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quarta-feira, 8 de junho de 2016

1963 - Minha Ligação Inicial com o Rock na Infância e Começo da Adolescência - 1963: Ao Eleger Predileções & Primeiros Ídolos - Por Luiz Domingues

Em 1963, concomitante com o desenvolvimento da fala e o poder de compreensão cada vez maior de minha parte, a absorção da avalanche de informações que recebia, se intensificava, na mesma proporção em que eu me qualificava para recebê-las.
Eu, Luiz Domingues, em 1963, na porta de minha residência, a posar em frente ao carro de meu padrinho, um Chevrolet dos anos quarenta, intacto e a tinir (alô especialistas em carros vintage: trata-se de um modelo Skoda, ano 1948, por acaso? Realmente eu não me recordo desse detalhe).
 
Nessa altura, eu já tinha as minhas predileções, simpatias & antipatias, embora naturalmente, claro que o senso crítico que eu possuía, era zero % ou algo não muito além disso pela incapacidade infantil normal em formulá-las com argumentos minimamente maduros. Foi uma fase em que o máximo que eu pude exprimir intelectualmente, foi gostar ou não, sem maiores explicações e nenhuma obrigação em ter razões bem fundamentadas para tal...
No campo das histórias em quadrinhos, por exemplo, foi quando tive a primeira demonstração de apreço por tal forma de arte e simpatia confessa por um personagem. Como o meu pai assinava o jornal, "Folha de São Paulo", com a criação de um suplemento infantil chamado: "Folhinha" em 1963, as tiras com personagens do desenhista, Maurício de Souza começaram a serem publicadas ali. 
 
Sendo analfabeto na ocasião, naturalmente que eu pedia para a minha mãe ler o texto contido nos balões e me tornei fã dos personagens, mas com especial predileção por um filhote de Tiranossauro Rex, chamado: Horácio. A identificação foi imediata visto que o personagem era tímido e vegetariano, como eu (ora vejam só... um filhote de T.Rex, que não comia carne... que bizarro), além da sua cor verde, pela qual eu simpatizava. 

Dali em diante, fui a descobrir outros personagens de outras turmas, incluso o universo Disney, do qual nunca gostei na verdade, com uma ou outra exceção a respeito de algum personagem isoladamente, por achar feminino demais ou melhor, na mentalidade que eu tinha naquela fase, aos três anos de idade, era "coisa de menina"... 
A foto acima não é das melhores, a encontrei na internet. Mas é exatamente essa a coleção de livros dos contos dos Irmãos Grimm, que meus pais compraram para me presentear e que minha mãe lia em voz alta para a minha compreensão, nas tardes de 1963, 1964...

E ao misturar conceitos, também, comecei a absorver os personagens clássicos das histórias infantis, ícones da literatura de Hans Christian Andersen ou dos Irmãos Grimm, por exemplo. Na minha ingenuidade, considerava todos iguais, sem distinção. Demoraria um pouco para conhecer o universo dos Super Heróis da Marvel e da DC Comics, mas foi mera questão de tempo.

No futebol, comecei a entender esse mundo, se bem que ainda timidamente. O que primeiro me chamou a atenção foi o interesse generalizado das pessoas, mas que contrastava com o ambiente familiar onde na figura masculina mais próxima e influente possível, eu não encontrava eco. Meu pai era uma avis rara nesse aspecto, pois ele detestava futebol, ao considerar ser uma perda de tempo, uma enganação, porque achava que todos os resultados eram arranjados para arrancar dinheiro das pessoas e por ser um fator alienante em potencial, visto que ele era politizado por natureza, e assim considerava o esporte bretão, uma arma na mão dos poderosos para a manipulação do povo incauto. Não é uma teoria absurda, devo admitir.
Ainda não apaixonado pelo verdão, mas já a colecionar taças...
 
Bem, não sou um adepto entusiasmado da teoria da conspiração a achar que está tudo dominado e somos todos trouxas manipulados pelas corporações, "mas que las hay, las hay"...

