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quarta-feira, 11 de março de 2015

Trabalhos Avulsos - Capítulo 33 - Tributo à Hélcio Aguirra - Por Luiz Domingues

Capítulo triste, pois sinceramente eu preferiria que isso jamais houvesse ocorrido e um amigo estivesse ainda entre nós. É o caso portanto de uma participação que fiz em um evento, ocorrido em fevereiro de 2014, e que apesar de ter sido prazeroso, musicalmente a falar, foi bastante doloroso, por outro aspecto. 

Pois foi o seguinte o que ocorreu: em fevereiro de 2014, eu recebi o convite de uma amiga minha, produtora musical, e nesse caso, foi irrecusável devido ao seu cunho sob luto mútuo em que fomos acometidos, pela perda de um grande amigo em comum.

Antes de falar do evento em si, preciso retroagir ao final de janeiro desse mesmo ano, 2014. Estava a trabalhar no meu Blog, durante a madrugada de um dia quente de verão, quando ao abrir o Google para realizar uma pesquisa, deparei-me com um notícia que rasgou-me o coração: 

"Morre o guitarrista Hélcio Aguirra, do Golpe de Estado".

http://musica.uol.com.br/noticias/redacao/2014/01/21/guitarrista-da-banda-golpe-de-estado-helcio-aguirra-morre-aos-56-anos.htm

http://g1.globo.com/sao-paulo/musica/noticia/2014/01/morre-helcio-aguirra-guitarrista-da-banda-golpe-de-estado.html

Aquele desconforto no estômago, típico de quando recebemos uma notícia chocante do falecimento de um familiar ou amigo querido, formou-se, e dessa forma, eu fiquei sem reação por algum tempo. Como assim? Perplexo, abandonei os meus afazeres, e passei a caçar informações pelos portais de notícias, quando finalmente tive que confrontar a realidade.

http://rollingstone.uol.com.br/noticia/morre-o-guitarrista-da-banda-golpe-de-estado-helcio-aguirra/

http://www1.folha.uol.com.br/ilustrada/2014/01/1401108-morre-o-guitarrista-helcio-aguirra-da-banda-golpe-de-estado-56-anos.shtml   
No dia seguinte, eu compareci com muito pesar ao seu velório, diga-se de passagem, um dos mais cheios que já havia visto até então, a denotar o quanto ele era querido por seus fãs, muitos amigos e colegas. Ali eu encontrei inúmeros amigos, gente com quem toquei, músicos contemporâneos de diversas bandas pelas quais atuei, jornalistas, produtores musicais etc. 
 
O produtor musical, Luiz Calanca esteve inconsolável no ambiente fúnebre. Nelson Brito pareceu mergulhado sob uma dor circunspecta, o percussionista, Nobuga, também mostrou-se desesperado. Enfim, foi uma tarde tristíssima para todos. 
Na cerimônia de cremação, eu fiquei ao lado do produtor, Vagner Garcia, que produziu três shows do Pedra, foi também produtor de uma coletânea na qual o Pitbulls on Crack atuou em 1993, e que aliás, desde o final dos anos 1980, era o "Big Boss" da gravadora Eldorado, e conviveu muito com o Hélcio, seu contratado, e este a viver grande fase com o Golpe de Estado. 
 
Ele, Vagner, contou-me as suas lembranças sobre os dias de glória do Golpe de Estado na sua gravadora, e o quanto estava perplexo por estar ali na cerimônia de cremação. 
 
Bem, eu conheci o Hélcio em 1984, e tornamo-nos amigos desde então. Além de ser um guitarrista excepcional e compositor inspirado, era um conhecedor de eletrônica, ao saber consertar com maestria, amplificadores, pedais etc. Ele culminara em ganhar bastante dinheiro com isso, paralelamente à sua carreira artística, com uma oficina super requisitada pelos músicos de São Paulo, por muitos anos, eu incluso, vide as inúmeras vezes em que o meu amigo mexeu no meu velho amplificador, Duovox...
Atravessei os anos a ser amigo dele, e ele a acompanhar os diversos trabalhos diferentes em que coloquei-me, e curiosamente, ele foi amigo de todos os músicos com os quais eu toquei, em meio a essas diferentes bandas.
 
