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terça-feira, 8 de dezembro de 2015

Patrulha do Espaço - Capítulo 8 - Mais Shows e Turnês! - Por Luiz Domingues

Esse último final de semana desgastara-nos em demasiado. Além dos danos materiais que tivemos com o ônibus, o aspecto psicológico, nos minara decerto. Porquanto tivemos uma semana taciturna com a lenta absorção de tal revés, mas os compromissos (e as contas), urgiam e dessa forma, no próximo final de semana tivemos um novo show para cumprir.

Desta feita, no entanto, não necessitou de uma viagem extenuante para se atingir o objetivo, mas a se configurar como um show na grande São Paulo, exatamente na cidade de Osasco-SP, para ser específico.

Por se tratar de uma cidade vizinha, resolvemos evitar o uso do ônibus, mesmo por que, pela localização do estabelecimento em questão, seria um estorvo estacioná-lo em plena região central daquela cidade, ainda a se considerar estar localizado o estabelecimento em questão, perto do paço municipal daquele município, tradicionalmente congestionado. Tratava-se do "Taco & Birra", uma casa noturna, com ares de motoclube, misturado com salões de Rock como o Fofinho e a Led Slay, da zona leste de São Paulo.

A proposta de se tocar nesse estabelecimento fora uma dica dos amigos da banda, "Baranga", que costumeiramente apresentava-se em bares desse porte, por conhecerem bem o circuito todo da grande São Paulo e muitas cidades do interior. 

Apesar da Patrulha do Espaço em meio à sua proposta artística não se encaixar como uma luva em tais estabelecimentos, como o Baranga encaixava-se, culminamos de muitas vezes nos apresentarmos em lugares assim. 

Nesse dia em específico, realmente tivemos a companhia do Baranga, ao compartilhar o palco e a noite. Além das duas bandas, uma terceira atração fez o show de abertura, chamada: "Nonah". Realmente não sei o significado que queriam denotar ao batizarem a sua banda com esse título, ainda mais com essa grafia, a acrescentar uma letra "H", sem um propósito ortográfico formal. Talvez fosse "nona", no sentido aritmético ordinal, talvez a denotar uma evocação à avó italiana de alguém, algo cabalístico, místico ou coisa que o valha. 

Não recordo-me exatamente do som desses artistas na época, para deixar um parecer digno, portanto, prefiro não dizer nada nesse sentido, mas soube que anos depois, de suas fileiras, o baixista (não recordo-me de seu nome), e o guitarrista dessa banda (Rodrigo Flausino), cresceram muito em suas carreiras, e hoje em dia são celebrados músicos em meio ao mundo do Heavy-Metal virtuoso. 

Após o show do Baranga, com aquela energia Rock'n' Roll que lhe era peculiar e permeada pelas loucuras cênicas da parte do Deca e do Paulão, sobretudo, nós tocamos e devo dizer que foi um show com bastante energia.

Caracterizou-se como um público Rocker, não vou dizer que não, mas apesar dessa sinergia ali presumida, eu saí do palco com a impressão de que houveram poucas pessoas que realmente demonstraram possuir noção da história e das tradições da Patrulha do Espaço. 

Foi um público caloroso e atento, mas no semblante da maioria, pareceu-nos nítida a questão que eu levantei acima. Não que isso incomodasse-nos além da conta. O Rolando Castello Junior, pela sua enorme experiência, relevava tranquilamente, e eu, também, mas cabe como uma reflexão, certamente. 

Foi interessante nos depararmos com um público Rocker, que não necessariamente, apesar disso, detinha a noção exata de quem éramos e o que representávamos. Ouso dizer que tal situação foi inusitada de certa forma, pois eu não me imagino a assistir uma banda dos anos sessenta, mesmo que esta não tivesse ficado mega famosa na época, sem no mínimo ter uma noção de onde ela veio, de quem foi contemporânea etc. 

Portanto, soara-me bastante exótica a perspectiva disso acontecer com a Patrulha do Espaço, e de fato, tal fenômefator seria tocar para um público não acostumado com shows de Rock, onde espera-se a perplexidade diante de uma sonoridade com a qual não estão acostumados de forma alguma. Outro aspecto bem diferente e surpreendente, eu diria, foi nos depararmos com plateias Rockers, mas sem muita noção do a variante tempo/espaço, dentro de seu próprio nicho de interesse e atuação, presumivelmente. Foi o caso dessa plateia que compareceu ao "Taco & Birra", de Osasco-SP...

Tratou-se de um bom show, não tenho queixas, aliás, a hospitalidade dos responsáveis foi notória, a destacar-se um dos responsáveis pela casa, o baixista, Paulo Callegari, este sim um Rocker com muita noção da história, mas por outro lado, foi exótico perceber nitidamente que a maioria dos presentes não dimensionou corretamente o que representara a Patrulha do Espaço.

Tal show ocorreu no dia 2 de março de 2002 e houve a presença de cerca de duzentas e vinte pessoas na casa, que não foi suficiente para superlotá-la, mas estava bem cheia, eu diria. 

No momento do pós-show dessa noite, houveram duas ocorrências não necessariamente a ver com a banda, mas dignas de nota: uma presença ilustre e inesperada, eis que o grande baterista, Ivan Busic, do "Dr. Sin", apareceu para nos cumprimentar e também uma moça que aparecia nos shows da Patrulha do Espaço nessa época, com regularidade e que quase tivera uma participação como assessora da produtora, Sarah Reichdan, em algumas situações ocorridas entre 2001 e 2002, surgiu no recinto com a edição da Revista da Folha de São Paulo em mãos, e a conter a sua foto na capa. 

Como tal revista era encartada na edição de domingo, mas a partir do final da tarde de sábado já se encontrava à venda nas bancas, ela já estava com a edição dominical em mãos. Tratava-se de uma matéria sobre adolescentes que mantinham fixação por algum assunto em específico e ela participara nesses termos, ao conceder entrevista para falar que gostava de ser notada a participar de programas de auditório da TV aberta. Em suma, uma futilidade, mas que lhe rendera os tais quinze minutos de fama, preconizados pelo Andy Warhol, tempos atrás...

O próximo compromisso foi marcado para o interior do estado, novamente, e foi conveniente para se exorcizar o demônio que pairou sobre nós, na semana anterior, quando da etapa mais nefasta da turnê causara-nos muitos dissabores.

Assim como surgira uma oportunidade para tocarmos em um show de recepção de calouros de uma universidade municipal em São Caetano do Sul-SP, recentemente, uma nova chance surgiu nesse sentido, em um dos campus da Unesp, especificamente o da cidade de Rio Claro. 

Desta feita, o show seria realizado no campo de futebol desse campus, ao ar livre e com a perspectiva de um bom público a comparecer, com noite estrelada e temperatura quente, como acontece tradicionalmente nas cidades interioranas de São Paulo. 

Viajamos sem problemas para Rio Claro-SP, com o "seu" Wagner já firmado como o nosso motorista oficial, doravante, e mediante alguns ajustes no ônibus, verificamos que o pior havia passado e o carro reunira condições para continuar a nos servir, apesar dos estragos sofridos na última viagem. 

Porém, uma revelação inusitada e nada a ver conosco, ou mesmo com o ônibus em si, nos chocou! 

Ocorreu que o Marcello observou a "CNH" (Carteira Nacional de Habilitação), do nosso motorista e ao invés de estar nomeado como "Wagner", como nós havíamos nos habituado a chamar-lhe, estava escrito: "Walter", no documento... 

Ora, cobrado a nos explicar tal confusão no seu documento, a sua explicação foi feita de uma forma tão prosaica, que de pronto nós afastamos a hipótese de se tratar de alguma falcatrua deliberada, mas pelo contrário, revelara-se até risível, ao remeter às sketchs do humor popularesco da TV. 

O que ele nos disse para justificar tal confusão gerada, foi que logo quando se apresentara, o Marcello entendera mal e ao passar a chamá-lo como: "Wagner", este passara tal informação aos demais e ele ficou com vergonha de nos corrigir. 

Inacreditável, pareceu uma piada singela vista nos filmes do Mazzaropi, mas foi o que ocorreu. Guardei essa passagem exótica para contar neste momento exato da cronologia, ao nomeá-lo como: "Wagner", até aqui, para passar ao leitor exatamente o que nós sentimos diante de uma revelação tão inusitada como essa. 

Bem, doravante renomeado como "seu" Walter, ele nos levou sob viagem sem problemas até Rio Claro-SP, distante cerca de cento e oitenta Km de São Paulo e ao chegarmos naquela simpática cidade interiorana (famosa por adotar o mesmo método de Nova York, no tocante a denominar as suas ruas e avenidas por números e acreditem, como isso é muito mais lógico e fácil para não confundir quem não conhece a cidade!), nós fomos para o Campus, um pouco afastado do centro e já a adentrar o perímetro rural desse município. 

Quando chegamos ao campo de futebol aonde aconteceria o evento, vimos que o palco estava montado e os técnicos do PA contratado, já faziam os testes preliminares de equalização do equipamento. 

Muitos estudantes veteranos trabalhavam na preparação das barracas ali programadas para suprirem a venda de comes & bebes e preparavam igualmente para acertar os detalhes de decoração do ambiente, a lembrar uma quermesse de festa junina. 

Estacionamos o nosso ônibus ao lado do palco e aguardamos o momento para se iniciar o soundcheck, sob o calor tórrido e tipicamente interiorano. Feito isso, nos informaram que haveriam apresentações de bandas locais antes do nosso show e que a noite seria fechada por uma banda chamada: "Ambervision", que eu não conhecia, mas deduzia ser similar em termos de sonoridade e proposta à banda, Quasímodo", no sentido de buscar promover releituras do estilo da "Disco Music" dos anos setenta.

Cumprido o soundcheck, um funcionário da secretaria municipal de cultura nos guiou até uma fazenda anexa ao campus, que pertencia à Universidade, e logicamente ao governo do Estado, visto ser a Unesp, uma universidade estadual (para quem não sabe, o Estado de São Paulo possui três Universidades sob a sua administração: Usp, Unesp e Unicamp). 

Essa lembrança, em chegarmos a essa fazenda, é uma das mais lúdicas que guardo na minha memória, enquanto bastidores das turnês da Patrulha do Espaço. A ideia foi que a usássemos como alojamento e estava aberta a possibilidade para pousarmos nela e assim voltarmos a São Paulo somente no dia seguinte. 

Tratava-se de uma fazenda centenária, outrora particular e nas mãos da Universidade, havia se tornado um misto de museu, laboratório de pesquisas e nesse quesito, a abranger as mais diversas, do campo da botânica para a zoologia, e ali havia disponível, o alojamento geral para o uso dos pesquisadores. 

Mas talvez por ter sido uma época de reinício das aulas, estava completamente vazia a fazenda, portanto, e o alojamento deserto, pareceu um set de filmagens para filmes do gênero "Western" ou até do ramo da "Sci-Fi". Não é preciso dizer o quanto apreciamos tal visão, e mesmo com o tempo relativamente curto do qual dispúnhamos para arrumarmo-nos para o show, resolvemos promover uma excursão pelas redondezas. 

Se tratou de uma típica fazenda cafeeira do século XIX, e dispunha de grandes galpões, senzala, haras e até a conter uma capela, a se parecer com uma mini cidade do velho oeste norte-americano. 

Já escurecia, mas realizamos tal caminhada como estudantes a participar de excursões escolares, sob intensa camaradagem entre nós, a se configurar como um momento lúdico dos mais agradáveis, como se fôssemos os "Monkees" inseridos em um dos seus episódios malucos, da série de TV homônima dos anos sessenta. 

Existe uma filmagem amadora a cobrir esses bastidores que ali vivemos, preservada em uma fita VHS, mas que eu já tenho digitalizada em meu acervo, e pretendo editar para lançar um dia, a ser postada no YouTube. 

Vimos ali presentes sob farta profusão, muitas aranhas enormes, morcegos alojados pelas árvores e um simpático gato preto que nos seguiu durante a nossa caminhada, a adotar postura habitual de um cão. 

Já se fazia a noite, quando o funcionário da secretaria municipal de cultura de Rio Claro nos levou ao Museu, anexo a fazenda. Havia ali uma exposição sobre literatura, mas a conter muito material de artes plásticas, também. Lembro-me que algumas ilustrações se mostraram bastante exóticas, talvez um tanto quanto macabras, o que provocou as inevitáveis especulações e piadas inerentes. 

Apesar da hospitalidade ali apresentada pelo secretário em pessoa, resolvemos não aceitar o convite para pousarmos, pois a viagem de volta seria bastante tranquila e todos preferiam certamente estarem em suas respectivas residências em São Paulo, ainda na madrugada, por conta da curta distância observada até a capital favorecer amplamente tal possibilidade. 

A seguir, com todos devidamente banhados, voltamos ao campus e nesse momento foi só esperar a última banda local encerrar a sua apresentação, para subirmos e tocarmos. 

Bandas locais ainda tocavam quando retornamos ao campus. Não estava super lotado, mas houve um bom contingente visível no campo de futebol. A temperatura esteve amena e a noite estrelada do interior, garantiu que a noitada seria agradável, sem dúvida. 

No palco, o backline foi o nosso para usarmos, portanto houve a certeza de haver uma qualidade sonora mínima, que tornasse a nossa performance, agradável. O PA se mostrara razoável, mas o sistema de iluminação, bastante inadequada. Pelas fotos disponibilizadas e pela pequena filmagem que existe sobre esse show, dá para ver que a iluminação foi bastante deficiente, infelizmente.

Rara foto desse show da Patrulha do Espaço ocorrido em Rio Claro-SP, no Campus da Unesp. Click, acervo e cortesia de Germano Meyer

O clima notado entre o público, foi bastante ameno, apesar de ter sido nítido que para a maioria ali presente, nós éramos desconhecidos. De fato, ali não foi um show direcionado a um público Rocker e conhecedor da matéria, portanto, foi previsível que não causássemos uma grande comoção. 

Todavia, foi um show animado, mesmo com o público em sua maioria a nos enxergar como uma banda a mais na sua "balada", e sem nos fornecer o devido valor artístico que detínhamos.

Por volta da metade do show, o Junior quis fazer uma brincadeira, ao promover um improvisado "Quiz" sobre a banda e gerou um rebuliço engraçado. O objetivo foi doar alguns CD's da banda para a plateia e tal confusão com pessoas do público a participarem, nos provocou muitas risadas nesse momento mais cômico da apresentação.

Uma outra foto rara desse show da Patrulha do Espaço, realizado no Campus da Unesp, em Rio Claro-SP. Click, acervo e cortesia de Germano Meyer

Tocamos o nosso set um pouco reduzido nessa ocasião, pois fora quase um show de choque. Encerramos bem aplaudidos e o pessoal do "Ambervision" já estava paramentado para entrar em cena, só a aguardar a nossa saída e a rápida retirada do nosso equipamento backline. 

A viagem de volta foi muito tranquila. Ainda era alta madrugada e já estávamos a descarregar o equipamento na minha residência, em São Paulo, com o sentimento de dever cumprido. 

O nosso próximo compromisso seria em uma cidade ali ao lado de Rio Claro-SP, mas como não haviam outras datas seguidas, não houve cabimento em ficarmos no interior naqueles dias que antecediam esse novo compromisso, por isso voltamos. 

Segundo a avaliação dos organizadores do show, cerca de duas mil pessoas estiveram presentes no campus da Unesp de Rio Claro-SP, neste dia 7 de março de 2002.

Voltaríamos na mesma região de Rio Claro, alguns dias depois. Desta feita, o nosso compromisso deu-se na cidade vizinha, de Limeira-SP, para empreendermos mais uma apresentação no Bar da Montanha. 

Conforme eu já citei anteriormente, o ambiente do Bar da Montanha mostrara-se o melhor possível em termos Rockers. Nesse sentido, destacava-se a atuação dos seus proprietários a se mostrarem super hospitaleiros, solícitos e dispostos a nos agradar em sua recepção. 

Contudo, o público foi um elemento estranho nessa equação. A casa em questão, recebia normalmente um bom público e no visual da maioria das pessoas que ali compareciam, denotava que estas seriam Rockers em sua postura, mas o fato é que normalmente pareciam alheias ao show, a conversarem nas mesas, sem prestarem atenção à performance da banda.

Chamara-nos a atenção tal comportamento surpreendente, pois a casa era teoricamente um reduto Rocker, e não uma boite a receber incautos despreocupados com outras atribuições que não dissessem respeito aos seus anseios hedonistas, como muitas outras em que nos apresentamos em outras cidades, portanto, causara-nos espécie esse tipo de comportamento blasé.

Foi uma apresentação tranquila, apesar disso. Os fãs que compareceram porque gostavam da Patrulha do Espaço, concentraram-se na frente do palco e comportaram-se como gostaríamos que os demais reagissem também, mas não foi possível exigir essa reação de ninguém, certamente. 

Isso ocorreu no dia 10 de março de 2002, com duzentas pessoas na plateia, aproximadamente. Voltamos para São Paulo com o dever cumprido, um cachê razoável no bolso e alguns dias depois, iríamos para um outro quadrante do estado, para exercermos um compromisso no palco do Sesc de Bauru-SP, no qual dividiríamos a noite com o Tutti-Frutti e mais uma vez teríamos o guitarrista do Sepultura como nosso convidado, Andreas Kisser.

Voltamos ao interior de São Paulo em poucos dias, a explorar desta feita um outro quadrante do estado. Fomos para o centro do estado, especificamente à cidade de Bauru-SP, uma pujante e tradicional cidade paulista com grande porte, para nos apresentarmos na unidade do Sesc local. 

Particularmente, eu não tocava nessa unidade do Sesc Bauru desde maio de 1980, quando ali me apresentara com o Língua de Trapo, por termos participado de um festival universitário de MPB, aliás, a banda ainda nem tinha adotado o nome de "Língua de Trapo" nessa ocasião, maio desse referido ano, e claro, tal relato encontra-se com detalhes no capítulo sobre a minha história com esse grupo. 

Bem, no caso da Patrulha do Espaço, foi um show compartilhado com o Tutti-Frutti e a ter como convidados especiais, o guitarrista, Andreas Kisser, do Sepultura e o mega trombonista, Bocato.

Foi mais uma produção da Sarah Reishdan e neste caso seguiu a ideia do espetáculo que fizemos no início de 2002, no Sesc Pompeia, na capital de São Paulo, para o show que ficou batizado como na ocasião como: "São Paulistas". 

Desta feita, a única diferença básica em relação ao show de São Paulo, foi a ausência do guitarrista e vocalista Clemente Nascimento, da banda Punk, "Os Inocentes". 