Sendo assim, o incentivo para que eu me interessasse, se dependesse dele, seria zero %, mas ele sabia que corria o risco de não me controlar, na medida em que eu crescesse e ao me socializar, sofreria influências vindas de múltiplas situações. E nem precisou entrar em idade escolar para que isso de fato ocorresse, pois isso logo aconteceria assim que comecei a ter mais contato com tios e primos, e sob uma segunda instância, finalmente ao ter maior convivência com meu avô materno, que era um entusiasta do ludopédio, desde o tempo do Clube Atlético Paulistano, e fã de Friedenreich, ou seja, acompanhava o futebol desde os primórdios. 

Eis o álbum de figurinhas do Torneio Rio-São Paulo de 1963, que meu primo mais velho trouxe um dia em minha casa para eu ver, e que foi o primeiro impulso concreto para eu começar a me interessar pelo futebol.

Mas o fator desencadeador mesmo foi através de um outro ícone infantil e absolutamente lúdico: um álbum de figurinhas! Através de meu primo mais velho que já era um santista fanático por conta do Pelé e o grande time que o Santos tinha na ocasião, fiquei encantado quando ele me mostrou o seu álbum oficial do Torneio Rio-São Paulo de 1963, com figurinhas dos jogadores, os uniformes e escudos de todos os clubes participantes etc.  

Não que eu passasse a acompanhar e entender ali naquele instante, porque realmente se dependesse do meu pai, não teria chance de vir a gostar, mas digamos que foi o primeiro sinal que tive para simpatizar com o assunto.  

Na primeira ilustração, o cartaz oficial dos Jogos Panamericanos de 1963, em São Paulo. Abaixo, foto da cerimônia de abertura do Pan 1963, no estádio do Pacaembu.
 
E ainda a falar sobre esportes, houveram os Jogos Panamericanos, em 1963 e São Paulo foi eleita a cidade sede. Lembro dos comentários e da cobertura da imprensa, embora fosse bem modesta se comparada à forma com a qual se cobrem grandes eventos dessa natureza, como Olimpíadas, Copa do Mundo e os próprios Jogos Panamericanos nos dias atuais, com super cobertura em canais de TV a cabo especializados e a internet a todo vapor. 

Pai norte-americano e filha brasileira. Jazz e samba tudo misturado. Família Pitman, Eliana e Booker

No campo musical, eu continuei a ouvir no rádio e ver na TV, muitos artistas e nessa altura, também já a reconhecer figuras internacionais, inclusive, casos de Ray Charles, Frank Sinatra, Dean Martin, Bing Crosby, Elvis Presley e muitos outros. 

Gostava da Leny Eversong, que cantava em inglês e francês, também e me confundia ao ponto de eu não saber se ela era brasileira. Mesmo caso da cantora, Eliana Pitman, que parecia uma diva do jazz norte-americano (se reforçava tal impressão pelo fato dela ser de fato, filha de um músico norte-americano de jazz, Booker Pitman). 

Nessa altura, as músicas dos Beatles já estavam a serem executadas sob um verdadeiro massacre nas emissoras de rádio e por conta dessa avalanche, começavam a aparecer na TV, artistas brasileiros similares, a buscar adequação com o novo modismo vindo da Inglaterra. Lembro de bandas como o Jet Blacks e The Clevers, se bem que esses artistas seguiam muito mais a cartilha do som instrumental de bandas como The Shadows e The Ventures.  
Dentro de casa, o primeiro disco de Rock genuíno que eu ouvi e fazia parte do acervo dos meus pais, foi a trilha sonora do filme, "Rock Around the Clock" ("Ao Balanço das Horas", no título em português), portanto foi com um pioneiro do Rock, Bill Halley, que tive o primeiro contato mais direto com tal escola musical, tendo esse LP em casa à disposição para ouvir quando quisesse.

Na TV brasileira do início dos anos sessenta, a música abundava e com muita qualidade, vide três exemplos acima nas fotos

Meus pais gostavam de assistir programas musicais na TV e eu também. Ali, a MPB oriunda de várias vertentes se apresentava, mas haviam também artistas de outras searas musicais. Muita música instrumental, com orientação jazzistica, via combos em trio com a formação clássica a contar com piano, bateria & baixo acústico, predominantemente (a onda dos combos, estilo Zimbo Trio, Tamba Trio etc), porém muitas vezes acrescidos com instrumentistas adicionais, a tocarem sopros, sax em sua predominância e trompete em segundo instância.

