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quarta-feira, 2 de dezembro de 2015

Patrulha do Espaço - Capítulo 2 - Fez da Nave de Novo, uma Navegadora - Por Luiz Domingues

Os responsáveis pelo salão não colocaram muita credibilidade em nossa capacidade para movimentar um público melhor do que eles normalmente arregimentavam, apenas com som mecânico, portanto, a negociação foi lenta, arrastada, e com a nítida incredulidade por parte deles. 

Então, nós fomos diversas vezes lá. E a cada rodada de argumentações de nossa parte, a contra-argumentação mostrava-se engraçada, quase em tom de pilhéria na forma de desculpas da parte de tais mandatários do salão. 

Ao verificarem que estávamos empenhados, cenas folclóricas aconteceram. Por exemplo, o dono do estabelecimento ao afirmar ter um contato em um programa popularesco da TV de então, daqueles típicos de baixo nível, nos indagou se nós aceitaríamos participar, entretanto, de antemão ele fez questão de salientar que não garantiria que fosse através de um número musical necessariamente pelo qual participaríamos, mas que poderia ser sob uma outra circunstância inusitada. Ora, como assim? Mediante tal afirmativa bizarra de sua parte, será que um de nós teria que simular nos submetermos a um teste de paternidade com alguma garota armada pela produção, para gerar-se uma falsa desavença e posterior briga armada e vexatória com atores a simularem uma sketch de baixo nível?

E outra ideia que soou épica: o patriarca da família que era proprietária do estabelecimento, empolgou-se e em dado instante da negociação, nos disse que bancaria o show a pagar todas as despesas da produção e nos oferecer um bom cachê. Por um segundo, chegamos a pensar que o homem falara sério, mas logo notamos que fora uma empolgação vazia. 

E houveram mais histórias bizarras sobre tais conversas que ouvimos por parte daquelas pessoas, mas que não vou narrar, para não comprometer a imagem de ninguém.

O fato cabal, foi que tais pessoas pouco dimensionaram o nome ou a história da Patrulha do Espaço. Para a compreensão deles, nós ou uma banda cover não demarcava muita diferença. Aliás, esse foi um problema de questão de não dimensionamento da nossa real envergadura artística e dentro da história, que nos afligiria ao longo da nossa trajetória, infelizmente. O importante para eles, seria a capacidade para angariarmos público e nesse quesito, sobreveio a sua descrença em nossa tradição. 

Creio que foi ao final de junho de 1999, que o martelo foi batido definitivamente e aí, começou a batalha pela melhor divulgação possível.

Acima, a filipeta oficial do nosso primeiro show oficial da formação. Na foto, eu (Luiz Domingues) e Rolando Castello Junior a ensaiarmos no estúdio Alquimia de São Paulo-SP em abril de 1999. Click e acervo: Rodrigo Hid
 
É evidente que contamos com o apoio de amigos nessa empreitada.
O Júnior angariara um patrocínio para cobrir os gastos do tradicional, "lambe-lambe", com um futuro candidato a vereador. Não tratava-se de um ano com eleições municipais, mas esse pré-candidato queria popularizar o seu nome, previamente, e forjar sua imagem como um incentivador das artes em geral. Então fora comum ver seu nome vinculado a shows musicais; peças teatrais e outras atividades artísticas. 
Rodrigo Hid e eu (Luiz Domingues), nas dependências do estúdio Alquimia de São Paulo em abril de 1999. Acervo: Rodrigo Hid. Click: Claudia Fernanda   

Os cartazetes e filipetas foram impressos por nós mesmos. A internet já continha um certo peso nessa época, mas nós praticamente não a usamos. Não haviam ainda as redes sociais massificadas, como hoje em dia. Rádio e TV foram impossíveis de serem usados, pelos preços proibitivos que cobravam. 
 
Desde meados dos anos noventa, já não haviam programas da TV aberta dispostos a agendarem bandas de fora do esquema do "jabá". Dessa forma, com poucos cartazetes e filipetas, nós cobrimos o circuito óbvio do Rock em São Paulo, como a "Galeria do Rock" e as lojas de instrumentos da Rua Teodoro Sampaio. E fizemos promoção mediante filipetas nas estratégicas saídas de shows de Rock, próximos de nossa data. 
Rodrigo Hid e Marcello Schevano em ação no ensaio da Patrulha do Espaço em abril de 1999. Click de Claudia Fernanda e Acervo de Rodrigo Hid

Por exemplo, lembro-me de haver contado com a ajuda de amigos e alunos para filipetar um show do grupo de Heavy-Metal, "Angra", no Palace, uma casa de shows localizada no bairro de Moema, na zona de sul de São Paulo. Nessa noite, um ex-aluno meu estava a filipetar um dos flancos da rua onde localizava-se tal casa, de onde uma parte do público saia, quando um garoto pegou a filipeta e disse-lhe: -"Patrulha do Espaço?" Isso é do tempo do meu avô"... 
 
Em suma, lidar com esse tipo de preconceito tolo se tornara normal, e ainda por cima em meio a esse público aficionado pelo Heavy-Metal, que parece ser obcecado pelo conceito do tempo. Como se música fosse um remédio e detivesse a data de validade para funcionar bem.
 
Outras ações engraçadas, foram no sentido de realizarmos entrevistas em programas de Rádio comunitárias. Foi o que esteve ao nosso alcance. 
 
Lembro-me de uma emissora dessas, uma rádio localizada no bairro do Tatuapé, zona leste de São Paulo, cujo contato fora um rapaz boliviano, dono de uma banca de jornais. O rapaz detinha o apelido sugestivo de: "Bolívia". E se tratava de um autêntico Hippie, com o seu cabelo pela cintura, e a se tratar de uma persona muito gentil e comprovadamente, um Rocker genuíno. Até aí, não foi nada demais.
Rodrigo Hid e Marcello Schevano em ação durante um ensaio da Patrulha do Espaço em abril de 1999. Acervo de Rodrigo Hid. Click: Claudia Fernanda

No entanto, a entrevista aconteceu sob um clima a parecer um filme policial, com o endereço da emissora a ser mantido em sigilo até quando os seus dirigentes confiaram em nós o suficiente para divulgar-nos. E no dia em específico, o clima foi sob apreensão, pois essa rádio já havia sido lacrada pela Embratel, diversas vezes. Nesse aspecto, foi engraçado, mas o resultado para nós foi nulo, pois o alcance limitadíssimo de uma estação pirata, não despertou interesse algum que agregasse-nos mais pessoas presentes na bilheteria do show. 
Na primeira foto, eu (Luiz Domingues) e na segunda, a formação chronophágica da Patrulha do Espaço reunida nas dependências do estúdio Alquimia de São Paulo, em abril de 1999. Click: Claudia Fernanda. Acervo de Rodrigo Hid 

Não lembro-me mais o nome dessa rádio. Mas foi algo absolutamente insignificante em termos de repercussão e foi uma pena, pois a boa vontade em ajudar da parte daqueles freaks abnegados, foi total. 
 
