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quinta-feira, 14 de maio de 2015

A Chave do Sol - Capítulo 7 - A Lançar o Disco com Muito Nonsense! - Por Luiz Domingues

Sei que é desagradável observar isso, mas não dá para não deixar de notar o erro crasso nessa nota publicada no Diário Popular... como assim, "Chaves?"

Aproximaram-se os preparativos para os shows oficiais de lançamento do primeiro disco d'A Chave do Sol, mas antes desses espetáculos se concretizarem, o próximo passo da banda foi um show em uma casa noturna, sob uma rara data em que fiquei sem compromisso com o Língua de Trapo, nesse primeiro semestre de 1984.  

Ocorreu no Albergue Bar, no dia 29 de junho de 1984. Localizado no bairro do Bexiga em São Paulo, aconteceu em uma sexta-feira, e teve cinquenta pessoas na plateia. Nesse show, aproveitamos para realizar o teste final com aqueles dois candidatos a vocalistas que havíamos experimentado anteriormente e cuja passagem sobre uma avaliação preliminar de ambos, eu já citei anteriormente.

E mais uma vez, o nosso amigo e eterno postulante à vaga de vocalista, Wagner "Sabbath" apareceu, e cometeu um tumulto nesse processo.  

Fizemos a nossa apresentação normalmente, e na parte final, com o bar quase vazio, cumprimos o teste. Os dois rapazes cantaram bem, e na verdade, eram muito parecidos, tecnicamente. Contudo, nenhum dos dois convenceu-nos definitivamente, e diante dessa falta de entusiasmo que obtivemos em relação a ambos, resolvemos dispensá-los.  

E no caso do Wagner "Sabbath", ocorreu que ele agiu no sentido de que pressionou-nos para ser incluído nos testes. E não contente com isso, assolou os tais candidatos psicologicamente, ao importuná-los, acintosamente. 

Um fator foi certo: ele tinha obstinação, e isso eu admirava nele, como característica de sua personalidade.

Bem, não fechamos com nenhum deles, mas em breve, uma nova oportunidade surgiria para a banda. Antes de chegar nesse ponto, preciso falar que no dia seguinte, fizemos um novo show, e esse rendeu uma boa história!

Ocorreu que em 30 de junho de 1984, um sábado, eu teria um show para fazer com o Língua de Trapo na cidade de Jundiaí, no interior de São Paulo (já falei sobre esse show no capítulo do Língua de Trapo sob tal viés). 

Mas eu havia dado o sinal verde para fechar um outro show d'A Chave do Sol, pois seria uma apresentação marcada para a meia noite. 

Falei com o Jerome Vonk, empresário do Língua de Trapo e ele garantiu-me que o show em Jundiaí-SP não teria atraso, e dessa forma, por volta das 23:00 horas, estaríamos novamente em São Paulo. Combinei com o Rubens Gióia, para ele fornecer-me uma carona, e assim, através de um frenesi total, eu fiz o show com o Língua de Trapo no interior, e fui velozmente para o show d'A Chave do Sol.  

Jundiaí, fica perto de São Paulo, cerca de cinquenta Km, portanto, deu tudo certo nesse sentido. Uma carona providencial deixou-me por volta de 23:15 h. no bairro de Pinheiros, na zona oeste de São Paulo e logo que entramos na rua combinada para o desembarque, eu avistei o carro do Rubens, que aguardava-me. 

Até aí, foi tudo bem concatenado, conforme o previsto e o combinado. Contudo, quando chegamos ao local do show, um mal-entendido foi gerado por uma observação que eu fiz, de forma inocente, e criou-se assim, um clima ruim para o show. O local foi o "Morro da Lua", onde fizéramos um dos mais inusitados shows da carreira da Chave do Sol, no ano anterior, 1983.  

Novamente contatados pelo rapaz que organizava festas com a inclusão de performances de motociclismo, desta vez, porém, ele foi menos invasivo, e não propôs insanidades, como em 1983 (já relatei sobre isso, anteriormente), a contentar-se em que tocássemos o nosso repertório normal, sem afetações.

O grande entrevero deu-se quando chegamos ao local, e encontramo-nos com o Zé Luiz. Ele estava muito nervoso, pois apesar de eu ter chegado somente alguns minutos além do combinado, ele fora o responsável pela montagem do equipamento, e estava há muitas horas ali, cansado, faminto e ansioso.  

Quando viu-me a adentrar o improvisado camarim, ele disse-me para eu preparar o baixo com agilidade, pois começaríamos o show, imediatamente. Eu, por minha vez, sem nenhuma intenção de causar-lhe nenhuma contrariedade, retruquei, ao dizer-lhe que acabara de chegar, e que achava melhor aguardar alguns minutos.

Então, ele explodiu e dessa maneira, tivemos uma ríspida discussão. Na mesma hora, eu percebi que ele estava irritado com a demora em esperar-me, e claro que esse estopim também continha a insatisfação que ele e Rubens sentiam por eu estar a tocar em outra banda, simultaneamente, e a prejudicar assim a nossa banda. 
 
Todavia, todos sabiam que eu precisava acumular funções dada a oportunidade que surgira, inclusive sob o âmbito financeiro e A Chave do Sol ainda não reunia condições nesse sentido, portanto, a insatisfação fora previsível, porém injusta para comigo, pelas circunstâncias. 
Naquele dia em específico, todos sabiam da situação, e ao analisar pelo meu lado, não medi esforços para fazer os dois shows, ao sacrificar-me para cumprir os dois compromissos da melhor maneira possível. Claro, fiquei chateado na hora, mas alguns minutos depois, eu entendi o ponto de vista dele, e fizemos o show, talvez não com o astral bom de sempre, mas de forma digna, sem dúvida, sob profissionalismo em respeito ao público presente.
O público não foi bom, no entanto, com apenas cem pessoas na plateia, e sob o frio de rachar do início do inverno, ainda mais naquele descampado e ao considerar-se que o Morumbi, por ser um bairro construído em uma parte alta da cidade, tradicionalmente é mais frio que outros bairros de São Paulo. Ocorreu no dia 30 de junho de 1984, um sábado.
E no mesmo dia 30 de junho de 1984, foi ao ar a quinta participação d'A Chave do Sol no programa: "A Fábrica do Som", da TV Cultura de São Paulo, conforme eu já relatei no capítulo anterior.

Antes de eu seguir a comentar sobre os preparativos do show de lançamento do nosso compacto, que ocorreu no Teatro Lira Paulistana, tenho uma história incrível para contar e que contém muitos detalhes. 

Com a projeção que alcançáramos através do programa, "A Fábrica do Som", da TV Cultura, o fato foi que nós criamos um divisor de águas.

Da primeira aparição em diante, a apontar uma clara tendência a crescer, nós solidificamos a nossa posição como banda emergente e postulante ao mainstream, com todos os elementos inerentes a quem alcança tal status. 

E dessa forma, foi natural que as oportunidades acontecessem. Pois foi então que uma produtora jovem, que a mostrar-se muito solícita, abordou-nos em meados de junho, para dar-nos uma ótima nova: ela desejou saber se aceitávamos realizar um show em uma enorme danceteria, recém-inaugurada em São Paulo, com grande badalação.

Claro que aceitamos e com grande euforia, evidentemente, pois representara muitos fatores positivos em jogo:

1) A oportunidade para se tocar em um lugar badalado.

2) Mediante a presença de um público enorme, pois o local era gigantesco em suas dimensões físicas.

3) Com o respaldo de conter equipamento de som e iluminação de peso e qualidade.

4) A certeza de haver uma boa cobertura na mídia mainstream impressa.

5) E o melhor de todos os benefícios: um cachê robusto, a significar algo muito acima do nosso padrão da ocasião.

Enfim, foram muitos elementos sensacionais somados e que justificaram a nossa euforia. Aceitamos, é claro, e ela tomou a dianteira das negociações com a casa, para fechar o show. 
 
Quando ela nos comunicou o valor do cachê, ficamos estupefatos! Foi muito maior do que havíamos imaginado pelo status da casa. Eu não saberia mensurar hoje em dia, após tantas mudanças monetárias ocorridas no Brasil, mas digamos que estávamos acostumados a ganhar no máximo, quinhentos mil cruzeiros, isso quando o cachê era considerado excelente, e ela propôs-nos um valor de quatro milhões, ou seja, significou algo astronômico aos nossos padrões normais, e a constituir-se de um patamar para artistas consagrados no mainstream, na verdade.