Meu pai tinha também várias caixas com coleções musicais temáticas, que foi um tipo de produto muito comum que a indústria fonográfica ofereceu ao consumidor, nessa época. Eram caixas a conter música étnica, por exemplo, com cada volume a representar a música folclórica de um determinado país, ou trilhas sonoras de diversos filmes. Haviam também caixas com versões orquestradas para sucessos multifacetados do momento, ou de épocas passadas.


Um bom exemplo desse tipo de caixa com vários LP's, denominada "Festival de Música Popular", foi lançada com a chancela da revista de variedades: "Seleções de Reader's Digest. Tal revista, que foi um clássico almanaque de leitura rápida ("leituras digestivas", para ler após as refeições, essa era a mensagem subliminar), variada e destinada ao cidadão comum norte-americano, fazia sucesso também aqui no Brasil, em versão em português, desde os anos quarenta, acredito. 

Não era vendida em bancas, mas apenas por assinatura. E sendo assim, essa caixa patrocinada pela referida revista, chegou a milhares de lares brasileiros, incluso o nosso, e meu pai adorava tal coleção. Meu avô materno também a possuía.


Com dez Lp's, era eclética na sua atribuição musical, com cada LP a apresentar um repertório completamente diferente, um do outro, mas todos os discos foram gravados por uma orquestra cujo nome, além de outras informações não constavam na ficha técnica da caixa (uma grande pena não constar informações nesse sentido!). 

Havia um LP somente com canções folclóricas brasileiras, com várias músicas de estados diferentes, outro de música erudita e assim por diante. 

Um desses LP's, por exemplo, continha marchas militares, incluso internacionais. Rapidamente eu associei várias marchas militares que ali ouvia, aos filmes de guerra, norte-americanos que via na TV, e onde tais marchas eram executadas mesmo em pequenos trechos, com tais fatores a reforçar o meu entusiasmo por filmes dessa natureza e a enfocar a Segunda Guerra Mundial, principalmente. 

Sob uma outra atribuição que pessoalmente conferi à essa coleção com discos a apresentar marchas militares, eis que tal LP se tornou também um sinal subliminar para a minha percepção. Se no domingo pela manhã eu fosse acordado pelo volume absurdo com o qual meu pai ouvia essas marchas, apesar da maneira violenta e desagradável para se despertar, era sinal que o meu "velho" (que na verdade era bem jovem na época, com apenas 29 anos de idade), estava com bom humor.

Por falar em filmes, a partir de 1963, comecei a apreciá-los intensamente, de fato. Não digo que os entendia perfeitamente, a se depender de cada caso e sua complexidade inerente, mas já identificava atores, cujos nomes decorei foneticamente, nos casos dos internacionais e com pronúncias exóticas na minha compreensão. 

E comecei a apreciar também, profundamente, o aspecto do tempo que via nos filmes. Achava extraordinário ver filmes produzidos nas décadas de vinte, trinta e quarenta e notar a particularidade de cada época. 

Filmes cinquentistas também eram exibidos, mas eram considerados "recentes", naturalmente.  Bem, posso afirmar categoricamente que de 1963 em diante, o cinema me arrebatou para sempre. Eu adorava os filmes de guerra, policiais/noir, históricos, os ditos "capa-e-espada" que designavam filmes ambientados na Idade Média e/ou Renascença até a Idade Moderna mais ou menos, épicos com ambientação na antiguidade, comédias, e claro, bem pequeno e sendo representante do gênero masculino, me tornei fã incondicional de filmes de ficção científica ou Sci-Fi, como são chamados ("coisa de menino"...).

Mesmo sem saber (e demoraria um pouco para ter essa consciência), me tornei fã de diretores como: Frank Capra, Billy Wilder, Rouben Mamoulian, William Wyler, Michael Curtiz, Ernst Lubitsch, John Ford, Jack Arnold... e a lista só aumentou com o passar dos anos. 