Em relação às filipetas no show do "Angra", a explicação para insistirmos em uma estratégia controversa foi por ter sido o show mais próximo em termos de público, que houvera nos dias que antecederam ao nosso. Eu também acho que não valeria a pena, mas entre "filipetar" para o público do Angra, ou da Ana Carolina (uma cantora/compositora da MPB da ocasião), ou pior ainda, artistas popularescos, foi preferível o Angra como o leque de opções que tivemos naqueles dias. 
A formação chronophágica da Patrulha do Espaço, reunida após o ensaio no estúdio Alquimia de São Paulo. Abril de 1999. Click: Claudia Fernanda. Acervo de Rodrigo Hid 

Foi ineficaz, é claro. Eu sempre procurei comandar equipes de divulgação com uma logística e um foco definido. Nesse caso, foi uma tentativa para aproveitar o cenário menos ruim. Se tratou do melhor que tivemos na ocasião, ainda mais se pensarmos sobre a nossa infraestrutura, mediante os nossos parcos recursos financeiros.
Marcello Schevano aos teclados, com Rolando Castello Junior na bateria. Ensaio da Patrulha do Espaço no estúdio Alquimia de São Paulo. Click: Claudia Fernanda. Acervo de Rodrigo Hid 

Quanto aos meninos, eles não estiveram deslumbrados com essa movimentação inicial. Se mostraram felizes, mas não houve nenhum exagero em sua postura. 
 
O período entre a divulgação e o primeiro show foi bom, com exceção da semana específica do show, pois a "bruxa" voou solta nesses dias terríveis que antecederam a data. Por pouco, o show não teve de ser cancelado. 
 
Começamos a semana felizes por vermos os cartazes "Lambe-lambes" com o nosso show anunciado, mas dois fatos terríveis aconteceram para atrapalhar a nossa perspectiva. O show ocorreria no sábado, dia 14 de agosto de 1999.
Marcello Schevano polivalente a tocar flauta, guitarra e teclados em prol da nossa banda. Ensaio da Patrulha do Espaço em abril de 1999 no estúdio Alquimia de São Paulo. Click: Claudia Fernanda. Acervo de Rodrigo Hid 

Na quarta-feira anterior ao dia do show, nós fomos surpreendidos com a notícia de que o Marcello sofrera um acidente com o seu carro, ao deslocar-se da faculdade para a sua casa. Ficamos apavorados, mas apesar do carro ter tido a dita perda total, ele sobreviveu e não teve nenhuma contusão séria, ao só apresentar um quadro com a ocorrência de dores nas costas motivadas por hematomas, pois o caminhão que o abalroou, atingira o seu automóvel pela traseira.

Sobre o acidente em si, o Marcello esteve parado no semáforo, quando ouviu o barulho de um caminhão a frear e colidir com a traseira do seu carro, sem dar tempo para que ele esboçasse uma reação. 
Quanto ao seu estado de saúde, após exames, o médico constatou terem sido apenas hematomas e o liberou. Pensamos em cancelar o show, pois o susto houvera sido enorme.
 
Porém, no dia seguinte algo pior aconteceu. Recebi um telefonema do Júnior, a se mostrar muito preocupado, pois um problema sério de saúde ocorrera com um familiar seu, de forma repentina. Prefiro não entrar em detalhes para não expor ninguém desnecessariamente. Digo apenas, que foi ainda mais dramático do que o acidente do Marcello, portanto, a lhe tirar a paz de espírito. 
Rodrigo Hid e Marcello Schevano em ação em um ensaio da Patrulha do Espaço no estúdio Alquimia de São Paulo. Abril de 1999. Click: Claudia Fernanda. Acervo de Rodrigo Hid 

O ensaio de sexta, convocado para dar o último apronto, foi realizado somente pelos garotos e eu (Luiz), pois o Rolando Castello Júnior realmente não apresentara condições para comparecer, entretido que estava em assistir um seu ente querido no hospital. 
 
Tememos que ele não pudesse realizar o show no sábado, dadas as circunstâncias e até a hora de reunirmo-nos para irmos ao salão, pairou tal dúvida. E assim, o clima mostrara-se pesadíssimo para a estreia, ou seja, algo diametralmente oposto ao que eu sonhara desde o início quando formatamos esta formação da nossa banda.


Luiz Domingues & Rodrigo Hid, em ação, no show de estreia de nossa formação da Patrulha do Espaço. 14 de agosto de 1999. Click: Eduardo Donato. Acervo de Rodrigo Hid 
O Júnior estava a enfrentar um problema gravíssimo de ordem familiar, muito preocupante pelo desenrolar dos acontecimentos e a determinar se ele poderia cumprir o show ou não. 
 
E o Marcello sentia ainda fortes dores nas costas. Apesar de tranquilizado pelos médicos quanto a não gravidade do seu quadro, a dor revelava-se muito forte e só deu-lhe trégua mediante o uso de fortes analgésicos. Portanto, o seu esforço para comparecer ao ensaio da sexta-feira, que precedeu o show, foi notável.
Ainda houveram mais agravantes. Tivemos pendências relativas à produção em si, para tratarmos. Foram detalhes cênicos sobre ornamentos e equipamentos para reforçar o palco, para ser específico. 
 
O transporte foi concretizado de uma forma precária, também. Sem dinheiro para contratar nem ao menos uma Kombi, tivemos que transportar tudo em nossos respectivos carros particulares. 

Na volta para a casa, no pós-show, o contingente aumentou, com outros amigos a colaborarem. Lembro-me dos carros dos amigos do meu exército de "Neo-Hippies", a auxiliar-nos, também. 
 
Portanto, diante de tantas intempéries que tivemos, eu louvo a grande disposição da parte da banda para promover uma volta à cena artística, minimamente adequada à sua grandeza adquirida na história do Rock Brasileiro, ao fazer um esforço descomunal para ter as melhores condições possíveis naquele momento, ao demonstrar grandeza de alma. E isso não foi pouco, pois pelo contrário, revelou-se como um mérito e tanto.
E chegou o grande dia, enfim da estreia da nossa formação. Se por um lado houve um clima amargo diante do que passamos nos bastidores naquela semana, garantiu-se também a perspectiva para enfim aniquilar a expectativa em torno do primeiro show. 
 