Bem, foi bem prazeroso pela convivência com tantos amigos e que sempre foram artistas significativos, igualmente e claro, tocar nas unidades do Sesc, sempre foi uma garantia de haver um tratamento digno, com infraestrutura logística da melhor qualidade, cachê decente e tudo mais.

Fizemos um ensaio básico para acomodar a presença dos convidados, conforme também houvera acontecido por ocasião do show de janeiro no Sesc Pompeia de São Paulo e a Sarah comunicou-nos que haveria uma van disponibilizada pela produção para nos conduzir para Bauru-SP. 

Contudo, já estávamos acostumados a usarmos o nosso ônibus próprio e mediante uma compensação financeira advinda do não uso da van, nós cobrimos a nossa despesa operacional de viagem. 

E tal acordo foi selado por conta de que Andreas, Bocato e Sarah precisavam voltar imediatamente a São Paulo por conta de compromissos pessoais e dessa forma, ficou acordado que o pessoal do Tutti-Frutti voltaria conosco no dia seguinte, portanto, a nossa predisposição para usarmos o nosso ônibus próprio, veio a calhar para acomodar os interesses pessoais diferentes, nessa questão.

Contudo, nem todos gostaram da ideia de voltar com o nosso carro velho, e isso gerou uma pitoresca história engraçada, que foi flagrada pelo nosso motorista, o "seu" Walter. 

Assim que chegamos a Bauru, fomos direto para o Sesc, com a finalidade de descarregar o nosso equipamento, no palco daquela instituição. Enquanto os roadies fizeram o duro trabalho braçal, sob o sol causticante e típico daquela cidade interiorana, eu fiquei na supervisão desse trabalho, como costumava fazer, na ausência de um road manager profissional que cumprisse tal função.

Ao travar conversa com os seguranças do Sesc, nós falamos sobre futebol e a conversa girou sobre o Noroeste, tradicional clube de Bauru e que há anos estava afastado dos holofotes da primeira divisão estadual, portanto vivia decadente, a perambular por divisões inferiores e longe da mídia. 

Mas enquanto eu conversava sobre o Noroeste, o nosso motorista que se encontrava dentro do ônibus ouviu uma conversa entre duas pessoas ligadas à comitiva do Tutti-Frutti, e uma delas comentou que lamentava muito ter que voltar para São Paulo "nesse ônibus horroroso"... de fato, a van contratada pela Sarah, era nova em folha, continha um ar condicionado glacial (e importante para se viajar pelo sempre muito quente interior paulista), detinha vídeo com qualidade e em comparação, o nosso carro era de fato desprovido de uma infraestrutura que não chegava nem perto disso. 

No entanto, o fato foi que o nosso motorista se melindrou com a conversa que ouvira e assim, ele alimentou o sentimento de rancor em relação à tal pessoa em específico e mesmo que esta não houvesse feito nada para ela, particularmente, ele passou a ranger os seus dentes, secretamente, quando lhe avistava. 

Segundo o "seu" Walter, essa pessoa estava registrada no seu "caderninho negro", por ter desprezado o "azulão", apelido que ele mesmo criara para o nosso bólido. Aliás, era engraçado ouvi-lo berrar a esmo durante as viagens, palavras de ordem que ele mesmo criava e que nos arrancava gargalhadas pelo caráter inusitado das circunstâncias. 

De forma completamente aleatória, ele berrava afirmações tais como: -"ninguém pode com o azulão" ou: -"sai da frente do azulão, seu FDP", ao referir-se aos outros motoristas que atrapalhavam-no etc.

E nesse caso em específico, ele realmente ficou ofendido pela colocação, muito mais que nós que éramos os donos do carro, de fato, pois a despeito da consideração ter sido desagradável, a pessoa em questão teve razão, no sentido de que nosso ônibus não continha nem 10 % do conforto da van que a trouxera da capital, até Bauru.

Nós nem ficamos chateados e rimos da história, mas o "seu" Walter tomou essa declaração como uma afronta pessoal e na viagem de volta, ele resmungava entre os dentes e direcionado para chamara a minha atenção, visto que geralmente fui eu quem sempre me sentava no banco mais perto dele nas viagens, ao dar conta que tal pessoa, "comia mortadela e arrotava peru, e que se fosse colocada de cabeça para baixo, não cairia nem uma moeda sequer de seus bolsos"...

Independente dessa animosidade que o "seu" Walter criou por sua conta própria, nós relevamos completamente essa colocação vinda de uma pessoa que era nossa amiga e nesse caso, a sua observação não nos soara ofensiva, diretamente, mas tratara-se de uma constatação, ainda que a maneira pela qual ela se expressara, não fora a mais adequada e nesse ponto, o nosso motorista teve razão de haver se aborrecido. Enfim, ao gostar ou não do nosso ônibus velho, seria em tal bólido que essa pessoa garantiria a sua volta a São Paulo...

Realizamos o soundcheck com tranquilidade nas dependências do ginásio de esportes do Sesc Bauru e enquanto eu passei aquele momento vespertino ali, claro que estabeleci a minha reflexão pessoal sobre a longa trajetória pessoal que eu fizera, desde que ali mesmo me apresentara, no então já bem longínquo mês de maio de 1980, quando ali me apresentei com o Língua de Trapo, que nessa ocasião dera os seus primeiros passos na carreira, a concorrer em um festival universitário local. 

Bem, claro que tudo isso foi uma conjectura que durou por alguns segundos apenas, pois eu estava ali com outros propósitos e não para uma empreender uma visita meramente afetiva e nostálgica. 

De volta ao hotel, o relaxamento foi bom após uma viagem cansativa e sob aquele intenso calor interiorano. Lembro-me do Andreas Kisser a surtar no saguão do estabelecimento, mas no bom sentido, quando dentro de uma conversa sobre futebol, ele ficou eufórico ao exaltar o seu clube do coração, aos berros, a lançar odes ao São Paulo FC, fanático torcedor que é daquele clube do Jardim Leonor. 

Reunimo-nos saguão do hotel para voltarmos ao Sesc Bauru, e dentro da van a descontração e camaradagem foi total.

Quando a van estacionou no pátio do Sesc, vimos que uma pequena multidão formada por caçadores de autógrafos estava a postos, mas sabíamos que haveria um contingente ali que norteara-se exclusivamente para assediar a pessoa do Andreas Kisser. Sim, apesar dele estar inserido nesse espetáculo na qualidade de nosso convidado especial, e não haver nenhuma menção de que tocar-se-ia músicas do Sepultura, a sua banda regular de carreira, o seu nome com forte apelo internacional no mundo do Heavy-Metal, despertara comoção entre os seus seguidores, naturalmente. E assim ocorreu...

Quando passamos pelo séquito de fãs separados pela ação dos seguranças, houve comoção total e vimos uma menina a passar mal de tão emocionada que ficara, sob uma crise nervosa intensificada pelo choro compulsivo, a motivar seu desmaio. 

Claro que a mocinha foi socorrida prontamente pelos seguranças do Sesc e nada de mais grave lhe aconteceu, mas foi chocante ver essa cena de histeria gerada pelo fator emocional. 

Bem, assim como no show que fizéramos com a sua participação em janeiro último, no Sesc Pompeia, eu nutri uma certa preocupação ao verificar a presença de tantos fãs do Sepultura presentes no auditório supostamente ali somente com o intuito de prestigiarem o Andreas, e que fatalmente frustrar-se-iam ao notar que não tocaríamos nenhuma música de sua banda. 

Mas durante o show, nada ocorreu que denotasse tal insatisfação de seu público em específico. Foi um show normal, um pouco reduzido, porém, para ser possível dar espaço ao Tutti-Frutti. Ao final, repetimos a dinâmica apresentada em janeiro e as duas bandas e seus respectivos convidados, subiram ao palco para um número final. Foi uma boa noitada para as duas bandas e seus convidados, com o público a responder muito bem.

Aconteceu no dia 15 de março de 2002, com público estimado em mil e quinhentas pessoas presentes, segundo informação do Sesc, relatada à produtora, Sarah Reichdan. 

Despedimo-nos de Sarah, Andreas e Bocato que voltaram para São Paulo, imediatamente após o término do espetáculo e nós fomos para o hotel a fim de repousarmos. Nem todos, no entanto, pois alguns foram aproveitar a noitada em Bauru, em uma casa noturna, local. 

Claro, eu preferi o silêncio monástico do quarto do hotel. No dia seguinte, bem cedo, fui ao refeitório para tomar o café da manhã e lá encontrei-me com Luiz Carlini e Rufino Lomba, que também buscaram o mesmo objetivo. Na mesa, Carlini recordou-se das muitas vezes em que hospedara-se naquele mesmo hotel em ocasiões anteriores, ao tocar com o Tutti-Frutti ou mesmo a acompanhar medalhões da música mainstream, como Guilherme Arantes e Erasmo Carlos. 

Foi um café recheado por histórias saborosas do Rock brasileiro setentista, certamente. Estava tudo tranquilo e então chegara a hora enfim: fomos para a estrada, com o objetivo de voltarmos para São Paulo. 

Sob o clássico calor extenuante do interior paulista, iniciamos a viagem de volta e o clima dentro do nosso ônibus, o dito, "azulão", foi o melhor possível. Somente o "seu" Walter guardara para si a animosidade adquirida com uma pessoa ligada à comitiva do Tutti-Frutti. Quando esta entrou no ônibus, ele rapidamente procurou-me visualmente, e sinalizou com uma piscada de olhos com ar de deboche, para fazer-me relembrar de sua bronca e eu ri, internamente, é claro...

Paramos exatamente nesse posto aí da foto acima, da Rede Rodoserv, na estrada Castelo Branco, cerca de cinquenta Km antes de Sorocaba-SP, no sentido: São Paulo, Capital

Em uma parada no meio do caminho para nos refrescarmos a bordo de um desses super postos luxuosos e caríssimos de beira de estrada, conseguimos amenizar um pouco do calor tórrido que atormentava-nos. A tal pessoa que criticara o nosso carro velho, estava esbaforida e teve razão de lamentar não ter voltado para São Paulo naquela van com ar condicionado glacial que a levara para Bauru, na noite anterior. 

Paramos em um outro posto adiante, para efetuarmos uma outra sessão de refresco geral, quando um pequeno fenômeno natural aconteceu entre nós e foi registrado em vídeo pelo Rodrigo. Um mini tornado levantou muita poeira do chão e ficou a nos circundar de uma forma engraçada.

O aspecto triste de se assistir esse vídeo se dá pelo fato de que dois membros do Tutti-Frutti que ali estavam a rir e brincar conosco, já não estão mais entre nós. Os saudosos: Rufino Lomba e o tecladista, Ronaldo "Rona" Bebeuz. No entanto, mesmo com essa constatação triste, um dia essas imagens irão para o YouTube. 

Deixamos a comitiva do Tutti-Frutti na porta da residência do Carlini, na Vila Pompeia, e de lá, deixamos o nosso backline na minha residência na Aclimação, para a seguir, levarmos o ônibus para uma oficina de tapeçaria automotiva. Já estava programado que deixaríamos o ônibus nessa oficina após a volta de Bauru e que por alguns dias ele permaneceria ali para receber várias benfeitorias em seu acabamento interno. E assim procedeu-se. 

Teríamos um pequeno hiato com shows doravante e o nosso próximo compromisso seria apenas ao início de abril, no Sesc Pinheiros, no bairro homônimo, de São Paulo.

Após o show de Bauru-SP, e com o ônibus na oficina de tapeçaria para adquirir melhorias estéticas na aparência dos seus bancos, nós estivemos em meio a um hiato de shows por duas semanas, aproximadamente. Mas os compromissos em outros campos prosseguiam e nesses termos, tivemos agendado um programa de rádio e um de TV, para nos apresentarmos.

Sobre o programa radiofônico, tratou-se de um gentil convite que partiu do guitarrista superb, Luiz Carlini, que o apresentava em dupla com o famoso ex-jogador de futebol e então comentarista esportivo, Walter Casagrande Junior, o popular, "Casão". 

Tal programa que essa dupla apresentava na emissora Transamérica FM de São Paulo, uma estação de primeira grandeza em termos de popularidade e pertencente a uma rede de alcance nacional, foi um misto de programa esportivo e cultural, nos moldes do velho, "Balancê" dos anos oitenta (falo muito sobre o "Balancê" de Fausto Silva, o hoje popular, "Faustão", nos capítulos sobre o Língua de Trapo e A Chave do Sol, principalmente), mas este era mais centrado no campo cultural e mais detidamente na música. 

Ambos Rockers por natureza, privilegiavam a boa música e os convidados geralmente eram egressos do mundo do Rock. Portanto, além da exposição que se projetou ótima pela audiência massiva, foi um prazer interagirmos entre amigos.


E assim fomos ao estúdio da emissora, localizado no bairro do Alto da Lapa, na zona oeste de São Paulo, sob uma noite muito agradável, com o objetivo em tocarmos ao vivo um set semi acústico mediante a execução de duas canções, por conta de que resolvêramos que eu usaria o baixo, para dar um peso maior na apresentação, a reforçar os violões de Hid & Schevano. 

Nos bastidores, tudo foi maravilhoso, com Carlini e Casagrande mega simpáticos conosco, ao nos deixar absolutamente a vontade. Interagimos com conversa animada e brincadeiras, ao dar muitas risadas, ainda no estacionamento da rádio e uma vez lá dentro, enquanto aguardávamos o chamado para adentrarmos o estúdio, ficamos um bom tempo de espera em um "lounge" a observar a movimentação dos outros convidados e funcionários da emissora. 

Figuras folclóricas estavam ali também para serem entrevistadas. Por exemplo, o ator, Alexandre Frota, com o qual interagimos um ano antes em um programa de TV da obscura, "Rede Vida" e cuja história está contada em detalhes em capítulo anterior, nem esboçou lembrar-se de nós, ali naquele ambiente. 

A badalação estava grande não apenas pela sua presença, mas também pela de outros artistas com visibilidade mainstream e nós fomos os representantes outsiders do underground ali, infelizmente obscurecidos pelo glamour alheio. 

Outra figura que chamou a atenção dos cinegrafistas e fotógrafos presentes, foi o vocalista da banda punk, Os Raimundos. Estava presente também a persona de Paulo Miklos, famoso componente dos Titãs e o rapper, "Sabotage". Miklos e Sabotage estavam em dupla porque divulgavam um filme no qual haviam atuado como atores. 

Fomos chamados e acertados os detalhes da mixagem bem simples que ali foi estabelecida, para a nossa apresentação musical, entramos no ar. Tocamos ao vivo: "Céu Elétrico", com dois violões, flauta, baixo, percussão e as vozes, é claro. 

Tivemos um segundo número e escolhemos executar uma música clássica dos primórdios da banda e que eu particularmente, gosto muito, chamada: "Transcendental". Tal canção, além de ser muito bonita, musicalmente, tem de fato, uma vibração muito a ver com os anos setenta e coadunava-se perfeitamente com os ideais "Chronophágicos" da nossa formação. 

Eu adorava tocá-la ao vivo e nessa versão semi acústica que fazíamos, o final emendava-se com o refrão de: "Listen to the Music", do "The Dobbie Brothers", a se estabelecer uma menção das mais agradáveis que criamos e claro, tendia a emocionar os antenados que estivessem ao nosso alcance. 

E foi o que aconteceu com Paulo Miklos que assistia a nossa entrevista, mas empolgou-se e juntou-se subitamente ao Rodrigo para cantar conosco tal refrão. 

Devo registrar também que o som do meu baixo, a usar apenas uma de minhas caixas Ampeg, revela-se surpreendente nessa tosca filmagem, por incrível que pareça. A fazer uso do Fender Precision, mais comedido do que seu som natural pelas circunstâncias, ele apresentou nessa ocasião, um som mais abafado e sensacional. Sou fã incondicional de seu famoso estalo médio-agudo, mas ao ter usado dessa forma, também ficou muito bonito.  

Tenho uma cópia da filmagem dessa nossa participação na referida emissora, que foi gravada através da velha câmera mini VHS na época, mas já foi digitalizada e a qualquer momento será postada no YouTube. Aconteceu no dia 25 de março de 2002. 

E sobre o programa de TV que também tínhamos agendado, tal contato fora nos fornecido pelo músico & produtor, Marco Carvalhanas, que não estava mais a trabalhar conosco, diretamente, como o fizera ao exercer a função de roadie manager na última etapa da turnê, em 2001, mas estava sempre a nos auxiliar de uma maneira ou de outra.

O excelente comunicador, Atílio Bari, um raro caso de apresentador de TV que se mostrava culto, além do fato de ser ser muito generoso ao abrir espaço para artistas outsiders como nós... 
 
Tal programa, chamava-se: "Em Cartaz", e era exibido no obscuro canal comunitário de São Paulo. Infelizmente eu diria, pois a sua proposta era extremamente salutar e dessa forma, deveria obter um espaço melhor na TV, ao invés de ser veiculado em meio a um canal que continha a  sua audiência no patamar ínfimo, sob quase traço zero. 

Conduzido por dois apresentadores, tratava-se de um misto de Talk-Show com revista cultural muito dinâmica e antenada, disposto a divulgar tudo de bom que São Paulo oferecia em termos de arte, cultura e espetáculos. Geralmente apresentava uma atração musical por dia, que era entrevistada e ocupava um generoso espaço para tocar várias músicas ao vivo e os apresentadores entremeavam o foco no artista musical, com dicas sobre lançamentos culturais os mais diversos e também de espetáculos em cartaz pela cidade.

                    Os apresentadores eram: Atílio Bari e Uka.  

Atílio era (é) ator profissional e Uka, se tratava de uma simpática menina de origem oriental, estudante de cinema na época. Super simpáticos, brincalhões e cultos, eles deixaram-nos muito a vontade, e foram pertinentes nas colocações e perguntas, quando ficou aquele sentimento de que foi uma pena que um programa tão bom estivesse vinculado em um canal que não era assistido por quase ninguém. 

O estúdio onde fomos entrevistados foi minúsculo em sua dimensão física e claro que nossa apresentação ao vivo foi na base do "acústico", com Rodrigo e Marcello a tocarem violões e eu apenas no baixo, mas a tocar bem baixo (e peço perdão pelo trocadilho infame), para não destoar da dinâmica, logicamente. 

Marcello tocou flauta também e o Junior fez uma percussão pontual. Por incrível que pareça, o som do meu baixo ficou com um timbre espetacular e não muito usual para o Fender Precision, pois ficou abafado, por eu ter mudado o registro que eu sempre usava (uso) para deixá-lo mais agressivo, com aquele "estalo" típico dele, e assim, abafado ficou mais "doce", mas muito bonito ao meu ver. 

