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quinta-feira, 12 de fevereiro de 2015

Língua de Trapo - Capítulo 22 - O Pós-Língua de Trapo, como Ex-Membro - Por Luiz Domingues

O momento pós-Língua de Trapo teve vários desdobramentos em minha vida, e o primeiro fato, ocorreu ainda em 1984. A minha primeira interação com a banda, na condição de ex-membro, ocorreu ainda nesse mesmo ano. Mais ou menos em outubro ou novembro, não recordo-me ao certo, eu fui assistir um show do Língua de Trapo, no teatro Sesc Pompeia. Foi estranho assistir o espetáculo com tão pouco tempo decorrente de minha saída. Foi como se eu fosse ainda da banda, pois sabia de cor todas as músicas, as marcações, as trocas de figurino, piadas, vinhetas de áudio e vídeo...

Ou seja, se o Mário Campos, meu substituto, tivesse uma indisposição qualquer, eu pegaria o baixo, e faria o show inteiro, sem problemas, pois não enferrujara, apesar de três ou quatro meses passados desde a minha saída da formação.

Laert Sarrumor, Ayrton Mugnaini Jr. & Alcione Sana, em foto dos anos noventa, a representar o programa radiofônico: "Rádio Matraca", da USP FM de São Paulo. Na segunda ilustração, a capa do EP lançado pel'A Chave do Sol em 1985

Quando o EP d'A Chave do Sol foi lançado em 1985, nós fizemos uma entrevista no programa de rádio que o Laert liderava, "Rádio Matraca", na USP FM. Ainda em 1985, eu tive um contato ainda mais próximo, e foi sensacional nesse caso, pois pude amenizar, e muito, o meu sentimento de remorso por ter deixado a banda, quando senti-me útil, sob uma circunstância especial para os meus amigos.

O Língua de Trapo estava classificado para participar do Festival de MPB que a Rede Globo lançou naquele ano, a tentar resgatar o glamour dos festivais dos anos sessenta. Foi de fato, muito grandioso para aquele momento, e apesar de estar muito aquém dos festivais sessentistas (verdadeiros clássicos icônicos e registrados na história da MPB), sob o ponto de vista artístico, fez bastante barulho em 1985. 

O Língua de Trapo estava prestes a lançar um novo LP com canções inéditas, naquele ano mesmo ano e participar de tal festival, pareceu ser o empurrão que lhes faltava para enfim ingressar no mainstream da música. Foi então que eu recebi o telefonema do Laert, a solicitar-me um favor.

Como se tratara de um evento de responsabilidade e o baixista, Mário Campos, não possuía um baixo importado de qualidade naquela ocasião, o pedido foi para que eu emprestasse o meu baixo para que ele o usasse durante a primeira eliminatória em que a banda participaria no Ginásio do Ibirapuera, em São Paulo, e eventualmente, se classificados, precisariam novamente do meu instrumento, para participar da final, a ser realizada no Maracanãzinho, no Rio de Janeiro. Claro que aceitei na hora, por vários motivos. 
 
Primeiro pelo apreço à minha ex-banda, da qual tenho orgulho por ser um membro fundador, pela qualidade do trabalho, pela amizade com todos os membros daquela formação, por nutrir simpatia pelo Mário Campos, um amigo muito gentil, mas também por outro motivo, mais "egoísta", de minha parte, digamos assim: a oportunidade para amenizar o meu remorso por ter deixado a banda, mais uma vez...

E assim, na 1ª eliminatória em que o Língua de Trapo participou, eu fui levar o meu baixo para o Mário usá-lo, no Ginásio do Ibirapuera, onde pude assistir o soundcheck da banda, e observei os bastidores de uma produção global e sob peso pesado. 

A grandiosidade de tal produção, impressionou-me pela sua estrutura. O equipamento usado, era gigantesco, a parecer-se adequado para suprir um show de Rock internacional, e a parte de aparelhagem de TV, foi o que houve de mais moderno para a época, é claro. 

Ao circular pelos corredores, notei que os participantes não eram "ilustres desconhecidos", como seria de se esperar para um festival que supostamente visara revelar novos artistas, mas pelo contrário, houve a presença de muitos medalhões, a deixar bem clara o poder de intervenção da parte das gravadoras e empresários, foi óbvio.

Fiquei muito orgulhoso de ver a minha ex-banda a participar de um evento desse porte, portanto a viver um "momentum" que parecia (e foi), ainda mais promissor do que aquele que eu experimentara como membro, entre 1983 e 1984. Dessa forma, senti-me mais que orgulhoso, mas feliz por vê-los em claro sinal de ascensão, e de certo, aliviado por meu remorso estar agora, muito diminuído, para não dizer erradicado.

Foi um furor a apresentação do Língua de Trapo, que eu assisti pela TV, apesar de ter sido disponibilizado um convite para que eu estivesse presente. Com "Os Metaleiros Também Amam", satirizaram o Heavy-Metal, e toda aquela baboseira em torno do termo "metaleiro", uma invenção imbecil da parte de marqueteiros do Festival Rock in Rio, recém realizado, e massificado a exaustão pela Rede Globo.

Eu nunca gostei de Heavy-Metal, mas tinha muitos amigos nesse meio, e sei de uma série de pessoas que passaram a odiar mortalmente o Língua de Trapo, por conta dessa sátira, ao tomá-la como uma afronta pessoal. Durante o festival, não foram apenas os "metaleiros" que ficaram indignados. O público comum da Rede Globo, escandalizou-se com a indumentária quase indecente com a qual o vocalista, Pituco Freitas, apresentou-se.