Da parte do Rolando Castello Júnior, houve uma velada ansiedade por conta de se testar os meninos ao vivo. Se através dos ensaios, eles haviam conquistado a sua confiança por tocarem e cantarem demais, houvera a dúvida no comportamento no palco, sob um show oficial.
De certa forma, eu deveria ter observado essa apreensão também, pois afinal de contas, seria o primeiro show oficial com os dois garotos, após mais de um ano e meio de ensaios apenas, por considerar-se o período em que estivemos a trabalharmos juntos em prol do Sidharta. Entretanto, ao contrário do Júnior, eu estive tranquilo nesse aspecto, pois a despeito de ser a primeira apresentação para valer, eu já havia conquistado a confiança totalmente nos dois.
 
O que não esteve bem, fora o clima ruim por conta dos percalços pessoais que enfrentamos naqueles dias.
A Revista Dynamite foi o primeiro veículo da imprensa especializada a publicar uma nota sobre a volta da banda, com nova formação, mas ainda a citar-me pelo velho apelido que eu usava anteriormente, como nome artístico, para designar-me. Não foi culpa deles, pois só firmei a ideia de cortar tal denominação a partir da gravação do CD "Chronophagia", em 2000. Porém errou feio o sobrenome do Marcello, como observa-se na nota acima. 
 
Sim, o Marcello ainda sentia dores decorrentes do seu acidente automobilístico ocorrido dias antes. A sua família esteve apreensiva, e com razão. O prudente teria sido cancelar o show e ele ter se colocado a repousar por alguns dias, mas ele bancou essa resolução de fazer o show e foi valente.
 
O Rolando Castello Júnior apareceu para tocar bem abatido e tenso. O que ele esteve a passar no seu âmbito familiar, fora pesado, mas também enfrentou a situação com a determinação de seguir em frente, com muita valentia. Chegamos no salão por volta das 17:00 horas. 
Montamos o palco com um exército de ajudantes, porém, todos amadores em essência. Foram vários dos meus alunos, o meu pequeno exército de Neo-Hippies ou de "Brancaleone", como queira o leitor, estiveram ali a colaborar. Nesse início, sem verba, não tivemos como contratar roadies profissionais, portanto, contamos com o apoio abnegado de amigos, em suma.
 
A montagem do palco foi tensa, no entanto, pois o Júnior que já estava muito nervoso por razões pessoais, irritou-se várias vezes com aquele contingente a querer ajudar na maior boa vontade, porém sem metodologia, mais a atrapalhar a montagem.
 
A nossa sorte foi ter contado com o técnico de som da casa, que se provara ser muito bom. Houve uma dificuldade técnica que dificultaria a sua atuação, mas se não fosse isso, o show teria sido perfeito.
O nome desse técnico era: Thales de Meneses, um "freak" que gostava da nossa proposta em torno do Rock Clássico, e se mostrara tecnicamente, competente. Sendo assim, quando começamos a levantar a equalização da bateria, logo percebemos o seu apuro na timbragem dos instrumentos.
 
Passados todos os instrumentos pela equalização, fomos tocar a canção: "Sexy Sua" para testar o retorno e ficara um primor! É muito raro na condição de se estar a trabalhar com um técnico estranho, alcançar-se um som dessa qualidade. Essa condição geralmente só é obtida se o técnico acompanha a banda em todos os shows e passa a conhecer bem o trabalho e as predileções de cada músico. Mas esse Thales surpreendeu, pois o som do palco ficara sensacional.
Essa foto com o Rolando em destaque, é de um ensaio no estúdio Alquimia, em abril de 1999. Click de Claudia Fernanda. Acervo de Rodrigo Hid

O problema técnico que eu mencionei anteriormente, foi sentido no fato de que só houve uma mesa para operar tudo e ela comandou o PA e o retorno, simultaneamente. O correto, é sempre contar-se com duas mesas, com direcionamentos diferentes. Uma comanda o PA, ou seja, o som que chega ao público e a outra comanda o monitor, ou seja, o som que o artista ouve no palco para poder guiar-se em sua performance. 
 
Neste caso, com uma única mesa a operar as duas funções pelo mesmo técnico, não foi uma situação ideal e para agravar a situação ali configurada, a mesa estava posicionada atrás das caixas do PA ao nosso lado no palco!
Conclusão: o técnico não reunira condições humanas para checar na hora do show, a situação real do som emitido pelo PA. Ele equalizou durante a passagem do som, mas na hora do show, ficou preso na mesa, só a ouvir o som do palco. Isso não fora culpa dele, mas da estrutura da casa.
 
Satisfeitos pelo soundcheck, fomos arrumar os últimos detalhes da ornamentação e resguardar-nos no camarim, à espera da hora do show.
Foi a primeira vez que preparamos toda aquela ambientação decorativa em torno dos valores estéticos das décadas 1960 & 1970, com a qual eu sonhara desde que formei o Sidharta em 1997, mas que na verdade, fora o resgate do sonho primordial acalentado na adolescência, na década de setenta e que fora devidamente atrapalhado pelo fato de eu ter ingressado na música no momento em que essa estética começava a definhar, atacada violentamente por detratores e cuja ação predatória fora apoiada amplamente pelos marqueteiros de plantão, ao trabalharem para fomentar tais interesses antagônicos e escusos.
Portanto, foi bastante emocionante para a minha expectativa pessoal em particular (e sei que para o Rolando Castello Junior, também), arrumar o palco com todos aqueles ícones visuais e até olfativos, vide o enorme número de incensos que fariam o show ter o perfume dos grandes Concertos de Rock de outrora. 
 
Tivemos um concorrente à altura naquela noite: por uma irônica coincidência, "O Terço" estava a realizar o seu show para celebrar a sua volta à cena, também. E para piorar, em um salão de Rock concorrente do Fofinho Rock Club onde tocaríamos e localizado na mesma avenida Celso Garcia, só que três Km adiante. Eles iriam tocar na Led Slay. Isso evidentemente atrapalhou um pouco a nossa vida, ao dividir o público. Sem O Terço tão perto, talvez pudéssemos haver angariado um público maior.
O som do PA, na passagem de som, estava bom. Mas uma situação é fazer o soundcheck com a casa vazia, e outra completamente diferente, é quando lota com pessoas. Tudo muda! Os corpos das pessoas influem decisivamente nas ondas sonoras emitidas e daí, é fundamental que o técnico de PA faça as correções nas primeiras músicas.
No entanto, como ele poderia fazer isso, a operar atrás do palco?
O som no palco estava excelente, parecia um disco de tão bem mixado, mas nós recebemos várias reclamações da parte de amigos, a dizer-nos que a sonoridade deixara a desejar para o público.
 