Era amigo de Rubens Gióia e Zé Luiz Dinola, d'A Chave do Sol, e o vocalista Beto Cruz, da mesma banda, foi quem o apresentou para Paulo Zinner e Nelson Brito para que se formasse o Golpe de Estado. 

No Pitbulls on Crack, Chris Skepis era seu amigo e aliás, foi o Hélcio quem apresentou-nos, quando este convidou-me a fazer shows com a banda Tributo ao Black Sabbath, "Electric Funeral", em 1990.
 
Em relação à Patrulha do Espaço, Hélcio era amigo de longa data do Rolando Castello Junior, e através de minha pessoa, Rodrigo Hid, e Marcello Schevano também tornaram-se amigos dele.
 
Com o Pedra, a ligação de Hélcio com Xando Zupo também remetia aos anos 1980, e em dada ocasião em que quebrara o braço, no início dos anos 1990, o Xando o substituiu em shows do Golpe de Estado, interinamente. 
Portanto, a sua perda repentina foi sentida por todos, e foi um tremendo choque.
 
Poucos dias após a sua perda, eu recebi um recado "inbox", pela rede social, Facebook, a sondar a minha possibilidade de vir a participar de um show em homenagem ao Hélcio, e com a sua possível renda revertida à sua viúva, Jane, para se minimizar a despesa do seu funeral.
 
Claro que eu aceitei de pronto, pois seria uma honra homenageá-lo, e ajudar a sua viúva, igualmente amiga minha. Mais que isso, seria a oportunidade póstuma para agradecer-lhe por tanta ajuda que deu-me, e tenho casos relatados aqui mesmo neste capítulo sobre os Trabalhos Avulsos, com oportunidades que foram proporcionadas por ele, Hélcio.
 
Óbvio que aceitei, e fui informado por tal produção, que muitos amigos estariam a aderir, também, e não poder-se-ia esperar outra resolução, ao considerar-se a comoção gerada, e mais que isso, o quanto o Hélcio era querido no meio.

Camarim da casa de espetáculos Olympia, em São Paulo/1992 durante o show do Black Sabbath: Hélcio e Tony Iommi, o seu grande ídolo, e certamente o maior influenciador da sua carreira  

As circunstâncias descritas seriam as seguintes: esse show-tributo aconteceria através de combos arranjados na hora, a se mesclarem os músicos, e cada combo tocaria duas ou três músicas do "Golpe do Estado", "Mobilis Stabilis" ou do "Harppia", bandas pelas quais ele foi membro, e cogitara-se até músicas do "Black Sabbath", "Judas Priest", "Ufo" e "Michael Schenker Group", bandas internacionais que ele gostava, e influenciaram-no, como guitarrista. 

Os dias passaram e houve uma certa falta de comunicação entre as três organizadoras e os músicos, mas não estou a culpá-las, pois ficou implícito que tal escolha de músicas a serem tocadas, ficaria a cargo dos músicos. De minha parte, eu avisei que não tinha tempo para tirar muitas músicas, portanto, gostaria de uma definição rápida, para focar em duas ou três apenas, mas essa definição não veio.

O grande vocalista, Abdalla Kilsam, especialista em reproduzir o som de bandas clássicas do Hard-Rock setentista 

A minha comunicação foi mais com o Abdalla, um grande amigo meu, vocalista, que tem muitos trabalhos cover pela noite paulistana, e que seria o cantor do combo onde eu tocaria. 

A faltar dois dias para o evento, eu resolvi ir com a proposta de realizar uma jam session sob improviso, pois não havia até ali nenhuma comunicação oficial sobre quais músicas eu tocaria, mas isso não importava. O crucial seria homenagear o Hélcio.

Cheguei ao local, a "Livraria da Esquina", e gostei do astral do estabelecimento. As instalações mostravam-se simples, a aparentar similaridades com salões de Rock periféricos, mas havia um astral um tanto quanto contracultural, com a sua decoração a evocar figuras importantes da literatura, e motivações "mezzo" psicodélicas.

De fato, ali era uma livraria com estrutura para shows musicais, o que tornava o ambiente salutar pelos propósitos nobres. Encontrei inúmeros amigos, e devo dizer que a maioria ali, era mais da cena do Heavy Metal oitentista, do que da órbita do Golpe de Estado.
Haviam mais fãs do Harppia, o que foi deveras exótico, por que a despeito do Hélcio ter tido uma parte importante de sua carreira com essa banda, e sob tal cena, a sua fama maior foi construída com o Golpe de Estado, não resta dúvida.