Ficamos eufóricos e de imediato a estabelecermos planos de divisão para tal montante e investimentos na banda etc. Ela cobrou-nos vinte por cento sobre o valor, o que foi justo, naturalmente, pois correspondera com a praxe do mundo empresarial. 
 
Outro fator positivo, o show foi marcado para uma data em que eu já estaria desligado do Língua de Trapo, portanto, foi o primeiro show d'A Chave do Sol, que eu tive a oportunidade de marcar nesse período pós-Língua de Trapo, quando não tive mais que melindrar-me com as duas bandas e com o empresário daquela outra banda, Jerome Vonk. 
 
A despeito de estarmos focados com os preparativos do show de lançamento do compacto, sabíamos que esse show a ser realizado na danceteria também merecia uma atenção especial, por tudo o que mencionei. Então, preparamos um repertório mesclado, por que sabíamos que lidaríamos com um público não acostumado às nossas elucubrações instrumentais, "setentismos" e que tais. 

Enfrentaríamos uma juventude burguesa, apreciadora de BR-Rock oitentista, não por gostar realmente, ao ser formada por ardorosos aficionados de tal estética, mas simplesmente por tal movimento estar na crista da onda, graças ao verdadeiro massacre exercido por tais artífices dessa estética, nas emissoras de rádio e TV, daquele instante de 1984. Mas claro, não apelaríamos a tocar Pop-Rock em voga de artistas como "Culture Club" ou "Duran Duran", definitivamente diametralmente opostos à nossa proposta.

A nossa aposta foi em Rock cinquentista, via "Blue Suede Shoes", "Johnny B.Goode", além de Jimi Hendrix, oportunidade em que o Rubens sempre poderia chamar a atenção com os seus malabarismos à guitarra.

Em termos de temas instrumentais, só tocaríamos: "18 horas" por ser música do disco que estávamos a lançar, e mesmo assim, se eu pudesse voltar ao passado, a cortaria sumariamente do repertório desse show em específico. 

Realmente, tocar uma música instrumental enorme, com solos longos, convenções complexas inspiradas na sonoridade do Jazz-Rock, em meio a um embalo burguês daqueles, foi uma insanidade. Claro que tocamos, "Luz", também, por ser a música mais palatável do compacto, e ter um aspecto cinquentista em sua constituição sonora.

Fora essa burilada básica no repertório, pensamos em caprichar no visual, e lembro-me que o Rubens chegou a alugar uma vestimenta para a ocasião. Foi um casaco pesado, ao estilo medieval, que deixou-o muito parecido com um príncipe de histórias infantis dos Irmãos Grimm, ou de Hans Christian Andersen. Mas não estou a ironizar. Ficou bem de fato para ele e lembrou o figurino de Rockers sessentistas, da adorável, "Swinging London". O Brian Jones certamente amaria essa vestimenta.
No dia do show, ficamos felizes por vermos que notas na imprensa grande, anunciaram o show. Foi esperado, por que a casa estava na crista da onda, por ser a danceteria mais badalada da cidade, em um momento onde haviam muitas, e todas a superlotar, com grande sucesso. Chamava-se: "Radar Tantã", e ficava localizada em um antigo galpão de fábrica, no bairro do Bom Retiro, próximo ao centro de São Paulo.

Tratava-se de uma fábrica imensa, e por seguir uma tendência europeia, manteve a arquitetura rústica de suas instalações, com as paredes a apresentar tijolos expostos, a estrutura antiga do teto e o piso rústico. Como modernidade, apenas o palco que seguia o padrão de palcos montados para shows ao ar livre. 

Os camarins atrás do palco, devem ter sido as antigas instalações de vestiários e sanitários para funcionários da velha fábrica. Eram igualmente instalações antigas, mas em condições de uso, portanto chegavam a serem charmosas pelo estilo retrô.

Foi o segundo final de semana da casa em funcionamento, pois na semana anterior, ela houvera sido inaugurada pelo Barão Vermelho, em sua plena forma, e com o astro, Cazuza, no auge. 

Foi portanto, uma tremenda responsabilidade para nós, pois se por um lado, A Chave do Sol colocava-se como uma banda em ascensão, por outro, não éramos uma banda alojada no mainstream, com sucessos Pop a tocar nas rádios etc.

A casa possuía alguns proprietários. Uma das sócias era a Dedé Veloso, ex-esposa de Caetano Veloso, e que esteve presente no dia, desde a passagem do som. 

Um fator extraordinário mudaria completamente o rumo desse show, não artisticamente, mas no seu aspecto financeiro. Ocorreu que a moça que fechou a data em nosso favor, telefonou-nos na manhã do dia do show, e comunicou-nos que não poderia estar presente, pois estava fortemente gripada, e muito indisposta. Ela perguntou-nos se não nos importaríamos em nós mesmos acertarmos o cachê com o gerente da casa, e mediante instruções sobre como procederíamos sem a sua presença, despediu-se e assim deixamos combinado de acertarmos a sua comissão, ao depositarmos em sua conta bancária, o valor cabível, na segunda-feira posterior. 

Sem problemas nesse sentido, fomos ao show, mas uma surpresa aguardar-nos-ia em relação ao cachê.

        A Chave do Sol, em foto promocional de julho de 1984

Chegamos à danceteria para o soundcheck, no horário combinado.
Não lembro-me se três ou quatro da tarde. 

O equipamento disponibilizado, foi peso pesado, a se constituir de um PA forte o suficiente para suprir shows em estádios de futebol. O galpão era imenso, e segundo os produtores que receberam-nos, a expectativa que aguardavam foi na marca de quatro mil pessoas presentes, para aquela noite. 

O técnico de som foi um sujeito conhecido no meio, apelidado como: "Castor". Boa pessoa, deixou-nos à vontade e equalizou um ótimo monitor de palco, ao qual não estávamos acostumados a lidar, diga-se de passagem, dada a constatação de que raramente até então fizéramos shows de grande porte.

Em conversa informal, ele contou-nos que operara a Patrulha do Espaço em ocasiões passadas, a quebrar o clima, e assim ganhou a nossa inteira confiança. 

Depois da passagem, desistimos em voltarmos para a casa e ficamos no próprio local. A espera seria enorme e entediante, mas retornar mais tarde seria arriscado, com um tumulto generalizado na porta, e dificuldades para estacionar carros particulares. 

A casa abriu no início da noite, e pôs-se a lotar sob uma velocidade incrível. A maioria das pessoas ali presentes, se mostrara oriunda da juventude burguesa, mas via-se ali e aqui, personas caracterizadas como integrantes de tribos oitentistas, típicas. Entre tais tribos, predominavam os "New Wavers". Esses ao menos eram pacíficos, e a sua postura social limitava-se a vestirem-se com aquela estética e seguir o seu som, sem incomodar ninguém, a despeito de outras tribos oitentistas, extremamente agressivas pela beligerância.

Haviam muitas meninas entre eles, a ostentarem aqueles cabelos pintados com cores cítricas, a imitar as garotas do "B52's", Cindy Lauper, Nina Hagen etc. 

O que incomodou-nos bastante foi o som mecânico de ambiente, a se revelar muito alto, emitido através daquele PA bem pesado. Mesmo fechados no camarim, foi quase impossível conversar com aquela zoeira, e a tocar todo o repertório Pop oitentista, possível e imaginário, portanto, a nossa paciência foi à lua e voltou por muitas vezes, tamanha a quantidade de ar que a fez inflar-se...

Um pouco antes do nosso show iniciar-se, duas pessoas da produção da casa convidaram-nos a participar da sessão livre de uso de aditivos, debaixo do palco, sob a estrutura metálica de sustentação. Somente o Zé Luiz aceitou ir, e esse ato causar-nos-ia uma dificuldade durante o show.

Começou o nosso show, e a pressão do som mostrou-se muito forte.
Víamos que o público reagia bem, a aplaudir e dançar, mas se fôssemos mais uma banda famosa do mainstream, estariam a delirar, tenho certeza. Não desagradamos, fomos aplaudidos, mas não houve um entusiasmo muito exaltado, digamos assim.