O técnico foi um profissional terceirizado, ali contratado. Ele só aparecia para operar shows ao vivo, sazonalmente. No funcionamento normal de som mecânico, havia outro, este sim, funcionário fixo da casa.
Por azar total, foi o ápice das desgraças que nos acometeram naquela semana: "O Terço" a resolver voltar à cena artística justamente na mesma noite que nós, e através de um salão rival e próximo, foi uma triste coincidência. Para brincar com a situação, incluímos a canção, "Hey Amigo" dessa celebrada banda no nosso set list e dedicamos a eles, como um sinal de boas-vindas à cena. O clima que estava tenso por conta dos aborrecimentos ocorridos durante a semana, amenizou na medida em que aproximou-se a hora do show. 
Camarim do Fofinho: Rolando Castello Júnior no centro, à esquerda, Samuel Wagner, que nessa época ainda não era roadie da banda, mas apareceu para assistir o show e à direita, Nelsinho, um fã da banda desde o primeiro show ocorrido pelos nossos fundadores em 1977! Acervo de Rodrigo Hid. Click: Eduardo Donato
Pedrinho "Wood" Ayoub, guitarrista do "Tomada" à época, e Marcello Schevano, no camarim do Fofinho, em 18 de agosto de 1999. Acervo e cortesia de Rodrigo Hid. Click: Eduardo Donato

O que tumultuou um pouco foi a desorganização que tivemos nesse dia, por não contarmos com roadies profissionais.
Da esquerda para a direita: Marcello Schevano, Eduardo Donato e Rodrigo Hid. Donato era colega de faculdade do Rodrigo e pertencente, portanto, à uma nova geração de estudantes de jornalismo da Faculdade Cásper Líbero, com os quais eu teria amizade, a repetir a tendência iniciada com a safra de amigos que lá firmei em 1979, da qual fundou-se o Língua de Trapo... Acervo de Rodrigo Hid. Click: Renata Hid

Foi tanta gente para tentar ajudar entre os meus neo-hippies, que estes mais atrapalharam, na verdade. Além de um sujeito que apareceu lá de última hora e que expressou a sua vontade para ser roadie a todo custo. Não vou nomeá-lo, para não comprometê-lo, mas era uma figura carimbada em camarins de bandas clássicas setentistas ainda em atividade. 
 
Tratava-se de um sujeito gentil e que de fato sabia trabalhar como roadie, mas quando bebia ou ficava "stoned", tornava-se inconveniente. Estava a perturbar-nos fortemente, mas para a nossa sorte, ele se auto-sabotou quando sob um ato de loucura, enrolou-se literalmente em uma fita "Silver Tape" e completamente atrapalhado para se livrar dessa amarra, ficou imobilizado (fantasiou-se como: "Imhotep", eu diria, a se parecer como uma múmia egípcia), a demorar para conseguir safar-se e deixar-nos então, em paz...
 
Luciano"Deca" Cardoso e eu (Luiz Domingues), no camarim do Fofinho. Deca foi durante cinco anos, meu colega no Pitbulls on Crack e é bastante citado no capítulo dessa banda, naturalmente. Acervo de Rodrigo Hid. Click: Eduardo Donato

O camarim era pequeno e o caminho para o palco se mostrou muito perigoso por ser sinuoso e com degraus preocupantes. 
 
Na medida em que chegava o horário do show, os problemas que tivemos ao longo da semana, com o acidente do Marcello e o problema grave de saúde com um ente querido do Junior, saíram de nossas cabeças e o foco foi para a nossa performance no palco. Ao pensar assim, é claro que a despeito de tais apreensões de bastidores, eu estava animado!
E lá estava eu no camarim do Fofinho, todo "Flamboyant", feliz por estar a iniciar uma jornada sob pleno resgate 1960 & 1970, enfim... Acervo de Rodrigo Hid. Click: Eduardo Donato
 
Aquele show foi a concretização de quatro meses de trabalho, entre os ensaios, procura por um espaço, divulgação etc. Além disso, estarmos a subir ao palco foi uma realização e tanto pela semana difícil que tivemos. E uma outra questão particular em meu caso: seria o êxito por quase dois anos de trabalho no projeto Sidharta. 
Patrulha do Espaço ao vivo em 14 de agosto de 1999. Acervo de Rodrigo Hid. Click: Eduardo Donato

O show começou enfim! Entramos com: "Não Tenha Medo" e "Festa do Rock", sem interrupções. Seguiram-se: "Ser" e "Tudo Vai Mudar". As músicas novas foram bem aplaudidas e chegaram a arrancar assovios. 
 
Houve também uma quase comoção quando tocamos músicas do primeiro disco da Patrulha do Espaço, da época do Arnaldo Baptista, e reconhecidas por fãs inveterados e antenados da banda, tais como "Sunshine", "Sexy Sua" e "Raio de Sol". 
 
Músicas clássicas dos álbuns da Patrulha do Espaço, tais como: "Sai Dessa Vida", com roupagem Funk-Rock bem setentista, "Ruas da Cidade", "Depois das Onze" e "Espere Aqui por Mim", levaram os fãs ao delírio. 
 
Foi possível sentir que não esperavam uma energia tão grande com a banda a tocar os seus clássicos, com três novos membros e apenas com a presença de Rolando Castello Junior como remanescente da formação original. 
 
Tocamos também: "Bruxas", "Atenção", "Bomba", "Meus 26 anos", e "Columbia". Da safra nova, além das que já citei, tocamos: "Retomada", "Nave Ave", "Terra de Mutantes" e "O Pote de Pokst", esta por sinal, arrancou gritos, pelo seu clima "zeppelineano", com uma aura mística grande, envolta em brumas, que seriam apreciadas por Jimmy Page, certamente. 
 
O palco estava recheado com ornamentos e dúzias de incensos a queimar.
Todo o sonho do Sidharta em trazer o "religare" das chamas sessenta-setentistas estiveram ali presentes! Primeiro show da nossa formação da Patrulha do Espaço. Agosto de 1999. acervo de Rodrigo Hid. Click de Eduardo Donato

Em cima dos amplificadores, colocamos estátuas de Divindades orientais, pedras coloridas e incensos. Espalhados pelo palco, diversos símbolos hippies, em cima dos teclados, um porta-retrato com a imagem de Timothy Leary...
O símbolo Hippie foi espalhado em vários pontos do palco! Rodrigo Hid no destaque, com Luiz Domingues ao seu lado. Patrulha do Espaço ao vivo em agosto de 1999. Acervo e cortesia de Rodrigo Hid. Click: Eduardo Donato

E assim, seguiu-se a noitada, com músicas do repertório clássico da banda, a mesclarem-se às novas, e além de tudo, a resgatarmos também o material da fase do Arnaldo Baptista, pois a Patrulha do Espaço não tocava essas músicas, desde que o cofundador da banda, evadira-se, em 1978. 