Isso poderia ser explicado parcialmente pelo fato das garotas que organizaram a festa, que detinham mais proximidade com tal cena do Heavy-Metal oitentista. Nada contra, mas achei exótico tocarem muito mais material do Harppia, do que Golpe de Estado e nenhuma menção ao Mobilis Stabilis, um outro trabalho importante do Hélcio.
E assim, os sucessivos combos puseram-se a tocar, com o Heavy-Metal a predominar. Percy Weiss, Tibério Corrêa, Ricardo Ravache, Nilton "Cachorrão", e outras figuras históricas dessa cena, tocaram, e o Rubens Gióia, o meu ex-colega d'A Chave do Sol, participou também.

Grande guitarrista e pessoa extremamente gentil, Roger Bacelli

O guitarrista da banda, Nacionarquia, Roger Bacelli, chamou-me então para tocar, e na hora, ele organizou um combo. Roger perguntou-me se eu aceitaria tocar alguma canção d'A Chave do Sol, com o Rubens. Claro que eu aceitei tocar com ele, Rubens, mas achei que tentar alguma música d'A Chave do Sol seria uma temeridade, pois as músicas dessa minha ex-banda, eram complicadas, cheias de convenções e detalhes e que não dava para tocar sem ensaios prévios, assim diretamente em uma jam despretensiosa. 

Na verdade o correto seria ter ensaiado com antecedência para fazer direito se fosse o caso, mas na falta dessa pré-produção, o melhor a ser feito ali, seria uma jam de improviso. O Roger, que é um excelente guitarrista e muito generoso, ainda ponderou se eu aceitaria fazer um cover, e que o Rubens havia proposto fazermos algo do Jimi Hendrix. Insisti que uma jam seria mais seguro, e mais condizente com o espírito do espetáculo. 

E assim, subimos ao palco, com o combo formado na hora, que consistiu de: Roger Bacelli na guitarra, Marcelo Ladwig (baterista da ótima banda de Hard-Rock, King Bird), e Rubens na outra guitarra, além de eu mesmo no baixo. Por incrível que pareça, com todo o afastamento que eu e Rubens tivemos pelos desentendimentos que culminaram com o fim d'A Chave do Sol, e início de uma dissidência para eu e Beto Cruz, o fato é que eu não tocava com ele, desde dezembro de 1987!

Enfim, além da comoção pelo passamento do Hélcio e de fato, o banner colocado no palco com a sua foto não deixou-nos perder o foco do propósito daquela festa, foi emocionante também para nós dois, eu e Rubens, esse reencontro.

Filmagem da tal jam citada, proporcionada pelo casal Rocker de fotógrafos e documentaristas, Bolívia & Cátia

Eis o Link para assistir no YouTube:
https://www.youtube.com/watch?v=5AiKzBH7L2U

Estávamos os dois sob comoção por isso também, e assim foi nítido nos respectivos semblantes. O tema que tocamos foi algo inspirado em Jazz-Rock ou Fusion, com o Roger a criar na hora uma bela harmonia, com uma certa sofisticação jazzística. Todos entraram no clima e ambos os guitarristas revezaram-se em solos sob o poder dos improvisos e bem interessantes, por sinal. 

Eu e Marcelo entendemo-nos bem, a promovermos mudanças de levadas, às vezes até a insinuar o Funk-Rock setentista. O público presente aglomerou-se na frente do palco, e houve uma comoção. Não esperava por isso, mas dentre os admiradores do Heavy-Metal oitentista, havia e há um respeito enorme pelo trabalho d'A Chave do Sol. Isso eu entendo e aceito positivamente, embora no capítulo sobre A Chave do Sol, nesta autobiografia, eu tenha feito inúmeras ressalvas ao fato da banda ter aproximado-se dessa cena. Ainda penso assim, mas jamais poderia deixar de reconhecer o carinho dos que professam tal admiração pessoal, e enxergam A Chave do Sol como componente desse cenário.

Fiquei muito contente com essa pequena comoção pró-A Chave do Sol, e mesmo ao não atender aos gritos de pessoas que pediam músicas da banda, e outros mais ousados a cobrarem uma "volta" oficial da nossa banda, claro que agradeci o carinho, com entusiasmo.