Todavia, se esperávamos até um clima um tanto quanto hostil e no máximo, uma educada frieza, portanto, saímos contentes com os aplausos educados daquele público nada a ver conosco, ou vice-versa como queira o leitor. 

O problema do Zé Luiz ter aceito o convite gentil que mencionei anteriormente, foi que os andamentos das músicas foram à Marte, Plutão e Vênus!

Músicas normalmente rápidas e que exigiam atenção na execução de convenções mais técnicas, ficaram dificílimas para ser em executadas, não obstante a dificuldade do Rubens para cantar dentro da métrica da melodia e letra, nessa circunstância super acelerada. Claro, o público em sua maioria não percebeu esse desconforto e mesmo assim, driblamos a dificuldade e tocamos tudo, ao errarmos muito pouco, mesmo com esse "beat" absurdo que foi adotado.

E convenhamos, o Zé Luiz era (é) um demônio na bateria, e mesmo sob tal velocidade estonteante, ele executou as suas viradas mirabolantes, e a rir, como se aquilo fosse fácil, e de certa forma, o foi mesmo... para ele! 

Claro, tirante a canção, "Luz", que por ser Rock'n' Roll, passava fácil por plateias não acostumadas ao nosso som, e os covers de Rocks cinquentistas que executamos, nas outras músicas o ânimo do público baixou um pouco, o que foi compreensível.

A Chave do Sol em julho de 1984, e essa sessão de fotos foi realizada na semana do show do Radar Tantã

Acabou o show, e no camarim nós recebemos as pessoas. Para a nossa surpresa, haviam sim fãs d'A Chave do Sol no recinto, e fomos visitados por alguns. Nessa noite, lembro-me que um de nossos amigos que auxiliaram-nos como roadies, foi o Wagner "Sabbath", eterno postulante a vocalista da nossa banda.

Wagner "Sabbath" em foto dos anos 1980, do acervo de Julio Revoredo

Como o Wagner era um sujeito alto e muito forte, pedi ele que acompanhasse-me até à sala da diretoria da casa, onde o gerente faria o pagamento do cachê, como nosso "segurança". Essa sala ficava no lado oposto e para acessá-la, não havia outro caminho a não ser passar pelo meio do público. 

Ao temer voltar com maços de dinheiro nos bolsos, sozinho em meio a uma multidão a conter cerca de quatro mil pessoas (aliás, o borderô oficial acusou quatro mil e quinhentas!), eu pedi ao Wagner "Sabbath" que fosse comigo, como "segurança" nessa missão temerosa. 

Atravessamos a multidão e fomos bem recebidos pelo gerente, apesar do clima tenso, com a presença de seguranças mal-encarados, mas fora algo compreensível, a se contemplar o alto volume de dinheiro vivo que estavam a contar, proveniente do movimento da bilheteria.

O rapaz pediu-me então, para eu contar o valor. Eu pedi ao Wagner que auxiliasse-me, e ao dividir em dois maços iguais na base da avaliação visual aproximada ao se considerar ser a metade do valor, para cada um, eu comecei a contar junto com ele. 

Estranhei, contudo, pois quando eu estava quase a aproximar-me da quantia de dois milhões de cruzeiros, pois ainda havia muito dinheiro a ser contado. Teoricamente, se eu houvera dividido o montante do dinheiro, em tese deveria ter parado na casa de dois milhões, mais ou menos, com o Wagner a precisar chegar nesse mesmo valor, com o seu maço.

No entanto, eu continuei a contar e para a minha surpresa, cheguei à faixa dos quatro milhões de cruzeiros, enquanto o Wagner ainda finalizava o seu maço. Quando ele terminou e disse-me que estava "certo, quatro milhões de cruzeiros, também", foi então que eu entendi finalmente a questão. 

O gerente perguntou-me se estava correta a quantia de ... oito milhões de cruzeiros! Cáspite! A moça havia dito-nos que havia vendido o nosso show por quatro milhões, quando na verdade, tratou-se de um valor de oito milhões!

O seu azar foi ter ficado doente no dia e o seu "contato" também ter faltado nesse esquema, pois o gerente não sabia de nada, e pagou-nos regiamente pelo cachê justo e combinado, sem imaginar que nós ficáramos alheios à essa realidade acertada entre eles.

Então, eu lhe disse que sim, estava correto e assinei o recibo. Despedimo-nos cordialmente e eu e Wagner voltamos ao camarim, com receio, mas em meio àquela euforia instaurada no salão, sob o som ensurdecedor, iluminação frenética e ao levar-se em conta que das quatro mil e quinhentas pessoas ali presentes, 99% dessas criaturas estavam muito loucas, bêbadas ou ansiosas para arrumarem parceiros sexuais, assim, ninguém notou que estávamos com os nossos respectivos bolsos das calças a se apresentarem com volumes indisfarçáveis formados pelas muitas notas de dinheiro. 

E tentei ser o mais discreto possível para transmitir a notícia ao Rubens e Zé Luiz, pois o camarim ainda mantinha a presença de estranhos etc.

A posteriori, já na residência do Rubens, sob um clima de euforia, nós guardamos o nosso equipamento e instrumentos, e fizemos uma literal, "chuva de dinheiro", como se tivéssemos ganhado na loteria. Foi hilário...

Para encerrar este caso, na segunda-feira, depositamos os 20% combinados pela comissão da moça, sobre os quatro milhões que dissera-nos ser o cachê total, e nem um centavo a mais. 

Naturalmente ela foi buscar a parte robusta que omitira e levou um tremendo susto, quando examinou o seu extrato bancário. Bem, nunca mais ela abordou-nos para propor nenhum outro show. Claro que ela tinha outros contatos, poderia ter vendido outros shows etc. Contudo, em nossa ótica, persistir em um tipo de relação desse tipo, teria sido muito desagradável, certamente, por tomarmos consciência de seus métodos escusos, na condução dos negócios.

Existem no mundo artístico, inúmeras histórias desagradáveis sobre empresários exploradores. Mas essa, baseada na conduta pela qual essa moça agiu conosco, extrapolou qualquer parâmetro. 

Para nós, portanto, que estávamos radiantes por receber um cachê muito acima dos nossos padrões, constatar que fora na verdade o dobro desse valor mencionado, foi uma surpresa enorme. 

Esse dinheiro serviu para investirmos em produção e divulgação dos shows que faríamos no Teatro Lira Paulistana, doravante, além de render uma divisão pessoal significativa, para cada um. Eu por exemplo, investi em figurino, ao melhorar o meu guarda-roupa cênico, o que ficou nítido pelas fotos e vídeos da nossa banda, dessa época em diante. Para encerrar essa história, tudo isso ocorreu no dia 14 de julho de 1984, no ambiente da danceteria "Radar Tantã", sob a visão de quatro mil e quinhentas pessoas, quando tocamos e voltamos para a casa, com nossos bolsos, literalmente cheios. 

E para a tal moça, como foi a data de aniversário da Queda da Bastilha, só posso dizer que a guilhotina agiu com justiça a ceifar-lhe uma pequena fortuna, que achou que ganharia fácil em nossas costas...

Passado esse show da Danceteria Radar Tantã, o foco seria enfim o lançamento do compacto simples a conter as canções: "Luz" & "18 Horas", com dois shows no Teatro Lira Paulistana. Como eu já analisei as duas faixas do nosso primeiro compacto, quando falei sobre as suas sessões de gravação, vou acrescentar mais algumas observações apenas.

“Luz” (Luiz Domingues)
Eis o link para escutar no YouTube:

Bem, no caso dessa música, o andamento é equivocado, ao meu ver. Um pouco para trás, teria ficado ideal. 
 
Apesar de gravar em linha e usar a técnica do pizzicato à época, o meu baixo, Fender Jazz Bass dá uns alguns estalos, vez por outra. Na minha linha, é óbvia a influência do baixista, Leo Lyons, do "Ten Years After". 
 
É um Rock’n' Roll tradicional, com sabor cinquentista, mas cheio de pequenas convenções, pois nada em nossa banda ficava “quadrado”, pela tradição que criamos. Já falei sobre a falta de uma base de guitarra com mais “drive”, que eu lastimo não existir. 
 