Fora a surpresa irônica em tocarmos: "Hey Amigo" d'O Terço e uma canção dos Beatles ("She Came Through in the Bathroom Window"), mas com o arranjo da versão do Joe Cocker.
O show foi um sucesso, pois mostrou toda a versatilidade dos dois garotos ao revezarem-se aos teclados, guitarras a mil por hora, vocalizações dos três da frente, flauta... enfim, fora uma nova Patrulha do Espaço a surgir. 
 
O público foi bom para os padrões do salão, mas aquém do que esperávamos pela envergadura da nossa banda, com cento e cinquenta pessoas presentes. Enfim, deu tudo certo, apesar das agruras vividas naquela semana!
Outra rara foto desse show de estreia da nova formação da Patrulha do Espaço, em 14 de agosto de 1999. Eu, Luiz Domingues a mil por hora no palco. Click, acervo e cortesia de Samuel Wagner

Semana terrível, sem dúvida, mas o show transcorreu bem, apesar dos pesares e o público que esteve ali presente, viu uma apresentação com muita energia, técnica e sobretudo, o sinal de resgate da Patrulha do Espaço às suas próprias raízes, para que pudesse enfim libertar-se dos ranços de Heavy-Metal cometidos em seus últimos anos de atuação. 
 
Como sempre brincávamos nos intervalos dos ensaios, tocávamos clássicos do Rock. E nesses termos, costumávamos tocar "Hey, Amigo", d'O Terço, com o Marcello a pilotar o órgão Hammond. Essa versão ficou muito boa, com os três da linha de frente a cantarem e o Rodrigo na guitarra. 
Quando soubemos que O Terço iria fazer um show de volta às suas atividades artísticas, como nós e no mesmo dia (e sob um local rival da casa onde tocaríamos), resolvemos incluí-la no set list, como brincadeira. Mas sem  haver ironia de nossa parte, pois gostávamos d'O Terço, é claro. 
 
E mais um detalhe sobre esse show: ele foi filmado! Não possui uma qualidade muito grande, pois tratou-se de uma câmera sob formato VHS, e o rapaz que filmou (Edson Vicentin), não gravou o show inteiro, infelizmente. Estudo para em breve, lançar trechos desse material no YouTube.
Uma panorâmica do palco desse show de estreia da nova formação da Patrulha do Espaço, em 14 de agosto de 1999. Da esquerda para a direita: eu (Luiz Domingues), Rodrigo Hid, Rolando Castello Junior e Marcello Schevano. Acervo de Rodrigo Hid. Click: Eduardo Donato

Após essa boa estreia, ficamos confiantes, muito mais animados e prosseguimos a ensaiar, neste novo instante sem a pressão inicial da estreia e a começarmos a criar algo já fora do material herdado do Sidharta. Lembro-me que ainda em agosto, o Marcello disse-nos que estava com algumas ideias para um tema progressivo, sendo essa peça, uma clássica suíte com várias partes.
Marcello Schevano no ensaio da Patrulha do Espaço no estúdio do Paulo "P.A." Pagni, baterista do "RPM", e onde a banda formatou a pré-produção do CD "Chronophagia", ao ensaiar a partir de agosto de 1999. Acervo e click: Luiz Domingues
 
Começamos a trabalhar nesse tema, que deu sim, bastante trabalho, pois a cada trecho que ele mostrava-nos, parávamos para arranjá-lo coletivamente.
Rodrigo Hid a pilotar os teclados dessa vez em ensaio da Patrulha do Espaço, no estúdio do P.A. Pagni. Click e acervo: Luiz Domingues

Foi de fato, a primeira música nova criada pela formação, sem contar a herança adquirida pelo Sidharta, como eu já salientei. Esta peça recebeu o título de: "Sendo o Tudo e o Nada", uma complexa suíte bem ao estilo do Rock Progressivo, bastante influenciada pelo "Yes", e bandas italianas clássicas dessa vertente, tais como "Premiata Forneria Marconi" e "Banco Del Muttuo Soccorso", principalmente.
 
Mas a despeito dessa animação com o material estar a ficar excelente após o show do Fofinho Rock Club, estivemos sem datas agendadas, e o Rolando Castello Júnior que estivera abatido por conta do problema familiar que tivera recentemente, ficara sem forças para movimentar-se nesse sentido, como uma agente de campo em prol da banda.
Somente alguns dias depois foi que surgiu um convite, mas não tratou-se de nada muito animador. Uma casa noturna localizada na Vila Prudente, na zona leste de São Paulo, estava a organizar um show ao ar livre, com um palco montado na sua rua.
 
Seria apoiado pela prefeitura, portanto com uma infraestrutura razoável de som, palco decente etc. E ao confirmar-se a participação, eis que abriria a possibilidade para agendarmos um show completo nas suas dependências, a oferecer-nos a bilheteria, a posteriori. 
 
Como as perspectivas estiveram difíceis naquele instante, nós aceitamos a participação da nossa banda nesse micro-festival, gratuitamente, na esperança de podermos agendar a seguir um show remunerado na própria casa em questão, conforme fora aventado pelos seus organizadores. 
 
E assim, nós tocamos na tarde de um domingo, dia 5 de setembro de 1999, em frente ao bar "Fuzzy's", na Vila Prudente, zona leste de São Paulo.
Lembro-me de haver cerca de cem pessoas ali presentes, apenas, apesar de ser gratuito, infelizmente. E a outra atração da tarde foi: "Os Ostras", uma banda que continha uma certa fama conquistada no âmbito da MTV, ao final dos anos noventa. 
 