Foi em 1963, também, que o meu pai me levou pela primeira vez a uma sala de cinema. Havia a restrição por eu não ter ainda a idade mínima para ingressar em uma sala de cinema, cinco anos completos, mas o porteiro não falou nada e nós entramos. Boquiaberto vi uma incrível imagem colorida naquela tela enorme, em uma sessão matinal dominical, que era bem comum nos cinemas daquela época, destinada às crianças. Foi uma seleção com desenhos antigos, muito provavelmente da produtora, Fleischer e tal experiência repetir-se-ia em muitos outros domingos entre 1963 e 1965, através de sessões marcadas para as dez da manhã.

Outro aspecto cultural muito particular e marcante na minha percepção, se deu nesse ano. Meus pais já haviam comprado coleções de livros infantis antes e entre elas, havia uma que gostava muito, com os contos clássicos dos Irmãos Grimm, que minha mãe costumava ler para a minha audição, em dias úteis após o almoço, estrategicamente para provocar o meu sono e poder deixá-la cuidar das tarefas domésticas em paz. 

No entanto, uma nova coleção de livros me foi presenteada pelos meus pais, ao remeter ao "Dia das Crianças" do ano de 1963 e mais adequada para ser apreciada quando eu fosse mais velho, sendo portanto uma espécie de investimento que fizeram para a minha formação. 

Não poderia ter sido algo mais certeiro, pois mesmo ainda analfabeto, pequeno e muito infantil, eu adorei aquela coleção de uma forma absurda, como se fosse algo que eu esperasse ter e na verdade, é claro que nem sonhava com sua existência.  

Chamava-se: "Trópico" e era uma série de tomos destinados ao público infantojuvenil, a abordar assuntos de interesse cultural em grande amplitude, através de pequenas dissertações ricamente ilustradas em traços realistas e muito bonitos. 

Foi um lançamento da Editora Martins Fontes e falava sobre assuntos relacionados à história em geral, artes, ciência a abordar descobertas & invenções, biografias de personalidades benfeitoras da humanidade em vários campos, curiosidades sobre a origem de diversas objetos, fenômenos da natureza etc. 


A organização dessa enciclopédia livre não guarda uma cronologia rígida, ou seja, após um artigo sobre  a civilização dos Fenícios, por exemplo, a próxima página poderia enfocar a vida e obra da Madame Curie, ou o resumo de uma obra literária, como "Os Miseráveis", de Vitor Hugo. Mais uma página virada e o assunto seria a invenção da máquina fotográfica ou a prensa de Gutemberg... enfim, só pelas figuras, a evocar tais temas, eu já fiquei louco pelos livros e quando aprendi a ler enfim, os devorei.  
"Trópico" se tornou tão importante na minha vida, que assim que eu me alfabetizei, comecei a escrever um "livro", a imitar acintosamente a predisposição dessa redação que me influenciara, para poder falar sobre assuntos culturais de diferentes motivações, sem guardar a cronologia rígida. 
A minha obsessão pela coleção "Trópico" se traduziu nessa tentativa infantil para imitá-lo, quando alguns anos depois, em 1968, comecei a escrever o que teria sido o meu "primeiro livro": "O Mundo em Qualquer Época". 
 
Claro que foi um esboço absolutamente infantil, com toda a ingenuidade e falta de profundidade inerente, para ficar restrito a uma lembrança pessoal guardada com carinho, apenas. Chamei-o como: "O Mundo em Qualquer Época", escrito em 1968, e claro, é apenas uma coleção com algumas dissertações que criei sobre assuntos variados, ao estilo do que eu adorava no "Trópico", anotadas em um caderno escolar e manuscrito a lápis, com caligrafia sofrível e a conter erros crassos de ortografia e gramática, inevitáveis à minha condição infantil de recém-alfabetizado na época.

Seriados e desenhos também se tornaram paixões arrebatadoras. Sobre desenho animado, foi de se esperar, mas o meu apreço pelos seriados para adultos já nessa idade, denotou que seria algo a me acompanhar pelo resto da vida. 