E além disso, o solo com o pedal “Phase 90” ativado o tempo todo, era uma marca registrada do estilo do Rubens, e consequentemente, da banda. Gosto do vocal solo do Rubens e como já salientei, ele nunca deixou a dever para nenhum vocalista do movimento BR Rock 80’s, portanto, a nossa busca insana por um vocalista nem precisava ter acontecido. 
 
E o Zé Luiz... até em um Rock aparentemente simples, ele quebrou tudo o tempo inteiro. Aquela cortada no chimbau, na convenção final, em cada cabeça de tempo tercinado, é genial, mesmo.

“18 Horas” (Luiz Domingues/Rubens Gióia/José Luiz Dinola). 
 
Eis o link para ouvir no YouTube:

Bem, quase ninguém nota, mas há vários acentos de guitarra percutidos durante algumas partes do meu solo. Tais intervenções são bem discretas, é verdade, mas estão lá, como sombra estratégica. 
 
Tem bastante reverber nessa guitarra, mas não naquele patamar desagradável e tipicamente oitentista, como gosma indesejável, mas a se tratar do reverber natural do amplificador do Rubens. 
 
O Zé Luiz arrebenta e não somente no seu solo, o que seria evidente, mas durante o solo do Rubens ele tem uma atuação impressionante. Como o solo da guitarra tende a atrair todo o foco, experimente prestar atenção nesse detalhe em uma próxima audição. 
 
No mais, o solo do Rubens é sensacional, mais puxado para o Acid Rock sessentista, sem dúvida. Também poderia haver uma base com um pouco de drive, mas por outro lado é até charmoso haver vários trechos sem base alguma, com o trio a tocar exatamente como soava ao vivo, nos shows.
O Compacto Simples Luz/18 Horas, na íntegra. Eis o link para ouvir no YouTube:
https://www.youtube.com/watch?v=bKVD4osVZ0Q

Conforme eu já disse anteriormente, para esses shows, nós concebemos várias inserções dramatúrgicas a visar impactar e diferenciar a estrutura de um show de Rock tradicional, onde apenas a performance sonora é geralmente produzida, como em um recital meramente musical, sem outros atrativos.

Foto de 1984, a mostrar o poeta, Julio Revoredo, com o compacto da nossa banda em mãos e eu, Luiz Domingues, ao lado. Acervo e cortesia de Julio Revoredo. Click: Rubens Gióia 

E a base literária dessa loucura que queríamos realizar, foi respaldada logicamente pelo poeta, Julio Revoredo. Logo no início do show, um texto hermético causaria um choque no público Rocker, não acostumado à essa erudição avantgarde do poeta, Julio Revoredo. 

Vou publicar esse texto na íntegra e explicar detalhadamente como ele foi declamado na performance do show, mas antes disso, preciso retroagir um pouco para comentar como deu-se a primeira colaboração dele, Julio Revoredo, como letrista d'A Chave do Sol.

O poema: "Vestido Branco", foi feito sob encomenda. Nós tínhamos a música e a melodia definidas, quando pedimos ao poeta, a sua colaboração, para elaborar a letra. A música se mostrava como uma balada ao sabor da Soul Music, bem no estilo "Motown" e particularmente eu gostava muito dela. O Julio entregou-nos a letra e adotamos o título por ele sugerido: "Vestido Branco".

Infelizmente, a música foi engavetada, ainda ao final de 1983, por destoar esteticamente da linha que adotaríamos posteriormente, por conta de nossas tentativas vãs em adequarmo-nos ao mercado da época. Esforço inútil, pois só deu-se bem no mundo mainstream, quem comungasse com a cartilha do Pós-Punk e ponto final. 

Contudo, quando se está em meio a um furacão, não há margem para divagações e no desespero, agarramo-nos em qualquer fator que passar perto. E foi o que fizemos, ao descartarmos uma canção com um potencial Pop muito bom, como teria sido o caso de: "Vestido Branco".

Enfim, se lamento o engavetamento de uma música boa como "Vestido Branco", isso ainda piora se levarmos em conta o fato de que não existe um único registro, ainda que mal gravado, dessa canção. Eu só tenho fragmentos dela, oriundos de fitas registradas em ensaios. Eis a letra de "Vestido Branco" e depois, eu mergulho no relato sobre os shows do Lira Paulistana.

 "Vestido Branco"

Há uma noite em algum luar
Um doce mistério a se desvendar
Cortinas brancas
Lábios, um sonho, um tom
Como tocar?

Cabelos loiros
Um intenso olhar que tenta crer no ato de se dar
Que tenta crer no ato de se arriscar
Há uma noite em algum lugar
 

Vestida de sonhos e de paz
Para vestir a nua carência que insisto em tirar
Num vestido branco de linho a rodar."


Na folha de caderno onde ele, Julio, entregou-nos o manuscrito, continha a data de 25 de julho de 1983, quando a finalizou. Nós concluímos a sua musicalização ainda antes de impressionarmo-nos com os boatos que mudariam a nossa direção artística, e dessa forma, ela seria descartada do repertório, assim como outras boas músicas, tais como: "Superstar", "Reflexões Desconexas", "Intenções", "Utopia", "No Reino do Absurdo", "A Dança das Sombras" e "Átila", ainda em 1983.
Passado o show do Radar Tantã, e eufóricos com o cachê robusto que recebemos, as nossas baterias concentraram-se então sobre a produção dos shows de lançamento do Compacto, a serem realizados no Teatro Lira Paulistana. Entre tantas ideias não usuais que tivemos em meio às sessões de "Brainstorm", fechamos em alguns conceitos de teatro nonsense. A ideia seria mesclar esse teatro do absurdo, à poesia hermética do poeta, Julio Revoredo.

Nessa explosiva mistura, a nossa música seria permeada por sensações de estranheza por parte do público tradicional de um show de Rock oitentista, e estávamos a apostar nesse elemento como propiciador de um diferencial. 

Nesse sentido, o primeiro ponto proposto, seria na entrada das pessoas no teatro.

Pensamos em uma ação interativa do público, que faria conexão com o texto inicial do show, que o Julio havia elaborado para nós. E dessa forma, nós criamos uma sketch teatral inusitada, para complementar a ação interativa com o público.
A parte interativa começaria na catraca, quando o espectador entregasse o seu ingresso ao bilheteiro do teatro e um de nossos atores convidados ao interpretar um "hostess", convidar-lhe-ia a abrir uma das mãos para entregar-lhe uma porção de açúcar! As reações mais inusitadas poderiam acontecer diante dessa estranha ação! E teria tudo a ver com o texto que dava início ao espetáculo...
A seguir, criamos a ideia do performático, Edgard Pucinelli Filho entrar em cena sob uma forma insólita: ele entraria enrolado dentro de um tapete, carregado por dois atores, e ao sair dele, declamaria o hermético poema inicial de Julio Revoredo.
Quando insistimos nessa ideia, o Edgard criou um empecilho. Ele aceitara a performance, desde que o poema fosse de sua autoria, e não do Julio. Nada contra a poesia dele, mas queríamos a sofisticação literária do Julio, e causar assim, uma sensação inusitada no show.
Com muito custo o Edgard aceitou, mas quando realizamos os ensaios da performance, na residência do Rubens, ele titubeou, pois era incômodo, sem dúvida, deixar-se enrolar dentro de um tapete. Dou-lhe o malefício desse incômodo como um fato, pois realmente nos ensaios ficou patente notar que não seria muito tranquilo passar por essa experiência.

O nosso argumento, foi dizer-lhe que seria um sacrifício com poucos segundos e que causaria um efeito cênico incrível, o que seria verdade. E nesse aspecto, ele ponderou, pois a despeito da poesia ser o seu carro chefe, ele gostava de ser performático e exercitava isso espontaneamente em todo show de Rock que ia, mesmo que não fizesse parte da produção, mas apenas ao ser parte do público.

Finalmente o convencemos a realizar a performance e mediante ensaios realizados na residência do Rubens, com direito à sessões de gargalhadas inevitáveis, vimos que seria um pouco incômodo para ele, mas funcionaria ao vivo. Entre os "atores" amadores que convocamos para as performances, estiveram conosco os nossos amigos: "Celso "Esponja" Bressan, Claudio "Capetóide" de Carvalho, Daniel "Papel", Iran Bressan, e o irmão do Claudio, Sérgio "Borracha" de Carvalho.