Apesar do pouco público in loco, o som no palco e no PA esteve razoável. E nesses termos, o show foi bom, com uma energia prazerosa etc. Na verdade, foi um "show de choque". Damos esse nome para shows curtos, e inseridos sob um contexto com vários artistas a apresentarem-se sucessivamente no mesmo palco, dentro de um evento somente.
Lembro-me que apesar de ter sido um show curto, tocamos músicas com teclados, também, como: "Sexy Sua" e "Sunshine". Digno de nota, tal festival apresentou igualmente o "Big Balls", de Xando Zupo, banda essa que em tal época só tocava covers. Recordo-me deles a tocarem músicas do "Deep Purple", por exemplo, além da presença de outras bandas ali presentes, formadas por garotos e se mostrarem irrelevantes sob um contexto maior da música. E o show prometido, dentro na casa e com remuneração, nunca aconteceu...
Rolando Castello Junior e Paulo P.A.Pagni no estúdio dele, P.A. e que foi o nosso QG, entre agosto e novembro de 1999

Seguiu-se a esse show ao ar livre na porta do Bar Fuzzy's, um período com ensaios que foram realizados com todo o empenho, até meados de dezembro.
 
Nesse ínterim, fizemos as primeiras fotos promocionais mais categorizadas, enfim, pois a sessão realizada anteriormente fora amadorística e nenhuma foto sequer foi aproveitada, por falta de qualidade técnica, ou simplesmente por estarem tais chapas sem apelo algum, a não ser duas que alimentaram a mídia por ocasião do primeiro show no Fofinho Rock Clube.
 
Nessas primeiras fotos, parecíamos um bando de sujeitos "fantasiados de anos 1960", a participarmos de um baile a fantasia temático.
 
Nessa segunda sessão que aconteceu em setembro, fomos a um estúdio localizado na Rua Nova York, no bairro do Brooklin, na zona sul de São Paulo. Esse fotógrafo (chamado: Moa Sitibaldi), fora um contato da Claudia Fernanda, namorada do Júnior, que nesta altura, estava a trabalhar como produtora da banda. 
 
Ela mantinha contatos no mundo das artes plásticas, pois trabalhava na produção de eventos dessa natureza, como exposições, vernissages, instalações etc.
Neste caso, as fotos ficaram boas e de fato foram usadas muitas vezes em publicações que eu tenho no portfólio.
 
Não houve a perspectiva de um novo show sob curto prazo. A próxima data agendada seria no Centro Cultural São Paulo, só em dezembro. Então, nesses meses de setembro, até o início de dezembro, nós pudemos afiar bem o repertório antigo da Patrulha do Espaço e trabalharmos forte nas músicas novas.
 
Vários ângulos da "batcaverna" do Paulo "P.A." Antonio, onde ensaiamos no segundo semestre de 1999. Clicks e acervo: Luiz Domingues

Tal oportunidade foi fundamental para chegarmos muito afiados aos shows de dezembro (seriam dois dias no Centro Cultural São Paulo), e principalmente no estúdio em janeiro, quando gravaríamos o primeiro álbum com essa formação e primeiro com inéditas da Patrulha do Espaço, desde 1985. Foram tempos difíceis, financeiramente a falar, pela escassez de shows nesses meses, todavia produtivos pela oportunidade para ensaiarmos bastante.
Na porta da residência do PA, com as presenças queridas de amigos em comum, nossos e do PA. Da esquerda para a direita: Marcello Schevano, o saudoso Hélcio Aguirra, o percussionista, Nobuga, Rodrigo Hid e Rolando Castello Junior. Click e acervo: Luiz Domingues

E nessa fase em que estávamos a ensaiar no estúdio do P.A. (Paulo Antonio, baterista do RPM), na Vila Mariana, zona sul de São Paulo, houve uma sinergia muito forte com o espírito dos ideais fomentados na época do Sidharta, pois nós usáramos bastante essa mesma sala de ensaio para compor e aprimorar aquelas canções novas, que agora seriam da Patrulha do Espaço.
 
Ali, que houvera sido o QG do Sidharta na maior parte do tempo, o ambiente hippie fora adequado para a atmosfera que buscávamos nessa nova identidade que imprimiríamos a favor da Patrulha do Espaço.
Mas na medida em que os meses finais de 1999 foram a extinguirem-se, a animação voltou, pois tivemos duas datas agendadas para cumprir no Teatro Adoniran Barbosa, no complexo do Centro Cultural São Paulo. E como seriam os nossos primeiros shows em um lugar mais categorizado, mesmo sem verba, decidimos caprichar na produção, ao máximo, dentro das nossas possibilidades.
Uma das ideias que tivemos, foi a de ressuscitar a clássica "bolha psicodélica", a ser utilizada como visual de fundo de palco. Entretanto, como os nossos recursos eram parcos, tínhamos que improvisar e de certa maneira sermos tão criativos quantos os primeiros hippies brasileiros fizeram para imitar o efeito que acontecia nos shows de Rock norte-americanos e europeus, dos anos sessenta. 
 
Foi então, que o Rolando Castello Júnior lembrou-se que o primeiro empreendedor que fez bolhas psicodélicas em shows de Rock em São Paulo, foi o artista plástico, André Peticov, irmão de um outro grande artista plástico, Antonio Peticov.
O grande artista plástico e testemunha ocular/partícipe da loucura contracultural hippie dos anos sessenta em São Paulo, André Peticov
 
Como o Rolando o conhecia desde os anos setenta, ele conseguiu o seu telefone então atual, e pediu-lhe ajuda. André tinha compromisso já firmado e não poderia estar presente nos shows para ele mesmo operar as projeções (seria o máximo poder contar com ele!). Mas ele foi simpático ao se mostrar imbuído de solidariedade ao enviar-nos instruções e assim, nós empreendemos esforços para arrumarmos um velho projetor de slides. A técnica seria rudimentar, primitiva e cheia de improviso.
O "maquinário" consistira de: um projetor velho, lentes de câmera fotográfica e uma lata de refrigerante, de preferência o clássico Guaraná ou Soda Limonada. 
 
As borbulhantes bolhas do refrigerante, ampliadas e projetadas, mediante contato com gelatinas coloridas de celofane, produziriam enfim, as bolhas psicodélicas, lindíssimas. Essa técnica se mostrara extremamente mambembe e artesanal, mas requeria uma atenção constante e a provocar inevitavelmente uma inundação incrível em volta, o que seria um problema estrutural a ser solucionado no dia do show.
Então nós percebemos, ao fazermos testes caseiros, que o projetor que arrumáramos era muito fraco em seu alcance de foco. Para projetar sob um diâmetro maior, precisaríamos de algo mais potente. O Rodrigo chegou a cotar preço de aluguel de projetores vintage, mas os valores aventados foram absurdos. E houve também a questão da tela. Teria que ser um tecido adequado e não quaisquer panos a esmo. 
A formação chronophágica da Patrulha do Espaço em fotos posadas. Em cima, foto de Moa Sitibaldi. Abaixo, acervo de Rodrigo Hid
 
Não tivemos outra alternativa a não ser o improviso, pois a verba que dispúnhamos fora inexistente. Nos testes caseiros, o efeito da bolha mostrara-se muito interessante, mas sob uma tela improvisada com a presença de tecido branco de linho. O nosso desafio seria arrumar um projetor mais potente, uma tela com maior dimensão e sob um tecido com qualidade superior, para melhorar a perspectiva da projeção. 
Junior a relaxar em uma pausa de ensaio e Claudia Fernanda, a nossa produtora à época, ao seu lado. Click e acervo: Luiz Domingues
 
A Claudia Fernanda que trabalhava com eventos, providenciou algumas peças de tecido que houveram sido usadas em uma instalação de artes plásticas que ela produzira recentemente. Não seria o tecido ideal para a projeção, mas mostrara-se bonito como cenário.
 