O emblemático e longevo seriado norte-americano, "Bonanza"

Eu adorava inúmeras séries que eram exibidas pela TV. "Bonanza" e "Bat Masterson" foram muito queridas, entre tantas outras. Gostava muito da saga da família Cartwright, personagens simpáticos e que pareciam se portar de forma justa e esse valor em específico, a justiça, eu já admirava muito, mesmo nessa idade. 

Tratava-se do cotidiano de um pai e três filhos, cada um desses filhos, de uma mãe diferente e todos donos de uma fazenda gigantesca ("Ponderosa"), latifundiários, portanto. 

O meu personagem predileto foi o "Hoss Cartwright", interpretado por Dan Blocker. Grandalhão e bruto, forte ao extremo e bom de briga, mas ao mesmo tempo dócil, infantil e muito ingênuo. Anos depois eu soube que não fora somente eu que gostava desse personagem, mas quase todas as crianças norte-americanas e de todos os países do mundo onde Bonanza fez sucesso.  

Sobre Bat Masterson, eu adorava o jeito inabalável de um gentleman que o personagem protagonista ostentava, em meio ao ambiente inóspito em que interagia, em pleno "velho oeste" norte-americano, misturado aos broncos que o habitavam.  
E muito mais que isso, eu gostava bastante de seriados tais como: Dr. Kildare, Perry Mason, Ben Casey, Patrulha Rodoviária, Rota 66, I Love Lucy, Os Três Patetas e muitos outros, incluso adaptações de antigos curta-metragens das décadas de dez e vinte, criados nessas décadas remotas, para serem exibidos na TV como sitcom, tais como obras de Charles Chaplin, Buster Keaton, Harold Lloyd, Laurel & Hardy e obras mais então recentes (produção dos anos quarenta), como Abbott & Costello.
Sobre "Twilight Zone", eu passei a adorar tal seriado, apesar de confessar que o assistia a sentir medo... e "Combat", um seriado sensacional que só reforçou o meu apreço pelos filmes de guerra.
 
Em termos de desenhos animados, também já tinha os meus prediletos e foram muitos. Tartaruga Touché, Pepe Legal, Lippy & Hardy, Zé Colméia, Jambo & Ruivão e um dos mais queridos em 1963: Wally Gator, um jacaré (na verdade um Alligator, daí o trocadilho com o nome do personagem), bom vivant que usava o zoológico de Los Angeles, onde morava, como se fosse seu spa particular... absolutamente hilário!
Programas infantis como Sessão Zás-Trás e Pullman Junior, também me agradavam, mas eu gostava mesmo era dos desenhos que exibiam, mais dos que as brincadeiras e gincanas que faziam ao vivo, no estúdio.

Sobre acontecimentos do ano, eu me lembro bem da morte do presidente, norte-americano, John Kennedy. A repercussão que teve na imprensa de então, foi enorme e gerou comoção total. 

Lembro das fotos nos jornais e revistas, a cobertura da TV e dos comentários dos adultos. Impressionou-me a ideia de que os tiros na sua cabeça lhe arrancaram os miolos do cérebro, como os adultos falavam ao meu redor e eu achei aquilo uma ato incrivelmente impressionante e terrível, e convenhamos, claro o que o foi mesmo... 

A antiga sede da Câmara Municipal de São Paulo, no Palacete Prates, da Rua Líbero Badaró, entre o Largo São Bento e o Viaduto do Chá, no centro velho de São Paulo e local onde o meu pai trabalhava desde 1955. Fui muitas vezes com ele ao seu local de trabalho e assisti sessões plenárias dos vereadores e muitos deles que tiveram projeção nacional na política, a posteriori. A sede do parlamento municipal paulistano funcionou nesse velho palacete até meados de 1969, quando foi transferida para um prédio moderno e construído para esse fim, no Viaduto Jacareí (Palácio Anchieta), ali perto mesmo e onde funciona desde então, até os dias atuais.
 
Eu já começava a me interessar-me pela política também e aí pela influência direta do meu pai que adorava a discussão e pelo fato dele ser funcionário da Câmara Municipal de São Paulo, conhecia muitos vereadores e seus assessores. Em breve, seria uma quase rotina na minha pequena compreensão de então, acompanhá-lo ao parlamento municipal e assistir sessões plenárias sentado na galeria dos munícipes ouvintes, para ver e ouvir os discursos de políticos. 

