando sob uma reação imediata, vários que ali estavam presentes e sabiam do resultado da partida, retrucaram a ironizar os santistas, ao fazer menção ao resultado do jogo com a derrota do time deles. 

Os torcedores santistas enlouqueceram e ameaçaram precipitar a parada do ônibus para descerem e procurarem as vias de fato, e nesse caso, não seria nada surpreendente por vir deles, que eram membros de uma das mais tradicionais torcidas uniformizadas daquele clube, e com longo histórico de truculência no seu currículo. 

Não pararam, mas se viessem, não teriam moleza, pois houvera no local, também, um bom contingente de adeptos do Heavy-Metal, os tais headbangers e esses sujeitos também não gostavam de levar desaforo para a casa.

A seguir, no dia 10 de abril de 1993, tocamos no "Garage Rock", uma casa de shows que localizava-se em Pinheiros, na zona oeste de São Paulo. Tocamos junto com bandas como: "Anjos dos Becos", "Jazzumbi" e "X-Rated". O público foi muito bom, com cerca de mil pagantes e como o local era enorme (literalmente uma garagem imensa), nós organizamos um futebol improvisado entre bandas para espantar o tédio da demora entre o soundcheck e a hora do show.

Começou com uma tampinha de garrafa, mas logo improvisaram a clássica bola de meia, ao conferir mais "qualidade" à disputa...
Como eu salientei acima, acho que desde os Novos Baianos, o futebol tem papel importante entre Rockers brasileiros. 

Outra curiosidade engraçada foi que um membro de uma das bandas foi surpreendido pelos seguranças da casa, a vontade com uma groupie, embrenhados na parte abaixo do palco, entre as estruturas metálicas de sustentação. Não vou revelar quem foi, mas digo que era um conhecido nosso.

E o próximo compromisso, foi participarmos do tradicional programa ao vivo da Rádio Brasil 2000 FM, que era muito cobiçado pelas bandas, não só de São Paulo, devido à sua boa audiência e sobretudo pelo formato. Isso por que foi um programa que permitira às bandas, tocarem por uma hora, com entrevista intercalada. 

E assim, apresentamo-nos no dia 3 de junho de 1993, com a presença de cerca de dez pessoas convidadas apenas, pela dimensão diminuta do estúdio e fomos entrevistados pelo radialista/jornalista/locutor Osmar "Osmi" Santos Junior, idealizador do programa.

Eis abaixo uma versão de "The Shadow of the Light", dessa apresentação na Brasil 2000 FM, sob um promo criado em 2015, com a ajuda dos produtores, Fernando Ceah e Jani Santana Morales, especialmente para o YouTube:

Eis o Link para assistir no YouTube:
https://www.youtube.com/watch?v=R1RQ7CGKEOg&feature=youtu.be

Abaixo, a versão de "Cracked Actor", do David Bowie e que adorávamos tocar, principalmente eu e Chris, por que gostamos muito do mestre camaleão, dos "Spiders From Mars" e toda a cena do Glitter Rock britânico e setentista.

Eis o Link para assistir no YouTube:
https://www.youtube.com/watch?v=nA1oAjzFB6Y


Foi uma apresentação muito divertida com muitas piadas no ar, é claro, ao serem proferidas pelos humoristas natos do "Pitbulls on Crack". Tocamos oito músicas nessa apresentação no programa, "Clip Independente": "Under the Light of the Moon", "The Shadow of the Light", "Cracked Actor", "Answer Machine", "Back in the Junkyard", "Killers", "Never Mind", "Candle Light" e "Ticket to Ride".  

"Cracked Actor" e "Ticket to Ride" foram releituras, do David Bowie e Beatles, respectivamente. 

Dali em diante, começariam as gravações da nossa participação na coletânea: "A Vez do Brasil", nome do programa da 89 FM, que ironizava a famigerada, "A Voz do Brasil", e só tocava bandas nacionais (uma atitude nobre, sem dúvida).

Essa nota publicada no jornal "O Estado de São Paulo", logo no primeiro dia de 1993, dá uma ideia de como havia uma efervescência Rocker em São Paulo, no início dos anos noventa, a insinuar levemente que poderia haver uma nova moda a ressuscitar o "BR-Rock", ao reeditar a onda oitentista, porém desta feita mediante a estética indie e ainda que fosse uma espécie de filhote do Pós-Punk oitentista, continha a atenuante por conta da influência que o grunge de Seattle estava a exercer.

E nesta avaliação dos "melhores" de 1992, da Revista Bizz (que era a "Bíblia" dos formadores de opinião, infelizmente), o Pitbulls on Crack teve menção espetacular, ao meu ver. 

Sobre a enquete que avaliou os "melhores de 1992" na cotação da revista "Bizz", nota-se que o "Skank" ainda era um ilustre desconhecido fora do mainstream e eu recordo-me de que os seus membros autoclassificavam-na como uma banda de reggae nessa época, mas já despontavam, e questão de dois anos depois, passariam a visitar a parada de sucessos do mainstream. O mesmo caso de Daniela Mercury, que estouraria como cantora de "axé music", logo a seguir, nos holofotes do mundo mainstream. 

Quanto aos demais, foram nomes que insinuavam-se pelo underground, como "Mickey Junkies", "Virna Lisi", "Yo-Ho-Delic", e "Gothic Vox". 

É curiosa a presença do "Second Come", em primeiro lugar, pois ao que consta-me, e corrijam-me se eu estiver errado, essa banda não aconteceu, simplesmente. 

"Justa Causa" é outro exemplo que não deu em nada e convenhamos, nem no âmbito underground eu sabia de sua existência à época. 

"Exhort" foi uma banda de Heavy Metal formada ainda nos anos oitenta, cujo baixista, Nando Machado, fora meu aluno e ele é irmão do Felipe Machado, este, guitarrista do "Viper" e jornalista. 

O "Gangrena Gasosa" fora uma banda de heavy-metal extremo, mas mantinha como mote uma curiosa temática, pois todos os seus membros usavam vestimentas ritualísticas do candomblé e as músicas giravam em torno da terminologia usada entre os membros de tal religião afro-brasileira. Por esse detalhe, reputo ser bastante criativa tal ideia pois investira no surrado espectro do satanismo/ocultismo/demonologia, exaustivamente usado por bandas internacionais desse gênero, mas sob criatividade, ao fazer uso do folclore genuinamente afro-brasileiro para impressionar os seus fãs.

Finalmente, o tal de "Xicotinho e Salto Alto" (escrito com X, errado, eu sei), foi uma incógnita na minha percepção. O que foi aquilo, uma dupla sertaneja, ou uma banda de rock satírica?

Para efeito de autobiografia, chama-me a atenção que no virar de 1992 para 1993, nós tenhamos suplantado o "Yo-Ho-Delic", que vinha de uma labuta mais antiga que a nossa, desde 1991, pelo menos. Além de ter maior longevidade, tal banda quando começamos a dar nossos primeiros passos, era a mais "hypada" nas conversas de bastidores pelas casas noturnas do circuito indie de São Paulo e também nas rodinhas de conversas frequentadas por jornalistas, músicos e produtores musicais. 

O fato de nós a termos superado na reta final, mesmo por entrarmos na corrida depois, foi algo extraordinário sob o nosso prisma (eu sei que essa banda lançou um disco solo logo a seguir) e explica um pouco a razão dessa banda ter sido preterida pela gravadora, a constar da coletânea e nós confirmados.

Continua...

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