Então, ficamos com um cenário simples, mas do jeito que ela arrumou, ficou até elegante. E no tocante à projeção, as bolhas ficaram muito sutis, longe do que sonhávamos, porém, surtiu um pequeno efeito.
Mesmo por que, tivemos que conformarmo-nos em usar o projetor pequeno e assim, o foco seria diminuto, portanto inadequado para o que desejávamos. Dessa forma, ficou uma porção bem comedida, mas de forma alguma comprometeu. 
 
E para dar suporte à essa produção, nós contamos novamente com aquela rede de amigos, sempre solícitos, que esteve junto conosco. Foi o Eduardo Donato, que operou o projetor nos shows e que havia entrado para o meu "exército de neo-hippies", mas que não era oriundo da minha sala de aulas. Tratava-se de um rapaz que o Rodrigo conhecera, quando este ingressara na Faculdade Cásper Líbero, em 1998. 
Marcello Schevano em destaque. Click e acervo de Rodrigo Hid    

Aliás, as histórias cruzavam-se! Nesse ano de 1999, no mês de maio, o Laert "Sarrumor" convidou-me para ir à sua festa de aniversário. Estávamos já a ensaiarmos com a Patrulha do Espaço e eu vivia aquela euforia em prol do resgate dos ideais oriundos dos anos 1960 & 1970, desde o tempo do Sidharta. 
 
Então, fomos à sua comemoração de natalício, eu (Luiz), Rodrigo e o Eduardo Donato todos vestidos como se estivéssemos nos anos setenta e o Larert achou que estávamos fantasiados a começou a rir, ao fitar-nos daquele jeito. 
 
Nesse dia, o Eduardo Donato o surpreendeu completamente, pois levara em seu bolso, a fita K7 que o Língua de Trapo lançara em 1980, e cuja gravação eu participei como membro da banda! Ele havia achado essa cópia em um sebo, recentemente, e a levou consigo para o Laert autografar...
Patrulha do Espaço e Eduardo Donato, em uma meditação de araque, em foto de janeiro de 2000
Na véspera dos dois shows que fizemos no Centro Cultural, corremos com a questão da produção e divulgação do espetáculo.
Foi efetivamente, a segunda grande campanha de divulgação em que empenhamo-nos, pois o show ao ar livre que realizáramos em setembro, não teve um esforço maior de nossa parte.
Colocamos nas ruas todos os cartazes que pudemos imprimir e o mesmo em relação às filipetas. Mas tivemos uma ótima nova em termos de mídia, de forma inesperada! 
 
Ocorreu que na véspera de nossas datas no Centro Cultural São Paulo, eu mesmo, Luiz, recebi um telefonema na minha residência, de um jornalista do veículo: "Folha de São Paulo". Ele propôs-me uma entrevista por telefone, predisposição essa em que aceitei de imediato.
 
Tal jornalista perguntou-me sobre a volta da Patrulha do Espaço, se neste caso haveria a participação do Arnaldo Baptista, se tínhamos novas músicas para apresentarmos, planos para gravar um novo álbum com inéditas, se tratava-se de uma volta para valer, ou só para cumprirem-se alguns shows nostálgicos etc. 
 
Mesmo surpreendido com esse interesse de um órgão mainstream, e historicamente avesso a espectro artístico pela qual pertencíamos, eu pus-me a responder com o máximo de boa vontade, é claro. Ao final, falei sobre o resgate que a banda pretendia fazer de volta às suas próprias raízes sessenta-setentistas e citei alguns estilos dessas décadas, que faziam parte de nosso espectro de novas composições.
 
Ao encerrar, nós trocamos informações sobre a entrega de fotos promocionais à redação do jornal e eu finalizei a entrevista a me sentir contente, por achar que fora algo extraordinário verificar um jornal gigante como a Folha de São Paulo, a procurar-nos espontaneamente, quando denotara estar a conferir-nos um estofo artístico, relevância etc.
 
Enfim, eu providenciei pessoalmente a entrega de fotos e levei-as à redação da Folha de São Paulo, e fiquei esperançoso por um bom desfecho. De fato, a matéria saiu publicada no caderno de cultura desse jornal, o tradicional: "Folha Ilustrada".
 
Qualquer artista no Brasil, sabe que ser citado no caderno "Ilustrada", é sinal de status, e abre portas. Entretanto, mesmo sem eu ter mencionado de forma alguma, o jornalista inseriu a palavra, "Heavy-Metal", em meio aos estilos que eu citei. Ora, é claro que eu não citaria tal estilo, pois eu fugia disso, e queria extirpar esse ranço que a banda agregara na sua carreira pós-1985, mesmo que não tenha sido um problema exatamente meu, visto que eu não fui componente do conjunto nessa época, mas isso incomodava-me. E infelizmente o jornalista inventou tal dado, literalmente e publicou essa informação, de uma forma indevida.
Claro, apesar desse lapso, não podemos reclamar por termos sido publicados no caderno Ilustrada da Folha de São Paulo, uma autêntica raridade para uma banda não coadunada valores antagônicos em via de regra.
 
Quanto à produção do show, nós tivemos que providenciar algum equipamento extra para suprir as necessidades de palco, ao visarmos alimentar os teclados, principalmente. No quesito cenográfico, conseguimos os tecidos, e sob a supervisão da Claudia Fernanda, o cenário ficou bonito, dentro de sua simplicidade aguardada.
Patrulha do Espaço ao vivo no Centro Cultural São Paulo em dezembro de 1999. Acervo: Luiz Domingues. Click: Eduardo Donato
 
Infelizmente, pela delicadeza quase transparente do tecido usado, a questão da projeção de bolhas psicodélicas ficou prejudicada.
Patrulha do Espaço ao vivo no Centro Cultural São Paulo em dezembro de 1999. Acervo: Luiz Domingues. Click: Eduardo Donato
  
Mostrou-se bastante discreta a ação da projeção, mais ao fornecer um colorido do que o que sonhávamos, mas foi o tal negócio: fizemos o melhor que pudemos, diante de nossos parcos recursos.
O simpático Jornal do Cambuci & Aclimação deu força à banda, a honrar sua tradição de apoiar a cultura, que vinha desde os anos oitenta, quando tal veículo deu suporte sob muito entusiasmo, para o evento: "Praça do Rock", que realizava-se no Parque da Aclimação. 
 