Lembrou-me o som do baixista britânico, John Ford, nos discos do "Strawbs", de certa forma. Essa participação da Patrulha do Espaço em tal programa foi digitalizada e lançada no YouTube em 2011, com o apoio que tive do Site/Blog Orra Meu. Na época, o Emmanuel, dono do site, não conseguiu postá-lo em versão integral, por isso foi dividido em três partes.

Na parte 1, tocamos "Céu Elétrico".

Programa Em Cartaz - TV Comunitária de São Paulo
26 de março de 2002 

Eis o link para assistir a parte 1 no YouTube:
https://www.youtube.com/watch?v=-l3nFMmaD8I

Na parte 2, tocamos, "Transcendental", com direito a uma incursão de "Listen to the Music", do " The Doobie Brothers"

Programa "Em Cartaz" - TV Comunitária de São Paulo
26 de março de 2002

Eis o Link para assistir no YouTube:
https://www.youtube.com/watch?v=lGpJq4Eo3C0

Na parte 3, tocamos "Retomada"

Programa "Em Cartaz" - TV Comunitária de São Paulo
26 de março de 2002

Eis o Link para assistir no YouTube:
https://www.youtube.com/watch?v=bcPrNOsCUNE


A se registrar também, que eu tive uma surpresa lá nesse estúdio, pois jamais imaginaria que um vizinho meu seria o sonoplasta do programa em questão. 

Sobre esse rapaz, eu sabia que ele era músico e que tocava muitos instrumentos de cordas, pela noite paulistana, geralmente em combos de música brasileira, da gafieira ao samba tradicional, a passar pelo chorinho e outras manifestações bem brasileiras. 

Ele era casado com a Luana Escobar, neta da atriz, Ruth Escobar, que morava na casa em frente à minha, do outro lado da calçada e que eu conhecia desde que mudei-me para tal residência, em 1991. 

A respeito do rapaz eu o conhecia muito além dos cumprimentos no cotidiano e apenas sabia que ele era músico, ao vê-lo a sair quase toda noite a carregar estojos de instrumentos e que tocava ritmos brasileiros pela noite. 

Todavia, ao chegar ao estúdio da TV Comunitária, deparei-me com ele, que então contou-me que trabalhava como sonoplasta do programa. O seu nome correto eu nunca soube, mas ele era conhecido pelo apelido de: "Chambinho" e durante o programa, ao se assistir o vídeo, se ouve o apresentador Atílio a chamá-lo por tal apelido, para que ele efetuasse alguma intervenção no áudio. 

Bem, foi assim que nos apresentamos no programa: "Em Cartaz", da TV Comunitária de São Paulo, no dia 26 de março de 2002.

A produtora, Sarah Reichdan, estava empenhada a todo vapor em seu intuito para proporcionar oportunidades para a Patrulha do Espaço e claro que isso foi louvável e muito animador. Essa parceria se colocara de vento em popa, desde o final de 1999, eu diria, mas esquentara de vez ao final de 2001 em diante, quando muito de seus esforços lograram êxito, principalmente em termos de produções dentro do universo do Sesc. Tudo foi maravilhoso nesse sentido, mas houve um senão e esta ressalva não foi necessariamente culpa dela.
Dos muitos shows da Patrulha do Espaço ocorridos em unidades do Sesc que ela fechara e produzira, nenhum, infelizmente, foi 100 % confortável para nós, artística ou tecnicamente a falar, dadas as circunstâncias em que se constituíram. Explico: o fato, foi que ela estava a nos encaixar em projetos pelos quais a banda não apresentava-se sozinha ou pior ainda, a fugir das suas características totalmente, ao realizar concertos semi acústicos, ou seja, a sair de sua característica natural, que sempre foi a da extrema eletricidade de uma banda de Rock clássica, que éramos.

Então, cabem algumas reflexões sobre essa linha de atuação da Sarah como produtora: 

1) o seu argumento de que muitas vezes ao se observarem certas condições desfavoráveis, estas seriam válidas para se pleitear a seguir situações melhores, fora um fato e baseado nisso, principalmente, foi que aceitamos fazermos shows sob condições desconfortáveis. 

2) Já elogiei efusivamente a atuação do Sesc no âmbito da produção cultural deste país em capítulo anterior e não acho necessário cansar o leitor com uma repetição, mas realço a minha crítica sob intenção construtiva, de que o maneirismo em que os seus produtores se baseavam para montar a sua programação, na qual, só agendavam mediante a existência de "projetos" e invariavelmente apresentassem como condição sine qua non a "obrigatoriedade" de se providenciar a presença de um ou mais convidados para participarem do evento, sempre foi muito equivocada. 

De antemão, com essa predisposição, desqualificavam o artista em si, ao se desprestigiar o seu trabalho e sua história, por conseguinte, pois se a sua simples presença não fornecia segurança à cúpula de cada unidade, que isso fosse o suficiente para atrair público, naturalmente estiveram a depor contra o artista, no campo subliminar.

A produtora, Sarah Reichdan em foto mais atual, já como Road Manager da artista baiana, Daniela Mercury
 
Observadas essas questões, a verdade foi que a produtora, Sarah, estava a lograr êxito em nos inserir no universo do Sesc, mas sempre sob condições não favoráveis para nós, sob o ponto de vista artístico e técnico. Sabedores disso, mas cientes que tratar-se-ia de uma estratégia de inserção da parte dela, portanto sujeita a pequenos sacrifícios, aceitamos fazer um show acústico na unidade do Sesc Pinheiros, no bairro homônimo, da zona oeste de São Paulo. 

Claro que seria desconfortável para nós, fazermos shows "acústicos", por sermos uma banda essencialmente elétrica e historicamente dotada de uma volúpia Rocker, que honrava as mais autênticas raízes em que ela fundamentara-se, desde 1977, quando de sua fundação. 

Mas por outro lado, apesar de ser desconfortável e aborrecido para nós, não haveria de ser uma tarefa impossível, pois a versatilidade dos nossos dois multi instrumentistas, certamente que viabilizava uma apresentação nesses moldes. 

E convenhamos, se havíamos sobrevivido a uma experiência de um show ultra acústico em novembro de 2001 (Projeto "Luz de Emergência", no Sesc Pompeia), no qual a condição sonora de se apresentar sem o reforço de um PA fora extremamente periclitante para a nossa banda, por dedução então, esse show no Sesc Pinheiros seria bem mais ameno nesse sentido. 

Isso por que não haveriam "convidados" (milagre o pessoal do Sesc não ter exigido isso), e melhor ainda, sim, teríamos um PA à nossa disposição!

Marcado para o dia 2 de abril de 2002, nós usamos as duas semanas que tivemos sem shows, e sem o uso do nosso ônibus, para prepararmos um set com canções adaptadas para o formato semi acústico. 

Claro que não seria 100 % acústico, pois usaríamos a cozinha tradicional formada por baixo e bateria. E também não furtar-nos-íamos ao uso de alguns teclados, com parcimônia, naturalmente, a se evitar a volúpia do Mini Moog e outros, pelos quais a eletricidade e a estridência seriam muito proeminentes. 

Portanto, o aspecto acústico mesmo seria delineado pela ausência das guitarras, substituídas por violões e claro, nós tentaríamos aproveitar melhor o recurso da flauta, que o Marcello executava bem. 

Diante disso, empreendemos pequenas adaptações para músicas normais do nosso repertório habitual, e a aproveitar, resgatamos algumas canções clássicas do repertório antigo da banda, caso de "Transcendental" (música aliás, que gosto bastante e adorava tocar ao vivo), além de outras canções com característica de "lado B" da época do Arnaldo Baptista, como: "Cowboy", "Pé na Jaca" e "Trem", que não costumávamos tocar em meio ao set elétrico normal. E o dia do show chegou!

Eu sei que passo a imagem para alguns que sou muito exigente com a mídia, mas como não deixar de observar esse texto escrito pelo estagiário da revista, "Veja", na ocasião? Como se não bastasse ignorar os trinta e cinco de carreira da banda naquela altura dos acontecimentos, ao imputar-nos importância apenas por termos "acompanhado" Arnaldo Baptista", o fruto do descaso absoluto em que bandas relegadas ao limbo do underground, sofrem costumeiramente neste país, ainda teve agravantes. Há a presença de dois erros crassos na consideração elaborada por parte desse então aspirante a jornalista, desinformado. Primeiro ponto: a Patrulha do Espaço sempre foi uma banda e não mera acompanhante de Arnaldo Baptista. Ele era componente da banda e se nos dois primeiros álbuns o seu nome foi colocado em destaque, foi mera opção dos marqueteiros da gravadora. Segundo, ele não fez parte da banda nos anos 1980. Arnaldo foi componente da banda entre 1977 e 1978, sob um período com apenas nove meses de duração. É duro exercer jornalismo na base do "chute" e/ou movido a preguiça, isso quando não entra o o fator do desdém motivado por idiossincrasias típicas que costumavam ocorrer nesse meio...

A unidade do Sesc Pinheiros nessa época, era bem tímida. Estavam a construir ainda a sede gigantesca dessa unidade, que hoje em dia é muito bonita e promove dúzias de atividades educacionais, artísticas e culturais, mas nessa ocasião de nosso show, tratava-se de um outrora sobrado residencial, devidamente adaptado. 

Por ficar localizado em plena Avenida Rebouças, claro que era uma tremenda casa, nos moldes dos casarões residenciais que tornaram-se comerciais dos anos setenta em diante, mas bem modesta em comparação as instalações que a unidade desse bairro ostenta hoje em dia, sem dúvida.  

Bem, a despeito disso, fomos com toda boa vontade fazer o melhor possível, dentro da perspectiva que nos apresentara, ou seja, não houve um auditório adequado com infraestrutura para shows musicais, mas sim um espaço adaptado, aonde outrora deve ter sido uma ampla sala de estar, residencial.

Claro, mesmo assim, foi no padrão do Sesc e com toda a estrutura mínima de eletricidade, assim a apresentar um equipamento terceirizado de PA e de iluminação, que esteve a postos para usarmos. 

Foi tudo minimalista, claro, calculado sob parâmetros de engenharia acústica para o local. Fomos bem recebidos pelos funcionários do Sesc e pelos técnicos terceirizados, mas mesmo assim, tivemos um princípio de constrangimento, quando os primeiros trabalhos de ajustes de som, começaram.  

Assim que o Junior montou a bateria e fez uma checagem básica, a tocar (isso é praxe de todo o baterista, tocar um pouco para simular situações de show, a fim de acertar os ajustes das peças), duas senhoras que trabalhavam em um gabinete em anexo, como escriturarias, surgiram exaltadas no salão a reclamarem que o "barulho" se mostrara como algo inadmissível e que estavam a trabalhar sob incômodo graças à tal ocorrência. 

Ora, aquilo fora apenas o início do trabalho de soundcheck e a bateria ainda nem havia sido microfonada. Se o som natural do instrumento soara em demasia para elas, imagine então quando o técnico iniciasse o ritual de captura de cada peça e o teste de equalização geral, começasse. 

Com tal manifestação, de início já estava caracterizado que aquela unidade da instituição não estava acostumada a promover shows em suas dependências. No máximo deviam acontecer ali apresentações intimistas com voz & violão, em termos musicais e o espaço, naturalmente devia ser mais usado para palestras, saraus literários ou atividades infantis com contadores de histórias para entreter os pequenos etc.  

Portanto, aquela situação foi um tanto quanto surreal, pois o usual ali seria o silêncio pelo que deduzimos, a caracterizar o ambiente de trabalho de um escritório convencional e assim, apenas fora do horário comercial, é que as atividades culturais deviam acontecer.  

E como não se costumava fazer apresentações que necessitassem de um PA, por mínimo que fosse, os seus funcionários burocráticos não estavam habituados a conviver com tardes de soundcheck, uma atividade profissional natural em qualquer casa de espetáculos e/ou teatros.

Até aí tudo bem, a Sarah Reichdan intercedeu a mediar com explicações básicas e as pessoas em questão não eram exatamente "brucutus" ignorantes que não detinham discernimento para enfrentar conflitos. 

De comum acordo, combinou-se então que o trabalho mais pesado de soundcheck ficasse para depois das 18 horas, quando o expediente burocrático da unidade encerrava-se, e nós concordamos em cooperar, mesmo ao ser desconfortável para nós deixarmos essa atividade para mais tarde e assim a nos extrair minutos preciosos de nossos momentos pré-show, momento em que é sempre importante estar relaxado para se cumprir um bom espetáculo.

Enfim, diante de outros problemas que enfrentamos em circunstâncias muito mais adversas em outras apresentações ocorridas em outros lugares, isso não foi nada. 

O som ficou bem equalizado e claro, ficara patente a necessidade de empreendermos uma dinâmica "espartana", pois qualquer acento mais forte do baixo e bateria, causaria um verdadeiro tsunami sonoro sobre os violões, flauta e vozes.  

A solução foi tocarmos de uma forma muito comedida, a se entrar no âmbito dos violões e vozes como parâmetro e se evitar assim os tradicionais voos que a cozinha dessa nave fazia nas apresentações elétricas, corriqueiras. E assim foi a nossa predisposição no decorrer do show...

Um bom público compareceu (para os padrões daquele tímido salão, é bom ressalvar), e quem apareceu, viu um show diferente, não só por essa docilidade sonora, não usual para a nossa banda, mas principalmente pelo set list a conter muitas surpresas que os fãs mais ardorosos e conhecedores da nossa história, certamente se regozijaram em ouvir.

De volta ao que tenho comentado nos últimos capítulos, louvo muito a atuação da produtora, Sarah Reichdan, que nesse período, muito nos ajudou, principalmente ao produzir shows nossos em várias unidades do Sesc, que era (é), um dos melhores, senão o melhor circuito de shows deste país. 

Todavia, fora mais um show não exatamente confortável, a fugir das nossas melhores características. Fazer shows acústicos ou semi-acústicos, ou a ter que abrigar convidados, não foi de todo mal, mas o que ambicionávamos mesmo, seria engatar uma série de shows nas unidades do Sesc, sob condições normais, ou seja, ao exercermos show de Rock com eletricidade e volúpia, que era o nosso real modo de ser. 

Mas isso nunca ocorreu, lamentavelmente, da parte dela, Sarah. Isso por que em breve, faríamos um show na unidade do Sesc Ipiranga, no bairro homônimo da zona sudeste de São Paulo, sob tais condições ideais ao nosso estilo e predileção, mas o produtor desse show no caso, foi o Paulo Barnabé, baterista e irmão do compositor/pianista, Arrigo Barnabé. Enfim, quatorze anos depois (2016), agradeço muito à Sarah, sem dúvida alguma, embora as suas produções nunca tenham caminhado conosco em igualdade de sintonia, nesse aspecto dela enxergar apenas saídas alternativas a visar semear algo para um futuro que nunca chegou. 

No dia seguinte ao nosso show realizado no Sesc Pinheiros, tivemos um compromisso no interior de São Paulo. Foi uma volta à casa noturna, "My Way", da cidade de Americana-SP. 

Falei sobre a nossa primeira passagem por essa cidade e casa em específico, com detalhes, em capítulos anteriores. Não vou cansar o leitor com uma eventual repetição nesses termos. O que posso acrescentar, é que desta feita, tal show não serviria como apoio estratégico para uma turnê interiorana como houvera ocorrido em dezembro de 2001, mas tratou-se de uma oportunidade sazonal. 

Claro, naquela casa noturna, o dividendo artístico a ser conquistado seria nulo. Para ser muito claro, ali só valeria a pena se tocar pelo cachê e nada mais. E o único consolo extra-monetário nessa determinação, foi o de que mesmo em condições infrutíferas, sempre apareciam fãs reais da banda. E neste caso, foram poucos, mas certamente que a emoção deles em estarem ali, nos contagiou e estimulou muito.

E para encerrar o mês de abril de 2002, nos apresentamos mais uma vez na casa noturna: "Volkana", em São Bernardo do Campo-SP, no ABC Paulista.

Desta feita, duas bandas de abertura estiveram presentes: "O Vale das Borboletas" e o "General Pig". Não tenho grandes lembranças dessas bandas, a não ser que "O Vale das Borboletas" era bem mais leve e com esse nome, bem interessado em sonoridades 1960 & 1970, e que o "General Pig" era mais híbrido e pesado, sem grande comprometimento retrô, e pelo contrário, a soar mais "modernoso".

Sobre as datas e público presente em cada show citado acima:

Sesc Pinheiros - São Paulo-SP - 2 de abril de 2002: cinquenta pessoas. 

My Way - Americana-SP - 3 de abril de 2002 - duzentas pessoas.

Volkana - São Bernardo do Campo-SP - 26 de abril de 2002 - cem pessoas.

Uma aventura e tanto aconteceu logo no início de maio, ao gerar uma história bizarra, e que de certa forma, foi triste para a banda. Mas antes de comentar sobre tal aventura, eu abrirei parêntese para falar da inclusão digital que a banda adquiriu, graças aos esforços solidários e espontâneos de um adolescente que abordara-nos ainda em 2001.

Na primeira foto, o jovem Marcelo Martins, que foi nosso webdesigner entre 2001 e 2002. Na segunda foto, ao vivo no Centro Cultural São Paulo, em janeiro de 2001, com Hélcio Aguirra a tocar como nosso convidado em três músicas. Click, acervo e cortesia de Salvatore D'Angelo (foto 2)

Ao retroagir um pouco, ainda em 2001, um garoto adolescente nos abordou certa vez com uma filipeta em mãos, que ele mesmo produzira, a anunciar algo a respeito de nossa banda, mas sem o nosso conhecimento prévio. 

Relutante e tímido pela pouca idade que ostentava, ele talvez temesse por uma reação intempestiva de nossa parte, principalmente da parte do Rolando Castello Junior, o membro fundador da banda. Contudo, o seu propósito foi dos mais nobres e assim que ele nos expôs a sua pretensão, imediatamente entrou para aquele rol seleto de apoiadores da banda. 

O seu nome era Marcelo Dorota Oliveira Martins e a sua proposta foi a de gerenciar como web designer um site oficial da nossa banda, fator que ainda não tínhamos à nossa disposição, apesar da era digital já estar consolidada na entrada dos anos 2000.

O que usávamos desde a volta de 1999 nesses termos virtuais, foi algo tímido, mediante ações caseiras perpetradas por Rodrigo e Marcello, em seus computadores familiares e ainda sem grande desenvoltura no campo da informática/computação/internet. 