Carlos Muniz Ventura, o popular: "Carlão", participou das performances, mas também atuou a ajudar-nos na produção e ao fotografar o show.

E o Julio Revoredo, que além do suporte literário, aceitou participar, ao comprometer-se em fazer uma performance incrível, que descreverei quando falar do show, propriamente dito.
Julio Revoredo em 1984, em fotos de seu acervo pessoal, acima e abaixo

Eis abaixo, a íntegra do poema hermético que o poeta, Julio Revoredo preparou para ser apresentado como uma performática apresentação de início do show, com Edgard Puccinelli Filho, na declamação:

"A Formiga" -  Por Julio Revoredo (escrito em 18 de julho de 1984)

"Ao entrarem na daedalira claustra, vocês receberam o pó que lhes embranqueceu a mente. 

Aqui vejo de tudo: acromyrmex, fórmica, atta, saúva, quenquem. 

Vocês viverão as emoções junto à medea masculina in vultus, antropotaupírico, mizar.

Com eles, verão agni in sanus, labirintar, supeto naturae claustra xeno enguido, semita vitae fallentis jhwh êxodo 33-114
Dgjx, aiba, kev. Em forma de lai.

Haverão versus: imagos, imagos, imagos sobre crepera.

O canto de sepulta urbis, fogo de santelmo, occuro animis, o occursus, Sulphur sacrum, eremus...

E se levantará a voz mórbida de semibus que será destruída por Teseu. Dialecticorum remis a meatin persubtilis creatio.
Teseu de Mithra, Teseu de fax phoebea, Teseu de nitella, traz no nome Helio, traz no nome Febo. 

Outras intervenções que criamos, foram igualmente performáticas. 

Uma delas, eu concebi ao recordar-me de um velho truque cênico que o Alice Cooper usava nos anos setenta, que fora o da simulação de brigas nas coxias, a despertar a dúvida no público, se tratava-se de alguma confusão real, gerada entre técnicos da produção, penetras ou alguém inusitado ali presente como um invasor.

Então, essa foi a minha singela homenagem à "tia" Alice, um dos artistas que mais influenciou-me na década de setenta. 

Em nosso caso, consistira da ideia de quatro atores que envolver-se-iam em uma briga, que começaria nos bastidores, e teria uma rápida incursão no palco. Três deles perseguiriam um suposto foragido, que tentaria refugiar-se atrás da bateria do Zé Luiz, sob um esforço desesperado para safar-se ou seja: quem seriam os perseguidores e o perseguido? Qual seria o motivo dessa perseguição? Aquilo vinha da rua? Tinha algo a ver com o show ou seria uma mera contingência insólita, gerada pela coincidência?

Essas dúvidas todas, plantadas deliberadamente, foram exatamente o que gostaríamos de fomentar na imaginação do espectador, por trazer-lhe algo inusitado em meio a um show de Rock tradicional, pois aconteceria com a banda a tocar normalmente e ignorar, por conseguinte, a ação toda dos atores, o que reforçaria a estranheza no imaginário do público. 

Ao analisar a sketch hoje em dia, admito que assumimos um risco. Os atores simulariam o tumulto, no corredor de acesso, e em meio a pessoas em pé, provavelmente se o Teatro detivesse a lotação que esperávamos (e teve). 

Em um tumulto assim, com a banda a tocar sob a pressão de som do PA e a maioria das pessoas desavisadas do caráter teatral da ação premeditada, alguém poderia envolver-se, a tentar defender o rapaz perseguido, ou se houvesse um policial na plateia, poderia intervir pelo seu instinto, e o que seria para visar apenas um efeito dramatúrgico, poderia tornar-se um tumulto verdadeiro. E por falar em tumulto, correríamos esse risco, com pessoas a assustarem-se e naquela estrutura frágil de segurança que o Lira Paulistana ostentava, uma pane com pessoas a saírem em correria, poderia gerar uma tragédia.


Outra sketch muito interessante, seria uma performance no meio do show. Sem explicações, um ator a usar um figurino performático, apenas entraria e caminharia em meio ao público.
O inusitado disso, seria o caráter quase fantasmagórico dessa aparição, pois ele entraria coberto por uma capa que cobrir-lhe-ia todo o corpo e sobre a cabeça, um abatjour enorme e aceso! 

Claro, a viabilidade técnica desse aparato, ficou a cargo do Zé Luiz, nosso inventor-mor, técnico de eletrônica, eletricidade, hidráulico, marcenaria e engenharia do faz-tudo da nossa banda!

Após testes efetuados na residência do Rubens, o aparato ficou aprovado e o insólito dessa performance, não foi apenas o aparato em si, mas o fato de que o poeta, Julio Revoredo, aceitou fazer a performance! Apesar de que durante o tempo todo dessa produção, ele salientou que não era ator, e sim poeta!

Contudo, mesmo ao salientar com insistência para deixar clara essa questão, ele foi muito eficiente, mesmo não sendo o seu ofício, e nos shows, cumpriu com galhardia a sua performance, a gerar um efeito muito significativo, conforme desejávamos. 

Logo mais, falo sobre a divulgação, os shows em si, e a oportunidade que vislumbramos ao vermos um jovem vocalista em ação, e sob uma circunstância não premeditada por nós. 

Esse personagem acima, de costas em uma janela, entraria de forma inusitada na vida d'A Chave do Sol, alguns dias depois de realizarmos os dois shows de lançamento do compacto. E protagonizaria histórias incríveis. Já estou para chegar nesse ponto da narrativa!

E precisávamos divulgar os shows. Lembro-me que conseguimos concretizar duas ações diferentes nesse sentido, a fugir dos métodos tradicionais da época, que centravam as suas forças sempre nos cartazetes e filipetas. 

Conseguimos também, emplacar notas nos jornais de grande circulação e encomendar cartazes Lambe-Lambe. Ao contrário do método precário com o qual tentamos fazer uma divulgação de um show em 1983, e cuja história pitoresca eu já contei em capítulo anterior, desta feita tivemos a verba e fizemos a coisa certa, ao contratarmos gráfica & colagem etc. e tal.

Todavia, não tínhamos condições para encomendar uma colagem de largo alcance, portanto, centramos as nossas baterias em alguns pontos da zona oeste de São Paulo, estrategicamente mais próximos do Teatro Lira Paulistana. 

E uma ação que consideramos estratégica por um motivo específico: queríamos sinalizar o quarteirão onde localizava-se o Teatro Lira Paulistana e sendo assim, decidimos confeccionar uma faixa, para colocá-la no cruzamento da Av. Henrique Schaumann, com a Rua Teodoro Sampaio, ou seja, no quarteirão onde ficava o Lira Paulistana, na Teodoro Sampaio. 

E de quebra, queríamos ter a exposição de um cruzamento com gigantesco movimento, ao ostentar diariamente, milhares de carros e pedestres que ali passavam, desde aquela época.

Mas o insólito dessa ação, foi que a verba acabou, e dessa forma, somente conseguimos pagar pela confecção da faixa, ao ficarmos sem apoio para colocá-la em um poste e sendo assim, esta incumbência ficou para nós mesmos. 

Adivinhe, leitor, quem foi o responsável por essa tarefa? Claro, Zé Luiz Dinola, o faz-tudo da banda. O problema, foi que não tínhamos uma escada adequada para aquela altura de um poste de iluminação tão alto. 

Isso aconteceu em um dia de semana, um pouco antes do dia da estreia da nossa temporada no teatro e assim, eu (Luiz), Rubens e Zé Luiz protagonizamos uma cena de pastelão, digna de um episódio de "Os Três Patetas".

Primeiro, tivemos o constrangimento de ter que providenciar uma escada emprestada, ao pedir em várias lojas comerciais do entorno. Depois, a cena dantesca em segurarmos a enorme escada, com o Zé Luiz pendurado sob uma altura considerável e sem nenhuma proteção. Fora a precariedade em não termos ferramentas adequadas etc. 