Um dado a mais para colaborar, foi a presença do super iluminador, Wagner Molina, que o Junior convidou para iluminar o nosso show e foi nesse dia em que eu o conheci e anos depois ele tornar-se-ia o iluminador oficial do "Pedra", um outro trabalho em que eu (Luiz) e Rodrigo Hid fomos participar.
Patrulha do Espaço, e um fã no camarim do CCSP. Dezembro de 1999. Acervo: Luiz Domingues. Click: desconhecido

Ao contrário do show do Fofinho Rock Bar, em agosto, o set list evitou as releituras e focou no repertório próprio da banda, a mesclar músicas de todos os discos, incluso da fase com Arnaldo Baptista em sua formação, e as novas canções, que fariam parte do álbum: "Chronophagia", em breve.
Foi nesses dois shows, inclusive, em que executamos várias músicas ainda não tocadas ao vivo (algumas apenas foram tocadas no Fofinho), incluso, "Sendo o Tudo e o Nada", um tema progressivo com muitas partes, a ostentar quase nove minutos de execução.
Patrulha do Espaço ao vivo no Centro Cultural São Paulo em dezembro de 1999. Acervo: Luiz Domingues. Click: Eduardo Donato
 
Esses shows ocorreram nos dias 9 e 10 de dezembro de 1999, quinta e sexta-feira, portanto dias difíceis para atrair-se um bom público ao Centro Cultural, com a agravante de que o horário das 19:00 horas, para realizar-se um espetáculo em uma megalópole como São Paulo, é um disparate, com milhões de pessoas presas no trânsito, bem na hora do "rush".
 
Todavia, a despeito disso, tivemos um público razoável: noventa pessoas na quinta e cento e cinquenta, na sexta. Animados com esses dois shows, que foram bons, e que gerou uma repercussão inesperada, tivemos a boa nova de que houve uma data marcada para fora de São Paulo, na metade de janeiro de 2000. Seria um show a ser realizado na cidade de Praia Grande, litoral sul de São Paulo.
 
E por ter sido assim, com o movimento de borderô dos shows do Centro Cultural São Paulo, mais a perspectiva de um show com cachê fixo e para breve, que o Júnior vislumbrou a possibilidade para entrarmos em estúdio, ao visarmos gravarmos o primeiro CD da nova formação.
Contatos começaram a serem feitos nesse sentido e a aproveitar-se uma oportunidade vislumbrada de outro trabalho dele, Rolando Castello Junior, em paralelo, uma visita a um estúdio de gravação foi programada para o final do ano de 1999.
Patrulha do Espaço ao vivo no Centro Cultural São Paulo em dezembro de 1999. Acervo: Luiz Domingues. Click: Eduardo Donato
 
Esses dois shows do Centro Cultural São Paulo foram filmados, não de uma forma integral, mas eu tenho planos em disponibilizar no YouTube, em breve. Bons shows que animaram-nos para virar o ano 2000!
Patrulha do Espaço no Fofinho Rock Bar de agosto de 1999. Click: Eduardo Donato. Acervo de Rodrigo Hid  
 
Quando chegarmos ao final do ano, o Júnior agendou uma audição de uma fita que ele havia gravado ao vivo, oriundo de um show que fizera em parceria com o baterista, Paulo Zinner, para homenagear o baterista do "The Who", Keith Moon. Esse show aconteceu em 1998 ou 1999, não lembro-me ao certo e fora gravado no Espaço Camerati, que tratava-se de uma charmosa casa de shows localizada na cidade de Santo André-SP, no ABC paulista, e que possuía um estúdio de gravação, acoplado. Daí a facilidade para gravarem-se shows, ao microfonar tudo, e acoplar-se tal mandada à mesa do estúdio. 
          Keith Moon, o grande e lunático baterista do The Who!
 
Essa audição fora uma questão particular dele, Rolando, mas serviu para alinhavar o acordo com o Camerati, para visar iniciarmos a gravação do nosso álbum, em janeiro de 2000.
 
Bem, de volta à audição, lembro-me de termos nos dirigido ao estúdio Camerati, que ficava situado no Bairro Jardim, no centro daquela simpática cidade do ABC paulista, Santo André-SP. Foi por volta das 22:00 horas do dia 30 de dezembro de 1999 que ali chegamos. 
Lembro-me dessa noite por esses fatos todos que eu contei e também por uma notícia que nos chocou e chateou bastante: George Harrison havia sido esfaqueado por um lunático que invadira a sua residência, naquele dia.
 
Nessa visita ao Camerati, estiveram presentes: eu (Luiz), Rolando Castello Júnior, Claudia Fernanda, Rodrigo Hid, Paulo Zinner, o baixista René Seabra e um amigo da banda, Roberto Garcia, ex-aluno meu e um entusiasta da causa. O técnico do Camerati, Zoroastro Barany, popular "Zôro", foi quem recebeu-nos e operou a sessão, naturalmente. 
E como o "Zôro detinha plenos poderes ofertados pelo dono do estúdio nessa época (tal proprietário foi o compositor/cantor cearense, Belchior), agendou a nossa gravação para o final de janeiro de 2000. 
 
Saímos do estúdio Camerati, felizes, pois tivemos a perspectiva de gravarmos em menos de um mês e isso significou um grande passo para a banda. Lançar um novo álbum, com canções inéditas, seria muito importante no sentido de conferir-nos um grande impulso. 
Patrulha do Espaço ao vivo no Centro Cultural São Paulo em dezembro de 1999. Acervo: Luiz Domingues. Click: Eduardo Donato
 
Esse é um dilema para bandas veteranas que voltam à cena, após um grande hiato, por que sem a novidade de um material inédito, ou seja, sem ter o que dizer, artisticamente, uma volta sempre é encarada sob judice pelos críticos, e até pelos próprios fãs, muitas vezes. 
 
E sobre material inédito com grande qualidade, foi algo que tivemos de sobra, literalmente. 
 
A sessão de audição encerrou-se e nós voltamos para nossas casas, a falarmos sobre George Harrison, bug do milênio e Nostradamus...

Continua... 

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