Enfim, claro que gostamos da oferta desse rapaz imberbe e mesmo ao se mostrar muito novo e a ter limitações típicas dessa pouca idade, tais como obrigações escolares e o controle familiar de seus atos, nós sabíamos que a sua boa vontade para nos auxiliar seria total e dessa maneira, ele faria o máximo ao seu alcance nesse sentido. 

De fato, apesar das limitações expostas, ele empenhou-se e o site que construiu, na base da gratuidade máxima, ficou para lá de digno para uma banda com o volume de notícias que gerávamos e sobretudo, pela história contada até então, com várias formações históricas, discos, fotos, peças de portfólio, dados arrolados etc.

       Marcelo Dorota Oliveira Martins, em foto bem mais atual

Marcelo Dorota Oliveira Martins, deu o seu máximo, foi de uma ajuda inigualável naquele momento, e graças aos seus esforços, a banda pode ter um site à altura de sua grandeza. 

Claro, algum tempo depois a vida tomou outro curso e por ter que focar em seus estudos, o site culminou em passar para as mãos de um webdesigner mais experiente, no caso, na pessoa de Luiz Carlos Cichetto, o popular "Barata", um famoso poeta Rocker e ativista cultural dos mais ativos de São Paulo e do Brasil, aliás até hoje, e este, a se revelar notável ao promover várias modernizações em diversas reformas que o site já teve ao longo desses anos todos. 

E fica aqui registrado o meu agradecimento formal ao então garoto, Marcelo Martins, hoje um adulto e que muito nos ajudou ali nos idos de 2001, 2002 e 2003.

Em outra outra ação muito bem-vinda da produtora, Sarah Reichdan, tivemos uma temporada em uma casa noturna de São Paulo, mas sob uma condição estranha. 

Temporada denotaria uma continuidade de shows em progressão diária, normalmente, mas a proposta foi outra nesse caso. Sarah havia fechado cinco shows a serem cumpridos no mês de maio, toda quinta-feira, em uma casa noturna chamada: "Venice", localizada no boêmio bairro da Vila Madalena, na zona oeste de São Paulo. 

Mais pareceu a sistemática de um "Stand Up Comedy", que trabalha com esse tipo de agendamento em casas noturnas, mas para artistas da música não fora uma prática muito usual. Ficamos contentes com o agendamento, é claro. Cinco shows no mesmo local, ainda que espaçados e diluídos em trinta dias, quase caracterizara uma mini temporada, mas ao mesmo tempo, ficamos bem desconfiados sobre tal dinâmica pouco usual.

Isso porque a tradição nesse tipo de dinâmica para uma banda de Rock, não era usual só para a nossa percepção, mas tivemos dúvidas se o público entenderia tal predisposição em ver a banda bater ponto em uma casa noturna, de forma fixa, sob um específico dia da semana, por cinco semanas consecutivas. 

Aí, entraria aquela estratégia que era comum nas décadas de sessenta e setenta e que não existia mais, apesar do Rolando Castello Junior insistir nela, que baseava-se na repetição e na crescente audiência gerada pela formação de opinião. Naquelas décadas, o público tendia a ver o mesmo show várias vezes e tal movimentação punha-se a agregar progressivamente novos curiosos, motivados pela propaganda espontânea gerada pela formação de opinião.

O Junior ainda acreditava nessa tática, mas eu não, e realmente preocupou-me essa temporada sob gotas homeopáticas que a Sarah fechou para nós. É bem verdade que havia uma atenuante nessa história, pois a Sarah espertamente fechou os cinco shows com um cachê fixo, e sob um valor digno para os padrões da época. 

Isso se constituiu em um bálsamo de tranquilidade a priori, mas nós sabíamos que se nos primeiros shows não houvesse um público razoável como quórum, nós teríamos problemas, pois contrato assinado não era garantia de que a casa cumpriria a sua palavra em uma eventual situação adversa, como é bem comum em casas noturnas, lamentavelmente. 

Então nós fizemos a nossa parte e trabalhamos em prol da divulgação da temporada, a enfatizar a continuidade de shows, a se marcar ponto toda quinta-feira etc. e tal.

No dia do primeiro show, nós montamos o nosso equipamento e fizemos o soundcheck no período vespertino, quando o técnico de som da casa, falou-nos educadamente, porém de forma enfática, que nós teríamos que tocar sob um volume muito baixo, pois a casa estava com problemas com a vizinhança e a ser vigiada e ameaçada pelos fiscais do "Psiu", um órgão ligado à prefeitura de São Paulo e que controla o nível de ruído nas casas noturnas da cidade. Isso era / é comum na noite paulistana. Não há casa noturna que não seja abordada sistematicamente pela fiscalização do "Psiu". 

Todavia, nos causou espécie tal afirmação, pois aquela casa noturna em específico, era vizinha de um sem número de outros estabelecimentos noturnos, aliás, uma marca registrada daquele bairro que tem fama boêmia justamente por abrigar uma quantidade absurda de bares e casas de espetáculos, e muitos, com música ao vivo. 

Outro fator a desabonar a alegação estranha do rapaz, foi a de que na noite anterior, houveram se apresentado duas bandas no mesmo espaço. Uma era declaradamente orientada pela estética do Heavy-Metal, e a outra, Punk-Rock. Ora, teriam esses artistas tocado baixo, diante da obviedade de professarem estilos absurdamente barulhentos por natureza intrínseca? 

Conhece alguma banda de Heavy Metal ou Punk-Rock que faça dinâmica como um quesito normal da sua performance, amigo leitor? Bem, foram obviamente duas contradições ali expressas e o sinal amarelo acendeu-se imediatamente para nós!

Tudo bem que a foto promocional da banda se mostrou inadequada para a tipologia da diagramação desse jornal acima (Jornal Agora). Mas daí a descrever as personas de Rodrigo e Marcello como "integrantes do conjunto", no mínimo denotou a preguiça acentuada do jornalista que preparou a nota. E a manchete em si... para que dizer "Rock do passado?" Foi nítida a vontade de nos estigmatizar com desdém. Bem, melhor ter a divulgação, mesmo com falhas assim, digamos, desrespeitosas, que nada, como se diz por aí.

Já a antever que aquela situação não acabaria bem, ficamos bastante desconfiados da continuidade do projeto em si, pois se antes mesmo da realização do primeiro espetáculo da temporada, o técnico de som da casa já nos advertira com essa conversa sobre o volume a ser adotado na hora do show, foi de fato um sinal de mau agouro. 

A noite chegou e nós fomos tocar. O público presente se mostrou muito tímido, com cerca de vinte pessoas, mas para nós, em termos de ânimo, tocar em um lugar vazio ou no palco do Festival de Woodstock de 1969, não mudava em nada a nossa determinação pela entrega artística absoluta. 

Fomos determinados a fazer nosso set tradicional e com a performance habitual, sem reservas, a despeito das observações vespertinas feitas pelo técnico de som da casa. 

Quem estava ali era fã da banda e estava a apreciar a nossa tradicional entrada com a música: "Não Tenho Medo", quando o técnico sinalizou-nos insistentemente para abaixarmos o volume. Se há algo que irrita um artista em pleno momento de performance, é alguém a insistir em querer tirá-lo das nuvens onde está, quando exerce a sua interpretação no palco, para trazê-lo abruptamente para o solo, mediante a quebra total da magia da ribalta. 

Ninguém tolera essa falta de sensibilidade da parte de alguém que não percebe que ali, naquele momento, o artista está quase que sob um transe "shamânico", fora da realidade telúrica e isso vale para atores, músicos, bailarinos ou poetas em ato de declamação. 

Ali em cima é uma outra realidade imersa em magia e assim, voltar para o chão é uma quebra energética visceralmente ruim, e que quase sempre causa um dano irreversível ao artista, pois perdida essa sinergia mágica, o espetáculo se mostra como praticamente arruinado, mesmo que ele o conduza até ao seu final e a grande massa não perceba o desconforto enorme, ali causado.

Sinalizamos que abaixaríamos os amplificadores e para que ele ficasse calmo, quando fomos para a terceira música, visto que a segunda canção, "Festa do Rock", era emendada na primeira, e não nos permitia para interromper ao bel-prazer do elemento. 

Mesmo ao segurar na mão e abaixar bastante os aparelhos, assim que começamos a tocar "Ser", o sujeito não notou a nítida amenizada que estabelecêramos e ficou ainda mais contrariado, como se ao contrário, nós houvéssemos aumentado o ímpeto, ou seja, ele estava transtornado e mesmo que desligássemos os amplificadores, ainda pediria para abaixar mais, ao caracterizar que estava predisposto a nos incomodar durante a noite inteira.

Ouça a canção, "Ser", enquanto lê, amigo leitor, e medite sobre a possibilidade dessa música ser executada com o volume de uma canção ao estilo "Bossa Nova", com voz & violão, como o rapaz em questão talvez achasse o ideal para ser executado na sua casa noturna...

"Ser", como todo fã da Patrulha do Espaço bem sabe, é um Hard-Rock vigoroso e tocá-lo sob um patamar com um volume baixo daqueles, foi uma tortura para nós e o sujeito ainda se manteve a desejar menos volume de nossa parte. 

Prosseguimos e ao tentarmos empreender ainda mais dinâmica na música seguinte, "O Pote de Pokst", abaixamos o volume dessa canção para um patamar hiper desconfortável para a banda, ao ponto do Junior ter ficado muito irritado ao ter que tocar a sua bateria sob um patamar insuportável, para comprometer completamente a sua performance, sem pegada alguma. 

Diante de tal pastiche sonoro que estávamos sendo obrigados a exercer, a banda esteve muito prejudicada e mesmo assim, o rapaz mostrara-se indignado, a gesticular de forma a mostrar que não se conformava e que possivelmente a considerar que nós não o "obedecíamos" por rebeldia ou coisa que o valha. 

No entanto, a realidade foi que estávamos a tentar atender a orientação da casa, embora o patamar sonoro em que encontrávamo-nos, fosse muito abaixo do padrão de um ensaio, portanto, aquilo estava a arruinar a nossa performance, ao ultrapassar em muito o nosso limite.

Extremamente irritado com o acinte à nós impingido, claro que o Rolando Castello Junior se indignou, a jogar as baquetas longe e a se pôr a andar contrariado para o camarim. A noite estava estragada e a tal continuidade da temporada alardeada, seriamente comprometida. 

O gerente da casa nos abordou no camarim a pedir desculpas, mas ainda a insistir na tese de que o "Psiu" estava a incomodá-los etc. Ora, se estavam com problemas dessa natureza com a fiscalização sonora da prefeitura, porque insistiam em programar shows de Rock ali?

E como se não bastasse isso, toda essa conversa foi muito suspeita, pois sabíamos que na noite anterior, haviam tocado duas bandas muito barulhentas, uma de Heavy-Metal e outra de Punk-Rock, ali mesmo naquele ambiente e que segundo apuramos com outros funcionários, ambas fizeram os seus respectivos shows longos e na íntegra, sem serem incomodadas pelo mesmo técnico e também pelo gerente. 

Não quero alimentar teoria da conspiração, mas o que realmente ocorreu ali, foi um mistério para nós. 

A produtora, Sarah Reichdan, não esteve presente, mas mandou um representante seu, o baterista, Carlinhos Machado, que eu já conhecia desde 1995, aproximadamente, pelo fato dele ser uma figura super conhecida no Rock paulistano, por ter tocado em inúmeras bandas, inclusive. 

Curiosamente, nove anos depois desse ocorrido, eu entraria na banda do guitarrista, Kim Kehl, "Kim Kehl & Os Kurandeiros", e toco com ele, Carlinhos, desde 2011, portanto, por ele ser o baterista dessa banda.

Meu amigo e desde 2011, colega de três bandas, o baterista Carlinhos Machado

Um gentleman no trato pessoal, Carlinhos estava ali a representar a produtora, Sarah, e então ele foi conversar com o gerente sobre o ocorrido e este garantiu-lhe que a temporada continuaria normalmente e que na próxima quinta-feira nós deveríamos voltar ali na sua casa para dar continuidade à temporada. 

Contudo, no dia seguinte, a produtora Sarah Reichdan nos ligou e nos comunicou que a temporada estava cancelada. Foi difícil mesmo para entender esse episódio, por tudo o que já expliquei. 

O que pretenderam realmente essas pessoas, ficou na consciência delas, e assim, muito provavelmente jamais saberemos. Ainda no decorrer de maio, a Sarah comunicou-nos que nas quintas posteriores, fãs da banda apareceram na tal casa e surpreenderam-se com nossa ausência, visto que muitos cartazes e filipetas foram para a rua a anunciar a temporada com cinco shows. 

Que seguíssemos em frente, não foi a primeira, nem seria a última vez que um espetáculo causar-nos-ia um dissabor nos seus bastidores. Para compensar, teríamos uma boa data para cumprir, mas aí sim através de um teatro bem estruturado e com a promessa de bom público presente ao seu auditório.

Sempre um porto seguro para qualquer artista, tocar no Sesc representava não só uma apresentação com infraestrutura adequada para uma banda de nosso porte, história e musicalidade, mas a certeza de um bom público presente e ao ir além, um aquecimento para a nova turnê que faríamos ao sul do país, desta feita sem apresentações no Paraná, mas concentrado apenas em Santa Catarina e Rio Grande do Sul. 

Como eu já disse anteriormente, a produtora, Sarah Reichdan, houvera nos ajudado muito, desde 2001, mas a sua estratégia para nos introduzir no universo do circuito Sesc, se baseava em uma peregrinação de shows, não exatamente confortáveis, na tentativa de se ganhar a confiança, primeiro dos produtores culturais dessa instituição, para depois, encaixar-nos em circunstâncias mais agradáveis, artisticamente a falar.

Empreender shows semi acústicos, ultra acústicos, ou ter que dividir o palco com muitos convidados, não foi exatamente o que desejávamos. Aliás, claro que não, se dependesse de nossa escolha.

Aceitamos as suas ideias e táticas, na esperança de que viesse a seguir, uma etapa mais confortável e vitoriosa para a nossa banda, quando supostamente faríamos muitos shows em diversas unidades dessa instituição, mas dentro de nossas características normais, ou seja, através do nosso show habitual com eletricidade total, e sem necessidade de apresentarmos convidados. Mas isso nunca ocorreu, infelizmente.

Portanto, esse show que faríamos na unidade do Sesc Ipiranga, seria dentro da nossa zona de conforto, mas neste caso, não foi uma produção dela, Sarah, mas sim do baterista/cantor, Paulo Barnabé, irmão do pianista/compositor e cantor, Arrigo Barnabé. 

Sujeito zen, de conversa amena e muito gentil, diga-se de passagem, ele foi solícito conosco em todas as etapas da produção desse show. 

No dia da apresentação, lembro-me bem, a Copa do Mundo de 2002, estava a pleno vapor e como sabemos, o país normalmente paralisa, literalmente, quando o Brasil vai jogar e nesse dia estava marcado o jogo: Brasil x China.

Por sorte nossa, o mundial de 2002, estava a ser disputado em dois países asiáticos, Japão e Coreia do Sul e por conta disso, quase todos os jogos ocorriam no fuso do fim da tarde ou noite, desses dois países asiáticos, e assim, os jogos eram exibidos na TV por aqui, muito cedo, ainda madrugada, ou na parte da manhã. Dessa maneira, o fato do Brasil jogar, não prejudicaria o nosso show, independente de resultado, se houvesse euforia ou depressão coletiva decorrente do pós-jogo.

Cheguei na unidade do Sesc em primeiro lugar, e pus-me a inteirar-me com os funcionários do equipamento de som e iluminação, terceirizados, sobre os primeiros procedimentos de montagem do palco. 

Logo os meus companheiros chegaram também e tudo transcorreu com calma, sem atropelos. A divulgação feita pelo Sesc Ipiranga estava a contento e nós também havíamos empreendido os nossos esforços na somatória e assim, a expectativa foi ótima, pois o boato estava bem forte sobre uma presença boa do público.

Soundcheck bem feito, iluminação decente de show de Rock profissional, camarim bem estruturado, cenotécnica... enfim, por que não acontecia sempre assim? Se fôssemos norte-americanos ou europeus, com a bagagem que tínhamos, a estrutura seria dali para muito melhor, e de uma forma contínua, não tenho dúvida, mas no Brasil, enfim...

Ainda a relaxarmos no camarim, a produtora da banda, Claudia Fernanda, sinalizou-nos que os ingressos estavam esgotados e que muita gente ficara sem a possibilidade de entrar. Apelamos para o produtor, Paulo Barnabé, para que convencesse os responsáveis pelo Sesc a liberarem a entrada desse excedente, para que tais pessoas excedentes pudessem assistir nos corredores, mas eles foram inflexíveis ao alegar normas de segurança coadunadas com as exigências dos Bombeiros e Defesa Civil e que isso tornava a nossa reivindicação, impossível, portanto. Uma pena, mas a segurança em primeiro lugar, isso foi (é) indiscutível.

Com a possibilidade cênica para começarmos o show com cortinas fechadas, nós combinamos com os técnicos que faríamos uso de tal recurso e foi muito bom começarmos a tocar com a cortina a ser aberta vagarosamente.

Ao nos depararmos com o público, percebermos em vários semblantes de diferentes pessoas, que haviam apreciado tal efeito cênico. Existe uma gravação nossa desses bastidores, providenciada  pelo próprio, Rodrigo Hid (ele instalou uma câmera Mini-VHS em cima de um cabeçote de amplificador, que nos filmou de costas pela perspectiva da lente). 

Em tal filmagem, é possível ver a banda a se preparar em seus últimos ajustes, segundos antes do show começar e está nos planos, lançar tal material no YouTube, um dia. Infelizmente há poucos momentos de show em si. 

Ali no Sesc Ipiranga, nós tocamos no volume compatível com o ambiente do teatro, mas de uma forma agradável para uma banda de nossa sonoridade e não aquela tortura que vivemos na casa noturna "Venice", que eu descrevi em parágrafos anteriores.

Na primeira fileira, eu notei a presença de um senhor, que era vizinho de quarteirão do Rolando Castello Junior. Esse senhor que já era veterano na época, a se tratar de um saxofonista que trabalhara a vida inteira a tocar pela noite paulistana, e que vivia a nos dizer que desejava assistir-nos ao vivo etc. e tal. 

Mas claro, o seu espectro musical era outro, e mesmo ao nos mirar como cabeludos e sabedor que éramos uma banda de Rock, não demonstrava contrariedade com essa diferença, mas o fato é que ele não devia mensurar direito o que seria um show normal, sob as nossas características.

Pois assim que o vi, a sua expressão facial se mostra como alguém em pânico e logo nos primeiros compassos da primeira música. Imaginei imediatamente que ele não aguentaria a massa sonora, ainda mais sentado na primeira fileira e a receber o impacto direto dos amplificadores no palco, somado à potência do PA. 