O crítico musical, Zuza Homem de Mello, chegou a exaltar-se durante a transmissão ao vivo, ao tecer duras críticas ao Língua de Trapo, e ao Pituco em específico. Bem, eu vibrei com a performance, com a sátira e tudo mais. E até um certo orgulho por ver o meu baixo em ação, eu senti... eles classificaram-se, e novamente eu lhes emprestei o meu baixo, que viajou ao Rio, sem a minha presença.

Depois dessa ocasião, eu só tive encontros sazonais e individuais com alguns membros da banda, até que em 1996, o Laert procurasse-me para que eu fizesse parte de uma banda, que faria um Tributo à Janis Joplin. Essa história já foi contada no capítulo: "Trabalhos Avulsos".

Mais encontros casuais houveram nos anos seguintes, e em 2005, eu fui convidado para o show de lançamento de uma caixa comemorativa dos vinte e cinco anos de existência da banda, com o próprio Laert a ironizar tal efeméride por ela estar "errada", visto que em 2005, comemorava-se na verdade, vinte e seis, ao menos se computasse os primórdios da banda em 1979, ainda sem nome definido sequer. 

Nesse mesmo dia do show do Língua de Trapo, ao chegar ao camarim, eu estava eufórico, por que acabara de entrevistar o mítico radialista, Jaques Sobretudo Gersgorin, do programa: "Kaleidoscópio", em uma produção proporcionada pelo jornalista, Bento Araújo, que a publicou na edição n°11, da revista Poeira Zine (Thin Lizzy, na capa).

Dessa forma, sabedor que o Laert também amava o Kaleidoscópio, uma paixão setentista comum a nós dois (Serginho Gama também era muito fã), eu cheguei com essa novidade e os telefones do Jaques em mãos, para que o Laert o convidasse a participar do seu programa radiofônico, "Rádio Matraca", ação que de fato ele preparou para ocorrer no início de 2006, e por sinal, programa em que eu tive o prazer de participar, também. 

Fora essa questão, o show do Língua de Trapo foi hilariante como sempre, e vários ex-membros estavam presentes, quando ao final, todos foram chamados ao palco para participar de um coral da canção, "Concheta", que foi filmado, mas que eu nunca achei no You Tube, e talvez esteja engavetado para um lançamento em DVD, no futuro.

      O Pedra a abrir o Uriah Heep em 2006. Foto : Grace Lagôa

Foi nesse dia que o baixista, Luiz Lucas, falou-me sobre um empresário que estaria a contratar "dinossauros" do Rock setentista internacional, para compor um festival, e que poderia encaixar o Pedra, a minha banda nessa ocasião, para tal evento. De fato, um ano depois, o Pedra estaria a abrir o show do Uriah Heep, dentro desse festival.

No dia em que o Jaques "Kaleidoscópio" foi ao programa Rádio Matraca, em 2006: Da esquerda para a direita, Alcione Sana (minha ex-aluna de baixo... mundo pequeno...); o diretor da USP FM (Marcelo Bittencourt); Jaques e Laert. Ao fundo, Zé Brasil, líder do Apokalypsis, histórica banda de Rock setentista. Eu não estou no enquadramento dessa foto, mas estava ao fundo, perto do Zé Brasil, e do jornalista, Bento Araújo. Foto : Grace Lagôa
Nessa segunda foto, enfim no enquadramento, com tantos amigos juntos ao grande, Jaques "Kaleidoscópio", uma das maiores influências setentistas que eu tenho no campo da contracultura em geral. Em pé, da esquerda para a direita: Luiz Domingues, Zé Brasil (Apokalypsis), Bento Araújo (editor da Revista Poeira Zine) e Marcio Gali Ortiz (sonoplasta da USP FM). Sentados: Alcione Sana, Marcelo Bittencourt (diretor da USP FM), Jaques Sobretudo Gersgorin (Kaleidoscópio) e Laert Sarrumor. Foto: Grace Lagôa

Depois dessa ocasião de 2005, houve essa entrevista do Jaques no Rádio Matraca (2006), e outra em que participei com o Bento Araújo, para falar sobre os shows do Alice Cooper, em 1974, no Brasil, também no programa. 
Laert Sarrumor & "Os Três do Pedra", em abril de 2011, no Melograno Bar de São Paulo. Click: Sandra Lozano

E finalmente, em 2011, o Pedra faria o seu último e melancólico show (tal banda voltaria à ativa, um ano depois, em 2012), através de um projeto encabeçado pelo próprio, Laert Sarrumor, realizado no Melograno Bar, em São Paulo. De fato, ele era (é), um fã do trabalho do Pedra, e ficou chateado por saber sobre o final de atividades da nossa banda, ao lamentar sobre essa resolução da banda, reservadamente, mas também publicamente pelas redes sociais da Internet, principalmente no Facebook.

No entanto, quando o Pedra voltou às atividades, em 2012, ele vibrou, e rapidamente nos programou para mais um show no mesmo espaço, espetáculo que fizemos com muito prazer. Basicamente foram esses os meus momentos pós-Língua de Trapo, depois de deixar a banda no ano de 1984...

Pedra & Laert Sarrumor no Melograno Bar de São Paulo, em dezembro de 2012. Click: Grace Lagôa

Continua...

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