Como se não bastassem esses percalços, fomos insultados pelos zombeteiros que sempre aparecem nessas horas, contudo, o que mais chateou-nos mesmo, foi a perda total do "glamour artístico", ao sermos flagrados nessa situação. Não pelo ato em si, pois não há nada de errado em estar a empreender um trabalho dessa natureza, mas por expormos a nossa falta de estrutura, pois estávamos a lançar o primeiro disco, tínhamos muitas apresentações na TV, matérias já publicadas, e muitos shows já realizados...

Por outro lado, eu lembrava-me de uma entrevista que havia lido do Herbert Vianna, dos Paralamas do Sucesso, naquela época mais ou menos (acho que na Revista Roll, não tenho certeza), onde ele contava que a vida fora "dura" para os Paralamas, antes de estourarem no mainstream. 

Dizia ele, que lembrava-se do tempo não muito distante, onde faziam shows na casa noturna: "Rose Bom Bom", de São Paulo (ficava localizada na Rua Augusta), e que nessa época marcada com vacas magras, tinham de tomar táxis na Rua Augusta, às 5:00 horas da manhã, pois não possuíam estrutura para ter um transporte próprio. 

Cáspite, pensei eu... eles reclamavam do que? Tinham dinheiro para tomar táxi! Quantas centenas de vezes vi-me em um ponto de ônibus, sozinho, durante a madrugada, a esperar um ônibus e com meu baixo (filho único) na mão, a temer por assaltos?


E chegou o grande dia do primeiro show da temporada para lançarmos o nosso Compacto! Foi no dia 30 de julho de 1984 e mediante um público pagante formado por oitenta e cinco pessoas, fizemos o primeiro show de lançamento do nosso primeiro compacto simples, que repetir-se-ia no dia seguinte, 31 de julho de 1984.
O início do show, que na verdade começou em seu preâmbulo, causou um efeito sensacional! Nunca esqueço-me em estar alojado no ponto alto do camarim, que comunicava-se com a técnica (onde o técnico de iluminação, trabalhava), e assistir tais reações sem que o público visse-me. O poeta, Julio Revoredo, Rubens e Zé Luiz, também foram ver, e todos gostamos muito de testemunhar as reações das pessoas. E foram diferentes, umas das outras, naturalmente...
Como você reagiria, caro leitor, ao entrar em um teatro para assistir um show de Rock e ser convidado a abrir a palma da mão para receber um punhado de açúcar? Bem, a maioria tratou por ingerir tal porção, de diversas formas, a comer, lamber etc.

Outros caíram na gargalhada, outros fizeram expressão facial a denotar estranheza e houveram casos de recusa, o que também fora esperado, pois muita gente não gosta de interagir em espetáculos. 

O açúcar tinha tudo a ver com o texto hermético criado pelo poeta, Julio Revoredo, que evocava o aspecto desse alimento, ao estabelecer a analogia com as formigas e também com A Chave do Sol, propriamente dita. 

Ouvimos também várias pessoas a conversarem sobre esse estranho procedimento e assim, o nosso intuito inicial foi cumprido, pois fomentamos algo diferente, a surpreender inteiramente a plateia. 

E quem incumbiu-se de fazer tal entrega ao público, foi o nosso amigo, Celso "Esponja" Bressan. Aliás, foi interessante pois mesmo não sendo um ator, ele se portou de uma convincente para efetuar tal performance. Mas outras surpresas sobressaíram-se...

Eu aboli o meu antigo apelido por muitos motivos, mas a confusão que isso gerava nos caracteres de TV e grafia nas publicações, sem dúvida foi um deles. Aqui nesta nota do "Estadão", o "agraciado" com a gafe não fui eu, no entanto. Imperdoável ao considerar-se ser um jornal de primeira grandeza do patamar mainstream, pois sendo assim, o que significou exatamente chamar o José Luiz como: "Jorge?"

O som programado para o ambiente de pré-show, foi na verdade, o clima estudado a demarcar para nós, o momento exato para nós começarmos a performance. 

Foi estratégico e cronometrado, combinado com o técnico do PA, Canrobert Marques, que tornar-se-ia nosso amigo doravante, e haveria de operar a banda em alguns shows fora do Lira Paulistana, também, no futuro.  

Por muitos anos no futuro, Canrobert Marques foi técnico fixo dos "Titãs", e naquela época, ele trabalhava com "Os Inocentes", e diversas outras bandas da cena Punk e do Pós-Punk. No entanto, ele era um rapaz que apreciava sonoridades dos anos 1970, e sob conversas reservadas, sem que os seus amigos punks soubessem, revelou-nos apreciar Prog-Rock setentista, item certamente proibido naquele tempo entre os seus pares. Tanto que quando estava a operar o som, ele enlouquecia com o som do Pink Floyd, que fora o nosso som de ante-sala e "deixa" para começarmos o nosso show. 

E a contagem combinada, foi o tempo certo de se executar um lado de uma fita K7, com sons escolhidos por nós, peças oriundas das escolas do Prog-Rock e Jazz-Rock setentistas, em predominância, e quando chegava-se no auge do famoso grito do Roger Waters (na música "Careful With the Axe, Eugene", do Pink Floyd), as luzes apagavam-se e o show começava. 
Fotos do poeta, Julio Revoredo, a mostrarem eu, Luiz e Rubens na saída de emergência do Teatro Lira Paulista, em julho de 1984. Click, acervo e cortesia de Julio Revoredo

Naturalmente, o público esperava que nós entrássemos em cena e iniciássemos de forma tradicional, apenas a apanhar os instrumentos e passarmos a tocar, no entanto, o que viram, foi o Celso "Esponja" e o Claudio "Capetóide", nossos atores amadores e voluntários, a entrarem no palco e carregarem um tapete persa, enrolado. E dessa forma, eles jogaram-no no chão e ao desenrolá-lo, saiu a exótica figura de Edgard Pucinelli Filho, a declamar o intrincado poema de Julio Revoredo: "A Formiga". 

As reações foram novamente dispares e interessantíssimas, tal qual a reação inicial causada pelo punhado de açúcar distribuído individualmente para cada espectador. Pessoas caíram na gargalhada, outras ficaram atônitas, um ou outro grito de "A Chave do Sol" (certamente a expressar que entrássemos e fizéssemos um show de Rock tradicional e assim a poupar-lhes de terem que ver um teatro nonsense pelo qual não esperavam), gente a fazer pilhéria com o Edgard etc.

Foi o que quisemos em princípio, isto é, provocar reação nas pessoas. E nestes termos estávamos por conseguir, plenamente. Porém, nem tudo foi positivo... 

Rubens clicado pelo poeta, Julio Revoredo, na porta do Teatro Lira Paulistana, no dia do primeiro show de lançamento de nosso compacto, em 30 de julho de 1984. Click, acervo e cortesia de Julio Revoredo

Pelo fato de serem atores amadores, os amigos, Celso e Claudio, entraram em cena, nervosos, com a adrenalina a mil e dessa forma, não colocaram o tapete no chão sob o cuidado com o qual haviam ensaiado efetuarem tal intervenção, na casa do Rubens. E sendo assim, quando o tapete tocou o solo, o Edgard soltou um grito de dor e ao sair do tapete, com a face toda amassada e assustado, causou risadas. Até o público perceber tratar-se de uma performance, demorou um pouco. 
Eu, Luiz Domingues, na porta do Lira Paulistana no dia do primeiro show de lançamento do compacto, em 30 de julho de 1984. Click, acervo e cortesia do poeta, Julio Revoredo

E ele gaguejou também, no início, pois só conseguiu restabelecer o foco, alguns segundos depois. Mas no cômputo geral, foi uma excelente performance, pois ele era extrovertido e carismático, sem dúvida. A seguir, as luzes apagaram-se e nós entramos e começamos a tocar.
 

O show seguiu normal até a quarta ou quinta música, não recordo-me ao certo, até que a segunda intervenção cênica ocorreu. E foi aquela que eu descrevi anteriormente, sobre a perseguição e captura de um estranho. 

Os "atores" posicionaram-se naquele espaço do teatro, entre a entrada da arquibancada e o hall de entrada do mesmo. No primeiro dia, foi tranquila a entrada, pois não haviam muitas pessoas em pé, naquele instante, posicionadas ali.