Muitos desses que eu vi a discursar, se tornaram deputados estaduais e federais e até senadores e governadores no futuro. Entrei em gabinetes e cumprimentei muitos deles, como Ulisses Guimarães e Franco Montoro, entre tantos outros. 

Sobre o meu cotidiano prosaico, eu já mantinha os meus hábitos e predileções. Gostava de uma série de guloseimas típicas da época, e de 1963 em diante, se tornou um hábito sair com meu pai após o jantar e irmos a uma bombonière que ficava ao lado do cinema acoplado ao colégio Agostiniano São José, que se localizava na primeira rua paralela em que morávamos, quando ele comprava um singelo tablete de chocolate branco, da marca Galak. Voltava então para a casa a saboreá-lo, sob a intensa garoa paulistana, que nunca falhava e a noite prosseguia em família, sob cobertores, em frente ao aparelho de TV, a assistir tudo o que descrevi acima e muito mais atrações. 
Fachada do Colégio Agostiniano São José, na Rua Marquês de Abrantes, no bairro do Belenzinho, zona leste de São Paulo, em foto mais atual.
Foto mais moderna do antigo cinema pertencente ao Colégio Agostiniano São José e que na época em que morei no bairro, era conhecido informalmente como o "cinema dos padres". Já faz tempo, se tornou um auditório para atividades curriculares e culturais para os alunos, apenas. 
 
Não é sempre que posso, mas vez por outra eu gosto de ir ao bairro do Belenzinho e ali ao lado do antigo cinema, que hoje é usado como auditório do Colégio Agostiniano São José, não existe mais a bombonière do jeito que ela era no início dos anos sessenta, mas funciona uma pequena lanchonete. Vou ali, peço um Galak e sento-me na mesa, para passar entre dez a quinze minutos a me recordar desse tempo bom que vivi ali naquele bairro, naquela década e o sabor do chocolate me ajuda a reativar as lembranças doces...

Gostava muito também do chocolate em forma de cigarros, da Pan, um clássico da época. Apesar da dificuldade que havia para se desembrulhar a embalagem, e que invariavelmente fazia o pouco conteúdo de chocolate existente, derreter na mão da criança, o sabor valia a pena. 

E ninguém na época achava perniciosa a ideia da embalagem do chocolate simular um cigarro, com a criançada a fazer pose como adulto, a segurar o cigarrinho na mão, apesar de que na minha compreensão de hoje em dia, seja um óbvio e absurdo incentivo ao tabagismo, ao glorificá-lo para crianças...

Tudo o que descrevi sob o âmbito cultural, me influenciar fortemente e logo a seguir, a música começaria a ganhar mais espaço, sem com que os outros aspectos fossem necessariamente diminuídos. Pelo contrário, a amplitude da minha visão caminhava em franca expansão. Estava na primeira infância ainda e um mundo de percepções novas se mostravam ali na frente, prontas para serem descobertas.  

E o Rock estava a esquentar... mesmo com a resistência sistemática da parte das pessoas conservadoras, com valores mais antigos e arraigados como modus operandi e que não engoliam a estridência das guitarras e o cabelo "longo" dos novos artistas a lhes cobrirem as orelhas, pareceu ser algo inexorável e os sinais só demonstravam apontar mesmo para se reverter em um processo irreversível.  
Aos poucos, aquela carga musical tão vibrante respingar-me-ia, apesar da minha pouquíssima idade na ocasião. Mas eu também estava a crescer, portanto... encontrar-nos-íamos mais cedo ou mais tarde...

Ao se encerrar o ano de 1963, a Beatlemania já era uma febre no Reino Unido. Em poucos meses, a invasão britânica chegaria à América e não foram somente esses quatro cabeludos de Liverpool, mas como um exército, muitos outros desembarcariam na mesma Blitzkrieg irreversível!

Escondam as suas filhas: os Rolling Stones estão em ação, também!
Continua...

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