Eu só não poderia supor que o seu martírio fosse tão grande, pois ainda estávamos no começo da segunda música, "Festa do Rock", quando o vi a se levantar da poltrona de forma incontinente, para se retirar sumariamente do recinto. 

Claro que eu não fiquei chateado pela sua retirada abrupta do ambiente e pelo contrário, tenho consciência de que mesmo ao levar em consideração que ele era um músico experiente, ao acumular tantos anos de carreira, o seu espectro musical habitual, além da extrema leveza sonora, deve ter sido praticado em quase 99 % das oportunidades sob situações acústicas, mediante a atuação com pequenos combos de Samba de Roda, Chorinho ou no máximo, em uma mini orquestra de gafieira. 

Portanto, qualquer sonoridade minimamente mais pesada que um conjunto de Rock no padrão da "Jovem Guarda", que ele devia achar "barulhento" em 1966, não comparava-se à nossa volúpia ali naquele palco. 

Não faz muito tempo, ainda em 2015, o vi a andar pelas ruas do bairro da Aclimação, mas ele não me viu. Estava muito envelhecido e demonstrava sinais de embriagues bem acentuados, lamentavelmente. 

Fora essa ocorrência exótica, foi um show excelente, que nos deixou muito felizes, pois a resposta do público foi muito calorosa. Aconteceu no dia 8 de junho de 2002, um sábado. Lotação máxima com trezentas cadeiras ocupadas ou duzentas e noventa e nove a contar com a saída desse senhor saxofonista e pelo menos oitenta pessoas do lado de fora do auditório, frustradas por não terem conseguido o ingresso. 

E o Brasil da dupla dinâmica, Felipão & Murtosa, venceu o time da China por 4x0...

Resenha sobre esse show realizado no Sesc Ipiranga de São Paulo, publicada na revista "Rock Brigade", um mês depois. O resenhista, cujas iniciais não consegui identificar, falou com propriedade e foi bastante elogioso à nossa performance, mas não consigo deixar passar em branco uma sutileza. Por fazer jus ao fato de tratar-se de uma revista dedicada ao mundo do Heavy-Metal, apesar de ostentar a palavra, "Rock", em seu título, foi incrível constatar o elogio que fez mais eloquente para as músicas: "Robot" e "Olho Animal", que aos seus ouvidos que professavam o Heavy-Metal, soara-lhe mais agradáveis. Até elogio com ênfase para "Olho Animal", o rapaz salientou, ao qualificá-la como "ótima". Indiscutível o gosto pessoal dele, mas é incrível como tal canção que considerávamos uma peça antagônica ao conceito pós-Chronophagia, era querida por outra faixa de público que aprovava a fase mais pesada da Patrulha do Espaço...
Após o show do Sesc Ipiranga que foi um sucesso, teríamos alguns dias sem compromissos antes da próxima etapa da turnê pelo sul do país. Aproveitamos para solucionar enfim a questão do estacionamento do ônibus e reiniciarmos os esforços para dar andamento ao tape com seis músicas inéditas, que graváramos em 2001, e estavam engavetadas, desde então.
Sobre o estacionamento do ônibus, já havíamos sido convidados a deixar dois espaços que haviam sido vendidos para a alimentar a inevitável sanha da especulação imobiliária e nesse terceiro que havíamos nos estabilizado por um tempo maior, o gerente havia nos dito inicialmente que ficássemos tranquilos, porque o estacionamento não estava a ser pressionado por incorporadoras. No entanto, logo a seguir, eis que o quadro mudou, como imaginávamos, dada a quantidade de grandes pátios a serem cooptados para a construção das torres residenciais e comerciais, a acelerar o processo de verticalização do bairro.

Chateados por mais essa repetição de um problema, passamos a procurar, já a nos acostumarmos com a ideia de termos que buscar uma alternativa em bairros vizinhos, visto que as opções estavam escassas no nosso bairro, a Aclimação. 

Nessas buscas, encontramos um estacionamento gigantesco no bairro vizinho do Cambuci. Tal garagem era especializada em caminhões e ônibus, se mostrava administrada por dois irmãos mal saídos da adolescência, porém ambos detinham um bom nível cultural, como estudantes universitários, portanto, a nossa comunicação foi bem melhor com esses rapazes. 

Tratava-se do negócio da família, ou um dos empreendimentos que administravam, pois demonstravam terem posses e o pai de ambos lhes delegou tal tarefa. 

Eles propuseram um preço razoável, dentro da normalidade do mercado e assim o negócio foi fechado. Dessa forma, ali naquele galpão imenso, coberto e com aspecto "velho guarda" dos anos trinta (devia ser mesmo dessa época pelo seu visual arquitetônico), o nosso bólido alojou-se, definitivamente.

Sobre o tape que graváramos com seis músicas, no estúdio Sonarte em 2001 (e curiosamente, muito próximo pela localização do seu espaço físico, desse estacionamento citado acima), começamos a ver uma luz ao final do túnel, quando lembramo-nos que um produtor teatral que conhecêramos em 2001, havia mencionado que era proprietário de um estúdio profissional, ainda que este fosse mais dedicado a atender uma clientela ligada no universo da música Gospel evangélica. 

Mesmo ao pairar a dúvida sobre a intenção de só atender a demanda de artistas religiosos, não custava nada ir lá para lhe perguntar e nessa altura, estavam a rarear os estúdios que ainda mantinham máquinas analógicas de gravação e se demorássemos mais um pouco, correríamos o risco de até perdermos toda a gravação, ainda armazenada sob uma jurássica fita com 2 polegadas, em pleno século XXI, em curso...

O tal proprietário chamava-se: Paulo, e era dono do Teatro Dias Gomes, localizado no bairro da Vila Mariana, onde nos apresentamos em 2001, em duas ocasiões. Ele acumulava a função de pastor evangélico, de uma congregação por ele mesmo fundada e em anexo ao seu templo, era dono de um estúdio de gravação profissional, cuja clientela alvo, eram esses artistas do espectro do universo da música Gospel, ou seja, a dita música evangélica. 

Tal filão já se mostrava sólido como nicho de mercado e em franca expansão, ao contrário da música chamada como, "secular", como eles mesmos se referiam à produção artística não religiosa. 

Fizemos o contato com o produtor teatral, Paulo e ele disse que não era uma regra rígida da sua parte, apenas atender artistas que praticavam música religiosa, absolutamente. Tratava-se outrossim da sua maior clientela, mas o estúdio estava aberto para qualquer artista, sem preconceitos ou sectarismo. 

Dessa forma, ele nos convidou de imediato a conhecermos as suas instalações, sem compromisso, e assim o fizemos na tarde de um dia útil, de junho de 2002.

O seu estabelecimento ficava localizado em uma travessa da Avenida Bosque da Saúde, no bairro da Saúde, zona sul de São Paulo. Se tratava de uma construção ampla, que devia ter sido residencial anteriormente e devidamente adaptada para atender a demanda de um templo evangélico e sobre um anexo construído em suspenso, ficava o estúdio. Gostamos do estúdio, apresentado pelo técnico contratado que era falante ao extremo, mas este foi solícito conosco, não posso me queixar. 

Claro, a sua demonstração de áudio foi em torno das produções em que estava acostumado a trabalhar e assim nós tivemos uma demonstração baseada em bandas e cantores gospel, atuantes naquele instante, com o rapaz que também era evangélico, a empolgar-se na sua exposição, ao enaltecer aqueles artistas que eram supostamente famosos em sua percepção, mas na realidade, isso se constituíra apenas dentro daquele universo religioso. 

Bem, com uma próxima etapa da turnê a se aproximar, reuniríamos condições financeiras para fechar o negócio e assim, uma perspectiva concreta para mixarmos aquele trabalho gravado um ano antes, surgiu, a abrir caminho para um novo álbum com músicas inéditas, a ser lançado pela nossa banda.


Uma nova fase da turnê, desta feita pelo sul do país, estava preparada para ser exercida. Isso consumiu bastante tempo da parte do Rolando Castello Junior, que agiu como empresário da banda a acumular funções. Daí termos ficado sem uma sequência de shows maiores nos meses de maio e junho, pois as negociações para alinhavar uma turnê com um mínimo de inteligibilidade logística, eram cansativas ao extremo e consumiam tempo do nosso baterista que assumia a função de empresário, algo extremamente desgastante para ele.

Mesmo assim, com todas as dificuldades que uma banda sem estrutura empresarial adequada enfrentava, mesmo ao possuir história, currículo, também por pertencer a uma árvore genealógica nobre na história do Rock brasileiro e a ser somado o aspecto da sua qualidade artística inquestionável, com o perdão pela minha absoluta falta de modéstia nesse último quesito. 

Nesse momento, a preocupação foi empreender uma revisão básica no nosso ônibus velho e sinalizar para o "seu" Walter dar a partida no "azulão" e nós fazermos daí em diante a longa jornada rumo ao sul do Brasil.

Ao contrário da primeira turnê que fizéramos no mês de janeiro, sob intenso calor, neste novo cenário nós enfrentaríamos o inverno rigoroso do sul e para nós que gostamos mais do frio paulistano do que o calor tropical de grande parte do Brasil, foi um alento. 

Passaríamos por cidades catarinenses e gaúchas, algumas já antes visitadas, como São Leopoldo e Porto Alegre no Rio Grande do Sul, mas as demais programadas, seriam atingidas pela primeira vez. 

Claro que estávamos motivados, mesmo ao levarmos em conta que seria cansativo ao extremo e acrescida tal experiência com as dificuldades inerentes de uma banda a realizar uma turnê sob uma estrutura muito aquém do que merecia. 

Todavia, resignados com as condições simples que detínhamos, só apresentávamos animação por estarmos na estrada a levar o nosso trabalho para o público sulista e isso foi tudo para nós em termos de motivação.

Partimos no dia 21 de junho de junho de 2002, com muito frio e sob aquele clima de Copa do Mundo. O time do Brasil enfrentava a equipe da Inglaterra nas quartas de final do Mundial e tudo girava em torno dessa partida no país inteiro, enquanto enfrentávamos a estrada. 

Já a rodarmos em direção ao estado do Paraná, mas ainda em território paulista, tivemos problemas com o ônibus. Uma pane na parte elétrica não pôde ser ignorada em uma viagem que seria noturna em grande parte do trajeto. Então, tivemos que parar em um posto onde havia uma oficina para examinar tal avaria e ali perdemos cerca de duas horas, além de deixamos uma quantia razoável em termos monetários e não prevista, nas mãos do mecânico de beira de estrada. 

O nosso destino inicial foi Concórdia-SC, uma cidade do oeste de Santa Catarina e assim que passamos por Curitiba, mudamos de estrada, com o objetivo de estabelecermos uma rota no sentido diagonal, que cortaria bastante o caminho para atingirmos a cidade de Concórdia. Foi por volta de duas da manhã quando passamos pelo entroncamento de duas pequenas cidades que são praticamente unidas mas marcam a divisa entre estados: Porto União e União da Vitória.

A se mostrarem como pequenas cidades e completamente desertas naquele horário, pareciam fantasmagóricas em tal momento, potencializado pelo frio intenso e a presença de uma acentuada neblina. 

Entramos enfim no estado de Santa Catarina e com a madrugada a avançar, o frio intensificara-se e a neblina, também. Então, chegamos em um ponto em que a rodarmos muito devagar em uma subida de serra íngreme, com aquele bólido pintado de azul escuro, sob intensa neblina, tornou muito perigoso o percurso, pois diversos caminhões e ônibus providos de motor turbo, passavam por nós a voar e naquela lentidão do nosso pobre bólido, o risco de colisão com aquela neblina seria terrível. 

Resolvemos parar um pouco para esperar dissipar a neblina, ao ponto que nos garantisse visibilidade mínima e só prosseguimos após melhorar um pouco, mas não muito. A neblina esteve fortíssima e a perspectiva foi que continuasse com tal volume até o sol raiar.

Vista aérea da simpática cidade de Concórdia-SC, a primeira cidade a constar dessa etapa da turnê de junho de 2002, em que realizamos um show

Finalmente chegamos em Concórdia-SC, já a passar das cinco da manhã e nos instalamos no confortável apart-hotel que a produção local, nos reservara. 

Assim que abrimos a entrada que dava acesso a uma sacada, vimos uma paisagem muito agradável, com a presença de um bosque e um riacho que produzia um ruído relaxante ao extremo e isso embalou o sono de todos da nossa comitiva. Apesar das dificuldades apresentadas na estrada, a nova tour começara bem!

Bem descansados, após boas horas de sono embalados pelo reconfortante som natural do riacho que passava atrás do apart-hotel, e também pelo frio intenso que valorizou o uso dos edredons e cobertores, recebemos a visita de pessoas ligadas com a produção local. Estava tudo sobre controle e a hospitalidade estava excelente, aliás a se manter o padrão em cidades interioranas em geral, independente de qual estado for da federação.

Cidade de porte mediano e muito bonita, Concórdia-SC possuía uma casa noturna que mantinha a tradição de abrir as suas portas para artistas autorais. E assim que chegamos ao estabelecimento para o soundcheck vespertino, vimos murais espalhados pela casa, com fotos de shows pregressos e assim verificamos então que muita gente boa já havia passado por lá. 

Claro, eram predominantemente artistas alojados no patamar underground como nós, mas houveram também representantes do mainstream, pois vimos fotos do Erasmo Carlos, Guilherme Arantes, Marcelo Nova e Engenheiros da Havaí, por exemplo.

Fachada da casa de espetáculos, Tulipa Bar, em Concórdia-SC

A casa chamava-se: Tulipa Bar e era bem montada. Não era luxuosa, mas se mostrava aconchegante. As suas proprietárias, eram duas mulheres simpáticas que nos receberam muito bem e tudo prometeu funcionar a contento para a noite, principalmente quando nos disseram que a expectativa gerada na cidade fora grande e que havia indício que uma caravana vinda de outra cidade próxima, Chapecó, estava organizada com gente muito a fim de nos ver. Claro que nos motivamos com tal perspectiva de contarmos com a casa cheia, e com público Rocker, melhor ainda.

Voltamos a caminhar para o apart-hotel, visto que optamos por deixar o nosso ônibus estacionado ali e a distância se mostrara mínima. 

O frio estava a se intensificar no entardecer, ao prenunciar uma noite gelada e de fato, ali era (é), uma das regiões mais frias do Brasil, tradicionalmente, com temperaturas que chegavam aos graus abaixo de zero, com costumeira facilidade, no rigor do inverno sulista. 

Antes de voltamos para a casa, tivemos um compromisso radiofônico e já noturno, em que através de uma pequena entrevista, reforçamos o convite para os Rockers locais enfrentarem o forte frio das ruas, e assim a se aquecerem ao nosso som Chronophágico. 

Porém, uma grande surpresa aguardar-nos-ia, e ocorreu quando entramos no estabelecimento, que já continha um bom contingente de pessoas no seu interior.

Assim que entramos, aquela turma de Chapecó-SC, que fretara um ônibus para vir nos assistir, nos envolveu aos berros, a nos ovacionar de uma forma tão contundente e emocionante que um clima de comoção instantânea, instaurou-se no local. 

Munidos com capas de vinis antigos da Patrulha do Espaço, mas também mediante várias capas do CD Chronophagia, em mãos, esses Rockers se puseram a cantar em coro, a música: "O Novo Sim", desse referido CD de nossa discografia e claro que nos emocionamos ante tal manifestação espontânea e carinhosa. 

Concomitantemente, uma equipe de jornalismo da TV local estava ali pronta para fazer uma micro entrevista conosco, e claro, os jornalistas foram rápidos ao filmarem essa chegada triunfal da banda em meio aos seus fãs, que cantavam uma música do novo disco que sabiam de cor e mais do que isso, demonstravam adorá-la. 

Bem, claro que nesse torpor todo gerado pela comoção ali instaurada, deu-me a oportunidade para fazer uma reminiscência e reflexão, imediata...

Nesses termos, como uma epifania, eu fui levado a relembrar todo o esforço empreendido para fazer o sonho do resgate energético das estéticas das décadas de 1960 & 1970, pulsar novamente, através dos primórdios do projeto, Sidharta. 

Pensei bastante nos então meninos, Hid e Schevano, mal saídos da adolescência, em maio aos ensaios para a composição daquelas canções, o sonho a movimentar todo aquele esforço e toda essa percepção reforçada por aquela garotada ali a cantar aos berros, sob intensa emoção. a música: "O Novo Sim"! 

Foi a concretização de tudo aquilo que começara ao final de 1997.  Claro, pensei até no José Luiz Dinola, que mesmo ao não vibrar com a mesma intensidade o sonho do resgate aquariano, fora, curiosamente, o autor dessa letra, que aqueles jovens Rockers catarinenses cantavam em plenos pulmões ao nosso redor.

Bem, em termos de proximidade com o meu sonho primordial e acalentado nos anos setenta, a Patrulha do Espaço provavelmente foi a banda pela qual eu atuei em que mais me proporcionou a chance para experimentá-lo concretizado, eu acredito. 

Claro que A Chave do Sol também proporcionou-me muitas alegrias nesse sentido, contudo, naquela conjuntura onde tal banda se inseriu em meio à década de oitenta, fora muito difícil exercer tais experimentações, portanto, não foi culpa da banda, mas das circunstâncias.

Porém, através da Patrulha do Espaço, pelo fato da banda ter imbuído-se desse resgate, explicitamente a falar, os resultados concretos foram muito mais visíveis, e assim, manifestações como essa da parte desses Rockers da cidade de Chapecó-SC, a se mobilizarem para nos assistir na cidade vizinha, Concórdia, e a nos recepcionar na casa noturna onde apresentar-nos-íamos, dessa forma tão esfuziante, foi uma prova cabal de que os nossos esforços lograram êxito, e em particular, eu me senti muito gratificado, por tudo o que expus. 

Com essa comoção toda ali gerada, foi claro que o show foi muito quente e esse público respondeu a cantar e vibrar, do início ao final. No entanto, tenho que registrar que a euforia e comoção ali manifestada ficou a cargo desses quarenta e poucos fãs ardorosos da Patrulha do Espaço, que vieram de Chapecó-SC, pois tirante poucos Rockers de Concórdia, o grande grosso do público do Tulipa Bar, reagiu ao nosso show de uma forma muito mais comedida. 

Fácil para se explicar, o público habitue da casa foi constituído pela jovem burguesia da cidade, fenômeno comum em muitas casas de outras cidades aonde já havíamos tocado anteriormente, portanto, não nos aborrecemos, tampouco surpreendemo-nos com essa apatia dessa fatia e convenhamos, obscurecida pelo vulcão emocional proporcionado pela outra fatia da plateia já citada. 