Terminada a minha participação, fiquei mais um pouco na casa, e parti, não sem antes cumprimentar as meninas (Sandra Marques, Christine Funke e Gigi Jardim), que esforçaram-se para o evento acontecer. 

Foi assim então a minha participação no evento: "Tributo ao Hélcio Aguirra", em 22 de fevereiro de 2014, na Livraria da Esquina, em São Paulo.  

Matéria sobre esse show publicada no site Wiplash:

http://whiplash.net/materias/shows/198805-golpedeestado.html

Cabe registrar que esse evento teve problemas decorrentes de alguns mal-entendidos gerados em redes sociais. Uma celeuma foi criada, pois houve a informação de que os membros remanescentes do Golpe de Estado estavam a desaprovar a realização de tal evento, e teriam lançado uma nota oficial, ao repudiá-lo. 

Alheio à essa questão, mesmo por que sou amigo dos três membros remanescentes, não entendi o por que deles terem tido essa reação. Uma explicação inicial dera conta de que eles consideravam o evento muito próximo do passamento do Hélcio, e que ele merecia um Tributo de maior porte, e organizado pela banda, de uma forma oficial. Bem, se por um lado houve uma certa razão, pois o Hélcio merecia um evento com grande porte para homenageá-lo, por que uma iniciativa gerada por amigos, e mesmo sem grande magnitude, não poderia ocorrer, em paralelo? Nesses termos, o Hélcio por ter muitos fãs e amigos, merecia tal carinho espontâneo, e ninguém poderia querer monopolizar uma homenagem. Por que não poderia acontecer tal Tributo sob uma proporção mais modesta?

Bem, dias depois do Tributo ter sido realizado, veio à baila uma outra polêmica. Um boato surgiu no métier, de que o evento fora manipulado para a renda não chegar às mãos da viúva do Hélcio, mas que fora embolsada por um elemento, que enganara as três organizadoras do mesmo. Quando eu tomei conhecimento desse rumor malicioso, fiquei indignado, pois tratou-se de uma mentira deslavada que espalhara-se de uma forma sorrateira pelas redes sociais da Internet, e que denegrira a imagem, não só das meninas envolvidas, mas fazia de nós, participantes (eu, incluso), "palhaços" que fomos tocar com um nobre propósito, e teríamos sido usados como idiotas úteis por um canalha inescrupuloso de plantão. 

Imediatamente eu entrei em contato com uma das garotas, e passei-lhe tal informação sobre o boato, e ela prontamente apressou-se e esclareceu tudo, não sem antes mostrar-se boquiaberta com a maldade sabotadora de quem espalhou tal calúnia. Ela enviou-me internamente o borderô da noite, e marcou visita à viúva do Hélcio, para entregar-lhe a quantia, que não era nenhuma soma vultosa, mas ajudar-lhe-ia certamente nesse momento difícil. 

Entretanto, a viúva recusou-se a receber, ao dizer-se constrangida pelo mal-entendido gerado antes da realização do evento, e autorizou a produção do show a doar o dinheiro para uma instituição de caridade. Dessa maneira, o dinheiro foi doado para a AACD da cidade de Osasco-SP, e essa amiga minha postou o recibo desse depósito no meu inbox de Facebook, e deve ter tornado isso público para calar a língua venenosa dos caluniadores, e sabotadores de plantão. 

Eu não acompanhei mais o caso, e não vou postar o recibo aqui, para não expor ninguém, mas na minha consciência, estou tranquilo, ciente que não fui "palhaço" de nenhum gatuno, como estavam a afirmar, e nem mesmo as três meninas podem ser acusadas de também terem sido idiotas úteis para o benefício de ladrões. 

Três meses depois, um outro evento com maior magnitude foi organizado pelos membros sobreviventes do Golpe de Estado, com vários convidados em um dos palcos da Virada Cultural de São Paulo, mas desta vez, eu não fui convidado, e foi óbvia a razão, pois o Nelson Brito foi quem deveria pilotar o baixo, o tempo todo. Nessa ocasião, a homenagem foi calcada no trabalho do Golpe de Estado, notadamente a banda com a qual o Hélcio mais brilhou em sua carreira.

Descanse em paz, amigo Hélcio, e muito obrigado por tudo!

O próximo trabalho avulso que eu realizei foi sob o manto da invisibilidade, saiba a razão disso, ao ler a seguir... 

Continua...

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