A entrada em cena ocorreu durante o solo de bateria da música: "18 Horas", reforçada então pelo fato de que eu e Rubens estávamos ocultos, fora dos focos de luz, com toda a ênfase do show no Zé Luiz. O perseguido entrou e escondeu-se atrás do surdo da bateria, com o Zé Luiz a solar, e este a esforçar-se para não esboçar reações.

Os três perseguidores vieram a seguir, e fizeram uma simulação tensa, que causou um frisson na plateia. Lembro-me de verificar várias pessoas a cutucarem-se, para chamar a atenção uma das outras e até alguns que tiveram o impulso de levantarem-se da arquibancada do Lira Paulistana, talvez sob um espasmo de alerta, sem entender o que aquilo realmente significava. 

Como eu já disse antes, uma performance dessas poderia suscitar diversas interpretações na imaginação das pessoas. Do ponto de vista do espectador, seria totalmente plausível acreditar que aquilo poderia ser uma briga real e com tal perseguição iniciada na rua Teodoro Sampaio, ou seja, algo completamente alheio ao show. Nesse caso, essas pessoas estariam ali meramente por acaso, como em cenas de perseguição de filmes de ação, onde brigas acontecem em lugares inusitados em meio a pessoas que não tem nada a ver com isso.

Não ocorreu nada errado, mas poderia ter acontecido, hoje eu enxergo essa possibilidade. Alguém poderia tentar intervir, por exemplo. E se houvesse um policial na plateia? O instinto de um profissional desses seria o de agir, por exemplo. 

Fora a possibilidade de uma instauração de pânico no ambiente. Bastaria uma pessoa assustar-se e sair a correr, para deflagrar uma ação coletiva desse porte e nas condições precárias de escoamento do Lira Paulistana, poderia tornar-se uma tragédia. 

Hoje em dia, eu não incentivaria a realização de uma sketch assim, em um show meu. Mas nada ocorreu de errado nos dois dias, e cenicamente a relembrar, causou um efeito muito interessante no público.

A terceira participação foi a mais produzida, apesar do material usado ser bem simples, improvisado mesmo. Consistia da entrada do "Homem Abatjour", com uma performance fantasmagórica, a caminhar pelo palco e interagir com a plateia, ainda que sem maiores exageros. 

Mais uma vez, a ideia fora dar um efeito nonsense, causar estranheza e sutilmente fazer uma analogia com o "Sol" da Chave do Sol. 

Durante a execução da música: "No Reino do Absurdo", o poeta, Julio Revoredo, entrou em cena com aquele paramento todo que eu descrevi anteriormente, mas que não custa repetir: a se constituir de uma capa preta que cobria-lhe até os pés, um abatjour na cabeça, enorme, e por baixo, a usar roupas casuais e sapatos pretos para reforçar o aspecto obscuro.

O Zé Luiz (quem mais?), preparou toda a engenhoca para acomodar-se à cabeça do Julio, com a respectiva armação para a lâmpada, e bateria para alimentá-la. A performance nos dois dias foi muito boa, e causou efeito. Foi difícil para o Julio, pois ficara quase impossível para ele enxergar alguma coisa, fora o calor que o manto e a luz acesa na sua cabeça, proporcionou-lhe, ainda mais sob os refletores da iluminação do teatro.

No primeiro show, da segunda-feira, ele assustou uma criança na plateia, que saiu a correr, ao arrancar risadas generalizadas de todos. A criança em questão foi o Victor Dinola, sobrinho do Zé Luiz, então com sete anos de idade, e filho da irmã dele, Elizabeth Dinola, a autora da ilustração da capa do nosso Compacto. 

Pelo fato de andar às escuras praticamente, o Julio acabou por usar de uma inspiração como performance, ao caminhar como o Frankenstein clássico interpretado pelo grande ator, Boris Karloff, o que foi positivo para a performance.

 
No cômputo geral, os dois shows foram muito bons, em todos os sentidos. Na parte musical, tudo fluiu bem. Estávamos muito bem ensaiados e também muito motivados, por ser o lançamento de nosso primeiro disco. A ideia de fazermos um show performático, com intervenções teatralizadas e sob a aura do nonsense, deu certo, pois surpreendemos o público.

Muita gente demonstrou gostar, pois ninguém de fato, esperava um show com tais elementos, sequer a imaginar que não seria um show de Rock tradicional, com a banda a tocar, pura e simplesmente. 

No máximo, esperavam por um cenário ou algum efeito pirotécnico, mas jamais esperariam tantos elementos "esquisitos". Lembro-me de algumas pessoas elogiar a nossa iniciativa, tais como: Luiz Carlos Calanca, da Baratos Afins, dono da loja e da gravadora pela qual estávamos a lançar o disco, Valdir Montanari, jornalista das Revista Rock Stars e Rock Show, além do programa de Rádio, Sinergia e Antonio Carlos Monteiro, jornalista da Revista Roll, entre outros.

 
Os nossos colaboradores também gostaram muito. Todos que participaram, divertiram-se em participar da produção. Do poeta Julio Revoredo à Edgard Pucinelli Filho, a passar por Celso "Esponja" Bressan, Daniel "Papel" Negrão, Claudio "Capetóide" de Carvalho, Iran Bressan, Carlos Muniz Ventura, Seiji Ogawa, Hélio, e Sergio "Borracha" de Carvalho.

Também firmamos amizade com o técnico de áudio do teatro Lira Paulistana, Canrobert Marques, que operar-nos-ia futuramente tanto no próprio Teatro Lira Paulistana em outras ocasiões, como em shows em outros locais, inclusive fora de São Paulo. 

A equipe de direção do Lira Paulistana também gostou muito, e as portas abriram-se para mais apresentações futuras da nossa banda, naquele famoso palco da cidade de São Paulo.

Tudo aconteceu nos dias 30 e 31 de julho de 1984. O público presente no dia 30, foi de oitenta e cinco pessoas, e no dia 31, cento e vinte pessoas (muito bom ao considerar-se que os shows ocorreram na segunda e terça-feira, considerados dias muito improváveis para produzirem-se espetáculos musicais, ainda mais show de Rock autoral). 

Cida Ayres, que era produtora do Língua de Trapo, deu uma ajuda e tanto na produção, por auxiliar-nos na divulgação, inclusive. 

Eis acima o Compacto na íntegra, para ser escutado.

Link do YouTube:
https://www.youtube.com/watch?v=bKVD4osVZ0Q
Todas as fotos anteriores dos shows de lançamento do Compacto no Teatro Lira Paulistana, em julho de 1984, são de autoria de Carlos Muniz Ventura. Acima, a banda a posar na porta do Teatro "Pimpão", onde participou do programa "Balancê", da Rádio Excelsior/Globo, na mesma ocasião. Click, acervo e cortesia de Julio Revoredo 

Para promover esse show, havíamos tido algumas ações de mídia, anteriormente, que deu-nos suporte. A primeira, foi ter participado do programa: "Balancê", da Rádio Excelsior de São Paulo. Esse contato, eu havia conseguido graças ao Língua de Trapo, por ter participado do programa com tal banda, anteriormente.

Tratava-se de um programa anárquico, realizado ao vivo, diretamente de um pequeno teatro de bolso (Teatro Pimpão), localizado na Rua Apa, no bairro de Santa Cecília, centro de São Paulo. 

Na sua condução, revezavam-se as personas de Fausto Silva e Osmar Santos e a intercalar-se às atrações musicais e de outros ramos artísticos (geralmente atores a promover peças teatrais e escritores a divulgar lançamento de livros), haviam as intervenções esportivas, com o boletim dos clubes de São Paulo, comentários e "sonoras" com entrevistas do meio do futebol.

Outra foto do acervo do poeta, Julio Revoredo, a mostrar A Chave do Sol na porta do Teatro Pimpão, a fim de participar do programa radiofônico, "Balancê", em julho de 1984

Nessa primeira aparição d'A Chave do Sol, o poeta, Julio Revoredo, esteve presente a acompanhar-nos, e ali clicou algumas fotos, inclusive. Tal participação foi no dia 9 de julho de 1984, e fazia muito frio, no feriado estadual em São Paulo. 