Por sorte, tal euforia provida pelos Rockers de Chapecó-SP tornou o show sensacional para nós e assim, saímos muito contentes daquele palco. 

Além disso, a satisfação da parte das donas do estabelecimento foi visível, certamente ao abrir as portas para que voltássemos a tocar em seu estabelecimento e foi o que ocorreu posteriormente, em outras ocasiões futuras. Assim ocorreu a noite no Tulipa Bar de Concórdia-SC, em 22 de junho de 2002, com cerca de duzentas e cinquenta pessoas no estabelecimento. 

Como uma última ocorrência dessa madrugada, nós observamos que um casal de namorados, muito jovens e com aparência de freaks setentistas, estavam ambos desolados em um canto, quando o público já havia saído da casa, quase que completamente. Os interpelamos e descobrimos que eles eram de Chapecó, mas haviam se distraído a namorar em algum recanto escuro e não perceberam que o seu ônibus fretado, havia partido. 

E naturalmente que sob naquela adrenalina toda, os seus amigos nem notaram a falta de ambos no veículo. Aquela cena pungente me remeteu aos anos sessenta e setenta, naturalmente, ao me fazer lembrar de jovens hippies presentes na porta de teatros, ao se sacrificarem para poder assistir grandes concertos de Rock e/ou MPB e a terem que amargar horas de espera para poder voltar para a casa. 

Sem dinheiro, no entanto, para usar um ônibus comercial para voltarem à sua cidade, não foi só a questão das horas de espera e do frio que estava intenso (até para eles catarinenses, e acostumados com o rigor do frio sob um padrão europeu). Lembro-me portanto do Rolando Castello Junior a lhes fornecer uma quantia em dinheiro, para que pudessem voltar para a casa, assim que o primeiro ônibus comercial para Chapecó, surgisse na rodoviária de Concórdia. 

No dia seguinte, antes de sairmos da cidade, ainda tivemos o cuidado de mandar instalar faróis de milha que não tínhamos à disposição em nosso ônibus. A experiência por termos permanecido sob uma neblina intensa na noite retrasada, ao passar muito perigo em uma estrada íngreme, sobre encostas e a sermos ultrapassados por caminhões e ônibus munidos com motor turbo, dispositivo que não tínhamos, nos deixou apreensivos e o mínimo nesse caso seria foi instalar faróis de milha específicos, para enfrentarmos situação de neblina, e também ao colocarmos adesivos refletivos na parte traseira do bólido. 

Ainda a falar dessa turma Rocker de Chapecó-SC, devo relatar que em um dado instante da entrevista que concedíamos a uma equipe de reportagem da TV local, o jornalista optou por aquela conversa clichê ao nos pedir uma "palinha", naturalmente a ignorar o fato de que qualquer vocalização "a capella" não substituiria a nossa volúpia Rocker no palco, portanto, claro que preferíamos não cantar a toa ali, e sim, convidarmos os telespectadores a virem nos assistir. 

Contudo, não satisfeito, ele perguntou aos fãs à nossa volta se eles cantariam então e de imediato, essa turma animada passou a cantar a canção: "Berro", que se tratava de um tema da Patrulha do Espaço, anterior à nossa formação, mas que curiosamente nós todos gostávamos muito também, e de fato, tal canção entraria em nosso set list de shows no ano posterior, 2003. 

Com essa comoção toda, é claro que o show foi muito quente, e esse público respondeu a cantar e vibrar, do início ao final. 

Com bastante tempo hábil, saímos de Concórdia-SC, no meio da tarde do domingo, com destino a Porto Alegre, no Rio Grande do Sul. A nossa meta foi viajar com tranquilidade, sabedores que haveria um longo trecho de serra a ser enfrentado, e assim, com o nosso ônibus a possuir um motor convencional e não turbo, a lentidão seria certa.

Paramos para jantar em um simpático restaurante de posto de gasolina, na altura de Passo Fundo, já no Rio Grande do Sul. Cabe explicar que tínhamos um show marcado para essa mesma cidade, naquele domingo, mas ele havia sido cancelado, daí termos descansado em Concórdia, até a metade da tarde. 

No posto, a comida farta, bem-feita, saborosa e sob um preço absurdamente baixo, nos deixou satisfeitos, apesar do show de Passo Fundo-RS, não ter se consumado e houve um certo ar de frustração por isso. 

De volta à estrada, ter um carro velho é um problema, pois mesmo ao realizarmos checagens básicas, sempre podemos ser surpreendidos. Já eram mais de dez da noite, quando um barulho forte, ocorrido perto do motor, nos deixou apreensivos. O "seu" Walter parou no acostamento e ao se levantar do banco de motorista, só disse-nos com aquele ar taciturno: 

-"foi a caixa de câmbio, e é grave"...

Relembramos de imediato o fantasma da "etapa do azar", onde tudo dera errado, sob uma sucessão de desgraças que nos acometera em fevereiro daquele mesmo ano, quando viajamos para três cidades interioranas, paulistas. 

Feita a constatação e que seja enaltecido, no meio da estrada, o "seu" Walter conseguiu ao menos nos tirar do perigoso acostamento e ao conseguir engatar a primeira marcha, nos advertiu que não seria possível se chegar à terceira e quarta marchas. Portanto, a rodar somente a fazer uso da segunda, ainda mais lenta que o máximo que conseguíamos e que já era pouco, foi muito perigoso com aqueles caminhões e outros ônibus mais modernos, a passarem a voar por nós.

Para agravar, houve a forte incidência da neblina e o frio esteve muito intenso. Mesmo assim, ele conseguiu nos conduzir até um posto de instalação razoável, com segurança, aonde outros caminhoneiros já haviam parado para dormir, também. 

Nesses termos, tivemos muita sorte, pois os frentistas do posto, nos disseram que havia uma mecânica, localizada a cerca de três Km dali, em uma pequena vila que ainda pertencia à Passo Fundo-RS. 

Mas claro, ao se registrar quase onze da noite de domingo, ela estava fechada, logicamente. A única solução foi dormirmos, para que na manhã de segunda-feira, um pouco antes das 8:00 horas da manhã, estivéssemos com o ônibus na porta de tal oficina e torcermos para que tal estabelecimento tivesse com a peça em seu estoque, e aí, sabíamos bem como funcionava um comércio remoto de beira de estrada etc. e tal. 

Bem, dormir no ônibus não foi lá muito confortável, mas também não foi algo insuportável. Deu para aguentar uma noite ali nos bancos do carro. Contudo, o grande problema que enfrentamos, foi o frio. 

Com a madrugada a avançar, o frio se intensificou muito. Cada membro da nossa comitiva tratou por se agasalhar o melhor possível, mas mesmo ao possuirmos cobertores que havíamos providenciado por precaução, estas peças foram insuficientes para enfrentar um frio de padrão europeu e com a agravante da umidade. 

Passamos muito frio naquela madrugada, essa foi uma lembrança que marcou. Existe até um vídeo curto, mas significativo que o Rodrigo gravou com a sua câmera Mini-VHS, no qual em um momento em que todos dormiam e só ele estava acordado, ele registrou a situação, inclusive ao mostrar o gelo no ônibus, causado pela forte geada. 

Acordamos e a aproveitarmos a facilidade do posto, fomos à lanchonete para tomar um café da manhã às 6:00 horas da manhã. O frio foi tão intenso, que batemos os dentes, literalmente, enquanto tentávamos formular pedidos ao funcionário do balcão. 

Naquela mesma estratégia de se acionar a primeira e segunda marcha apenas, rodamos até a tal mecânica no vilarejo e tivemos que esperar o dono chegar. Quando o rapaz abriu a loja e ouviu a nossa queixa, nos tranquilizou, pois a oficina possuía a peça, nova em folha, à disposição, mas claro, alertou-nos que a sua instalação demoraria um pouco, pela obviedade de ser uma operação mecânica relativamente trabalhosa. 

Isso já esperávamos, alertados pelo "seu" Walter que nos descrevera como seria o conserto. E sob tal morosa operação, verificamos que as ruas no entorno dessa oficina, ostentavam um cascalho mesclado a centenas de pedras, obviamente não preciosas, mas de uma beleza natural incrível e muito usadas para o artesanato, sob múltiplas formas. 

Falamos com os mecânicos da oficina e eles disseram que aquela profusão de pedras era corriqueira na natureza local e que muita gente vinha de fora para apanhá-las. Eram tantas que os rapazes locais não demonstravam nenhum interesse em preservá-las para si e dessa forma, nós enchemos vários sacos com centenas delas e rateamos tal material entre nós na volta à São Paulo. 

Fiquei com algumas em minha posse e distribuí o montante excedente que obtive, a vontade para parentes e amigos, a posteriori. Limpas e polidas, elas tinham um aspecto muito bonito. 

Ao caminhar até uma banca de jornais, perto da oficina, li a manchete estampada no jornal, "Zero Hora", o maior do Rio Grande do Sul: "Região de Passo Fundo registrou temperatura de -5º nesta madrugada... esteve explicado o frio que passamos dentro do ônibus!

Por volta das 10:00 horas da manhã, o dono do estabelecimento anunciou a conclusão da instalação da peça. Pagamos e evidentemente que foi caro, pelas circunstâncias todas.

Seguimos viagem enfim, com o "seu" Walter a se regozijar por que nesse instante, o "Azulão" estava com o câmbio a parecer uma "manteiga", de tão leve que estava para passar a marcha. 

A amenizar um pouco a situação que nos fatigara, certamente, ele nos arrancou risadas até Porto Alegre, quando dirigiu eufórico com o câmbio "amanteigado" e berrava, freneticamente: 

-"sai da frente que o azulão está com câmbio novo... ninguém segura o azulão"...

Chegamos em Porto Alegre no início da tarde e sem maiores problemas, ainda dentro do cronograma da turnê. Tínhamos um compromisso na TVE gaúcha a cumprir, e um pouco adiantados para tal, foi possível parar no hotel a fim de descarregar a nossa bagagem pessoal e tomarmos banho, antes de irmos à TV.

                  O ótimo guitarrista gaúcho, Evandro Demari

Encontramo-nos no caminho com o guitarrista, Evandro Demari, que na excursão de janeiro nos hospedara no sítio de sua propriedade, nos arredores de Bento Gonçalves-RS. Ele nos acompanhou nessa incursão na TV, mas desta feita, apenas como amigo, sem participar a tocar conosco.

Na TV, nós fomos muito bem recebidos pela sua produção. Participaríamos de uma revista cultural vespertina, pela qual concederíamos entrevista e tocaríamos duas músicas ao vivo.

Montamos o nosso equipamento e fizemos o primeiro bloco com entrevista. Havia um grupo de "rap", paulistano, que apresentar-se-ia na mesma noite em Porto Alegre e que esperava a sua vez para ser entrevistado, também. Não lembro-me de seu nome, mas recordo que era enorme, com muitos componentes e esses rapazes ficaram a assistir a nossa entrevista e em um dado momento, o apresentador os inseriu na conversa e eles foram respeitosos, ao nos saudarem, e obviamente que retribuímos no mesmo grau de gentileza. 

Eles disseram serem moradores de algum bairro da zona norte de São Paulo, Santana ou Mandaqui, talvez, mas sinceramente não me recordo, exatamente. 

Fomos convidados a tocar, então, quando assumimos posição em um palco montado do outro lado do cenário, ao me fazer lembrar de alguns programas musicais da TV internacional, como: "Later With Jools Holland", da TV britânica, por exemplo, com esse tipo de dispositivo de estúdio grande. 

Tocamos nesse estúdio de TV as canções: "Ser" e "Homem Carbono". Enquanto tocávamos, "Homem Carbono", um acidente terrível, cênicamente a se descrever, ocorreu...

O suporte do teclado que o Rodrigo usou para tocar, cedeu e bem na hora do refrão, com ele em destaque e a ser filmado por um cinegrafista móvel! 

Lembro-me do barulho do piano a cair no chão, mesclado ao acorde involuntário de sua mão, ao tentar salvá-lo sob um movimento de intenso reflexo e simultâneo ao seu esforço para não perder a linha ao continuar a cantar com intensidade e interpretação!

Foi tragicômico, mas ao mesmo tempo, eu louvei a intenção dele para tentar manter a postura artística, apesar do desastre. Claro que rimos da situação depois, mas na hora do ocorrido, sobrou bronca para um dos roadies, que não apertara o suficiente os parafusos do suporte. E também houve uma pane no pedal de bumbo do Rolando Castello Junior, a gerar mais um aborrecimento para essa aparição de TV. 

Voltamos ao hotel a lamentarmos a panes que aconteceram, mas ao mesmo tempo, contentes, pois a despeito desses acidentes a aparição fora muito boa no cômputo geral e o programa fora exibido ao vivo, para todo o estado do Rio Grande do Sul. 

A seguir, chegou a hora para irmos para o show...

Nós tocaríamos novamente no Manara, uma casa noturna bem estruturada e que já havíamos visitado na etapa anterior da turnê pelo sul, em janeiro desse mesmo ano de 2002. 

Desta feita, no entanto, a produção não estava tão caprichada como da vez anterior, em termos de divulgação e a presença do público, ficou bem abaixo do que esperávamos.

Fizemos o show no padrão habitual, naturalmente e foi até surpreendente sob um certo aspecto. Explico: na ocasião anterior, havia mais gente presente, mas infelizmente nós não conseguimos estabelecer uma boa sinergia com o público. 

Desta feita, o público foi menor em termos quantitativas, mas a empatia foi muito melhor... vá entender!

O nosso amigo, Evandro Damari, fez o show de abertura e depois participou conosco em nosso show como convidado em uma música. A banda, "Spartacus", também fez um show de abertura.

                   O ótimo guitarrista gaúcho, Evandro Demari

O som do Evandro e de sua banda de apoio era bem na linha do Blues-Rock clássico, com muita qualidade e técnica e o Spartacus apresentou um som mais pesado, no limite do Hard-Rock, quase a beirar o Heavy-Metal. 

Voltamos para o hotel e o dia posterior, terça-feira, seria livre para a banda, sem compromissos oficiais. Mas claro que aproveitamos para fazermos contatos e no meu caso, eu acompanhei o Rolando Castello Junior para uma visita à várias lojas de discos de Rock, no centro da cidade, ao estilo das lojas da Galeria do Rock de São Paulo. 

Foi uma tarde agradável, sem dúvida, a conversarmos com muitos lojistas e que na tradição desse tipo de empreendedores, mostraram-se todos profundos conhecedores da história do Rock. 

Um fato desagradável ocorreu quando estávamos em uma dessas lojas do centro da cidade, mas alheio completamente à nossa presença e sobre a loja em si. 

Nesses termos, infelizmente, presenciamos um assalto do outro lado da rua, sob uma ação muito rápido, quando um "trombadinha" assaltou um senhor idoso. Aliás, foi um "trombadão", no caso, pois o sujeito tinha seguramente mais de 1.90 de altura, e covardemente ante o seu tamanho avantajado, empurrou o pobre vovô e arrancou-lhe a carteira, sob uma fração de segundos. Não deu tempo nem de esboçar tentar ajudá-lo, com o meliante a se evadir, rapidamente.

Para amenizar o astral depois dessa ocorrência triste, nós apreciamos muito uma visita à Casa de Cultura Mario Quintana, ali no centro de Porto Alegre. 

Na parte noturna, todos foram aproveitar a noite de Porto Alegre, mas eu preferi fazer uma caminhada pelo entorno do hotel, ao fazer um reconhecimento do bairro. Gosto de conhecer cidades dessa forma, a andar a pé e eventualmente a fazer uso do transporte público local. 

O frio se intensificou quando resolvi parar em uma pizzaria que pareceu-me simpática, e ali jantei sozinho, a apreciar o ambiente e a pizza, naturalmente. 

No dia seguinte, enfim tivemos a continuidade da turnê, com um show na cidade de Novo Hamburgo-RS. Para quem não conhece o estado do Rio Grande do Sul, é bom esclarecer que tal cidade fica muito perto de Porto Alegre, por se encontrar no espectro de sua região metropolitana, com muitas outras cidades ali agrupadas no entorno. 

Por se localizar perto, nós nos demos ao luxo de programar a viagem somente para o período da tarde, portanto ainda estendemos mais algumas horas de permanência na capital gaúcha. 

No café da manhã, ficamos a assistir o jogo da semifinal da Copa do Mundo e o time do Brasil venceu a equipe da Turquia, por 1x 0. 

O Rodrigo saiu sozinho para um passeio matinal pelo bairro, e filmou tal passeio. Nessa filmagem, dá para se ouvir a manifestação das pessoas a gritarem e o foguetório a se comemorar o gol do Brasil, o que chega a ser curioso, como um registro de época. 

Após o almoço, partimos para Novo Hamburgo-RS, aonde tocaríamos na noite de quarta-feira.

Chegamos em Novo Hamburgo-RS com muita tranquilidade e bem antes do horário combinado para a abertura da casa e assim arrumarmos o palco e realizarmos o soundcheck. A casa continha denominação e ambientação condizente com seu mote: Abbey Road.

Foto da internet, a mostrar um pedaço do ambiente da casa noturna "Abbey Road", de Novo Hamburgo-RS
 
Dessa forma, haviam muitos itens de decoração que remetiam aos Beatles, naturalmente, mas também continham outros ícones do Rock e do Blues internacional, ali presentes como decoração temática.  

O dono do estabelecimento montou um pub aconchegante, sem dúvida alguma e a conter uma estrutura boa para uma banda tocar, logicamente ao se considerar o fato de que as dimensões do estabelecimento eram pequenas.

Outra foto do mesmo estabelecimento que cito e o submarino amarelo da decoração, dispensa maiores comentários sobre a ambientação "Beatle", ali predominante

Gostamos muito da ambientação Rocker e Beatle, sobretudo, fizemos o soundcheck e aguardamos a hora do show nas imediações, ao jantarmos em um estabelecimento próximo. 

Não dormiríamos em Novo Hamburgo-RS, pois o nosso plano inicial foi irmos direto para São Leopoldo-RS, onde tocaríamos no dia seguinte.  

Um bom público compareceu à casa e o dono se surpreendeu, bem naquela dinâmica de não acreditar no potencial de uma banda com trabalho autoral, acostumado que estava a produzir bandas cover no seu estabelecimento. Mas também pelo fato de ser uma quarta-feira, dia difícil, normalmente, para se produzir shows.  

E vou além, foi um bom público, a se portar de forma bem animada e que nos deixou bastante satisfeitos, naturalmente. O nosso amigo de São Leopoldo (o guitarrista, Luciano Reis), apareceu e foi o nosso guia para seguirmos no avançar da madrugada, para a sua cidade, aonde tocaríamos no dia seguinte.

Chegamos no meio da madrugada em São Leopoldo-RS, sem nenhum problema ocorrido com o ônibus e sob a condução firme de nosso motorista, "seu Walter". Com a presença do nosso amigo, Luciano Reis, como guia, tudo foi facilitado também em termos de caminho.

            Aspecto da entrada da cidade de São Leopoldo-RS

Novo Hamburgo e São Leopoldo ficam tão perto uma da outra, que a impressão é que se muda de um bairro para outro. O local onde tocaríamos em São Leopoldo foi novamente o BR3 do "Biba", aquele freak louco e cheio de ideias mirabolantes, que encontráramos em janeiro. 

Toda a produção seria novamente do amigo, Luciano e mais uma vez, a sua banda faria a abertura do nosso show, mas desta feita não seria a banda Tributo ao Black Sabbath, "Sabbra Cadabra", mas sim um trio, pelo qual curiosamente ele tocaria baixo, ao invés de guitarra, desta feita com a proposta de se tocar covers variados. Tal banda se denominou: "Voodoo Trio". 

Tudo foi basicamente igual em termos de produção, ao show anterior que fizéramos na mesma casa, mas desta vez houve uma maior agilidade, pois todos os envolvidos souberam antecipadamente das limitações de uma casa pequena e com fraca infraestrutura disponível, sendo assim, o Luciano antecipou-se e tomou as providências devidas.

Visão de ruas da cidade de São Leopoldo-RS, no período noturno

Após o rápido soundcheck, tivemos um bom tempo livre e dispersamos, sem ter sido marcado um jantar oficial da comitiva em algum restaurante, e nesse caso, cada um se aventurou sozinho pelo centro da cidade de São Leopoldo e nessa caminhada que eu fiz acompanhado do Rolando Castello Junior, nós vimos que havia uma outra casa noturna sob ambientação Rocker, localizada a alguns poucos quarteirões do BR3 (na Avenida Lindolfo Collor), e com as suas portas abertas, nós entramos e vimos que a banda, "Autoramas", fazia o seu soundcheck naquele momento. 

Foi interessante notar que mesmo em outro mundo de atuação artística e especificamente no caso deles, o do universo do "Indie Rock", o fato foi que eles estavam a labutar como nós, ao tocarem em turnês montadas no ambiente do underground e naturalmente que respeitamos muito a luta dos colegas. 

Fizemos o nosso show e foi mais uma vez, sensacional. São Leopoldo nos recebera com um calor Rocker extraordinário mais uma vez, e aquele público emocionou-se e comoveu-nos com sua reação muito intensa.

Em um dado momento do show, quando eu falei ao microfone que havíamos tocado em Porto Alegre, dois dias antes, ao externar então a minha intenção de agradecer o carinho do público gaúcho em geral, alguns gritos de repúdio aos porto-alegrenses, soaram no ambiente. 

Alguns mais exaltados xingaram os habitantes da capital gaúcha, e claro que tal manifestação nada teve a ver comigo, tampouco com a nossa banda. Tratara-se da pura rixa local entre cidades e a seguir, alguém começou a cantar o hino gaúcho e todos ao seu redor se uniram, sob uma demonstração impressionante de comprometimento com a sua cultura regional. 

Passado esse momento de demonstração do orgulho gaúcho, o show prosseguiu e tudo continuou na sua normalidade, com a banda a mil por hora na performance, e o público em estado de êxtase. 

No dia seguinte, seguimos para Joinville-SC e o nosso amigo, Luciano Reis, viajou conosco, como convidado especial. Ele teria que voltar a São Leopoldo-RS, no sábado, mas aceitou assim mesmo a fim de aproveitar mais um pedaço da nossa turnê. E claro que seria um prazer contar com ele na comitiva. 

Enfim, foi um ótimo show em São Leopoldo-RS, e nesse instante esteve encerrada a etapa gaúcha e nós voltaríamos para Santa Catarina, aonde três shows nos esperavam-nos: Joinville, Blumenau e Florianópolis.

Saímos na hora do almoço para Joinville-SC e tivemos um problema logo no início, um pouco além de São Leopoldo-RS, quando um pneu estourou na estrada. Não foi nada muito problemático, pois demos sorte de ter sido um pneu com melhores condições e no primeiro borracheiro que encontramos, resolvemos o problema sem maior trauma. 

Dali em diante, a viagem foi prazerosa ao extremo, com longos trechos a mirarmos a orla marinha do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina, e a mantermos uma conversa animada dentro do "azulão". 

Chegamos em Joinville com tranquilidade e com um bom tempo hábil antes da chegada do dono do estabelecimento. Tratava-se de uma casa com uma boa amplitude, praticamente um galpão que em outra época possivelmente serviu como armazém para as atividades do pequeno porto de água doce da cidade. Chamava-se: "Cais 90", e ficava à beira de um rio, perto do centro da cidade.

Enquanto o dono do estabelecimento não chegava, eu resolvi dar a minha volta rotineira pelas imediações, à cata de uma banca de jornais, costume em que havia me habituado a exercer, que fora o de comprar os jornais locais, por conta de possivelmente haver sido publicada alguma matéria, ou no mínimo um tijolo com o serviço do show que faríamos, no caderno de atrações culturais do dia.

Ruas do centro da bela, Joinville-SC, uma cidade pujante ao extremo
 
Como nas cercanias eu nada encontrei, pus-me a caminhar até o centro da cidade que não era tão distante dali e fiquei bastante impressionado com a beleza da cidade, com várias construções residenciais principalmente, em estilo germânico, bem acentuado. 

Muitas das ruas ostentavam nome duplo, grafadas em português e alemão, para mostrar o óbvio que eu já sabia, mas comprovei in loco: a força da imigração alemã na região, era (é) enorme. 

Quando eu voltei para o estabelecimento, o dono já havia chegado e os nossos roadies estavam a todo vapor a transportar o equipamento para o palco. O proprietário do estabelecimento era um rapaz de meia idade, muito educado e simpático, ao nos recepcionar muito bem em sua casa. 

Entretanto, apesar dessa hospitalidade agradável, havia um problema no equipamento de PA da casa: só existia a metade de um equipamento normal de operação, portanto, este trabalhava sob um sistema mono, muito bizarro, eu diria. 

Leigo no assunto, o dono nem entendeu o que lhe falamos sobre o equipamento, pois ele promovia normalmente shows ali para as bandas locais que estavam acostumadas a usá-lo dessa forma, sem reclamar de nada. Bem, fazer o que sob uma circunstância dessas? 

Montamos o nosso backline e nos conformamos em contarmos com um sistema de PA mono para suprir o show, o que foi algo absolutamente inusitado. 

Ficamos alojados em um bom hotel e após o jantar, fomos para o Cais 90, a fim de esperar a hora para tocarmos.

Quando entramos no local, no período noturno, a casa estava abarrotada, o que nos animou, mesmo sob a perspectiva de ser mais um show em casa noturna inadequada. 

Nesses termos, estávamos mais do que acostumados a lidar com tal tipo de adversidade em nos apresentarmos para plateias não Rockers, e sem noção alguma de quem éramos, portanto, a desconhecer o nosso repertório. 

Pela aparência geral, pareceu ser uma juventude burguesa da cidade, mas não hostil, pois assistiram o show com atenção e aplaudiram educadamente todas as músicas. Contudo, houve uma ala Rocker também, e esta, mostrou-se bem animada.

Nessa foto ao vivo d'Os Depira", Parffit está do lado esquerdo, com um baixo Rickenbacker, em suas mãos.

Ali nessa noite conheci o baixista da banda, "Os Depira", bastante conhecida na cidade, e que foi mais um dos encontros importantes que sempre cito na minha história com a Patrulha do Espaço, pois me surpreendeu positivamente. 

A banda não tocou na abertura do nosso show, mas foi muito bom ter conhecido, Parffit Balsanelli e verificado que ele era um artista a vibrar na mesma sintonia. Em nossa conversa, lembro-me bem que falamos bastante sobre o Rock Progressivo setentista, quando ele citou inúmeras bandas italianas dessa década citada e que eu também aprecio bastante, caso do "Banco Del Mutuo Soccorso", por exemplo. 

Bem, muitos anos depois, eu tive o prazer de publicar uma resenha de um álbum d'Os Depira" em meu Blog 1, cujo link está aí abaixo:

http://luiz-domingues.blogspot.com.br/2014/11/cada-qual-com-seu-vicio-os-depira-por.html

De volta ao show, ele foi bom pela junção da animação dos Rockers locais e fãs da Patrulha do Espaço, com a boa vontade louvável do público alheio em se portar educadamente, perante um artista desconhecido por ele. Saímos satisfeitos do palco, portanto. 

Aconteceu no dia 28 de junho de 2015, uma sexta-feira e o "Cais 90" recebeu cerca de cento e cinquenta pessoas nessa noite. No dia seguinte, teríamos um outro show em outra cidade, mas mediante um percurso pequeno. Iríamos para a não menos bela, e fortemente influenciada pela cultura germânica, Blumenau-SC.

Chegamos em Blumenau-SC, com muita tranquilidade na tarde do sábado. Esse show seria sui generis para a banda, pois a proposta do contratante foi boa, porque seria um espetáculo a fazer parte de uma festa a comemorar os dez anos de atuação de um colunista social local, através do jornal estadual: "Jornal de Santa Catarina".

No entanto, houve um componente exótico nessa história: seria realizado na praça de alimentação de um Shopping da cidade! Qual artista não passou por situações inusitadas no decorrer de sua carreira? Pois é, a Patrulha do Espaço iria tocar em uma praça de alimentação de um Shopping Center, local onde naturalmente muitas mesas estariam reservadas para os convidados do colunista, Horácio Braun, mas muito usuários normais do tal estabelecimento estariam misturados e naturalmente que haveria uma sensação de estranheza generalizada.  

Outro fator a nos limitar foi com a orientação prévia de que deveríamos observar uma disciplina férrea no tocante à dinâmica. Eu toco atualmente (2016), e já toquei anteriormente com bandas que fazem e/ou faziam dinâmica com muita normalidade, mas a Patrulha do Espaço não detinha essa característica. Banda com volúpia Rocker, na tradição de bandas de expressão do porte como o The Who e o Led Zeppelin, a palavra "dinâmica" não constava do dicionário da Patrulha do Espaço.

Bem, além do cachê, haveria a vantagem da festa ser da motivação de um colunista social com prestígio na cidade, mas artisticamente nós estivemos apreensivos sobre a performance, ao pensarmos no local inadequado, a questão da dinâmica e também pelo equipamento que sabíamos de antemão vir a se tratar de um PA muito modesto, adequado apenas para apresentações intimistas e adequados apenas para alimentar voz & violão, na melhor das hipóteses.  

Bem, a hospitalidade esteve ótima, e o mínimo que poderíamos fazer, seria nos imbuirmos de muita boa vontade e darmos o nosso melhor, dentro desse cenário não exatamente adequado para nós, em respeito ao contratante e seus convidados.  

Sobre o repertório, se cogitou que privilegiássemos algumas concessões e a ideia seria resgatar algumas músicas que tocáramos em formato acústico, quando do show realizado no Sesc Pinheiros de São Paulo, há dois meses antes. De fato, o kit de violões estava disponível conosco na viagem e de fato, nós poderíamos ter feito isso.

Todavia, se ponderou que nunca mais havíamos ensaiado músicas com tais arranjos e seria um risco apresentá-las assim, despreparadas. 

Então, resolvemos apresentar o repertório habitual e a tentarmos segurar manualmente, o ímpeto natural da banda. Havíamos nos hospedado em um hotel de categoria em Joinville, mas em Blumenau, o contratante não economizou e nos alojou em um hotel com cinco estrelas, literalmente, portanto, o conforto ali foi ainda melhor que o da noite anterior e o relaxamento pré e pós show, foi muito grande a nos fornecer energia para encerrarmos a turnê no dia seguinte, em Florianópolis e voltarmos para São Paulo, a seguir.  

Bem, foi a véspera da final da Copa do Mundo e a cidade estava toda mobilizada para esse jogo que seria transmitido diretamente do Japão, na manhã de domingo.

Aspecto da cidade de Blumenau, provavelmente da sua famosa festa germânica, "Oktoberfest", a julgar pela multidão observada nas ruas

Tão bonita quanto Joinville, Blumenau também contém traços fortes da cultura germânica. Isso é público e notório, mas nós constatamos in loco tal predisposição e apreciamos isso.  

O hotel se localizava muito próximo do referido Shopping e a caminhada foi prazerosa, mesmo com o frio intenso e outra lembrança que guardo é a do Rolando Castello Junior a usar um chapéu alemão típico que comprara no comércio de rua, naquela tarde.

Quando chegamos ao Shopping Neumarket, vimos que ele estava lotado, o que foi normal para um sábado a noite, ainda mais em uma cidade interiorana que não prima por conter muitas opções noturnas. A praça de alimentação estava bem lotada e o jornalista, Horácio, se confraternizava com os seus amigos, quando uma banda de abertura foi se apresentar. 

Apreciamos o inusitado da situação, pois ao contrário de estarmos habituados a contar com bandas de Rock como abertura dos nossos shows, desta feita se tratou de uma banda orientada pelo folclore germânico, típica, inclusive visualmente pelos trajes que os seus componentes usavam.

Bem, Blumenau tem uma tradição fortíssima nesse aspecto, a começar pelo "Oktoberfest", uma típica festa alemã, portanto, foi mais do que natural, para eles, apresentar esse tipo de atração.  

De nossa parte, nós gostamos muito da apresentação da banda, "Meiose", com o seu cancioneiro folclórico teutônico e muito bonito. Mas ao mesmo tempo em que apreciávamos a apresentação desse grupo folclórico, nos preocupávamos, pois o som deles se mostrara como uma "pluma" perto do nosso e sem contar a aceitação popular do show deles, que foi total pela questão cultural da cidade e o nosso, por ser Rock autoral e fora da difusão mainstream, certamente haveria de causar estranheza. 

Enfim, estávamos sob uma situação desconfortável e a melhor opção foi enfrentar a adversidade com a máxima resignação e dignidade...

Portanto, fomos imbuídos sob espírito resiliente para a apresentação e para a nossa total surpresa, o nosso repertório não causou grande estranheza e pelo contrário, não observamos dispersão constrangedora, tampouco hostilidades. 

Tocamos sob um patamar de volume bastante desagradável, é verdade, mas foi um show até surpreendente ao se considerar os nossos temores prévios.  

Claro, mesmo nas condições mais adversas, sempre haviam fãs...  e neste caso, foram poucos, mas lá estavam eles munidos com capas de discos em mãos, inclusive o CD Chronophagia, que fora o então mais atual trabalho da nossa formação, no afã de nos pedirem autógrafos.  

Fomos dormir satisfeitos com o resultado e o jornalista, Horácio, também gostou da nossa apresentação, ao nos agradecer por termos feito o show em sua festa.  

No hotel, o aquecedor no quarto foi providencial, com aquele frio rigoroso do sul e amparado por tal boa condição assegurada, me lembro em ter apagado e assim, eu só fui acordar atordoado pelo foguetório, quando o centroavante Ronaldo mandou duas bolas para a rede do goleiro, Oliver Kahn.  

Pior que essa gritaria ouvida das ruas, foi quando o interfone tocou e eu ouvi a voz do Rolando Castello Junior...

Eu ainda estava torpe pelo foguetório irritante a comemorar os gols da seleção brasileira, mas também impelido a não querer sair daquela cama quente de jeito nenhum, até pelo menos o meio-dia, eis que eu fui massacrado pelo toque intermitente do telefone do hotel. 

Estranhei, no entanto, pois não havia pedido para me chamarem da recepção para ser despertado, pois a ideia foi realmente sair na hora limite da diária, visto que a distância entre Blumenau e a capital, Florianópolis, era mediana e mesmo a sairmos com prudente margem de vantagem para prevenir eventuais problemas na estrada, não haveríamos de nos atrasarmos.

Todavia, não foi o que aconteceu, pois a quebrar todo o planejamento prévio, se tratara do Rolando Castello Junior do outro lado do fone, a comunicar-me de uma forma agoniada que nós deveríamos partir de forma acelerada, pois ao olhar o jogador Cafu, a levantar a Taça de Campeão na mão, e por ouvir a gritaria e foguetório pelas ruas, lhe ocorrera o insight de que ficaríamos presos nas comemorações de rua e assim, ele ficara desesperado, por temer um atraso mastodôntico em nossa saída dali...

Enfim, todo mundo saiu com a face amassada dos quartos, a lamentar muito o fato de estarmos a deixar o conforto de um hotel cinco estrelas e naquele frio do sul, assim às pressas, como se estivéssemos a perder o último trem para Clarkesville ou Jaçanã, como queira o leitor...

Entramos no ônibus e realmente houve uma movimentação popular intensa, mas longe de uma interdição completa das ruas. Além do mais, se tratou de uma cidade interiorana e mesmo que isso ocorresse, não seria muito difícil nos desvencilharmos da multidão formada por torcedores ufanistas, e de fato, foi o que ocorreu. 

E assim, rapidamente já estávamos na estrada e a adrenalina absolutamente desnecessária já havia devidamente sido abaixada no organismo de todos da comitiva...

Bem, chegamos em Florianópolis muitas horas antes da previsão da casa onde apresentar-nos-íamos, a nos abrir as suas portas para a montagem do palco e soundcheck. 

O nosso compromisso seria em cumprido em uma casa noturna sob ambientação Rocker, chamada: "Underground". Ela ficava localizada na avenida que margeia a Lagoa da Conceição, um lugar de uma beleza incrível e recheada por turistas, com imensa maioria formada por argentinos, tanto que muitas placas de informações são bilíngues ali, com português e espanhol (castellaño), grafados lado a lado. 

Almoçamos nas imediações da referida casa, em um restaurante decorado com motivações náuticas e após uma longa espera, finalmente fomos aguardar a abertura da casa, aonde apresentar-nos-íamos.

A cidade de Florianópolis estava festiva pela vitória da seleção brasileira, mas também houve a notícia da morte de uma personalidade religiosa famosa e querida no país, o espírita, Chico Xavier.

Dias antes já havíamos amargado a notícia da morte do lendário baixista do The Who, John Entwistle, que nos chocara profundamente, visto ele ter sido um dos grandes ícones da história do Rock sessenta-setentista e uma influência para todos nós, evidentemente. 