Fizemos a nossa performance, a dublar, o que foi exótico ao tratar-se de um programa de rádio, mas houve um sentido: havia um público ali presente, por tratar-se de teatro, portanto, cerca de cinquenta pessoas apareciam ali todos os dias e geralmente eram os operários da construção do Metrô, pois eles estavam ali perto a concluir as obras da linha 3, leste/oeste, com a estação Marechal Deodoro, a ser preparada, ao lado.

O comunicador, Fausto Silva, ainda não era famoso como o é hoje em dia, mas foi o Balancê que motivou sua ida à TV, primeiramente para comandar o programa "Perdidos na Noite", que mudaria de emissora três vezes antes de chegar à TV Globo e diluir-se no popularesco, "Domingão do Faustão", que está no ar, desde o final dos anos 1980. 

Nesse dia, após o término do programa, o Faustão convidou-nos para um café na padaria da esquina da Rua Apa, com a Rua das Palmeiras, quando disse-nos para levarmos o nosso material de divulgação para a sua produtora, Lucimara Parisi, a visar levar-nos a participar do "Perdidos na Noite", na TV (nessa visita à padaria, Faustão confundiu o poeta, Julio Revoredo como componente da banda, mas na prática, como colaborador, poder-se-ia dizer que ele o fora, mesmo). Eu já havia participado desse programa uma vez com o Língua de Trapo, e de fato, tal atração televisiva era o "Balancê", igual em sua concepção, só que adaptado para a TV, com o mesmo formato. 

E a outra ação de divulgação que realizamos, foi na Rádio Jovem Pan AM, no dia 16 de julho, em um programa chamado: "São Paulo Agora", este sob cunho jornalístico mais sério. Estar em uma emissora de grande audiência como essa, foi um feito notável para uma banda independente e ficamos contentes em poder falar do lançamento do disco, promover o show do Lira Paulistana e ter a nossa música, "Luz", executada para uma audiência de milhões de pessoas (literalmente), em rede por todo o Brasil. 

Esse programa foi conseguido graças a um contato do Luiz Calanca, da Baratos Afins. As portas do "Balancê" abriram-se para nós, e no dia 26 de julho, nós voltamos e reforçamos a divulgação do show do Teatro Lira Paulistana e desta feita, levamos ingressos cortesia para serem distribuídos aos ouvintes.

Fotos do dia em que fomos às instalações da RTC (Rádio e Televisão Cultura, acompanhados do poeta, Julio Revoredo. Acervo e cortesia de Julio Revoredo. Click: Rubens Gióia

E no dia 27 de julho, eu e Rubens fomos aos estúdios da Rádio Cultura AM, e divulgamos disco e show, no programa "Panorama", sob outro contato que eu tinha conseguido, graças ao Língua de Trapo. E tivemos também mais uma oportunidade que eu havia obtido através de meus tempos a atuar com o Língua de Trapo, que foi no programa de TV, "Realce". Exibido pela TV Gazeta de São Paulo.
Gravamos a nossa participação pela primeira vez nessa atração televisiva, e foi ao ar, no dia 20 de julho de 1984. Nesse dia, houve um grupo de dançarinos de "Break", uma dança de rua que fora "febre" no início dos anos 1980, e assim, o seu apresentador, o argentino, "Mister" Sam, não fez-se de rogado e deixou-os no cenário, para que dançassem, atrás de nós, como figurantes.
Foi hilário ter esse pessoal ali, pois obviamente que o nosso som não fazia sentido algum para eles. No vídeo, dá para sentir o clima de constrangimento por parte dessa turma de dançarinos de rua.

 

 

 

 

 

 

 

A entrevista que o Mister Sam realizou conosco, foi hilária e em todas as vezes em que participaríamos do programa, doravante, sempre seria nesses termos, com total improviso e nonsense.

A Chave do Sol pela primeira vez no Realce da TV Gazeta de São Paulo, em 20 de julho de 1984

Eis o Link para assistir no YouTube: 
https://www.youtube.com/watch?v=o0ZR6XZwB6A

Passados os dois shows de lançamento do Compacto, tivemos perspectivas para outros shows em vista, além das resenhas que começavam a aparecerem publicadas através da imprensa escrita, e de convites para participarmos de programas de Rádio e TV. 

Contudo, toda essa movimentação maravilhosa, não demovera-nos da ideia de procurarmos um vocalista. A ideia foi continuar a procurar esse "frontman" tornara-se uma obsessão, praticamente. 

Nessa altura, estávamos a cada dia a conhecer mais gente do meio musical e aproximarmo-nos do mainstream, pelas beiradas, a conhecermos pessoas que detinham contato com a primeira divisão da música.

Portanto, ficávamos a par da rede de boatos que intensificavam-se com a proximidade do Festival "Rock in Rio", que já alardeava uma mega produção com a presença de diversos artistas internacionais, e certamente, todo mundo que estava na luta por um lugar ao sol nessa ocasião, pleiteava um lugar entre os artistas nacionais. 

Claro, a perspectiva concreta seria para o pessoal consolidado do BR-Rock aproveitar tal oportunidade em peso, artistas esses que estavam com a presença forte na mídia fortemente mainstream desde meados de 1982. Porém todo mundo mantinha esperanças recônditas, incluso nós...

E fora o mega evento que aproximava-se, a rede de boatos falava sobre investimentos da parte das gravadoras, a buscarem novas bandas etc.

Claro, o nosso som, visual e estética eram antagônicos ao estilo predominante na predileção de seus artífices, ou seja, tudo favorecera quem comungava dos ideais da estética do Pós-Punk e os seus derivados. A turma do Pop, embarcava pela seara da "New Wave", mas este insípido estilo fora na verdade, uma mera variante do Pós-Punk, também, e sob diluição Pop comercial e infantiloide, em muitos aspectos.

Restara-nos então apostar na vertente oposta, mas igualmente tipicamente oitentista, que seria a do Heavy-Metal/Hard-Rock. A Chave do Sol, nunca, em momento algum teve essa vocação. Contudo, naquele funil opressor em que as forças dominantes nos anos 1980 impuseram-se na música, não restou-nos outra alternativa.

Portanto, estávamos imbuídos da necessidade de impor mais peso no nosso som, sem contudo descaracterizar as nossas raízes setentistas, principalmente no tocante ao Jazz-Rock. 

E uma segunda necessidade premente, foi achar um vocalista com potência vocal compatível, e presença de palco como um frontman. Seria pedir demais que esse suposto novo componente tivesse como característica também o aspecto do carisma pessoal? 

Mas é claro que isso seria fundamental, igualmente! Então, a nossa busca prosseguiu, mas depois das tentativas de testarmos pessoas mediante anúncios, que inclusive houvera provocado que nós perdêssemos tempo com sessões dedicadas a pessoas sem nenhuma condição concreta, estávamos apenas a comentar para alguns amigos, para que estes pudessem indicar-nos alguém. Nesse quesito, o poeta, Julio Revoredo, nosso colaborador e letrista, chegou a fazer pesquisa de campo em nosso favor.

Fotos clicadas pelo poeta, Julio Revoredo, durante a apresentação da banda: "Ano Luz", no evento "Praça do Rock", em 1984, onde ele mesmo ficara impressionado com a performance do vocalista, Fran Dias, ao ponto de motivá-lo a indicá-lo à nossa banda. Click, acervo e cortesia de Julio Revoredo

Recentemente (2012), ele, Julio Revoredo, concedeu entrevista ao Blog d'A Chave do Sol (conduzido pelo abnegado fã, Will Dissidente), onde contou essa história, ao revelar que fora a vários shows com bandas emergentes, para observar possíveis vocalistas para A Chave do Sol. Desse esforço, ao final de 1984, ele descobriria e dar-nos-ia a dica sobre um cantor sensacional, chamado: Fran Alves, que de fato, ingressaria em nossa banda, ao final de 1984, e estrearia em janeiro de 1985. 

Mas antes disso, ocorreu uma oportunidade fortuita. E não foi por conta das observações do poeta, Julio Revoredo, mas sim por um meio inesperado, que viemos a conhecer um vocalista dotado de um grande potencial...

No próximo capítulo, esse misterioso personagem da foto, obscurecido pela luz solar, será revelado. Click, acervo e cortesia de Julio Revoredo
 
E esse inusitado vocalista surgido antes do Fran Alves, apareceu de forma inesperada para A Chave do Sol...

Continua...

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