Bem, morte de celebridades e ufanismo futebolístico a parte, estávamos prestes a encerrar essa etapa da nossa turnê pelo sul. Florianópolis foi a última etapa para nós e podíamos já comemorar antecipadamente o sucesso dessa turnê, independente de como seria o show no bar "Underground", casa onde apresentar-nos-íamos. Como uma praxe, sempre que sentíamos uma vibração boa do local, e das pessoas envolvidas na produção, a infraestrutura deixava a desejar...

Tratava-se de uma casa rústica, ao se parecer com um mini centro cultural aberto para artistas do patamar underground, e daí o nome do estabelecimento ser coadunado com esse espírito, mas o equipamento de som e iluminação ali disponível, mostrava-se precário. 

Na base da boa vontade, o pessoal responsável pelo espaço se desdobrou para providenciar ajustes de improviso e assim, o som melhorou um pouco, mas mesmo assim, seria sofrido tocar com um PA tão tímido. 

Quando a noite chegou, nós compensamos toda a precariedade do equipamento e fizemos um dos mais inspirados shows não apenas dessa etapa da turnê, mas desse ano inteiro de 2002, até aquele instante. 

Foi um clima gerado em torno das tradições de um show de Rock de outrora e que contagiou o público presente, que foi inteiramente coadunado com essa vibração, ou seja, tal sinergia nos propiciou levantarmos voo naquele palco escuro, carente de uma iluminação alucinante e portanto, melhor condizente com a energia ali estabelecida por nós, em perfeita sincronia com a plateia.

Aquela plateia formada por Rockers genuínos, merecia nos ver no palco do auditório, Fillmore West, com aquela vibração de 1970, para melhor situar o leitor que entende o que eu quero dizer exatamente. 

Bem, a suarmos aos píncaros, deixamos o palco mega satisfeitos com a energia do show e também com o assédio que foi grande embora não fosse um grande contingente ali presente.

Com o amigo, músico e compositor, Paulo Valério Silva, no camarim do "Underground", que foi nos prestigiar naquela noite. Foto rara dessa noite, e do acervo dele mesmo, gentilmente disponibilizada para engrandecer o meu Blog

Aconteceu no dia 30 de junho de 2002, no palco do "Underground" de Florianópolis. Bem, fechada com chave de ouro essa etapa da turnê, voltamos para São Paulo extenuados pela somatória dos onze dias longe de casa. 

No cômputo geral, não tivemos grandes problemas com o ônibus (problemas na parte elétrica ao sairmos de São Paulo, troca da caixa de câmbio em Passo Fundo-RS, além de um pneu furado em São Leopoldo-RS), e poucos aborrecimentos com fatores corriqueiros e extra-musicais, apenas. 

Despedimo-nos do pessoal do "Underground" e entramos no ônibus ainda ao final da noite de domingo, com vontade de voltar para São Paulo, sem escalas. Relaxados dentro do ônibus, e a apreciarmos a paisagem noturna belíssima de Florianópolis, o astral quebrou-se como por encanto, quando alguém notou que o banner da venda de discos e souvenirs que usávamos para ornar a loja ambulante, não estava dentro do carro. 

Um dos roadies havia esquecido o banner na casa noturna. O "seu" Walter sugeriu que voltássemos imediatamente para resgatar o artefato, mas o Rolando Castello Junior pediu para ele seguir em frente, pois provavelmente a casa já estaria fechada e seria um aborrecimento ter que ligar para o responsável pela casa voltar e abrir o estabelecimento etc. e tal... paciência, mais um prejuízo de última hora, desta feita sob pequena monta, pelo menos isso. 

A viagem seguiu tranquila nesse momento e já a adentrarmos a alta madrugada, todo mundo dormia, menos eu, que ficava ligado o tempo todo a conversar com o "seu" Walter.

Então, eis que subitamente perdemos a luz externa do nosso ônibus. O "seu" Walter me disse que provavelmente perderíamos a ignição se parássemos para verificar o ocorrido e assim, ele sugeriu que parássemos somente em um posto onde houvesse a certeza de haver um eletricista, para não corrermos riscos. 

Já estávamos adiante de Curitiba, a nos aproximarmos da fronteira de estados entre Paraná e São Paulo, quando achamos um posto com um auto-elétrico aberto. Quando o ônibus desacelerou e fez a manobra de entrada no posto, os demais se puseram a acordar e a nos perguntar o que ocorria e o "seu" Walter lhes explicou, mas daquele seu jeito enigmático de se expressar ante questões sérias, ao dar a entender que teríamos problemas mais sérios para enfrentarmos ali. 

Como quase todo mecânico de beira de estrada, o sujeito que nos atendeu fez as suas verificações e assim emitiu indiretas de que seria difícil achar um dínamo novo, naquela hora em seu estoque etc. e tal. A nossa sorte foi que o "seu" Walter falava a linguagem dessa gente e ficou atento ao sujeito a barganhar e a peça "miraculosamente" apareceu em uma embalagem lacrada, em algum compartimento secreto daquele barracão insalubre e nos foi vendida por um preço um pouco acima do normal de mercado. Se estivéssemos sozinhos, o elemento teria nos arrancado o valor absurdo que pedira, inicialmente.

Enquanto o eletricista instalava a peça, nós ouvimos um barulho incrível na estrada, e de repente, eis que a surgir após a curva, um caminhão apareceu em pleno ato de capotamento, a parar com uma violência a seguir, sob um estrondo na encosta rochosa. 

Pior que ver um acidente desse porte, ali a menos de cem metros de distância de onde estávamos, foi verificarmos que em meio a pessoas que socorriam o caminhoneiro, todo ensanguentado e atordoado, uma multidão de oportunistas apareceu, sabe-se de lá de onde, e essa turba ensandecida iniciou um saque violento, que pareceu um ataque de gafanhotos à carga do caminhão. Neste caso, foram caixas a conter "bolachas" (entenda "biscoitos", se você que estiver a ler, não for paulista ou gaúcho). 

Fiquei chocado com a cena, mas muita gente que estava no posto, se portou como se estivesse acostumada com uma barbaridade dessas e, assim permanecemos no terceiro mundo e algumas pessoas perguntam o motivo dessa situação incômoda não mudar.

Bem, sem meios para ajudar, ficamos chocados e temerosos com todo o nosso equipamento no ônibus. Se essas pessoas roubavam caixas a conter bolachas, com aquela volúpia animalesca, por dedução, se soubessem do valor do que carregávamos conosco, então... 

Consertado o nosso carro, voltamos para a estrada e vimos que viaturas da Polícia Rodoviária e muitas ambulâncias com paramédicos estavam a chegar para socorrer o caminhoneiro acidentado. Quanto à sua carga, bem, tudo foi saqueado.

Chegamos em São Paulo já na metade da manhã, extenuados certamente, mas felizes pelo cômputo geral da turnê. O nosso próximo compromisso formal, seria realizado apenas no mês de julho, com mais três shows no Centro Cultural São Paulo.

Voltamos para São Paulo e o nosso próximo compromisso foi realizado somente em duas semanas, mas o tratamos como uma importância extra, devido ao fato de ser uma micro temporada no Centro Cultural São Paulo, com três datas de shows.
 

O Rolando Castello Junior traçou uma estratégia ao tratar tal temporada como o fim da turnê dos discos, "Chronophagia" e "Dossiê Volume 4", mais para ter um mote publicitário do que demarcar isso oficialmente, visto que só lançaríamos um novo álbum de fato, em março de 2003, portanto, por muitos meses, ainda estaríamos sob a égide dos discos anteriores, a realizarmos diversos shows, através de etapas da turnê, interioranas e interestaduais.

Voltou a tona também o assunto da mixagem do novo álbum e com os lucros obtidos na última excursão pelo sul do país, esteve viabilizada enfim tal produção, mas só fomos tratar do assunto após a realização da temporada no Centro Cultural São Paulo.

Então, os nossos esforços nessas duas semanas que tivemos sem shows, foram no sentido de sua divulgação e quem costumava colocar a mão na massa nesse aspecto, fora eu mesmo, ao fornecer o meu carro à disposição para cruzar a cidade inteira e muitas vezes a percorrer cidades vizinhas da Grande São Paulo, também, em uma corrida frenética e extremamente onerosa, pois a gasolina gasta era absurda em cada operação dessas. 

Eu gastava dias em uma campanha dessas e mediante a ajuda do roadie, Samuel Wagner, que colocava os cartazes nos lugares, efetivamente, nós rodávamos juntos centenas de Km's, a enfrentarmos calor, frio e chuva nessas ações ultra cansativas. Mas apesar do caráter arcaico de tal empreitada, eu gostava da sensação do dever cumprido, ao espalhar o nome da minha banda pela cidade toda.

Claro, em uma capital do tamanho de São Paulo e ainda por cima a atingir municípios vizinhos da Grande SP, para cobrir tudo mesmo, eu precisaria de pelo menos dez equipes montadas e com pelo menos três auxiliares em cada carro, mas na escassez de recursos para contratar equipes profissionais acostumadas com esse tipo de divulgação, eu trabalhava sozinho, com um auxiliar apenas e digo, mesmo ao não cobrir nem 10% do que eu gostaria, era um volume absurdo de cartazes colocados em estabelecimentos que mantinham perfil compatível de pessoas a circularem e interessadas em nosso trabalho.

Somente na famosa "Galeria do Rock", localizada no centro de São Paulo, houve época em que existiram ali, mais de duzentas lojas de discos reunidas, só para o leitor não acostumado à dimensão da cidade de São Paulo, ter uma noção.

Portanto, cobrir a cidade inteira e a nossa proposta foi para se buscar a amplitude, por não colocar cartazes apenas em lojas de discos, tratou-se de um trabalho hercúleo. 

O Rolando Castello Junior e a Claudia Fernanda centraram os seus esforços na parte burocrática e o CCSP, assim como o Sesc, costumava exagerar em demasia na exigência de documentos, a dar trabalho aos pleiteantes pelo uso do teatro, por lhes obrigar a visitar muitas repartições e cartórios para deixar tudo em ordem. 

E a colaboração do Rodrigo Hid fora positiva, também, mas sob o cunho secreto. Como jornalista formado e a possuir muitos colegas da faculdade que atuavam na mídia, ele continha os seus contatos e a usar o expediente de um pseudônimo, abordava diversos órgãos de imprensa, quando se apresentava como assessor de imprensa da banda, a cavar matérias. Graças aos seus esforços, muito do material que a banda obteve em termos de mídia escrita, foi por seu mérito. 

Infelizmente, dois dias antes da estreia, eu fiquei fortemente gripado. Até aí, gripe é super desagradável para se lidar no cotidiano, mas não impede que uma pessoa trabalhe, foi o que eu pensei. Mas desta vez os sintomas do meu estado gripal passaram da conta e assim, na véspera da estreia no CCSP, eu fiquei prostrado, com febre alta e uma indisposição inacreditável. 

Passei a informação aos companheiros, que se prontificaram a suprir a minha ausência na produção do dia e toda a logística de transporte e arrumação do equipamento ficou a cargo deles e dos roadies. Quem conhece-me pessoalmente sabe que eu não suporto ficar alheio a esse trabalho, inclusive ante o trabalho braçal, portanto, foi frustrante para a minha pessoa, não ajudar. Eu só teria que cumprir o soundcheck e participar do show, mas foi irritante ao extremo, acostumado a ser bem atuante nos bastidores, normalmente, porém, paciência...

Feita a divulgação, foi a hora do Rock ser exercido, mas com a repentina baixa operacional de minha presença, acometido por uma gripe que me surpreendeu, negativamente. 

Fiquei frustrado duplamente, porque o nosso amigo, Luciano Reis, de São Leopoldo-RS, fora convidado a vir a São Paulo, para assistir e ser um artista convidado de uma das noites, a tocar guitarra conosco. E por ter sido sempre gentil como nosso anfitrião e cicerone em duas ocasiões que cumprimos no sul. Nesse momento eu estive fora de combate para retribuir a gentileza, e a ser um bom anfitrião.

Mas tal ausência foi suprida pelos rapazes que o levaram para conhecer a Rua Teodoro Sampaio do bairro de Pinheiros, a se constituir do maior centro de lojas de instrumentos e equipamentos do país e também a Rua Santa Ifigênia, localizada no centro, referência para eletro/eletrônicos. Não tenho certeza, mas acho que o levaram também à Galeria do Rock, visita inevitável para quem gosta de discos. 

Bem combalido, eu fui levado pelo Rodrigo Hid, somente na hora do soundcheck, que ocorreu dentro da normalidade de sempre, no Centro Cultural São Paulo. Tivemos o apoio do iluminador superb, Wagner Molina, que é um grande mestre das luzes e era bastante conhecido no meio, tanto que conhecia a equipe de iluminação fixa da casa e teve, portanto, toda a sua cooperação para afinar os spots, conforme os efeitos que estava a criar em sua concepção.

E o técnico de som seria o mesmo dos anos anteriores, o nosso amigo Paulinho, ex-baterista da banda, "Cygnus", que militou na cena pesada de São Paulo, nos anos oitenta. 

Tirante o meu estado de saúde lamentável, sob debilidade física, foi um show agradável, com o público ao não notar com exatidão que eu estava em um momento de mal-estar físico, com febre, tosse violenta e fraqueza generalizada.

O primeiro show ocorreu no dia 19 de julho de 2002, sexta-feira e com cerca de setenta pessoas na plateia. Tratou-se de um bom público por se considerar que ao se marcar show em São Paulo às 19 Horas se torna contraproducente ao extremo pela obviedade de ser a hora do rush em meio a uma cidade gigantesca.
No dia seguinte, sábado, o relaxamento por estarmos em temporada foi grande, pois o palco montado de um dia para o outro, foi uma dádiva para quem sabia o trabalho que representava montar um palco e fazer um soundcheck inicial, da estaca zero. 
 
Ao se precisar estabelecer apenas alguns ajustes pontuais, o soundcheck do segundo show em diante, quando se faz temporada em local fixo, é muito mais ameno. E com isso, sobra tempo para o artista relaxar convenientemente para o show. 
 
No sábado, tivemos dois guitarristas convidados: Xando Zupo e Hélcio Aguirra. Por incrível que pareça, esta seria a primeira vez que eu tocaria com o Xando Zupo, efetivamente, pois na prática, eu o conhecia desde 1984. 
 
E sobre o Hélcio Aguirra, não seria nenhuma novidade, pois desde os tempos d'A Chave do Sol , nos anos oitenta, eu estava acostumado a tocar com ele em diversas circunstâncias, de brincadeiras informais em estúdio, até a participar de show tributo (Ufo/Michael Schenker Group e Black Sabbath, tudo isso contado devidamente nos capítulos dos "Trabalhos Avulsos"). 

Com um público mais encorpado, foi um show com muita energia e eu estava um pouco melhor da minha convalescença gripal. Ocorreu no dia 20 de julho de 2002, com cerca de duzentas pessoas na plateia. 

Para fechar a micro turnê, no domingo, tivemos mais público no auditório e mais três participações especiais entre os nossos convidados. Luciano Reis, o nosso amigo gaúcho e que estava a acompanhar esta etapa da nossa turnê, tocaria, além de haver uma micro apresentação da banda: "Quarto Elétrico", como uma espécie de abertura do show, para tocar vinte minutos sob um show de choque de sua parte.

Tínhamos apreço por essa banda com a qual interagíamos desde 2001, e cujos laços de amizade foram selados ad eternum, eu diria, pois o Ivan Scartezini seria meu companheiro, futuramente no "Pedra" por dez anos, Marcião Gonçalves é nosso super amigo até os dias atuais e mesmo ao não conviver muito conosco, Denny Caldeira, também. Isso sem contar sobre o Thiago Fratuce, que fora meu aluno nos anos 1990, por muito tempo naquela década. 

E haveria mais uma atração importante e sem nenhum demérito aos artistas já citados, muito emocionante para a Patrulha do Espaço e seus fãs: Dudu Chermont.

Dudu Chermont fora o guitarrista da Patrulha do Espaço em sua fase de ouro ao final dos anos setenta e início dos oitenta. Ele não gravou o disco de estúdio com o Arnaldo Baptista, cujo guitarrista foi John Flavin (ex-Secos & Molhados e Humahuaca), mas entrou a seguir na banda, e fez história ao participar dessas duas fases de ouro do grupo. 

Infelizmente, Dudu não estava bem em relação à sua saúde e apresentava um quadro com debilidade física muito acentuado, que se arrastava há anos sem perspectiva de melhora. Muito envelhecido e com nítidas limitações físicas decorrentes da saúde fragilizada, Dudu não tinha mais o aspecto jovial de outrora, por ter ficado quase irreconhecível, ao perder o viço da juventude.

Lembrava-me dele a atuar com a Patrulha do Espaço nos anos oitenta, mas a minha memória retroagia até para antes disso, por tê-lo visto em ação entre 1976 e 1977, a tocar com o grupo "Santa Fé", banda do ex-vocalista do Made in Brazil, Cornélius Lúcifer. 

Quando no soundcheck do domingo, ele fez soar os primeiros acordes de sua participação especial à guitarra, fiquei arrepiado (e fora a música, "Arrepiado", curiosamente nesse instante que testávamos), pois ele demonstrou estar a tocar e cantar como se o tempo não tivesse passado e ao ir além, passara por cima de sua condição pessoal de saúde, naquele instante, que era péssima.

Parecia que estava a tocar normalmente na Patrulha do Espaço em 1980, no auge de sua forma, com uma execução à guitarra e também na voz, perfeita. 

Bem, pois na hora do show, ocorreu sim uma comoção entre os fãs mais veteranos da banda que suspiraram de saudade ao verem o grande, Dudu Chermont, a assumir a guitarra ao lado do Marcello Schevano e com o Rodrigo Hid dedicado aos teclados nesse momento do show. 

Foi um verniz e tanto obtermos a glória da Patrulha do Espaço do passado, mesclada ao presente da nossa formação de então e poeticamente a descrever, se mostrou como algo muito no espírito da "Chronophagia" em síntese.

O show foi o mais emocionante dessa mini temporada, exatamente por termos tido a participação de um ex-membro histórico da banda a abrilhantar o show como um convidado especial.
Foi no dia 21 de julho de 2002 e com duzentas e cinquenta pessoas presentes na plateia.

Esteve encerrada oficialmente a turnê do álbum "Chronophagia" e que levou como adendo também, o lançamento da coletânea: "Dossiê Volume 4", em sua esteira. 

Entretanto, continuaríamos a empreender muitos shows sob a égide de turnês a visitar localidades interioranas e interestaduais, até março de 2003, quando enfim lançaríamos um novo álbum.

Continua...

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